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Necessidades de saúde do idoso: perspectivas para a enfermagem

Healthcare needs of the aged: perspectives for nursing

Necesidades de salud de los ancianos: perspectivas para la enfermería

Resumos

Este estudo apresenta como temática central as necessidades de saúde do idoso. Tem como objetivos: compreender as expectativas do idoso que experiencia ações de enfermagem na atenção básica e apontar as necessidades do idoso neste contexto. Foi desenvolvido mediante a abordagem teórico-metodológica da fenomenologia social de Alfred Schutz. Utilizou-se a entrevista fenomenológica junto a idosos tendo como questão central: quais são as suas expectativas com relação à enfermagem? Emergiram como categorias do vivido: Encontrar o outro (humano) na atitude da enfermagem e estabelecer relações com outras pessoas. O estudo aponta para a importância das ações denominadas não técnicas da enfermagem como necessidade de saúde.

Idoso; Enfermagem; Atenção básica à saúde; Determinação de necessidades de cuidados de saúde


This study has as central thematic the healthcare need of the aged. It was established as aims: to understand the expectations of the aged one who experiences nursing actions in primary health care and to point out at healthcare need of the aged one in this context. It was developed through the theoretical and methodological approach of the phenomenological sociology of Alfred Schutz. It was used a phenomenology interview with aged persons having as question: which are your expectations about the nursing professionals? Two lived categories emerged: to find the other (human) in the nursing professional attitude and to establish relationships with other persons. The study points out at the importance of the named none-technical nursing actions as health needs.

Aged; Nursing; Primary healthcare; Needs assessment


Este estudio tiene como temática central las necesidades de salud de lo anciano. Tiene como objetivos: Comprender las expectativas de los ancianos que experencian acciones de enfermería en la atención primaria y apuntar las necesidades de los mismos en este contexto. Fue desenvolvidio mediante el referencial teórico e metodologico da fenomenologia sociologica de Alfred Schutz. La entrevista junto a personas ancianas teve como cuestion central: cuales son sus espectativas en relación a la enfermería? Como categorias del vivido emergiram: encontrar el otro (humano) en el actitude de la enfermeria y establecer relaciones con otras personas. El estudió apunta para la importancia de las acciones de la enfermería denominadas non técnicas como necessidad de salud.

Anciano; Enfermería; Atención primaria de la salud; Evaluación de necesidades


PESQUISA

Necessidades de saúde do idoso: perspectivas para a enfermagem

Healthcare needs of the aged: perspectives for nursing

Necesidades de salud de los ancianos: perspectivas para la enfermería

Cristina Alves de LimaI; Florence Romjin TocantinsII

IUniversidade Estácio de Sá. Faculdade de Enfermagem, Núcleo de Saúde do Adulto e Idoso. Rio de Janeiro, RJ

IIUniversidade Federal do Estado do Rio de Janeiro. Departamento de Enfermagem e Saúde Pública. Rio de Janeiro, RJ

Correspondência Correspondência: Florence Romjin Tocantins Rua Dr. Xavier Sigaud 290 - sala 505. Praia Vermelha CEP 22290-180 - Rio de Janeiro, RJ Submissão: 11/02/2009 Aprovação: 22/03/2009

RESUMO

Este estudo apresenta como temática central as necessidades de saúde do idoso. Tem como objetivos: compreender as expectativas do idoso que experiencia ações de enfermagem na atenção básica e apontar as necessidades do idoso neste contexto. Foi desenvolvido mediante a abordagem teórico-metodológica da fenomenologia social de Alfred Schutz. Utilizou-se a entrevista fenomenológica junto a idosos tendo como questão central: quais são as suas expectativas com relação à enfermagem? Emergiram como categorias do vivido: Encontrar o outro (humano) na atitude da enfermagem e estabelecer relações com outras pessoas. O estudo aponta para a importância das ações denominadas não técnicas da enfermagem como necessidade de saúde.

Descritores: Idoso; Enfermagem; Atenção básica à saúde; Determinação de necessidades de cuidados de saúde.

