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Mobilidade acadêmica internacional na formação em enfermagem: relato de experiência

Movilidad académica internacional en la formación de enfermería: relato de experiencia

RESUMO

Objetivo:

relatar a experiência da mobilidade acadêmica internacional na Irlanda por meio do programa Ciência sem Fronteiras durante a graduação de enfermagem.

Método:

trata-se de um relato de experiência apresentado em ordem cronológica e de natureza descritiva.

Resultados:

a oportunidade de conhecer e poder discutir as questões de saúde e de enfermagem na Irlanda possibilitou a revisão de conceitos e um olhar mais reflexivo a respeito das práticas de enfermagem. Além disso, o intercâmbio promoveu o fortalecimento pessoal em relação ao enfrentamento e solução de problemas, desenvolvimento de habilidades técnico-científicas, aperfeiçoamento das competências linguísticas e construção de personalidade, independência e maturidade.

Conclusão:

diante de uma experiência tão construtiva e enriquecedora que essa mobilidade proporciona ao graduando, aos governantes, à população e à enfermagem brasileira, espera-se que o compartilhamento dessa vivência sirva de encorajamento para aqueles que buscam novos horizontes, com o objetivo de agregar conhecimentos para a vida pessoal e profissional.

Descritores:
Intercâmbio Educacional Internacional; Enfermagem; Educação Superior; Educação em Enfermagem; Universidades

RESUMEN

Objetivo:

relatar la experiencia de movilidad académica internacional en Irlanda a través del programa Ciencia Sin Fronteras durante el curso de enfermería.

Método:

relato de experiencia expresado en orden cronológico, de naturaleza descriptiva.

Resultados:

la oportunidad de conocer y pode discutir cuestiones de salud y de enfermería en Irlanda permitió la revisión de conceptos y una visión más reflexiva respecto de las prácticas de enfermería. Además, el intercambio promovió el desarrollo personal respecto a enfrentar y solucionar problemas, adquisición de habilidades técnico-científicas, perfeccionamiento de competencias lingüísticas y formación de la personalidad, independencia y madurez.

Conclusión:

frente a la experiencia tan constructiva y enriquecedora que la movilidad le otorga al estudiante, a los gobernantes, a la población y a la enfermería brasileña, se espera que compartir la vivencia aliente a aquellos que buscan nuevos horizontes, con el objetivo de sumar conocimientos útiles para la vida personal y profesional.

Descriptores:
Intercambio Educacional Internacional; Enfermería; Educación Superior; Educación en Enfermería; Universidades

ABSTRACT

Objective:

report the experience of international academic mobility in Ireland through the program Science Without Borders during undergraduate education in nursing.

Method:

a report of experience presented in chronological order, with a descriptive nature.

Results:

the opportunity to know and be able to discuss questions regarding health and nursing in Ireland allowed the review of concepts and a more reflective perspective regarding nursing practices. Additionally, the exchange promoted personal strengthening regarding the confrontation and solution of problems, development of technical and scientific abilities, improvement of linguistic competences and construction of personality, independence and maturity.

Conclusion:

regarding such constructive and enriching experience that this mobility provides to students, to the governing authorities, to the population and to Brazilian nursing, sharing this experience is expected to serve as encouragement for those who search for new horizons, with the objective of adding knowledge for their personal and professional life.

Descriptors:
International Educational Exchange; Nursing; Higher Education; Education, Nursing; Universities

