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Avaliação das famílias de usuários de crack sobre grupo de apoio

RESUMO

Objetivo:

avaliar a percepção dos familiares de usuários de crack sobre grupos de apoio ofertados a esse núcleo de cuidado em um Caps Álcool e Drogas do sul do Brasil.

Método:

utilizou-se o referencial teórico da avaliação de quarta geração, tendo como dispositivo metodológico o círculo hermenêutico-dialético. A coleta de dados ocorreu através de 500 horas de observações e entrevistas com 12 familiares de usuários de crack, e na análise foi utilizado o método comparativo constante, que gerou a unidade de significado “grupo de família”.

Resultados:

esse grupo foi avaliado pelos familiares como um espaço que instrumentaliza para o manejo do o usuário em domicílio. Avaliaram a necessidade de estrutura básica para a realização dos grupos, de maior duração dos encontros, de sigilo das informações e de diversidade de horários.

Considerações finais:

sugere-se às instituições de ensino investimentos na formação e na qualificação de profissionais da enfermagem voltados para o atendimento em grupo.

Descritores:
Grupos de Apoio; Pesquisa sobre Serviços de Saúde; Cocaína Crack; Família; Saúde Mental

ABSTRACT

Objective:

to evaluate the perception of the relatives of crack users in relation to the support groups offered to this population in a Psychosocial Care Center for Alcohol and Drugs in the South of Brazil.

Method:

the fourth-generation theoretical framework was used for evaluation, having as methodological device the hermeneutical-dialectic circle. Data collection occurred through 500 hours of observations and interviews with 12 relatives of crack users, and the comparative constant method was used in the analysis, generating the “family group” unit of meaning.

Results:

this group was regarded by the family members as a space for guidance on the management of users in their home environment. They reported the need for a basic structure to conduct the groups, greater duration of the meetings, confidentiality of information and diversity of timetables.

Final considerations:

investment in education and training of nursing professionals focused on group care is suggested to the education institutions.

Descriptors:
Self-Help Groups; Health Services Research; Crack Cocaine; Family; Mental Health

RESUMEN

Objetivo:

evaluar la percepción de los familiares de usuarios de crack sobre grupos de apoyo ofertados a ese núcleo de cuidado en un CAPS (Centro de Atención Psicosocial) Alcohol y Drogas del sur de Brasil.

Método:

se utilizó el referencial teórico de la evaluación de cuarta generación, teniendo como dispositivo metodológico el círculo hermenéutico-dialéctico. La recolección de datos ocurrió a través de 500 horas de observaciones y entrevistas con 12 familiares de usuarios de crack, y en el análisis se utilizó el método comparativo constante, que generó la unidad de significado “grupo de familia”.

Resultados:

ese grupo fue evaluado por los familiares como un espacio que instrumentaliza para el manejo del usuario en domicilio. Evaluaron la necesidad de estructura básica para la realización de los grupos, de mayor duración de los encuentros, de sigilo de las informaciones y de diversidad de horarios.

Consideraciones finales:

se sugiere a las instituciones de enseñanza inversiones en la formación y en la calificación de profesionales de enfermería dirigidos a la atención en grupo.

Descriptores:
Grupos de Autoayuda; Investigación en Servicios de Salud; Cocaína Crack; Familia; Salud Mental

INTRODUÇÃO

A atual legislação em saúde mental preconiza a redução gradual e planejada de leitos em hospitais psiquiátricos e prioriza a implantação de serviços e ações de saúde mental de base comunitária, capazes de atender com resolubilidade aos usuários que necessitem de atenção(11 Brasil. Ministério da Saúde. Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas em Saúde. Reforma psiquiátrica e política de saúde mental no Brasil. In: Conferência Regional de Reforma dos Serviços de Saúde Mental: 15 anos depois de Caracas[Internet]. 2005[cited 2017 Sep 10]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/Relatorio15_anos_Caracas.pdf
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).

Entre os serviços de base comunitária, destacam-se os Centros de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (Caps AD), criados para atender à grande demanda de usuários de crack, álcool e outras drogas no Brasil, que se tornou uma questão de saúde pública. De acordo com a Organização Mundial de Saúde, pelo menos 10% da população dos centros urbanos de todo o mundo consome de modo prejudicial substâncias psicoativas(11 Brasil. Ministério da Saúde. Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas em Saúde. Reforma psiquiátrica e política de saúde mental no Brasil. In: Conferência Regional de Reforma dos Serviços de Saúde Mental: 15 anos depois de Caracas[Internet]. 2005[cited 2017 Sep 10]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/Relatorio15_anos_Caracas.pdf
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). Os Caps AD são dispositivos estratégicos da rede e passam a ser implantados sobretudo em grandes regiões metropolitanas e regiões ou municípios de fronteira com indicadores epidemiológicos relevantes(11 Brasil. Ministério da Saúde. Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas em Saúde. Reforma psiquiátrica e política de saúde mental no Brasil. In: Conferência Regional de Reforma dos Serviços de Saúde Mental: 15 anos depois de Caracas[Internet]. 2005[cited 2017 Sep 10]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/Relatorio15_anos_Caracas.pdf
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).

