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Diagnóstico de saúde: uma responsabilidade da enfermagem comunitária em Angola

RESUMO

Objetivo:

Caracterizar a situação de saúde da população do bairro do Imbondeiro, setor C (Luanda).

Método:

Estudo descritivo, transversal e quantitativo. Incluídas as famílias residentes no setor, que aceitaram participar de forma livre e esclarecida e acedidas de modo acidental, por contacto “porta a porta”.

Resultados:

Fez-se o diagnóstico de saúde de 341 agregados familiares, envolvendo 1321 pessoas. 46,02% são do género masculino, 54,08% do género feminino; destes, 42,62% são crianças, 15,14% adolescentes e 42,24% adultos. A maioria das famílias é alargada. A alimentação engloba açúcares e hidratos de carbono. Existe consumo de álcool e violência.

Conclusão:

Os resultados obtidos e apresentados vão de encontro aos do Instituto Nacional de Estatística (INE), no que diz respeito às três faixas etárias estudadas e ao seu diagnóstico de situação de saúde, revelando ser necessário intervir na promoção de hábitos de vida saudáveis, em áreas como violência doméstica, consumo de álcool, hábitos alimentares, doenças sexualmente transmissíveis, entre outras.

Descritores:
Diagnóstico; Promoção da Saúde; Atenção Primária à Saúde; Determinantes Sociais de Saúde; Participação da Comunidade

ABSTRACT

Objective:

To characterize the health situation of the population in the Imbondeiro neighborhood, sector C (Luanda).

Method:

This is a descriptive, cross-sectional and quantitative study. Families living in the sector were included, included in the sample by “door to door” contact. They accepted to participate through a free and consented form.

Results:

Health diagnosis of 341 family households was conducted, involving 1,312 people. A total of 46.02% are male and 54.08% are female; from these, 42.62% are children, 15.14% adolescents and 42.24% adults.

Conclusion:

The results obtained and presented are in accordance with the data from the National Institute of Statistics of Angola (INE), revealing that it is necessary to intervene and to promote healthy lifestyle habits, regarding issues such as domestic violence, alcohol consumption, inappropriate eating habits, sexually communicable diseases, among others.

Descriptors:
Diagnosis; Health Promotion; Primary Health Care; Social Determinants of Health; Community Participation

RESUMEN

Objetivo:

Caracterizar la situación de salud de la población del barrio Imbondeiro, sector C (Luanda).

Método:

Estudio descriptivo, transversal, cuantitativo. Se incluyeron las familias residentes en el sector, que aceptaron participar de forma libre, aclarada, a las cuales se tuvo acceso de modo accidental, por contacto «puerta a puerta».

Resultados:

Se realizó el diagnóstico de salud de 341 agregados familiares, lo que implicó a 1321 personas, de las cuales un 46,02 % del sexo masculino y un 54,08 % del sexo femenino. De estos, un 42,62 % son niños, un 15,14 % adolescentes y un 42,24 % adultos.

Conclusión:

Los resultados obtenidos y presentados están de acuerdo con los datos del Instituto Nacional de Estadística, lo que revela la necesidad de intervenir en la promoción de hábitos de vida saludables, en cuestiones como violencia doméstica, consumo de alcohol, hábitos alimentarios inadecuados, enfermedades sexualmente transmisibles, entre otros.

Descriptores:
Diagnóstico; Promoción de la Salud; Atención Primaria de Salud; Determinantes Sociales de Salud; Participación de la Comunidad

INTRODUÇÃO

Angola vive uma transição epidemiológica, caracterizada pelo peso das doenças transmissíveis e das doenças crónicas não transmissíveis, sendo que, apesar do investimento efetuado e da melhoria dos principais indicadores de saúde globais do país, os indicadores permanecem abaixo da média dos países africanos e do mundo(11 Angola. Ministério da Saúde. Contribuição do sector de saúde para o plano nacional de desenvolvimento 2018-2022. Luanda: MS; 2016.). Ainda se verifica uma elevada taxa de mortalidade materna, infantil e infanto-juvenil, um nível de má nutrição elevado em menores de 5 anos, uma persistência de surtos de cólera, raiva e sarampo, bem como existe um aumento exponencial da sinistralidade rodoviária e violênci(22 Angola. Ministério da Saúde. Plano Nacional de Desenvolvimento em Angola, 2012-2025.2. Luanda: MS; 2012.). Face a isto, é necessário maior enfoque nas medidas de promoção e proteção de saúde, prevenção das doenças, informação e mobilização social de modo a obter um maior empoderamento e participação das comunidades nas intervenções a nível da saúde(11 Angola. Ministério da Saúde. Contribuição do sector de saúde para o plano nacional de desenvolvimento 2018-2022. Luanda: MS; 2016.).

