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Aspectos epidemiológicos da ocorrência do Enterococcus resistente a Vancomicina

Aspectos epidemiológicos de la eventual aparición del Enterococcus resistente a la Vancomicina

Resumos

Estudo descritivo realizado em um hospital público, de maio de 2005 a outubro de 2007. Objetivou-se determinar os aspectos epidemiológicos que envolvem o Enterococcus resistente à vancomicina (VRE) e descrever a evolução dos pacientes. Os dados foram coletados de registros em prontuários. Após a coleta, as informações foram processadas no SPSS. Usou-se a distribuição de frequência e medidas de tendência central. Participaram do estudo 122 pacientes. A maioria foi do sexo masculino, com idade média de 43 anos (DP= 18,8). A infecção por VRE foi desenvolvida por 16,3%. O antimicrobiano mais usado previamente à identificação do VRE foi a vancomicina (62,3%); 97,5% foram submetidos aos procedimentos invasivos; 45,0% eram dependentes de cuidados intensivos de enfermagem; 77,9% tinham pelo menos uma ferida aberta, e 50,8% evoluíram a óbito. Esses dados sugerem que recomendações de controle da resistência bacteriana devem ser encorajadas diuturnamente, visando à redução da mortalidade, morbidade, custos hospitalares e, consequentemente, uma melhor qualidade da assistência ao paciente.

Infecção; Infecção hospitalar; Fatores de risco; Farmacorresistência bacteriana


Estudio descriptivo, realizado en un hospital público desde mayo de 2005 a octubre de 2007. Se objetivó determinar los aspectos epidemiológicos que involucran al Enterococcus resistente a vancomicina (VRE) y describir la evolución de los pacientes. Los datos fueron recolectados de registros en historias clínicas, después de la recolección, la información obtenida fue procesada en SPSS. Se usó la distribución de frecuencia y medidas de tendencia central. Participaron del estudio 122 pacientes. La mayoría, de sexo masculino, con edad media de 43 años (DP = 18,8). El 16,3% desarrolló infección por VRE. El antibiótico más usado antes de la identificación del VRE fue la vancomicina. (62,3%); 93,5% fueron sometidos a procedimientos invasivos, 45,0% dependían de cuidado intensivo de enfermería, 77,9% tenía por lo menos una herida abierta y 50,8% fallecieron. Tales datos sugieren que deben ser alentadas en forma ilimitada medidas de control de la resistencia bacteriana, apuntando a la reducción de la mortalidad, morbilidad, costos hospitalarios y, consecuentemente, a una mejor calidad de atención del paciente.

Infección; Infección hospitalaria; Factores de riesgo; Farmacorresistencia bacteriana


This descriptive study was conducted in a public hospital from May 2005 to October 2007, with the purpose to determine the epidemiological aspects that involve vancomycin-resistant enterococci (VRE) and describe the evolution of patients. |The data was obtained from registers on patient records and then processed in SPSS. Frequency distribution and measures of central tendency were used. A total 122 patients participated of the study, the majority were males with an average age of 43 years (SD= 18.8), and 16.3% developed VRE infection. Vancomycin has been the most used antibiotic (62,3%), 97.5% used invasive procedures, 45.0% were dependent on intensive care nursing, 77.9% had at least one open wound and 50.8% progressed to death. The data suggests that recommendations for bacterial resistance control should be encouraged to reduce mortality, morbidity, hospital costs and thus provide better quality care to patients.

Infection; Cross infection; Risk factors; Drug resistance, bacterial


ARTIGO ORIGINAL

Aspectos epidemiológicos da ocorrência do Enterococcus resistente a Vancomicina

Aspectos epidemiológicos de la eventual aparición del Enterococcus resistente a la Vancomicina

Adriana Cristina OliveiraI; Ledna BettcherII

IEnfermeira. Pós-Doutora pela New York University. Professora Adjunta da Escola de Enfermagem da Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, MG, Brasil. adrianacoliveira@gmail.com

IIMestre em Enfermagem pela Escola Enfermagem da Universidade Federal de Minas Gerais. Enfermeira do Serviço de Controle de Infecção do Hospital João XXIII da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais. Belo Horizonte, MG, Brasil. nepircs@gmail.com

Correspondência Correspondência: Adriana C. Oliveira Av. Alfredo Balena, 190 - Santa Efigênia CEP 30130-100 - Belo Horizonte, MG, Brasil