Uma substância psicoativa que tem chamado a atenção das autoridades, da mídia e da sociedade em geral é o crack, uma vez que vem atingindo todas as classes sociais e tem sido associado pela opinião pública ao desencadeamento de agressividade e violência, além de causar danos à saúde individual(22 Santos MFS, Acioli Neto ML, Sousa YSO. Social representations of crack and adolescence in Pernambuco’s media. Estud Psicol[Internet]. 2012[cited 2017 Jan 20];29(3):379-86. Available from: http://www.scielo.br/pdf/estpsi/v29n3/08.pdf
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). O crack é resultado da mistura entre bicarbonato de sódio, adulterantes e cloridrato de cocaína e, quando fumado, produz pequenas partículas absorvidas pelo pulmão, causando rapidamente a sensação de prazer fugaz(33 Willhelm FF, Escobar M, Perry IDS. Changes in body composition and anthropometric parameters in crack-cocaine addicts admitted in an addiction unit. J Bras Psiquiatr[Internet]. 2013[cited 2017 Mar 21];62(3):183-90. Available from: http://www.scielo.br/pdf/jbpsiq/v62n3/02.pdf
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).

O Brasil apresenta uma taxa de prevalência de usuários de cocaína, em suas diversas apresentações, estimada em 0,7% na população entre 15-64 anos, constituindo o maior número de dependentes da América do Sul(44 Volpe FM, Alemão MM, Drummond HA, Pinto LTS, Rocha AR, Silva EM, et al. Costs of admissions for cocaine/crack abuse: comparing general hospital and psychiatric hospital settings. Rev Med Minas Gerais[Internet]. 2014[cited 2016 Nov 14];24(5):22-8. Available from: http://rmmg.org/exportar-pdf/1617/v24s5a03.pdf
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). No início dos anos 1990, menos de 10% das internações de dependentes químicos eram de usuários de crack; no entanto, no final daquela década esse número subiu para 80%. No mundo, estima-se que 14 milhões de pessoas utilizem de forma abusiva cocaína e crack, sendo este o principal responsável pelas internações hospitalares nos Estados Unidos(55 Lacerda BL, Palmeiro PG, Kazmirczak AM, Mascarenhas MA. Crack addicts and social reintegration: reflections on a case study. Rev Uniara[Internet]. 2014[cited 2017 Jan 20];17(2):125-32. Available from: http://revistarebram.com/index.php/revistauniara/article/view/33/23
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).

O uso compulsivo do crack interfere na dimensão individual do usuário, comprometendo também seu relacionamento social, de forma que os vínculos sociais e familiares estáveis e normalizados fragilizem-se e rompam-se, marginalizando o usuário progressivamente. A dificuldade de convivência entre usuário e familiares é caracterizada como um dos principais obstáculos a serem enfrentados em relação ao uso dessa substância(66 Dias MAS, Silva LCC, Brito MCC, Silva AV, Rodrigues AB, Dias FAC. Biological and social repercussions from the use of crack: the voice of family members and users. Sanare[Internet]. 2013[cited 2017 Jun 07];12(2):21-6. Available from: https://sanare.emnuvens.com.br/sanare/article/view/378/270
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).

Nesse cenário, os Caps AD devem inserir a família no contexto de cuidados dos usuários de crack. Ao pensar sobre a assistência em saúde mental, a inserção da família no tratamento é um elemento indispensável para a reabilitação do dependente químico. Dessa maneira, a participação familiar no serviço de atenção em saúde mental e nos cuidados com o usuário de crack pode favorecer a aproximação afetiva entre os membros da família, rompendo com preconceitos sobre incapacidade e periculosidade e desmistificando a ideia de exclusão social(77 Duarte MLC, Olschowsky A, Vianna K. Crack users’ evaluation regarding family groups in the psychosocial care center. Cogitare Enferm[Internet]. 2015[cited 2017 May 10];20(1):81-8. Available from: http://revistas.ufpr.br/cogitare/article/view/37597/24848
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).

Os Caps AD possuem uma série de atividades voltadas tanto para os dependentes químicos quanto para seus familiares, pois se acredita na relevância da participação do familiar no tratamento do usuário de crack. Essa participação pode ocorrer de diferentes formas, como através do atendimento individual, do atendimento em grupo, de oficinas e de visitas domiciliares(11 Brasil. Ministério da Saúde. Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas em Saúde. Reforma psiquiátrica e política de saúde mental no Brasil. In: Conferência Regional de Reforma dos Serviços de Saúde Mental: 15 anos depois de Caracas[Internet]. 2005[cited 2017 Sep 10]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/Relatorio15_anos_Caracas.pdf
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).