ABSTRACT

This study has as central thematic the healthcare need of the aged. It was established as aims: to understand the expectations of the aged one who experiences nursing actions in primary health care and to point out at healthcare need of the aged one in this context. It was developed through the theoretical and methodological approach of the phenomenological sociology of Alfred Schutz. It was used a phenomenology interview with aged persons having as question: which are your expectations about the nursing professionals? Two lived categories emerged: to find the other (human) in the nursing professional attitude and to establish relationships with other persons. The study points out at the importance of the named none-technical nursing actions as health needs.

Descriptors: Aged; Nursing; Primary healthcare; Needs assessment.

RESUMEN

Este estudio tiene como temática central las necesidades de salud de lo anciano. Tiene como objetivos: Comprender las expectativas de los ancianos que experencian acciones de enfermería en la atención primaria y apuntar las necesidades de los mismos en este contexto. Fue desenvolvidio mediante el referencial teórico e metodologico da fenomenologia sociologica de Alfred Schutz. La entrevista junto a personas ancianas teve como cuestion central: cuales son sus espectativas en relación a la enfermería? Como categorias del vivido emergiram: encontrar el otro (humano) en el actitude de la enfermeria y establecer relaciones con otras personas. El estudió apunta para la importancia de las acciones de la enfermería denominadas non técnicas como necessidad de salud.

Descriptores: Anciano; Enfermería; Atención primaria de la salud; Evaluación de necesidades.

1. INTRODUÇÃO

O envelhecimento populacional brasileiro vem se acentuando consideravelmente e já neste século XXI, causará aumento nas demandas sociais e econômicas(1). Este fato implica inclusive a mudança no perfil de adoecimento e traz repercussões para atenção a saúde e para políticas públicas, que passam a enfatizar a promoção da saúde, a manutenção da autonomia e a valorização das redes de suporte social, gerando impactos nas diversas formas de se prestar assistência aos idosos(2). Dentre estas formas também está a importância de se rever as ações de enfermagem junto a esse grupo da população(3).

Em consonância com o quadro sócio-epidemiológico que se delineia no Brasil, foi aprovado a Política Nacional da Pessoa Idosa (PNPI), que tem por propósito central recuperar, manter e promover a autonomia e a independência dos idosos, através do desenvolvimento de ações de saúde individuais e coletivas(4), em consonância com os princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS)(5).

A assistência de enfermagem, por sua vez, é uma ação práxica, e de acordo com a demanda da clientela pode também ser reconhecida por uma dimensão não apenas biológica. Assim, a pessoa percebe suas necessidades demandando um tipo de ação de saúde que provoca satisfação em suas expectativas. Com este entendimento, os reflexos da assistência e do cuidado de enfermagem podem ser analisados entre outros, pelo bem-estar sentido pelo idoso e, consequentemente, o atendimento a suas necessidades de saúde(6).

Importa lembrar que para o cuidado denominado técnico - relacionado a aspectos predominantemente físicos, existem manuais, modelos de intervenções, rotinas de procedimentos, que padronizam e fundamentam cada ação. Porém, as que envolvem o cuidado humano - denominado de cuidado não físico, não são normatizadas em manuais. Nesta concepção e reconhecendo a ação de enfermagem um processo interativo, o mesmo precisa ser vivido, possuir um significado para quem o realiza (enfermeiro), e para aquele que o recebe (cliente)(7).

Assim, dentre as ações de enfermagem, estão as ações não técnicas que se referem à compreensão e ao atendimento de necessidades sentidas e vividas pelo cliente e não apenas por aquelas pré-estabelecidas pelo olhar profissional.

A concepção de necessidade de saúde do sujeito no contexto da enfermagem apóia-se na compreensão do mundo biológico, psicológico e social como geridos por um tipo de relação em que, a cada estímulo, o ser humano reage com uma resposta que busca a adaptação a uma nova situação. Ao focalizar o idoso como sendo sujeito da atenção de enfermagem fala-se de alguém inserido numa sociedade e num grupo social, que também participam da forma que esse ser concebe, avalia e sente como sendo necessidades de saúde. Ao mesmo tempo, reconhece-se que os seres humanos não mantêm padrões estáticos ao longo do tempo. Pelo contrário, mudam o seu modo de agir para fazer frente às demandas da vida que se alteram ao longo da existência(8).