De acordo com os dados dos Censos de 2014, em Angola registam-se 25.789.024 habitantes, dos quais 48% pertencem ao género masculino e 52% ao género feminino, com uma taxa de crescimento natural da população de 2,7%(33 Angola. Instituto Nacional de Estatística. Resultados definitivos do recenseamento geral da população e da habitação de Angola 2014. Luanda; INS; 2016.). Destes, 63% residem na área urbana e 37% na área rural, sendo a província de Luanda a mais habitada com 6.945.386 residentes(33 Angola. Instituto Nacional de Estatística. Resultados definitivos do recenseamento geral da população e da habitação de Angola 2014. Luanda; INS; 2016.). A taxa da população dos 0-14 anos é de 47,3% e a de idosos de 2,4%, sendo de realçar que apenas 13% da população com 18 a 24 anos completou o II Ciclo do ensino secundário(33 Angola. Instituto Nacional de Estatística. Resultados definitivos do recenseamento geral da população e da habitação de Angola 2014. Luanda; INS; 2016.). Estes dados refletem uma população bastante jovem, tal como na maioria dos países em desenvolvimento, constituindo um desafio para o crescimento do país. O acesso a água apropriada para consumo abrange 44% dos agregados familiares; 60% tem acesso ao saneamento e 70% despeja os resíduos sólidos ao ar livre(33 Angola. Instituto Nacional de Estatística. Resultados definitivos do recenseamento geral da população e da habitação de Angola 2014. Luanda; INS; 2016.).

Neste enquadramento e tendo inerentes fatores de ordem individual e familiar, ambiental, ocupacional, económica, social, cultural e administrativa, colocam-se indubitáveis desafios aos profissionais de saúde em geral e aos enfermeiros especialistas em saúde comunitária em particular.

A enfermagem de saúde comunitária desenvolve uma prática globalizante centrada na comunidade, competindo-lhe integrar a equipa multidisciplinar no que diz respeito à elaboração do diagnóstico de saúde de uma comunidade, para consequente implementação de projetos de intervenção. O diagnóstico de saúde de uma população aponta para a situação presente, criando uma referência para o futuro e serve para orientar as intervenções de saúde, no sentido de responder às necessidades da população na prevenção, no controlo de doenças e na promoção da saúde.

A realização de um diagnóstico da situação de saúde de uma população, permite conhecê-la em profundidade, tendo como referência o presente e se possível o passado, no sentido de delinear o futuro. Este orienta as ações a desenvolver, em função da problematização das principais dimensões da realidade social e do correspondente mapeamento de necessidades.

Decorrente dos resultados do diagnóstico realizam-se projetos de intervenção comunitária, com foco nas necessidades de saúde identificadas como prioritárias, no âmbito da promoção da saúde da comunidade.

A elaboração deste diagnóstico tem a finalidade de concorrer para a consecução dos objetivos do Plano Nacional de Desenvolvimento Sanitário (PNDS) 2012-2025 de “melhorar a prestação de cuidados de saúde com qualidade, nas vertentes de promoção, prevenção, tratamento e reabilitação, reforçando a articulação entre a atenção primária e os cuidados hospitalares”(22 Angola. Ministério da Saúde. Plano Nacional de Desenvolvimento em Angola, 2012-2025.2. Luanda: MS; 2012.).

OBJETIVO

Caracterizar a situação de saúde da população do bairro do Imbondeiro, setor C (Luanda).

MÉTODO

Aspectos éticos

A realização do diagnóstico da situação de saúde é considerada como uma das competências específicas do Enfermeiro Especialista em Saúde Comunitária. Neste sentido este foi efetuado no bairro do Imbondeiro (Luanda).

Todos os envolvidos participaram livre e esclarecidamente neste estudo, estando a sua identidade anonimamente protegida, a informação individual mostra-se confidencial e deste trabalho nunca lhes adveio nenhum malefício, tal como referido no parecer da autorização do estudo, proferida na pessoa do Presidente do Conselho de Administração da Clínica Multiperfil.