Neste estudo destacam-se os grupos de apoio destinados aos familiares de usuários de crack, que nesses espaços buscam obter informações, orientações, opiniões, encorajamento, compartilhamento de experiências e apoio psicológico. Além disso, esses grupos oferecem aos participantes o desenvolvimento de habilidades para o enfrentamento da doença e para o tratamento de seu familiar usuário de crack a partir do contato com outras pessoas que vivenciam situações semelhantes(88 Moscheta MS, Santos MA. Support groups for prostate cancer patients: integrative literature review. Ciênc Saúde Colet[Internet]. 2012[cited 2017 May 10];17(5):1225-33. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v17n5/a16v17n5.pdf
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).

No grupo, as pessoas ainda podem desenvolver vínculos de amizade com os demais participantes, sentindo-se acolhidas. Com o tempo, por meio do vínculo terapêutico, passam a aderir com maior facilidade às atividades terapêuticas propostas. Tal adesão permite e favorece trocas intersubjetivas, inclusão, autopercepção, autoconhecimento e expressões de afeto, tornando-se um veículo para o processamento de informações(99 Brischiliari A, Bessa JB, Waidman MAP, Marcon SS. Conception of family members of people with mental disorders on self-help groups. Rev Gaúcha Enferm[Internet]. 2014[cited 2017 May 15];35(3):29-35. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rgenf/v35n3/pt_1983-1447-rgenf-35-03-00029.pdf
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-1010 Ribeiro VV, Panhoca I, Dassie-Leite AP, Bagarollo MF. Therapeutic group in speech language and hearing sciences: literature review. Rev CEFAC[Internet]. 2012[cited 2017 Jun 01];14(3):544-52. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rcefac/2011nahead/53-11.pdf
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). Além disso, esses espaços proporcionam alívio para angústias e esclarecimento de dúvidas, facilitando, assim, o convívio domiciliar e resgatando os laços afetivos entre usuário e familiares.

Este estudo advém da vivência das pesquisadoras em atividades de extensão e ensino em um Caps AD, em que a convivência com familiares de usuários de crack nos grupos de família possibilitou trocas sobre essa realidade familiar. Desse modo, os grupos de família surgem como espaços potentes para ações de cuidados. Assim, tem-se a seguinte questão norteadora: qual a avaliação dos familiares de usuários de crack sobre os grupos de apoio às famílias ofertados em um Caps AD da fronteira oeste do Rio Grande do Sul?

Entende-se que o referencial da avaliação de quarta geração pode fazer emergir o empoderamento dos familiares como protagonistas das mudanças necessárias para a qualificação dos Caps AD no atendimento aos familiares de usuários de crack em grupos de apoio.

Espera-se com este estudo avançar no conhecimento científico no campo da saúde mental e da dependência química, bem como relatar a importância dos grupos de apoio como estratégia de cuidado nos serviços substitutivos, consolidando a rede de suporte aos familiares de usuários de crack.

OBJETIVO

Avaliar a percepção dos familiares de usuários de crack sobre os grupos de apoio ofertados a esse núcleo de cuidado em um Caps AD.

MÉTODO

Aspectos éticos

Foi utilizado o Termo de Consentimento Livre e Informado em duas vias, de acordo com a Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012, do Conselho Nacional de Saúde, que aprova diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisa envolvendo seres humanos(1111 Brasil. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Diretrizes e Normas Regulamentadoras sobre Pesquisas envolvendo Seres Humanos. Resolução n. 466, de 12 de dezembro de 2012[Internet]. 2012[cited 2017 Mar 10]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/cns/2013/res0466_12_12_2012.html
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). Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Cabe salientar que esta pesquisa foi conduzida de acordo com os padrões éticos exigidos.

Referencial teórico-metodológico

O referencial teórico metodológico utilizado na pesquisa é o da avaliação de quarta geração, proposto por Guba e Lincoln(1212 Guba E, Lincoln Y. Avaliação de quarta geração. Campinas: Unicamp; 2011.). Caracteriza-se por ser descritiva e analítica, com abordagem qualitativa dos dados. Também é descritiva porque observou, registrou e correlacionou fatos sem manipulá-los.

A avaliação de quarta geração é uma forma de avaliação em que as reivindicações, preocupações e questões do grupo de interesse servem de base para determinar a informação necessária, a qual é implementada através dos pressupostos metodológicos do paradigma construtivista(1212 Guba E, Lincoln Y. Avaliação de quarta geração. Campinas: Unicamp; 2011.). O círculo hermenêutico-dialético foi utilizado como técnica de coleta de dados na qual se prevê, em uma primeira etapa, a observação e, posteriormente, as entrevistas.

Tipo de estudo

Trata-se de uma avaliação do tipo qualitativa, construtivista, responsiva, com abordagem hermenêutico-dialética.