Desta forma, uma assistência voltada para as necessidades de saúde requer atenção à vida cotidiana do idoso, conhecendo seu modo de ser e pensar, ou melhor, repensando e redescobrindo prioridades para o planejamento das ações de enfermagem.

Mesmo quando o sujeito ao qual é destinada a ação profissional é tomado na sua individualidade no momento do cuidado e da assistência, ele é um ser social e suas necessidades também o são. Essa assunção conceitual tem implicações práticas que merecem ser discutidas, para que ela não se dê apenas num plano teórico(8).

A perspectiva de assistência e cuidado ao ser humano envolve uma conjugação de sentimentos e procedimentos técnicos(9). Desta forma, e se sentindo cuidado e assistido, o idoso desperta para sentimentos e emoções positivas, recuperando a autonomia e retornando a vida.

Com este entendimento, assistência e cuidados expressivos englobam necessidades psicoafetivas dos idosos, ou seja, carinho, atenção, zelo, que só ocorrem na presença do outro, em uma relação social condicionado pelo contexto social(10). Assim, ao enfermeiro algumas características podem ser desenvolvidas com intuito de melhorar o planejamento do seu cuidado como ter paciência, ser persistente e ainda desenvolver a capacidade de prestar atenção nas pessoas idosas, suas expressões e atitudes(11). Esta dimensão interpessoal valoriza a humanização da assistência e do cuidado e resgata a sua condição humana.

No cotidiano do idoso acontecem muitas perdas, e adaptações são necessários, assim como o contato pessoal, o amor, o apoio e a atenção Tais necessidades - humanas, são essenciais. E a Enfermagem pode ajudar a pessoa idosa a identificar os grupos sociais e se unirem a eles, com o propósito de ampliar sua rede social(12).

Com esta perspectiva, e em estudo sobre a identificação de áreas relevantes para atenção da enfermagem gerontológica no contexto ambulatorial, é enfatizado uma prática direcionada para a educação em saúde, mediante atividades de apoio de grupos que valorizem o envelhecimento ativo, em oficinas terapêuticas(13).

Entendemos que a enfermagem, no contexto da Atenção Básica Brasil(14), também deve optar por uma postura sensível, compreendendo as necessidades assistenciais de saúde do idoso mediante uma interação enfermeiro-cliente e assim desenvolver medidas que conduzam ao bem-estar e a saúde, favorecendo sua relação com o mundo onde está inserido.

Desta forma, é de extrema importância a atenção de enfermagem para com as expectativas do sujeito que procura o serviço de saúde, visto que sua ação profissional tem como fundamento contemplar as necessidades de saúde expressas pela clientela(15). A enfermagem deve atentar para o universo do outro - em todas as suas dimensões, a fim de compreender o que significa bem-estar e saúde para o mesmo.

Tendo por referência estas reflexões, entende-se que o idoso tem como necessidade receber uma assistência e um cuidado, por vezes, longe das práticas - cientifica e tecnologicamente promissoras, numa perspectiva biológica. Aos olhos dos idosos a ação profissional não deve só se preocupar apenas com o tratar a doença ou aliviar sinais e sintomas, embora isso faça parte de sua atenção. Sua relação profissional não deve estar voltada apenas para a questão biológica, mas ser principalmente uma pessoa capaz de acolher, em uma relação de abertura, compreensão e confiança. Deve haver uma valorização interpessoal, tendo por referência a cultura dos idosos e a participação deste nas decisões a serem tomadas.

Ao não priorizar equipamentos e máquinas, a ação de enfermagem permite potencializar abordagens dinâmicas, em que os sujeitos - idoso e enfermeiro, encontram-se, atuam juntos, deixando fluir as expectativas numa interação entre falas e escutas, produzindo uma acolhida de intenções que estas pessoas esperam neste encontro: momentos de cumplicidade, nos quais há uma responsabilização em torno do problema que vai se enfrentando, momentos de confiabilidade e esperança, nos quais se produzem vínculos e aceitação(16).