INTRODUÇÃO

A universidade desempenha um papel crucial no desenvolvimento da sociedade por meio de suas três dimensões constitutivas (ensino, pesquisa e extensão), promovendo a aquisição e a geração de conhecimento e a formação de indivíduos qualificados e preparados para atuar no mercado de trabalho(11 Glat R, Pletsch MD. O papel da Universidade no contexto da política de Educação Inclusiva: reflexões sobre a formação de recursos humanos e a produção de conhecimento. Rev Educ Espec [Internet]. 2010[cited 2015 Aug 12];23(38):345-56. Available from: http://cascavel.ufsm.br/revistas/ojs-2.2.2/index.php/educacaoespecial/article/view/2095/1444
http://cascavel.ufsm.br/revistas/ojs-2.2...
). Atualmente, no Brasil, existem diversos programas populares criados a partir do século XXI que democratizam o acesso da população ao ensino universitário. Entre alguns programas de incentivo ao acesso e à permanência na universidade oferecidos aos estudantes pelo Ministério da Educação (MEC), estão o Programa Universidade para Todos (ProUni), o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), o Sistema de Seleção Unificada (Sisu) e, recentemente, a criação do programa Ciência sem Fronteiras (CsF), que possibilita ao acadêmico de Ensino Superior receber aprimoramento e qualificação em níveis internacionais(22 Brasil. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Superior. Programas e Ações [Internet]. Brasília (DF): Ministério da Educação; 2015 [cited 2015 Aug 13] Available from: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=12498&Itemid=820
http://portal.mec.gov.br/index.php?optio...
).

O Ciência sem Fronteiras é uma iniciativa do Governo Federal em convênio com os Ministérios da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), o MEC e as Secretarias de Ensino Superior e de Ensino Tecnológico do MEC, tendo como instituições de fomento o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Este programa visa a possibilitar, por meio da mobilidade acadêmica internacional, a formação e a capacitação de estudantes brasileiros em relação à tecnologia e inovação. Além disso, o CsF busca atrair pesquisadores estrangeiros que queiram desenvolver pesquisas no Brasil ou estabelecer parcerias com os pesquisadores brasileiros nas áreas prioritárias definidas no Programa, bem como possibilitar que esses pesquisadores recebam capacitação especializada no exterior(33 Brasil. Decreto n.º 7.642, de 13 de dezembro de 2011. Institui o Programa Ciência sem Fronteiras [Internet]. Diário Oficial da União [cited 2015 Aug 15]. Available from: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Decreto/D7642.htm
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).

Em relação à enfermagem, a internacionalização e o contato do acadêmico com um modelo de ensino e atuação de enfermagem diferentes do que está habituado promovem a permuta de conhecimentos e agregação de novos valores e competências ao futuro da profissão em ambos os países envolvidos. Sendo assim, o intercâmbio de estratégias entre os países estimula mudanças pequenas e graduais nas práticas diárias da assistência de enfermagem(44 Dalmolin IS, Pereira ER, Silva RMCRA, Gouveia MJB, Sar­dinheiro JJ. Intercâmbio acadêmico cultural internacional: uma experiência de crescimento pessoal e científico. Rev Bras Enferm [Internet]. 2013 Jun [cited 2015 Aug 15];66(3):442-7. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-71672013000300021&lng=en
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).

Tendo em vista todos os benefícios e as vantagens que a mobilidade acadêmica internacional pode agregar à formação do acadêmico de enfermagem, justifica-se o investimento e manutenção dos convênios entre Instituições de Ensino Superior brasileiras e internacionais. Dessa forma, a participação do curso de enfermagem no programa Ciência sem Fronteiras é importante para a formação e capacitação de estudantes em relação à tecnologia e inovação; o desenvolvimento da produção científica qualificada para reconhecimento e valorização das revistas brasileiras de Enfermagem(55 Brasil. Ministério da Educação. Ofício nº 31/2012 de 04 de dezembro de 2012. Ciência sem Fronteiras [Internet]. Coordenação da Área de Enfermagem/CAPES [cited 2015 Aug 15]. Available from: http://www.cofen.gov.br/wp-content/uploads/2013/01/oficio_ciencia_-sem_fronteiras.pdf
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). Não obstante, a troca de experiências entre ex-bolsistas é primordial para o aperfeiçoamento das estratégias da mobilidade acadêmica internacional e difusão dos conhecimentos e competências associadas durante esta experiência.