Procedimento metodológico

Cenário do estudo

Este estudo foi realizado em um Caps AD que possui um ano de funcionamento, localizado na fronteira oeste do estado do Rio Grande do Sul, sendo serviço de referência para uma população de 125.435 habitantes(1313 Brasil. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística-IBGE. Censo 2010: estimativas das populações residentes segundo os municípios [Internet]. Rio de Janeiro; 2010[cited 2017 Aug 08]. Available from: http://cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?codmun=432240
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).

Fonte de dados

A coleta de dados ocorreu no período de junho a setembro de 2013 e contou com 15 profissionais designados como grupo de interesse, da totalidade de 30 trabalhadores de que o serviço dispunha naquele período. Participaram da coleta de dados quatro psicólogos, três cuidadores, dois técnicos de enfermagem, três oficineiras, uma terapeuta ocupacional, um enfermeiro e um médico.

Coleta e organização dos dados

Foram realizadas 500 horas de observação, registradas em um diário de campo. Inicialmente, a observação se deu de forma mais livre, buscando conhecer o funcionamento do serviço, fase que é denominada de etnografia prévia(1212 Guba E, Lincoln Y. Avaliação de quarta geração. Campinas: Unicamp; 2011.), totalizando 160 horas. Na sequência, as observações focaram-se mais no objeto do estudo e foram guiadas por um roteiro divido em três grandes eixos (serviço, atendimento aos familiares de usuários de crack e trabalhadores), totalizando 340 horas. Este estudo contou com a participação de quatro observadores externos ao serviço, que tinham conhecimentos sobre observação participante e se revezaram em todos os turnos a fim de captar mais dados acerca do objeto pesquisado.

Através da utilização do círculo hermenêutico-dialético, as primeiras entrevistas foram menos estruturadas, permitindo que o respondente falasse livremente sobre o serviço. Mas, à medida que as entrevistas eram realizadas, a análise permitia que fossem identificadas questões a serem expressas nas entrevistas seguintes, de modo que, cada vez mais, as entrevistas se estruturavam, sem deixar de permitir que todos os entrevistados pudessem lançar novas questões, se assim o desejassem.

Foram entrevistados 12 familiares de usuários de crack que autorizaram a gravação das entrevistas e estavam de acordo com os critérios de inclusão. Pelos critérios de seleção dos participantes, incluíram-se todos aqueles que se inseriam em ao menos um dos cinco grupos de familiares oferecidos pelo Caps AD no momento da coleta de dados, que fossem maiores de 18 anos e possuíssem boas condições de comunicação. Como critério de exclusão, foram desconsiderados aqueles familiares que não estivessem inseridos em algum grupo ofertado pelo serviço. Os sujeitos que compuseram o estudo foram denominados de F (família) e numerados de 1 a 12, na ordem das entrevistas.

As entrevistas foram agendadas previamente de acordo com dia, hora e local marcados pelos próprios entrevistados. Todas foram gravadas e em seguida ouvidas, a fim de introduzir no círculo hermenêutico questões/assuntos para a próxima entrevista. Dessa forma, a primeira entrevista durou 20 minutos, e a última, uma hora, já que o primeiro entrevistado respondeu a apenas duas perguntas, e o último, doze.

Com a finalização de todo o círculo hermenêutico-dialético as entrevistas foram transcritas na íntegra. Dessa maneira, iniciou-se a fase de organização e análise dos resultados prévios a serem apresentados na reunião de negociação, que serviu para a construção de consensos acerca do grupo. Essa reunião foi realizada pela própria pesquisadora e ocorreu por meio de agendamento prévio de data e horário do encontro, que contou com o comparecimento dos 12 entrevistados.

Análise dos dados

Para a análise dos dados utilizou-se o método comparativo constante, que permite que a análise seja realizada concomitantemente à coleta de dados(1212 Guba E, Lincoln Y. Avaliação de quarta geração. Campinas: Unicamp; 2011.). Assim, essas unidades possibilitaram construir as categorias temáticas que, posteriormente, direcionaram as categorias analíticas deste estudo. Dessa maneira, na categoria analítica “cuidado com o familiar de usuário de crack” discutimos a unidade de significado “grupo de família”.

RESULTADOS

Grupo de família

A maioria dos familiares de usuários de crack entrevistados era do sexo feminino (66,6%), formada por mães (58,3%), irmãs (25%) e esposas (8,3%), com idade entre 40 e 59 anos (60%). Em relação ao nível de escolaridade, a maioria dos familiares relatou possuir ensino fundamental incompleto (41,6%). Os entrevistados, predominantemente, disseram frequentar o Caps AD uma vez por semana (58,3%) para participação nos grupos de familiares. A renda mensal de um salário mínimo foi a mais citada por essas famílias (50%).