No contexto da Atenção Básica foi observado que o cotidiano do idoso é repleto de vivências e expectativas que precisam ser compreendidas pela enfermagem. Assim, para nortear o desenvolvimento deste estudo foi elaborada a seguinte questão norteadora: Que expectativas o idoso tem no encontro com a enfermagem no contexto da Atenção Básica?

Desta forma, foram pontuados os seguintes objetivos para o estudo: compreender as expectativas do idoso que experiencia cuidados de enfermagem no contexto da Atenção Básica e, apontar as necessidades assistenciais do idoso no contexto da Atenção Básica.

Esta pesquisa vem ao encontro da importância de produzir estudos que possam direcionar a ação dos profissionais de saúde e que atuam com pessoas idosas reconhecendo suas expectativas diante da ação do enfermeiro(17). Além disso, as diretrizes estabelecidas pela Política Nacional do Idoso estimulam a discussão sobre estudos voltados para a questão da assistência à saúde e o envelhecimento(4). Neste sentido, é oportuno analisar atentamente a ação da enfermagem junto ao idoso, porque é da prática que advém a organização e a construção de seu conhecimento visando contribuir para a promoção da saúde de diferentes grupos da população.

METODOLOGIA

Trata-se de uma pesquisa que utilizou o método qualitativo, tendo como referencial a fenomenologia sociológica de Alfred Schutz(17), realizada no período de setembro a outubro de 2004.

Para compreender o fenômeno, a expectativa do idoso em relação à ação da enfermagem, é preciso voltar à consciência do indivíduo que recebe a assistência e o cuidado, a essência do todo. Quando o idoso interage com outros, materializa seus anseios em forma de ações, preenchendo-as de significados. É preciso compreender seu movimento no mundo.

Este mundo da vida é algo que se manifesta no sujeito através de suas relações. Ele o sente, concebe, julga, raciocina, imagina e age, a partir de sua existência - assim se forma sua consciência(18).

Com este entendimento, o mundo da vida reveste-se de significações para o homem, quer como mundo a conhecer, a dominar, a transformar, quer como o lugar de seus projetos e ações. Assim, a fenomenologia social de Schutz permite compreender a ação, através dos motivos da ação, ou seja, os motivos para, que se referem a algo que o sujeito pretende realizar, os objetivos que se pretende alcançar(18).

A fenomenologia sociológica de Alfred Schutz propõe que em toda ação que o sujeito estabelece têm um sentido intencional e busca aí atender suas expectativas, suas necessidades. Contudo este sentido e significado somente o próprio indivíduo pode desvelar(18).

Os motivos de cada sujeito são expressos em ações quando se dirige a outro, e este do mesmo modo se reporta com uma ação, o que Schutz denomina de relação social. Quando esta relação social ocorre no mesmo espaço e tempo cronológico têm-se a denominada relação face a face(18).

Cabe assim ao profissional - enfermeiro e pesquisador, uma atitude compreensiva diante dessas intencionalidades. Esta atitude implica interpretar ações a partir de seus motivos e objetivos, descritas pelas próprias falas dos sujeitos.

Neste sentido, a fenomenologia de Schutz fundamenta-se naquele que vivencia e experiência determinado fenômeno, pois só o próprio indivíduo pode dizer o que pretende com a ação. Com esse entendimento a abordagem valoriza o sujeito, suas vivências e suas ações conscientes, logo suas expectativas(18). Este também é o fundamento da ação de enfermagem, que busca reconhecer a necessidade de saúde e assistencial a partir das experiências de vida de integrantes de diferentes grupos da população.

Os sujeitos do estudo foram 13 (treze) usuários de uma Unidade Básica de Saúde localizada na Área Programática 2.2, situada no município do Rio de Janeiro (BR). Estes usuários, todos maiores de 60 anos, recebem assistência de enfermagem através de um grupo de convivência e também mediante visitas domiciliares.