Espera-se com este relato divulgar as experiências e competências de enfermagem obtidas durante a mobilidade para a comunidade acadêmica, principalmente, graduandos de enfermagem e aqueles interessados neste programa e; promover reflexão sobre as diferenças e similaridades da formação e atuação do enfermeiro entre as IES envolvidas a fim de, cada vez mais, aprimorar a formação acadêmica e a assistência de enfermagem prestadas à população. Portanto, este trabalho tem como objetivo relatar a experiência da mobilidade acadêmica internacional na Irlanda por meio do programa Ciência sem Fronteiras, durante a graduação de enfermagem.

RELATO DE EXPERIÊNCIA

Trata-se de um relato de experiência vivenciado por uma acadêmica do 8º período de enfermagem da Universidade Federal de Alfenas - Minas Gerais durante a mobilidade acadêmica internacional realizada no período de janeiro de 2014 a maio de 2015 no Institute of Tecnolology Tralee (ITT), na Irlanda. O cenário das atividades desenvolvidas na Irlanda ocorreu em 3 momentos distintos: 1) curso intensivo de inglês durante os primeiros seis meses; 2) realização do International English Language Testing System (IELTS), exame de proficiência em inglês e, 3) curso de disciplinas de enfermagem geral e outras matérias que fossem da preferência do acadêmico.

Vale ressaltar que, devido à barreira linguística, não foi permitido a realização de estágio curricular, e os alunos de enfermagem foram aconselhados a selecionar módulos dos primeiros anos do curso e outras disciplinas relacionadas à cultura irlandesa. No âmbito científico, também não foram oferecidas oportunidades para desenvolvimento de pesquisas científicas. No entanto, o departamento de Enfermagem do ITT se dispôs a apresentar a infraestrutura de dois hospitais em Tralee - o Hospital Geral de Kerry e o Hospital Bon Secours - e a responder todas as dúvidas dos acadêmicos em relação à organização dessas instituições. Embora as expectativas em relação ao estágio curricular e à pesquisa científica não terem sido atendidas, as aulas e as visitas técnicas aos hospitais agregaram conhecimentos sobre novos equipamentos, materiais, tecnologias e práticas de enfermagem diferentes daquelas disponíveis no Brasil.

Além das disciplinas cursadas durante a mobilidade acadêmica, foram fornecidas palestras: "Cuidado ao idoso: demências degenerativas e disfunções cognitivas"; "Cuidado ao idoso: políticas nacionais sobre abuso e autonegligência"; e "Políticas de proteção à criança e ao adolescente"; capacitação do uso do glicosímetro na verificação de glicemia dos pacientes; curso on-line obrigatório sobre Diretrizes Nacionais Irlandesas para enfermeiros, sobre administração de medicações e treinamento compulsório reconhecido pela Irish Heart Foundation, acerca da ressuscitação cardiopulmonar e uso de desfibrilador automático externo em adultos e crianças. A participação em congresso e palestras de enfermagem também foi importante para a expansão dos conhecimentos e troca de experiências com outros acadêmicos. Ademais, em dezembro de 2014, a aluna foi convidada pelo escritório internacional do instituto a operar como embaixadora de enfermagem do programa Ciência sem Fronteiras, para esclarecimento de dúvidas dos próximos bolsistas e promover ao instituto a comunicação das redes sociais.

Em relação às disciplinas cursadas, estas compreenderam o desenvolvimento de estratégias de aprendizagem para apoiar os acadêmicos a se tornarem aprendizes independentes no Ensino Superior; aprimoramento de habilidades linguísticas e consciência cultural necessárias para fins acadêmicos e sociais; desenvolvimento de competências para expandir a compreensão da prática baseada em evidências na enfermagem; introdução e capacitação do aluno aos conceitos de enfermagem e suas atribuições para que forneçam um nível dependente de cuidados individualizados centrados na pessoa, bem como exploração das bases fundamentais da teoria e prática de enfermagem.