Anteriormente à abertura do referido Caps AD, o grupo de apoio aos familiares de usuários de crack era organizado no Caps II do mesmo município. No entanto, as salas disponibilizadas para esses grupos eram pequenas, dificultando a acomodação dos participantes e a possibilidade de fala de cada familiar. Além disso, suas reuniões ocorriam em apenas um dia da semana, o que muitas vezes acabava desmotivando os participantes pela falta de opção de horários.

A diferença é que aqui é maior, é mais amplo, as salas dos grupos são mais amplas. Lá não tinha o mesmo espaço, porque lá era pequeno e [eram] muitas pessoas no grupo, muito apertado. (F5)

A sala daquele outro Caps era pequena, mas tinha bastante gente, teve uma vez que teve quarenta numa sala. (F7)

Uma familiar comentou com outra que estava conhecendo o serviço, no corredor, que aqui no Caps AD as salas são ótimas, são grandes, e tem cinco horários de grupos. (Observador A)

Os familiares avaliaram negativamente a superlotação no grupo de familiares que funcionava no Caps II, bem como o tamanho das salas. Durante as observações realizadas na coleta de dados, alguns familiares verbalizaram aspectos positivos sobre a ampla estrutura física do Caps AD e sobre a oferta de cinco horários diferentes para realização dos encontros. Assim, entende-se a importância de uma sala adequada, onde todos possam ser visualizados, em um ambiente propício para trocas e sem interrupções.

O atendimento do Caps AD através dos grupos de apoio aos familiares de usuários de crack foi avaliado como uma atividade de extrema importância pois, além de inserir o familiar no cotidiano do serviço, oportuniza alívio e aprendizado.

Assim como eu tenho problema, tenho que tentar ajudar os outros que têm problemas semelhantes. A psicóloga no grupo nos ensina, explica as coisas, nós desabafamos também. Esclarece muitas coisas que a gente não sabe. (F2)

Os grupos tão me ajudando. Eu vejo que não sou só eu que tenho esse problema, não sou só eu que lido com isso, tem pessoas que passam por coisas piores [...]. Eu falo o que eu penso, eu falo as novidades, as minhas dúvidas eu tiro, acho que é suficiente. Acho que é bom. (F4)

O grupo de familiares fornece orientações e esclarecimento de dúvidas sobre o tratamento e os transtornos ocasionados pelo uso ou abuso de álcool e outras drogas. Dessa forma, a vivência grupal com os familiares oportuniza o aprendizado de novos comportamentos, partindo do compartilhamento de seus problemas e de sua aceitação, sendo um excelente recurso terapêutico para fortalecer a família nesse momento.

Durante a coleta de dados, o Caps AD oferecia cinco horários para os grupos de apoio aos familiares de usuários de crack, o que facilita a participação dessas famílias, colaborando para a manutenção do tratamento do usuário.

Melhorou, porque agora tem grupo nos três turnos. Eu estou no das 10:15. Tem até de noite. Ficou melhor para quem trabalhar. Quem não pode vir de manhã ou de tarde, tem à noite. Bem melhor. (F3)

Pra mim ficou bom. Eu pedi para ser nesse horário porque às vezes eu faço faxina e é o horário que eu posso. A gente pode escolher um horário em que se pode participar. (F10)

Os familiares de usuários de crack avaliaram como positiva a oferta de grupos nos três turnos (manhã, tarde e noite), além dos diferentes horários de grupos, pois isso facilitava sua participação no tratamento, sem interromper suas rotinas de trabalho e de lazer.

No entanto, os entrevistados avaliaram que o tempo dos grupos era muito curto para que os familiares pudessem se expressar igualmente.

Dependendo da quantidade de pessoas que estão no grupo, porque às vezes dá tempo de uns falarem e não sobra tempo para os outros. (F7)

É só uma hora. Então eu acho que uma hora é pouco, acho que tem que ter mais um pouquinho, no máximo duas horas. Por que é muita mãe pra falar e às vezes a gente está com muita vontade de falar e botar pra fora, e o tempo não dá, é muito pouco. (F9)

O tempo destinado às sessões grupais deve ser organizado de forma a contemplar a fala dos integrantes, proporcionando maior participação e envolvimento de todos, dentro do horário estabelecido previamente.

Alguns participantes sentiam dificuldade em interagir no grupo, sobretudo por estarem diante de pessoas desconhecidas. Apesar desse entrave inicial, achavam importante ouvir as experiências de vida das outras famílias e aprender com esses relatos.

Tem pessoas às vezes que ficam com vergonha de falar na frente de outras, principalmente aquela que está chegando no seu primeiro dia, geralmente pede para falar em particular, pois tem receio de se expor na frente de todo mundo. (F12)

Os familiares normalmente não falam, por isso que eu falo muito no grupo, porque as famílias parecem que ficam muito retraídas em expor o problema que têm quanto há um dependente químico. (F1)

Os entrevistados avaliaram que há muitos familiares que chegam ao grupo pela primeira vez e se sentem constrangidos para falar ou até mesmo se expor em frente de outras pessoas. Chegam assustadas e retraídas e assumem uma postura de escuta nesse primeiro momento. Cabe ao moderador do grupo perceber essa dificuldade inicial e auxiliar nessa ambientação, trazendo à tona a importância da verbalização do caso de cada participante, tanto para si mesmo quanto para os outros integrantes do grupo.