A Atenção Básica aos idosos na Unidade é contemplada de dois modos: por um total de quatro Agentes Comunitários (PACS), além dos serviços oferecidos na Unidade Auxiliar de Cuidados Primários de Saúde (UACPS) da Secretaria Municipal de Saúde do Município (SMS-RJ). Os idosos assistidos pela UACPS recebem a atenção de enfermagem por demanda espontânea, participando de um grupo de convivência e através de visitas em domicílio - Programas de Agentes Comunitários (PACS). Desta forma, este estudo usou como meio de acesso aos idosos - usuários dos serviços, estes dois espaços assistenciais, pois permitiam abordar os sujeitos propostos pelo estudo: idosos localizados no mundo da vida(18), independente de suas limitações físicas.

Os dados foram obtidos por meio de um roteiro de entrevista que constou de quatro perguntas que permitiram traçar as características dos idosos, e, um questionamento fenomenológico: o que você espera ao encontrar a enfermagem?

A interpretação das falas constituiu-se de um momento de várias releituras do conteúdo das falas, para que emergisse a essência do significado das ações dos sujeitos. Estas constantes releituras possibilitaram uma compreensão de suas expectativas de ação e posteriormente a identificação do significado da ação de procurar a enfermagem para o idoso. Os resultados foram interpretados e apoiados em concepções teóricas da fenomenologia sociológica de Schutz(18) e literatura correlata aos achados.

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Prefeitura da cidade do Rio de Janeiro, recebendo parecer favorável no memorando de número 51, em agosto de 2004. Todos os idosos entrevistados assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido respeitando-se, entre outros, o anonimato dos sujeitos da pesquisa, tal qual estabelecido na autorização institucional para a realização da investigação.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A organização das informações para encontrar as categorias de análise foi realizada de acordo com o referencial teórico-metodológico. Primeiramente foi descrita a população entrevistada, momento em que os dados objetivos obtidos foram organizados para facilitar a visualização de suas principais características.

Conhecendo as características do grupo de idosos entrevistado

O roteiro de entrevista constou de quatro perguntas que permitiram traçar as características dos entrevistados: idade, sexo, estado civil, limitações ou doenças experenciadas, além da identificação/relação de quem cuida do entrevistado. No quadro 1 é possível visualizar os aspectos que caracterizam os entrevistados.


No total foram entrevistadas 13 pessoas idosas, sendo que destas a maioria no espaço da Unidade Básica, entre os meses de setembro e outubro de 2004. A idade dos entrevistados variou entre 64 e 80 anos, sendo que a maior parte tem mais de 70 anos, são do sexo feminino e estão viúvos/as.

Estudos demonstram que os homens procuram menos os serviços de saúde para as ações de promoção e preventivas de doenças, pois podem associar a fraqueza ao comportamento feminino, levando ás desconfianças da masculinidade, socialmente instituída, Outras questões seriam o medo da descoberta de uma doença grave e a vergonha de expor seu corpo(19).

Com relação ao responsável pelos cuidados em domicilio, foi identificado que os entrevistados contam, em sua maior parte, com os cuidados de familiares, principalmente de filhas. De acordo com a Política Nacional da Pessoa Idosa(4) a família deve ser a responsável pelo cuidado dos idosos em relação ao atendimento e suas necessidades. Se o cônjuge não pode assumir o cuidado, o papel é assumido pelos filhos. Assim, cabe ao profissional de saúde que assiste ao idoso ter uma visão mais ampla do processo de envelhecimento e da importância da rede de suporte familiar que o idosos possui(20).

No que diz respeito aos problemas de saúde ou limitações relatadas pelos idosos entrevistados, predomina a "pressão alta" e o "diabetes". A hipertensão arterial acomete quase 69% dos idosos, está freqüentemente associada a outras doenças como a arteriosclerose, diabetes e síndrome metabólica, conferindo ao grupo alto risco cardiovascular(21).

Faz-se importante ressaltar que as idosas que participavam do grupo de convivência, falavam de suas doenças, como se fizessem parte de sua vida, sem necessariamente entendê-las como limitadores, ou mesmo atrapalhando sua existência no mundo.