Embora similar às estratégias de ensino brasileiras, o curso de enfermagem no ITT se destaca pela sua natureza prática, com menos tempo de teoria em laboratórios e em salas de aula e mais horas destinadas à aprendizagem nos hospitais e nas clínicas. Durante os estágios clínicos, os acadêmicos de enfermagem atuam em diversos setores como bloco cirúrgico, pronto atendimento, atenção básica, ambulatório, pediatria, maternidade e clínica de saúde mental. Vale ressaltar que o programa também possui linhas de pensamento similares à dinâmica curricular da enfermagem brasileira, enfatizando a importância de trabalhar com uma equipe multiprofissional e de planejar a assistência de enfermagem de forma individualizada, incentivando a participação da pessoa em seu próprio cuidado. Semelhante aos programas de educação em enfermagem, o curso visa ao cuidado, à comunicação e à compreensão dos processos de saúde e doença do ser.

Outro aspecto observado durante a mobilidade é a existência de apenas enfermeiros, residentes e acadêmicos de enfermagem nos setores dos hospitais, o que difere do Brasil pela existência dos auxiliares e técnicos de Enfermagem. Cabe enfatizar que na Irlanda, desde 2007, há a possibilidade de enfermeiros e enfermeiros obstetras prescreverem medicações. Os profissionais que almejam prescrever necessitam realizar um curso, denominado de Prescriptive Authority, com duração de seis meses que é oferecido por IES credenciadas, para que possa obter o título de enfermeiro prescritor (Nurse Prescriber). Ademais, em algumas categorias é permitido que enfermeiros prescrevam narcóticos e medicamentos para cuidados paliativos(66 Nursing and Midwifery Board of Ireland. Frequently Asked Questions about Prescriptive Authority [Internet]. Ireland, 2014 [cited 2015 Sep 16]. Available from: http://www.nursingboard.ie/en/prescriptive_authority.aspx
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).

Uma característica bastante peculiar neste país é a existência de uma categoria de enfermagem denominada Advanced Practice Registered Nurse (APRN). Esta é comum em países como Austrália, Bélgica, República Checa, Finlândia, França, Irlanda, Japão, Polônia, Estados Unidos, Canadá e Reino Unido. Os enfermeiros licenciados nesta categoria são profissionais que atuam autonomamente, sendo responsáveis pela própria prática e adquiriram uma base de conhecimento especializado por meio de um curso de mestrado. Dessa forma, estes profissionais devem demonstrar alta capacidade de avaliação, de diagnóstico, de análise e de habilidades de julgamento clínico e os componentes deste nível de prática, objetivando garantir o bem-estar para a pessoa e sua família, oferecendo intervenções de saúde em colaboração com outros profissionais. É de competência desse tipo de enfermeiro atuar em: 1) prática clínica; 2) liderança e prática colaborativa; 3) educação e aprendizagem; e, 4) pesquisas e na prática baseada em evidências(77 Northern Ireland Practice and Education Council for Nursing and Midwifery. Advanced nursing practice framework: supporting advanced nursing practice in health and social care trusts [Internet]. Ireland 2014 [cited 2015 Aug 22]. Available from: http://www.dhsspsni.gov.uk/advanced_nursing_practice_framework.pdf
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).

Durante o período de mobilidade acadêmica, foram vivenciados altos e baixos momentos. A experiência de mudar para um país com o clima diferente do que a acadêmica estava habituada, o enfrentamento de barreiras linguísticas e socioculturais e o condicionamento psicofisiológico às rotinas irlandesas, de início, tudo isso causou estranhamento e insegurança. Todavia, os problemas não impediram a busca por novos horizontes, prosseguimento dos estudos, planejamento de viagens, estabelecimento de amizades, agregação de novos valores e visões de mundo. As dificuldades são inerentes a readaptação do acadêmico e, portanto, não são dignas de maior destaque.