Os familiares avaliaram a importância do sigilo das informações que são reveladas pelos integrantes do grupo. A confiança nesse sigilo facilita a exposição das histórias contadas pelos familiares de usuários de crack.

Isso é o certo, o que ficou ali morreu ali, isso é o certo, tu pode chorar, berrar, falar palavrão, dizer tudo que tu pensa, morreu aqui. (F11)

Desse modo, é relevante que o coordenador do grupo sinalize a cada encontro a importância do sigilo das informações que são compartilhadas no encontro, comprometendo e responsabilizando todos os participantes nesse acordo.

Os entrevistados também avaliaram as transformações ocorridas em suas condutas, a partir da participação no grupo do Caps AD, em relação ao usuário de crack.

O grupo aqui do Caps ajuda mais em relação ao comportamento dele. Ter mais pulso firme, nos dizer o que tem que falar pra ele, saber falar não. (F11)

Para mim droga era sem-vergonhismo. Porque quando a gente vê nos outros é uma coisa! Mas quando a gente vê na gente é bem diferente. Eu comecei a entender o que era um usuário. Porque antes eu não sabia lidar, hoje eu sei. Aqui no grupo me ensinaram muita coisa, mas é difícil. (F12)

Os familiares avaliaram positivamente a mudança de suas atitudes com relação à dependência química de crack do usuário. Relataram que o grupo ajudou no entendimento sobre a adição, sobre questões comportamentais do usuário, além de auxiliar a manter uma conduta mais enérgica no domicílio.

Os entrevistados avaliaram que a participação no grupo era importante porque nele se sentiam acolhidos, o que lhes permitia falar, chorar, conversar, pedir ajuda, ou seja, expressar seus sentimentos, sem medo de serem julgados.

DISCUSSÃO

A estrutura básica para a organização de um grupo baseia-se nas condições físicas do ambiente para a realização das atividades, tais como: uma sala ampla, arejada, iluminada, com acomodação para todas as pessoas, oportunizando a visualização de todos os participantes(1414 Uruguaiana-RS. Secretaria Municipal de Saúde. Centro de Atenção Psicossocial aos Usuários de Álcool e Outras Drogas. Projeto de implantação do CAPS III com ênfase em AD. Uruguaiana, 2012).

Essa concepção de ambiência converge para a construção de locais acolhedores e harmônicos que propiciem o encontro entre profissionais de saúde e usuários do serviço, proporcionando o bem-estar e indo de encontro ao estereótipo de que esses espaços dos serviços de saúde são frios e hostis. Assim, as áreas de trabalho, além de mais adequadas funcionalmente, devem proporcionar espaços prazerosos a todos os que usufruam deles(1515 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde, Núcleo Técnico da Política Nacional de Humanização. Ambiência[Internet]. 2ª ed. Brasília; 2007[cited 2017 Aug 08]. (Série B: Textos Básicos de Saúde). Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/ambiencia_2ed.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
).

Atualmente, os Caps precisam estar com as portas abertas para a inserção das famílias, integrando-as e incentivando sua participação nas atividades desenvolvidas pela instituição, dando suporte, ao mesmo tempo, para que elas possam conjuntamente contribuir para a saúde do usuário do serviço(1616 Maia CAAS, Oliveira KKD, Rangel CT, Pessoa Jr JM, Fernandes RL, Miranda FAN. Contextual aspects of family participation in psychosocial care centers. Rev Enferm UFPE[Internet]. 2016[cited 2017 Feb 14];10(Supl.4):3676-81. Available from: https://periodicos.ufpe.br/revistas/revistaenfermagem/article/download/11143/12647
https://periodicos.ufpe.br/revistas/revi...
-1717 Duarte MLC, Olschowsky A, Vianna K. Attention people crack of dependent on a psychosocial care center. Rev Contexto Saúde[Internet]. 2016[cited 2017 Nov 13];16(31):165-72. Available from: http://oaji.net/articles/2017/1006-1492440973.pdf
http://oaji.net/articles/2017/1006-14924...
).