Ações da enfermagem e necessidades do idoso

De acordo com as falas dos idosos, as ações da enfermagem desenvolvidas puderam ser agrupadas em duas categorias concretas do vivido: ações técnicas e ações não técnicas da enfermagem (Quadro 2). Ou em outras palavras, a expressão de necessidades físicas e não-físicas na perspectiva da enfermagem ao desenvolver ações assistenciais junto ao idoso na atenção básica(7).


A partir desse momento foi dado inicio à interpretação dos depoimentos, lembrando que este se constitui de um momento de várias releituras ao conteúdo das falas, para que pudesse emergir a essência do significado das ações dos sujeitos- dos idosos em relação à enfermagem(18). Estas constantes releituras possibilitaram uma compreensão da ação da enfermagem na concepção do idoso e posteriormente a identificação das expectativas em comum dos idosos na atenção básica em relação à enfermagem.

Para a emersão das categorias concretas vividas pelos idosos foi necessário realizar várias leituras e releituras dos depoimentos, a fim de captar o significado comum nas falas dos depoentes, buscando a convergência, identificando aspectos comuns a todas as transcrições, ou seja, a essência do motivo para de se voltar para a enfermagem. Essa construção levou à elaboração do típico da ação dos idosos em relação à enfermagem a partir de suas vivências(18).

Dentre as ações técnicas voltadas para aspecto físico foram referidas, pelo idoso, as seguintes falas:

Eu espero que seja uma boa enfermeira. Fazendo o curativo bem feitinho. O que eu preciso para estar bem é que o curativo seja feito diariamente... (N2)

Orientação e amizade. Conviver mais com outras pessoas... (N6).

Palestra, poder ficar mais solta, comunicativa, distrair... (N7).

Aprender a cuidar de si, ter motivação, palestra, nos ajudar a resolver problemas, espairecer, encontrar com as colegas fazer amizades, tranqüilidade, bem-estar... (N11).

Conversar, orientações, aprender a cuidar de si, fazer novos amigos... (N12).

Tirar a pressão, medir glicose, cuidar da gente... (N13).

Conforta, aí [depois] dá remédio, orienta... (N1).

Palestras, receber atenção, passeamos juntos... (N5).

Faz orientações e ajuda também nos remédios... (N8).

Até o momento ela é útil, [dá] atenção, [dá] remédio, somos bem atendidos. Nos ajuda a resolver nossos problemas... (N9).

Ah, muita coisa, não posso nem explicar. Ela vem fazer curativo aqui na gente. Às vezes quando tem alguma coisa na gente [problema de saúde] ela dá pra gente [medicações]. O que ela tiver, deixa aqui com a gente quando a gente não tem. Muita coisa! Nem sei como agradecer a ela. Vê pressão também (N3).

Muita coisa boa: palestras, orientações, ensinamentos, como cuidar de si: exercícios, ginástica, caminhada, motivação. Os passeios são muito bons: nunca imaginei que viveria isso... (N10).

Nestas falas observa-se que as ações de enfermagem também são vista sob uma perspectiva biológica, respondendo com procedimento técnico às necessidades de saúde do idoso. Merece destaque que estes procedimentos técnicos estão previstos para serem desenvolvidos num contexto de ações programáticas de saúde(4).

Quanto ao outro grupo de ações, referentes às ações não técnicas verbalizadas pelos idosos sujeitos da investigação, e que apontam para necessidades não físicas, estão(7):

Filha, vou te dizer a verdade: elas são tão boas que acho que sem elas ficaria difícil [chora]. Tudo que preciso recorro a elas e elas me ajudam: quando não estou muito legal elas confortam, aí [depois] dá remédio, orienta. Quando a gente não vai ao posto elas vão atrás da gente. Isso é um carinho muito especial, não é? São ótimas mesmo! (N1).

Ah, muita coisa, não posso nem explicar. Ela vem fazer curativo aqui na gente. Às vezes quando tem algum problema na gente ela dá pra gente remédio. O que ela tiver, deixa aqui com a gente quando a gente não tem. Muita coisa! Nem sei como agradecer a ela. Vê pressão também (N3).

Ela vem bater papo, matar a saudade: uma amiga querida! dá carinho e conforto ao velho. Eles [o velho] foram pessoas que trabalharam muito e são mal compreendidos (N4).