REFLEXÃO TEÓRICA

A Enfermagem tem aprimorado cada vez mais a qualificação dos cursos de graduação e programas de pós-graduação em todo país, evidenciando-se o crescimento da produção científica e de mão de obra qualificadas bem como o reconhecimento e fortalecimento da qualificação das revistas brasileiras na área de Enfermagem, além de sua contribuição no processo de internacionalização da ciência brasileira(55 Brasil. Ministério da Educação. Ofício nº 31/2012 de 04 de dezembro de 2012. Ciência sem Fronteiras [Internet]. Coordenação da Área de Enfermagem/CAPES [cited 2015 Aug 15]. Available from: http://www.cofen.gov.br/wp-content/uploads/2013/01/oficio_ciencia_-sem_fronteiras.pdf
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). Portanto, a mobilidade acadêmica internacional é uma estratégia imprescindível para o crescimento da Enfermagem brasileira e internacional e suas implicações à saúde da população.

No que diz respeito às diferenças estruturais dos hospitais e universidades entre os países, é evidente a discrepância da disponibilidade e qualidade dos materiais e tecnologias utilizadas nos cuidados de enfermagem em alguns desses países. No entanto, notar essas diferenças e compará-las é um passo importante para reflexão das políticas de investimento futuras e mudanças nas estratégias de saúde. Em outros países, como na Espanha, há o investimento em materiais que visem à qualidade dos serviços prestados na biossegurança dos envolvidos, pacientes e profissionais. Alguns destes materiais são: cateteres de acessos venosos periféricos com sistema automático de recapeamento das agulhas, esparadrapos transparentes, agulhas hipodérmicas automáticas e individuais para mensuração de glicose, opções de luvas de procedimentos com látex e sem látex, entre outros materiais(88 Santamaria FS, Kurschner CF, Munhoz CJM. Relato de experiência na mobilidade acadêmica internacional. Revista Internacional em Saúde Coletiva [Internet]. 2014 [cited 2015 Sep 24];5:110-22. Available from: https://www.growkudos.com/articles/10.15411/figesc.v5i5.61
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).

Algo que chama atenção no modelo de assistência à saúde irlandesa é a isenção de taxas restrita apenas as pessoas/famílias de baixa renda e indivíduos com até 16 anos de idade. O resto da população que não se enquadra nesse contexto social e financeiro deve pagar algumas taxas para receber atendimento em hospitais e serviços de emergência bem como pelas medicações prescritas. Em alguns casos em que o indivíduo tem uma doença crônica, o governo oferece as medicações gratuitamente. Em relação à Saúde Coletiva, em especial, a Atenção Primária (Primary Care), existem centros de saúde (Health Centre) localizados na maioria das cidades irlandesas que são bastante similares à organização Estratégias de Saúde da Família (ESF) existentes no Brasil. Esses centros possuem uma equipe multiprofissional composta por médicos e enfermeiros especializados em Saúde Pública, terapeuta ocupacional, fisioterapeuta e pessoal de apoio. Além disso, contam com o suporte de fonoaudiólogos, nutricionistas, conselheiros/psicólogos, dentistas.