Desenho, local do estudo e período

No âmbito do estágio de Enfermagem de Saúde Comunitária II deu-se resposta a esse desígnio através da realização, entre 24 de Abril e 6 de Julho de 2017, do diagnóstico de saúde da população do setor C do Bairro do Imbondeiro, distrito da Samba, Município de Luanda. Trata-se de um estudo descritivo, transversal e quantitativo.

População ou amostra; critérios de inclusão e exclusão

A população-alvo deste estudo foi a comunidade residente do setor C do Bairro Imbondeiro, tendo-se considerado como critérios de inclusão para este estudo, todas as famílias residentes no referido setor que aceitaram de forma livre e esclarecida participar, tendo sido contactadas pessoalmente, “porta a porta”. Foram excluídos os frequentadores de condomínios que pertenciam a empresas alocadas no bairro.

Protocolo do estudo

Utilizou-se a técnica de amostragem acidental e como instrumentos de colheita de dados utilizaram-se questionários adaptados à população em estudo, respeitando os princípios éticos da colheita e tratamento de dados. Neste estudo os questionários não foram alvo de pré-teste, uma vez já terem sido previamente aplicados numa comunidade com caraterísticas semelhantes. Os questionários utilizados (quatro) dizem respeito às condições gerais de vida, e às condições específicas de cada membro do agregado familiar, de acordo com a faixa etária. O conceito de grupo etário foi definido de acordo com o preconizado pela Organização Mundial de Saúde, bem como todos os conceitos utilizados na elaboração dos questionários.

Análise dos resultados e estatística

Na análise dos resultados aplicou-se a estatística descritiva, utilizando o software estatístico SPSS® versão 21. Os questionários são disponibilizados, após consulta aos autores, a quem pretender replicar o estudo.

RESULTADOS

A amostra foi constituída por 1321 pessoas, sendo 46,02% do género masculino e 54,08% do género feminino; deste total, 42,62% corresponde a crianças, 15,14% são adolescentes, e 42,24% adultos, constituindo 341 agregados familiares. Dado que não se dispõe do número total da população do setor C do bairro, não é possível calcular a percentagem da amostra.

Caracterização das condições gerais de vida

Verificou-se que predomina a família alargada (51,9%), com uma média de 5 elementos por agregado familiar, sendo que 29,9% dos agregados são constituídos por mais de seis pessoas.

Em relação à habitação verificou-se que 40,5% das habitações têm somente um quarto, 65,4% têm um a dois quartos e quase a totalidade (99,4%) das habitações tem banheiro. O rendimento familiar (71%) é proveniente do salário, sendo o seu valor (32,8%) situado entre 20.000 a 50.000 kwanzas, sendo que 40,5% dos agregados familiares têm rendimento superior a 50.000 kwanzas. 58,1% das famílias residem em casa própria, 38,4% em casa alugadas e destes 66,41% têm aluguel entre 7.000 e 25.000 kwanzas.

Da totalidade das pessoas que integraram a amostra, 98,9% utilizam água de tanque/cisterna, e 78% das famílias efetuam o tratamento de água. Destas, 72,6% utilizam lixívia e apenas 6,16% refere consumir água mineral.

Ainda sobre as condições de habitabilidade, 97,7% das habitações possuem energia eléctrica da rede pública. No que se refere ao estado de conservação das habitações, 59,53% destas apresentavam fissuras, pragas (baratas e ratos) e humidade e bolor no seu interior.

Quanto aos indicadores de conforto, 77,4 % têm frigorífico e/ou arca congeladora. Das famílias que responderam à questão “outros indicadores de conforto”, 92,7% têm ventoinha. Em relação aos meios de comunicação a quase totalidade (93,5%) utiliza o telemóvel; 88% das famílias têm televisão e 19,4% internet.

No que concerne à posse de animais domésticos, o cão predomina em 30,2% dos agregados familiares.

No ambiente exterior das habitações verifica-se que o pavimento das ruas é maioritariamente de terra-batida (51,3%), pavimentado em 45,5% e 5,3% apresenta água estagnada no perímetro da habitação.