O atendimento em grupo com participantes que vivenciam a mesma situação facilita a identificação e a troca de confidências, particularidades e intimidades entre os membros, como também possibilita à equipe de saúde conhecer as reais necessidades e anseios desses familiares, facilitando o planejamento de uma assistência mais focada na família(1818 Alves RD, Morais TTM, Rocha SP, Rocha NNV, Duarte SR, Sampaio FFF. Family members group in a caps ad: embracing and reducing strains. Sanare[Internet]. 2015[cited 2017 Jul 09];14(1):81-6. Available from: https://sanare.emnuvens.com.br/sanare/article/view/613/330
https://sanare.emnuvens.com.br/sanare/ar...
-1919 Behenck AS, Wesner AC, Finkler DC, Heldt E. Contribution of group therapeutic factors to the outcome of cognitive-behavioral therapy for patients with panic disorder. Arch Psychiatr Nurs[Internet]. 2017[cited 2017 Nov 13];319(1):142-6. Available from: http://www.psychiatricnursing.org/article/S0883-9417(16)30217-5/pdf
http://www.psychiatricnursing.org/articl...
).

Desse modo, verifica-se que o grupo de familiares surge como uma forma de inserção da família e uma estratégia utilizada pelo serviço de apoio para contribuir no processo terapêutico do usuário. Além de incluí-la no serviço, estará instrumentalizando-a para o cuidado(1616 Maia CAAS, Oliveira KKD, Rangel CT, Pessoa Jr JM, Fernandes RL, Miranda FAN. Contextual aspects of family participation in psychosocial care centers. Rev Enferm UFPE[Internet]. 2016[cited 2017 Feb 14];10(Supl.4):3676-81. Available from: https://periodicos.ufpe.br/revistas/revistaenfermagem/article/download/11143/12647
https://periodicos.ufpe.br/revistas/revi...
,2020 Behenck AS, Gomes J, Heldt E. Patient rating of therapeutic factors and response to cognitive-behavioral group therapy in patients with obsessive-compulsive disorder. Issues Mental Health Nurs[Internet]. 2016[cited 2017 Nov 13];37(6):392-9. Available from: http://www.tandfonline.com/doi/full/10.3109/01612840.2016.1158335?scroll=top&needAccess=true
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).

Além disso, é importante que certas especificações, como limite de tempo, sejam explicitadas para os participantes no começo da sessão. Cabe ao coordenador do grupo estipular o tempo destinado a cada participante, favorecendo assim a fala e o envolvimento de todos os familiares, dando oportunidade igual a todos. A satisfação dos participantes é considerada um indicador essencial para a avaliação da efetividade dos grupos de apoio(2121 Alvarez SQ, Gomes GC, Oliveira AMN, Xavier DM. Support group as a strategy of care: the importance for relatives of drug users. Rev Gaúcha Enferm[Internet]. 2012[cited 2017 Jul 10];33(2):102-8. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rgenf/v33n2/15.pdf
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).

Nesse sentido, é necessário que os profissionais que coordenam os grupos saibam gerenciar o tempo de fala, permitindo que todos expressem seus sentimentos e dúvidas. Desse modo, é relevante que o profissional possua conhecimento sobre grupos, suas características e dinâmicas de funcionamento(2020 Behenck AS, Gomes J, Heldt E. Patient rating of therapeutic factors and response to cognitive-behavioral group therapy in patients with obsessive-compulsive disorder. Issues Mental Health Nurs[Internet]. 2016[cited 2017 Nov 13];37(6):392-9. Available from: http://www.tandfonline.com/doi/full/10.3109/01612840.2016.1158335?scroll=top&needAccess=true
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). Ele deve propiciar um ambiente aconchegante e seguro, possibilitando e estimulando que as famílias exponham assuntos pessoais, de modo que o cuidado e o respeito pelos outros, seus sentimentos e seus pontos de vista sejam prioridade(1919 Behenck AS, Wesner AC, Finkler DC, Heldt E. Contribution of group therapeutic factors to the outcome of cognitive-behavioral therapy for patients with panic disorder. Arch Psychiatr Nurs[Internet]. 2017[cited 2017 Nov 13];319(1):142-6. Available from: http://www.psychiatricnursing.org/article/S0883-9417(16)30217-5/pdf
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,2121 Alvarez SQ, Gomes GC, Oliveira AMN, Xavier DM. Support group as a strategy of care: the importance for relatives of drug users. Rev Gaúcha Enferm[Internet]. 2012[cited 2017 Jul 10];33(2):102-8. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rgenf/v33n2/15.pdf
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).

Cabe ainda ao coordenador compreender que, na área da saúde, o segredo profissional requer proteção e apresenta grande utilidade prática e social, na medida em que relaciona obrigatoriedade legal e postulados morais a serem cumpridos(2121 Alvarez SQ, Gomes GC, Oliveira AMN, Xavier DM. Support group as a strategy of care: the importance for relatives of drug users. Rev Gaúcha Enferm[Internet]. 2012[cited 2017 Jul 10];33(2):102-8. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rgenf/v33n2/15.pdf
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). O sigilo deve ser respeitado por ambas as partes (participante e profissional), já que a confiança é fundamental quando se trabalha com saúde mental. O sigilo faz-se necessário para que o grupo se sinta protegido(77 Duarte MLC, Olschowsky A, Vianna K. Crack users’ evaluation regarding family groups in the psychosocial care center. Cogitare Enferm[Internet]. 2015[cited 2017 May 10];20(1):81-8. Available from: http://revistas.ufpr.br/cogitare/article/view/37597/24848
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,2121 Alvarez SQ, Gomes GC, Oliveira AMN, Xavier DM. Support group as a strategy of care: the importance for relatives of drug users. Rev Gaúcha Enferm[Internet]. 2012[cited 2017 Jul 10];33(2):102-8. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rgenf/v33n2/15.pdf
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).