Em alguns estudos sobre relatos desta vivência no exterior, utilizados como base desta discussão, pode-se notar que os graduandos de enfermagem realizaram estágio extracurricular e desenvolveram pesquisas científicas durante a mobilidade, e que, com isso, proporcionaram um ganho significativo e agregador aos conhecimentos de enfermagem(44 Dalmolin IS, Pereira ER, Silva RMCRA, Gouveia MJB, Sar­dinheiro JJ. Intercâmbio acadêmico cultural internacional: uma experiência de crescimento pessoal e científico. Rev Bras Enferm [Internet]. 2013 Jun [cited 2015 Aug 15];66(3):442-7. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-71672013000300021&lng=en
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5 Brasil. Ministério da Educação. Ofício nº 31/2012 de 04 de dezembro de 2012. Ciência sem Fronteiras [Internet]. Coordenação da Área de Enfermagem/CAPES [cited 2015 Aug 15]. Available from: http://www.cofen.gov.br/wp-content/uploads/2013/01/oficio_ciencia_-sem_fronteiras.pdf
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6 Nursing and Midwifery Board of Ireland. Frequently Asked Questions about Prescriptive Authority [Internet]. Ireland, 2014 [cited 2015 Sep 16]. Available from: http://www.nursingboard.ie/en/prescriptive_authority.aspx
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7 Northern Ireland Practice and Education Council for Nursing and Midwifery. Advanced nursing practice framework: supporting advanced nursing practice in health and social care trusts [Internet]. Ireland 2014 [cited 2015 Aug 22]. Available from: http://www.dhsspsni.gov.uk/advanced_nursing_practice_framework.pdf
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-88 Santamaria FS, Kurschner CF, Munhoz CJM. Relato de experiência na mobilidade acadêmica internacional. Revista Internacional em Saúde Coletiva [Internet]. 2014 [cited 2015 Sep 24];5:110-22. Available from: https://www.growkudos.com/articles/10.15411/figesc.v5i5.61
https://www.growkudos.com/articles/10.15...
). Vale destacar que a chance de trabalhar em outro contexto de saúde, com outros profissionais e equipes multiprofissionais, possibilita aos graduandos a observação de diferentes práticas, aprendizado sobre os diversos modos de cuidar e a trabalhar em equipe, focando na educação e na prevenção em saúde(44 Dalmolin IS, Pereira ER, Silva RMCRA, Gouveia MJB, Sar­dinheiro JJ. Intercâmbio acadêmico cultural internacional: uma experiência de crescimento pessoal e científico. Rev Bras Enferm [Internet]. 2013 Jun [cited 2015 Aug 15];66(3):442-7. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-71672013000300021&lng=en
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). Dessa forma, destaca-se ainda mais a importância dos pactos entre as IES brasileiras e estrangeiras em relação a estas atividades, a fim de garantir ao acadêmico a oportunidade de explorar novos campos de estágio curricular e de pesquisa.

De maneira similar à vivência nesta mobilidade, a participação em disciplinas de enfermagem estrangeiras alberga novos conhecimentos e reflexões ao acadêmico que, por sua vez, tende a comparar a metodologia de ensino e as práticas de políticas de saúde estrangeira com a do seu país de origem. As disciplinas cursadas promovem a ampliação da reflexão crítica e do aprendizado acerca de conceitos éticos e assistenciais significantes que podem vir a ser implementados na política pública brasileira. Além disso, algumas disciplinas podem não constar na grade curricular dos cursos de graduação em enfermagem no Brasil, garantindo ao aluno um fator diferencial em sua formação.

No que tange a prescrição de medicamentos, os enfermeiros irlandeses possuem grande autonomia para prescrever antibióticos, drogas antivirais, antidepressivos e outras drogas controladas. Destaca-se que os principais objetivos da prescrição por enfermeiros são: 1) melhorar os serviços à população, incluindo a qualidade de vida (por exemplo, cuidados paliativos e cuidados do idoso); 2) reduzir os atrasos; 3) dispor a formação e especialização de enfermeiros da melhor forma possível e, 4) auxiliar o desenvolvimento de um serviço baseado na pessoa certa, proporcionando o cuidado certo no contexto correto. Além disso, o enfermeiro pode prescrever também radiação ionizante (raios X), sendo que esta ação suporta os serviços de saúde na prestação de serviços mais ágil, acessível e eficaz.

Para além da autonomia dada a esta classe de trabalhadores, a literatura aponta que enfermeiros e parteiras são prescritores seguros; os pacientes enxergam estes profissionais como algo positivo, uma vez que estes possuem atributos como responsividade e empatia, além da capacidade de comunicação de modo eficaz e fornecimento de informação adequada sobre as condições e o tratamento de um paciente; a prescrição por enfermeiros/parteiras reduz os custos e o tempo de espera por prescrições; as taxas de adesão dos pacientes ao enfermeiro/parteira prescritores são elevadas; enfermeiros/parteiras realizam uma anamnese detalhada antes de tomar uma decisão sobre uma intervenção e tendem a prescrever intervenções não farmacológicas(99 An Bord Altranais. Practice Standards and Guidelines for Nurses and Midwives with Prescriptive Authority [Internet]. Dublin: An Bord Altranais 2010 [cited 2015 Sep 25]. Available from: http://www.nursingboard.ie/getAttachment.aspx?id=d1c592bd-3994-4579-b03d-4a341823c4f1
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).