Caracterização do grupo: crianças

Do total de crianças estudadas (563), 50,4% são do género masculino e 49,6% do género feminino, com uma idade média de 5 anos, sendo a moda de 3 anos. Do total das crianças, 52,2% frequenta a escola; destas, 87,1% frequenta o primeiro ciclo e 14,3% o ensino pré-escolar. Em relação ao cuidador, 76,6% das crianças identificadas ficam ao cuidado de familiares na ausência dos pais, sendo que 13,5% ficam sozinhas em casa sem a supervisão de um adulto.

No que diz respeito à vigilância de saúde das crianças, o Centro de Saúde é o recurso mais referido pelos cuidadores, tendo sido utilizado no último ano por 61,6% das crianças, destes, 41,5% efetuaram consulta por um enfermeiro, 50,14% recorreram a consulta médica e somente 8,64% refere tê-lo feito para vacinação e/ou consulta de vigilância.

Em relação aos antecedentes de saúde 12,4% do total de crianças já sofreu um acidente, sendo as quedas o mais significativo com 58,6% dos acidentes, seguido das queimaduras com 20% e das mordeduras por animais com 7,14%.

Apenas 4,8% das crianças recorreram à consulta de vigilância oral e 36,8% faz a escovarem dos dentes 2 vezes ao dia.

No referente à higienização das mãos, 47,4% dizem fazê-lo antes das refeições e depois de utilizar as instalações sanitárias.

Em relação à alimentação, 41,4% das crianças ingere leite todos os dias. Das crianças até um ano de idade apenas 13,5% o bebem e 14,4% das crianças refere nunca consumir leite ou derivados. No que concerne ao consumo de carne ou peixe 6,9% nunca consome. A sopa representa 22,6% dos alimentos consumidos; 12,8% nunca consome fruta e 20,8% nunca consome salada e legumes. A ingestão de alimentos açucarados é referida por 55,2% das crianças, com a ingestão de doces no mínimo três vezes por semana e 44,8% ingere refrigerantes no mínimo três vezes por semana. 92,6% consome alguma forma de hidratos de carbono (arroz, massa, batatas e funje ...) pelo menos três vezes por semana.

Como forma de ocupação dos tempos livres, dos que referem brincar, 47,3% também tem hábito de ver televisão; 10,3% têm leitura como ocupação de tempos livres, e 7,6% também têm prática de desporto, associada à brincadeira, como ocupação de tempos livres. 2,3% das crianças refere dormir menos do que 8 horas diárias. A média de horas de sono é 10,24 horas, sendo 20 horas o número máximo de horas de sono por dia e o mínimo de 6 horas.

Caracterização do grupo: adolescentes

Na amostra da população adolescente predomina o género feminino com 52,5%, sendo a idade média dos adolescentes 14,35 anos e a moda de 15 anos. 16,5% não possuem escolaridade obrigatória completa; em 63,5 % dos respondentes as habilitações literárias são o primeiro ciclo; 96% dos adolescentes são estudantes.

Em relação à forma como se deslocam, 63% fá-lo a pé, 30% de transportes públicos e 1,5% de bicicleta.

Quando estão doentes 18% dos adolescentes recorrem a instituições de saúde, destes, 43,85% recorre ao Centro de Saúde e 41,02% ao hospital.

Do total da população adolescente, a situação patológica mais referida é do foro respiratório com 73,3%. No último ano 41% dos adolescentes diz ter utilizado os serviços de saúde, sendo que 51,2 % diz ter recorrido a consulta médica e 48,8% a consulta de enfermagem.

Em relação à vida sexual, 13,5 % desta população refere ter vida sexual ativa iniciada com idade igual ou inferior a 15 anos e 13,7% refere tê-la iniciado aos 11 anos. Da população de adolescentes que já iniciaram a vida sexual, 7,41% já tem filhos tendo sido progenitor entre os 15 e 16 anos. Da população adolescente com vida sexual ativa, 29,6 % refere a não utilização de qualquer método contraceptivo, sendo que 25,9% justifica-a pela ausência do conhecimento. Dos adolescentes que utilizam contraceção todos referem que utilizam o preservativo.

Em relação à saúde oral, somente 3% dos adolescentes refere fazer vigilância de saúde oral e 59,5% faz a escovagem dos dentes de acordo com o recomendado.

Em relação aos hábitos de higienização das mãos, 10,5% não tem hábitos de lavar as mãos.