Logo a participação no grupo apresenta-se como uma fonte contínua de recebimento de informações, que mantém a família fortalecida, auxiliando-a na tomada decisões relativas ao cuidado do usuário de drogas, com o respaldo do conhecimento recebido(77 Duarte MLC, Olschowsky A, Vianna K. Crack users’ evaluation regarding family groups in the psychosocial care center. Cogitare Enferm[Internet]. 2015[cited 2017 May 10];20(1):81-8. Available from: http://revistas.ufpr.br/cogitare/article/view/37597/24848
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,2121 Alvarez SQ, Gomes GC, Oliveira AMN, Xavier DM. Support group as a strategy of care: the importance for relatives of drug users. Rev Gaúcha Enferm[Internet]. 2012[cited 2017 Jul 10];33(2):102-8. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rgenf/v33n2/15.pdf
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).

Limitações do estudo

Faz-se necessário ressaltar as limitações deste estudo, considerando que o processo hermenêutico-dialético é dinâmico, havendo dados que poderiam ter sido mais contemplados nas discussões do processo avaliativo. Porém o fator tempo de realização do estudo interferiu no processo da pesquisa.

Contribuições para a área da enfermagem

Os dados resultantes deste estudo podem estimular novas investigações em outros cenários, em diferentes realidades que a enfermagem está inserida, e, assim, contribuir para qualificar o atendimento destinado aos familiares no âmbito do crack e outras drogas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa teve como objetivo avaliar a percepção dos familiares de usuários de crack sobre os grupos de apoio ofertados a esse núcleo de cuidado em um Caps AD no sul do Brasil.

Foram indicadas algumas questões pelos familiares durante as entrevistas, tais como o grupo de familiares lotado no Caps II, o atendimento em grupos de familiares no serviço, a diversidade de horários dos grupos de família no Caps AD, a duração dos grupos de familiares, a vergonha de algumas famílias de falar em grupo, o sigilo das informações no grupo de familiares e a mudança na atitude da família em relação ao usuário de crack.

Os grupos ofertados pelo Caps AD foram avaliados como uma ferramenta a mais no cuidado do familiar do usuário de crack, pois proporcionam conhecimento, conforto e alívio da ansiedade, trazendo benefícios também para os usuários. É desse modo que os resultados da pesquisa reforçam a importância dos grupos de familiares dentro de um serviço substitutivo como o Caps AD, oferecendo acolhimento, informações, enfrentamento do preconceito, apoio e tratamento.

O processo de transformação ocorrido na área de saúde mental preconizou a presença e o fortalecimento da participação da família do indivíduo em dependência química no cotidiano dos serviços substitutivos dessa área, o que repercute diretamente no processo de reabilitação do usuário.

A avaliação de quarta geração constitui-se como uma importante possibilidade metodológica no campo da saúde mental, na medida em que possibilita que sejam acessadas dimensões pouco passíveis de serem apreendidas por medições e indicadores. Dessa maneira, considera-se que essa metodologia propiciou um processo avaliativo participativo, dando voz aos familiares dos usuários de crack no Caps AD e permitindo o compartilhamento dos resultados das análises pelo avaliador e pelo grupo de interesse.

Este estudo tem como limitação envolver dados referentes a um serviço específico e, por isso, não possibilita generalizações. Ainda, considera-se que o processo hermenêutico-dialético é dinâmico, havendo informações que poderiam ter sido mais contempladas nas discussões do processo avaliativo. No entanto, o fator tempo de realização do estudo interferiu no processo da pesquisa.

Portanto salienta-se a importância de os profissionais que atuam como coordenadores de grupos nos Caps AD buscarem conhecimento sobre esse dispositivo de cuidado com os familiares, com vistas à mudança de práticas enfocando apenas os usuários. Ainda, julga-se importante a realização de pesquisas que explorem os principais desafios no atendimento e na inserção dos familiares e na promoção de grupos pelos serviços especializados em saúde mental.

A formação de profissionais para essa atuação, com ênfase na criatividade e em dinâmicas, fidelizaria a participação de familiares pouco presentes no contexto desses serviços territoriais. Enfatiza-se a necessidade de as instituições de ensino investirem na discussão e na qualificação de profissionais de enfermagem orientados para o atendimento em grupos familiares, evidenciando o potencial desse trabalhador nos Caps.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2018

Histórico

  • Recebido
    20 Mar 2018
  • Aceito
    10 Abr 2018
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