Tendo em vista o exposto, o papel exercido por profissionais da enfermagem em ambos os países, possui suas similaridades e discrepâncias no que tange a autonomia do profissional, na tomada de decisões e intervenções. Isto leva a refletir sobre a liberdade e autonomia da enfermagem no Brasil que, embora sancionadas pelo Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem (CEPE), ainda condicionam e delimitam a prática do enfermeiro. Assim, para vencer os empecilhos que abarcam a atuação de enfermagem brasileira, é preciso avançar nas relações entre os profissionais das diferentes categorias, evitando a imposição de uma sobre as demais, buscando o trabalho em equipe, e sempre visando ao cuidado da pessoa. Ainda, a detenção de mais conhecimento sobre alguma prática, certamente, proporciona ao profissional uma posição vantajosa para o exercício de sua autonomia(1010 Przenyczka RA, Lenardt MH, Mazza VA, Lacerda MR. The paradox of freedom and autonomy in nurses' actions. Texto Contexto Enferm [Internet]. 2012[cited 2015 Sep 27];21(2):427-31. Available from: http://www.scielo.br/pdf/tce/v21n2/en_a22v21n2.pdf
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).

Independentemente das discrepâncias entre as experiências relatadas por acadêmicos de enfermagem que vivenciaram o programa Ciência sem Fronteiras e das limitações deste programa, ressalta-se a importância e diferença significativa da mobilidade na formação do aluno de enfermagem. Reforça-se ainda a atuação do graduando como ator principal da sua própria trajetória acadêmica, sempre objetivando superar as dificuldades, aproveitando ao máximo as oportunidades que lhe são oferecidas em busca do conhecimento que almeja. No que tange à atuação de enfermagem, ainda há um longo caminho a percorrer para que estes profissionais possam atingir o ideal de liberdade/autonomia, cabendo à categoria continuar lutando por melhores condições de trabalho e maior valorização profissional.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A mobilidade acadêmica internacional oferece um leque de oportunidades para a expansão dos conhecimentos científicos e visões de mundo, proporcionando ao acadêmico uma visão ampla, reflexiva e crítica acerca das questões sociais, políticas, econômicas, pessoais e profissionais. A oportunidade de conhecer e poder discutir as questões de saúde e de enfermagem na Irlanda possibilitou a revisão de conceitos, quebra de paradigmas e olhar mais reflexivo a respeito das práticas de enfermagem. Além disso, foi um momento de desenvolvimento de habilidades técnico-científicas e interpessoais, de aperfeiçoamento das competências linguísticas e de construção de personalidade, independência e maturidade.

Haja vista os benefícios que o programa de mobilidade acadêmica internacional, Ciência sem Fronteiras, pode vir a acrescentar ao acadêmico por meio do desenvolvimento pessoal e de competências técnico-científicas, e à nação como um todo por meio da inserção de tecnologias inovadoras no ramo da saúde e, consequentemente, melhoria na qualidade de serviços prestados, sugere-se maior divulgação e investimento no programa Ciência sem Fronteiras. Diante de uma experiência tão construtiva e enriquecedora que essa mobilidade proporciona ao graduando, aos governantes, à população e à enfermagem brasileira, espera-se que o compartilhamento dessa vivência sirva de encorajamento para aqueles que buscam novos horizontes, com o objetivo de agregar conhecimentos para a vida pessoal e profissional.

REFERÊNCIAS

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Oct 2016

Histórico

  • Recebido
    27 Dez 2015
  • Aceito
    25 Jun 2016
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