A nível da alimentação, 30% dos adolescentes não refere a ingestão de sopa, 19% não ingere leite e/ou derivados. 66% do total de adolescentes do estudo ingere doces 3 ou mais vezes por semana, sendo relevante o facto de 54% o fazer diariamente. A ingestão de alguma forma de hidratos de carbono (arroz, massa, batatas e funje ...) é efectuada todos os dias em 95% dos adolescentes.

Como forma de ocupação dos tempos livres os adolescentes referem ver televisão e ler, com 62,5 e 56,5% respetivamente; 40,4% dos adolescentes refere a prática de desporto pelo menos uma vez por semana.

Em relação à violência entre os adolescentes, 13,5% refere ter sido vítima dentro do recinto escolar e 12,5% refere ter sido o agressor; 2,5 % referem ainda ter sido agredido por namorado/namorada. Fora do recinto escolar, 22% refere ter sido vítima e 15,5% ter sido o agressor com 6,5% a dizer ter sido agredido pelo namorado/a.

As quedas e os acidentes de viação são os acidentes mais referidos pela população adolescente (42%).

Caracterização do grupo: adultos

Foram inquiridos 558 adultos dos quais 59% são do género feminino, sendo a idade média de 31,37 anos, com uma moda de 19. Mais de metade da amostra (59,7%) tem como habilitações literárias o segundo ciclo, sendo significativo o fato de que 18,92% dos adultos não possui nenhum nível de escolaridade.

Em relação à situação profissional, 29,5% encontra-se desempregado e 32,4% integra o setor primário e 22,2% dos adultos são estudantes.

A maior parte da população (67,6%) utiliza os transportes públicos e 18,8% anda a pé como o meio de deslocação mais utilizado.

Em caso de algum problema de saúde, 54% refere “outros” como recurso em caso de doença, sendo o Centro de Saúde o recurso mais utilizado com 55%.

Cerca de 90% da população com mais de 18 anos não tem antecedentes de doença; dos restantes adultos, a HTA é o antecedente mais representativo com 79,4%.

A adesão ao regime terapêutico não se verifica em 17,05% dos inquiridos, sendo a causa da não adesão a negligência (40%) e a falta de recursos financeiros (13,3%).

66,2% do total da amostra, acedeu aos serviços do Centro de Saúde no último ano, sendo que 34,05% recorreu ao enfermeiro e 64,05% ao médico. Na amostra da população adulta 48,1% utiliza algum método contraceptivo, sendo o preservativo o método mais frequente em 65,8% dos indivíduos. Dos que referem não utilizar contraceptivo, como justificação para a sua não utilização referem o desconhecimento (59%), o não querer utilizar (2,8%), a falta de interesse (2,8 %), 17,36% por não ter namorado/a e 7,29% por se encontrar na menopausa.

3,2% da amostra da população adulta tem dependentes a cargo; destes, 61,1% apresentam dependência parcial e 16,7% dependência total. Dos que têm dependentes a cargo, 55,6% não tem qualquer tipo de apoio. Dos 38,8% com algum apoio, 57,14% é ao nível dos cuidados de higiene e conforto.

Somente 7% faz vigilância de saúde oral, 62,6 % faz a escovagem dos dentes de acordo com o recomendado e 27,5% efetua-a de manhã, à noite e após as refeições.

Relativo aos hábitos de higiene, 5,7% da amostra de adultos, não tem hábitos de lavagem das mãos, e 94,6% dos adultos tomam entre 6 a 8 banhos por semana.

Relativamente aos hábitos alimentares, 94,3% ingere alguma forma de hidratos de carbono (arroz, massa, batatas e funje) todos os dias, 37% ingere enchidos 3 ou mais vezes por semana, 34,4% ingere doces 3 ou mais vezes por semana e 25,6% diariamente.

Quanto à ocupação dos tempos livres, as atividades mais indicadas são ver TV e ir à igreja, com 47,6% e 30,2% respetivamente; 39,4% tem outras ocupações dos tempos livres, como descansar (28,18%), a lida da casa (28,18%) e ouvir música com 12,27%. 28,4% pratica desporto pelo menos uma vez por semana.