A enfermagem é fora de série: as meninas são verdadeiramente tudo de bom. Elas explicam e têm muita paciência. Parecemos que somos seus filhos. Explicam para gente como viver melhor. Eu saio daqui muito feliz. Aqui é onde me achei... (N6).

Participo do grupo, aqui tem muitas coisas boas: atenção. Hoje converso mais e consigo me abrir... (N7).

Muita coisa boa: palestras, orientações, ensinamentos, como cuidar de si... exercícios, ginástica, caminhada, motivação... os passeios são muito bons e nunca imaginei que viveria isso... (N10).

Coisas boas! Palestras e ginástica. Melhorei muito: eu era muito contrariada, amargurada, ficava presa e aqui me solto, converso com amigos e me ajuda a se entender melhor (N2).

Uma vez passei mal e elas foram muito atenciosas e amigas. Só faltam mesmo quando não dá... (N11).

Orientações, brincadeiras, atenção e nos trata bem... (N12).

Nestas falas identificam-se ações de outra natureza, isto é, as denominadas não técnicas, que se desenvolvem a partir de necessidades assistenciais das mais variadas apresentadas pelo idoso, apontando para importância da relação sócio-afetiva entre o enfermeiro e o idoso.

As categorias concretas do vivido possibilitaram a compreensão dos significados da ação da enfermagem em relação ao idoso, desvelando as necessidades dos idosos que vivenciam o fenômeno de serem cuidados pela enfermagem no espaço da Atenção Básica.

Nesse sentido, as categorias concretas do vivido, permitiram construir como típico da ação do idoso ao procurar a enfermagem, a expectativa de: Encontrar um profissional voltado para o ser humano e criando espaço de convívio social, onde quem experimenta esta ação, traz em sua subjetividade a expectativa de responder a suas necessidades de saúde no processo de ser cuidado na Atenção Básica(22).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A ação de enfermagem junto ao idoso no contexto da Atenção Básica implica um diálogo permanente, sendo uma experiência intersubjetiva, ou seja, que tem como lócus central pessoas - idoso e profissional de enfermagem.

A participação dos grupos de idosos no reconhecimento de suas expectativas assistenciais, e consequentemente de suas necessidades de saúde, possibilita maior impacto, ações profissionais mais participativas considerando hábitos e valores. Partilhar as decisões é um caminho para implementar o princípio ético da autonomia, principalmente quando relacionado aos idosos, que tem sua capacidade tão discutida. A participação ativa dos indivíduos nas decisões pode ser o caminho para se efetivar a humanização na atenção à saúde, não contrariando a liberdade do idoso, fazendo-o participante ativo através de suas experiências com o mundo assistencial.

O caminho escolhido para esta descoberta foi através de um olhar compreensivo voltado para o mundo de vivências e experiências do idoso revelando suas necessidades de saúde sentidas.

O idoso espera da enfermagem predominantemente ações não-técnicas, caracterizando como necessidade de saúde receber alegria, amizade, tranqüilidade, conforto, consolo, felicidade, agrado, carinho e ate mesmo levantar sua moral, o espírito, sair da solidão lhe fazendo acordar para o mundo a sua volta. Neste encontro tem a necessidade de poder conversar e resolver seus problemas através do dialogo tanto com os enfermeiros como com outros idosos.

O estudo mostrou também que através da relação que se estabelece com o cliente é possível desvelar as necessidades de saúde e assistenciais sentidas pelo mesmo.

Desta forma a atitude compreensiva da enfermagem é fundamental para que se alcance o bem-estar e a saúde do idoso, pois este demonstra satisfação em receber a assistência e o cuidado de quem se mostra como pessoa.

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  • Correspondência:
    Florence Romjin Tocantins
    Rua Dr. Xavier Sigaud 290 - sala 505. Praia Vermelha
    CEP 22290-180 - Rio de Janeiro, RJ
    Submissão: 11/02/2009
    Aprovação: 22/03/2009
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      06 Jul 2009
    • Data do Fascículo
      Jun 2009

    Histórico

    • Aceito
      22 Mar 2009
    • Recebido
      11 Fev 2009
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