No que se refere aos comportamentos aditivos, 4,3% da amostra da população adulta é fumadora, com início depois dos 18 anos. 38,1% ingere álcool, e destes 81,2% consome-o pelo menos uma a duas vezes por semana, 13,6% entre duas a quatro vezes por semana e 4,2% mais que quatro vezes por semana.

Os antecedentes de algum tipo de acidente foram referidos por 46,5% da amostra da população adulta. Os acidentes de viação representam 53,85%, seguidos das queimaduras (14,23%) e da mordedura animal (12,21%).

Relativamente a agressões sofridas ou infligidas, 27,4% refere ter sido vítima de agressão e 14,3% ter sido o agressor. Dos indivíduos agressores, 15,6% agrediu o companheiro/a e dos indivíduos vítimas de agressão 14,1% foram agredidos pelo companheiro/a.

48,7% da amostra dorme entre 8 a 9 horas e 1,4% toma alguma medicação para dormir.

DISCUSSÃO

Da análise efetuada, os resultados obtidos são sobreponíveis aos dados apresentados pelo INE(33 Angola. Instituto Nacional de Estatística. Resultados definitivos do recenseamento geral da população e da habitação de Angola 2014. Luanda; INS; 2016.) relativos à caracterização da população Angolana, onde a faixa etária mais representativa é a das crianças e o género feminino o maioritário.

Sendo que investir em educação é investir no desenvolvimento(44 Favaro N, Tumoro S. A relação entre educação e desenvolvimento econômico no capitalismo. Educ Soc [Internet]. 2016 [cited 2017 Jan 05]; 37(135):557-71. Available from: http://www.scielo.br/pdf/es/v37n135/1678-4626-es-37-135-00557.pdf
http://www.scielo.br/pdf/es/v37n135/1678...
) é preocupante o número de adolescentes que não possuem escolaridade obrigatória completa, bem como o número de desempregados desta amostra.

Os países que não valorizam a educação como ferramenta para o desenvolvimento da nação parecem apresentar uma economia frágil e população com rendimento disponível baixo, o que se reflecte no bem-estar da população, ao nível do emprego, condições de habitabilidade e determinantes de saúde(55 Martins P, Cotta R, Siqueira-Batista R, Mendes F, Frachescinni S, Priore S, et al. Democracia e empoderamento no contexto da promoção da saúde: possibilidades e desafios apresentados ao programa de saúde da família. Physis [Internet]. 2010 [cited 2017 Jan 05]; 19(3):679-94.).

O tipo de família predominante é a alargada, com uma média de 5 elementos. Na ausência dos pais, as crianças ficam maioritariamente ao cuidado de familiares, o que pode estar relacionado com a tipologia familiar e com a baixa frequência de creches e centros de ocupação de tempos livres, bem como com o seu elevado custo económico em Angola. Ressalva-se o fato de que, na ausência de um adulto, as crianças ficam sozinhas em casa, com os riscos que estão associados a esta prática.

A maioria das residências apresenta apenas um único quarto com implicações ao nível da higiene dos espaços, privacidade, arejamento e da proteção da saúde das famílias, nomeadamente a nível da doença respiratória que se verificou ser frequente na população adolescente. A célere urbanização, a que se assiste em Angola, é uma oportunidade para estas pessoas e contribuirá, inquestionavelmente, para a melhoria das suas condições de habitabilidade(66 AFDB, OECD & UNDP. African Economic Outlook 2016: sustainable cities and structural transformation. OECD Publishing. 2016.).

Em relação à vida sexual dos adolescentes, verifica-se o seu início precoce, com falta de conhecimento relativo à contracepção, o que se manifesta pela sua não utilização. Na população adulta, cerca de metade refere a utilização de contraceptivos e quando não utilizam a razão mais apresentada é a falta de conhecimentos. A promoção de comportamentos saudáveis através da utilização dos métodos contraceptivos promove a melhoria da saúde materna, que é um dos indicadores de avaliação de desenvolvimento e de qualidade de vida de um país e da sua população. A elevada taxa de mortalidade materna e neonatal, bem como o elevado índice de incidência de infecção por VIH, na população Angolana(22 Angola. Ministério da Saúde. Plano Nacional de Desenvolvimento em Angola, 2012-2025.2. Luanda: MS; 2012.), são fatores preocupantes e que podem ser reduzidos com o incremento do conhecimento da população face à utilização do preservativo.

Verifica-se que uma das razões manifestadas para a não adesão ao regime terapêutico farmacológico é a falta de recursos económicos.

A nível alimentar os hábitos são desequilibrados, com consumo excessivo de hidratos de carbono, enchidos e doces preterindo a fruta, saladas e legumes. O consumo de leite não é um hábito regular em todas as crianças, principalmente na faixa etária até um ano de idade. A prática desportiva está presente em todos os grupos estudados, mas de uma forma não regular. Estes fatores associados podem justificar a presença das doenças crônicas mais referenciadas nos questionários (hipertensão arterial).

No que se refere aos comportamentos aditivos é considerável e preocupante o número de adultos que referem o consumo de álcool, o que se pode previsivelmente relacionar com a violência que esteja presente, quer em adolescentes quer em adultos, tanto na posição de vítima como de agressor(66 AFDB, OECD & UNDP. African Economic Outlook 2016: sustainable cities and structural transformation. OECD Publishing. 2016.-77 Duailibi R, Pinsky I. Álcool e violência: a psiquiatria e a saúde pública. Rev Bras Psiquiatr [Internet]. 2005 [cited 2017 Jan 05]; 27(3):176-7. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rbp/v27n3/a04v27n3.pdf
http://www.scielo.br/pdf/rbp/v27n3/a04v2...
). Na realidade a perturbação do equilíbrio da família, devido ao abuso de substâncias aditivas como o álcool, potenciado pelo baixo rendimento disponível pode conduzir a comportamentos violentos(88 Bes T, Lopes F, Morgan G, Ribeiro M, Duarte W. Relação da violência intrafamiliar e o uso abusivo de álcool ou entorpecentes na cidade de Pelotas, Rev AMRIGS[Internet]. 2013 [cited 2017 Jan 05]; 57(1):9-13. Available from: http://www.amrigs.org.br/revista/57-01/1108.pdf
http://www.amrigs.org.br/revista/57-01/1...
).

Os acidentes de viação são os acidentes mais frequentes nos grupos dos adolescentes e do adulto o que vai de encontro ao definido pelo PNDS, como sendo um indicador a melhorar(22 Angola. Ministério da Saúde. Plano Nacional de Desenvolvimento em Angola, 2012-2025.2. Luanda: MS; 2012.).

Limitações do estudo

O facto de não ter sido possível aceder a todas as famílias pode ter impedido o desocultar de aspetos relevantes. Por outro lado, o receio de dar informações, presente algumas vezes na comunicação não-verbal dos participantes, também pode ter deixado por revelar aspectos importantes relativos à sua saúde e modo de vida.

Contribuições para a área de enfermagem

Conhecer o modo de viver de uma dada população, bem como os seus comportamentos de saúde, permite uma intervenção de enfermagem dirigida e adequada às reais necessidades de grupos e populações. Esta intervenção, surge como competência e responsabilidade dos enfermeiros de saúde comunitária que, através da compreensão dos processos de vida das pessoas, desenham projetos que possibilitam promover a saúde e o bem-estar.

CONCLUSÃO

O planeamento em saúde é uma ferramenta fundamental para o desenvolvimento da saúde comunitária. Só é possível desenvolver estratégias de intervenção quando se conhece a realidade da saúde de uma comunidade. Este conhecimento é efetuado através da elaboração do seu diagnóstico, representando este um elemento específico aos cuidados especializados e uma das competências do enfermeiro especialista em saúde comunitária.

A enfermagem comunitária assume um papel de vital importância, uma vez que os profissionais desta área são, por excelência, detentores de competências que lhes permitem responder de forma adequada às necessidades das pessoas, grupos e comunidades, partindo da avaliação multicausal dos principais problemas de saúde e prosseguindo, desenvolvendo programas/ projetos de intervenção, com vista ao empoderamento e ao exercício da cidadania.

Os resultados obtidos no diagnóstico de situação de saúde apresentados corroboram os expostos pelo Instituto Nacional de Estatística, indicando um vasto campo de intervenção desde as condições de habitabilidade às de promoção de hábitos de vida saudável. A violência de género, o abandono infantil, o consumo de álcool, e as doenças sexualmente transmissíveis representam, assim, áreas prioritárias para intervenção da enfermagem de saúde comunitária.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Oct 2018

Histórico

  • Recebido
    13 Set 2017
  • Aceito
    09 Nov 2017
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