RESUMO

Estudo descritivo realizado em um hospital público, de maio de 2005 a outubro de 2007. Objetivou-se determinar os aspectos epidemiológicos que envolvem o Enterococcus resistente à vancomicina (VRE) e descrever a evolução dos pacientes. Os dados foram coletados de registros em prontuários. Após a coleta, as informações foram processadas no SPSS. Usou-se a distribuição de frequência e medidas de tendência central. Participaram do estudo 122 pacientes. A maioria foi do sexo masculino, com idade média de 43 anos (DP= 18,8). A infecção por VRE foi desenvolvida por 16,3%. O antimicrobiano mais usado previamente à identificação do VRE foi a vancomicina (62,3%); 97,5% foram submetidos aos procedimentos invasivos; 45,0% eram dependentes de cuidados intensivos de enfermagem; 77,9% tinham pelo menos uma ferida aberta, e 50,8% evoluíram a óbito. Esses dados sugerem que recomendações de controle da resistência bacteriana devem ser encorajadas diuturnamente, visando à redução da mortalidade, morbidade, custos hospitalares e, consequentemente, uma melhor qualidade da assistência ao paciente.

Descritores: Infecção. Infecção hospitalar. Fatores de risco. Farmacorresistência bacteriana

RESUMEN

Estudio descriptivo, realizado en un hospital público desde mayo de 2005 a octubre de 2007. Se objetivó determinar los aspectos epidemiológicos que involucran al Enterococcus resistente a vancomicina (VRE) y describir la evolución de los pacientes. Los datos fueron recolectados de registros en historias clínicas, después de la recolección, la información obtenida fue procesada en SPSS. Se usó la distribución de frecuencia y medidas de tendencia central. Participaron del estudio 122 pacientes. La mayoría, de sexo masculino, con edad media de 43 años (DP = 18,8). El 16,3% desarrolló infección por VRE. El antibiótico más usado antes de la identificación del VRE fue la vancomicina. (62,3%); 93,5% fueron sometidos a procedimientos invasivos, 45,0% dependían de cuidado intensivo de enfermería, 77,9% tenía por lo menos una herida abierta y 50,8% fallecieron. Tales datos sugieren que deben ser alentadas en forma ilimitada medidas de control de la resistencia bacteriana, apuntando a la reducción de la mortalidad, morbilidad, costos hospitalarios y, consecuentemente, a una mejor calidad de atención del paciente.

Descriptores: Infección. Infección hospitalaria. Factores de riesgo. Farmacorresistencia bacteriana.

INTRODUÇÃO

As infecções hospitalares são consideradas atualmente como problema de saúde pública, acometendo mais de 15% dos pacientes internados, agravando-se com a emergência da resistência bacteriana(1). Nas últimas décadas é crescente o surgimento de cepas resistentes a múltiplas drogas, dentre esses germes se destaca o Enterococcus.

O Enterococcus resistente a vancomicina (VRE) foi identificado primeiramente na Europa, em 1986, estendendo-se a outros países. Nos Estados Unidos, a taxa estimada de VRE em unidades de terapia intensiva é de 28,5%. Na América Latina, o aumento na prevalência de VRE é encontrado na Argentina, no Uruguai e no Chile(2-4).

No Brasil, os primeiros relatos de VRE ocorreram em Curitiba (1996), posteriormente em São Paulo e Rio de Janeiro(5). Em Minas Gerais esse patógeno começou a emergir nas unidades de saúde a partir de 2005, entretanto, até o momento, não há publicação de acompanhamento sobre o assunto.

Apesar da disponibilidade de guidelines que orientam sobre as medidas de controle e prevenção na emergência do VRE nas unidades de saúde, as taxas são crescentes e causam preocupação para a equipe multiprofissional(2,4,6).

A presença do Enterococcus resistente a vancomicina apresenta implicações econômicas e sociais. Estima-se que o tratamento de uma infecção por Enterococcus resistente a vancomicina seja dez vezes mais caro que uma infecção por um Enterococcus sensível, além de estar associado ao significativo aumento na mortalidade(7-8).

Além do custo assistencial, destacam-se também as experiências vivenciadas por pacientes e familiares, relacionando a presença do VRE ao risco de adquirirem uma infecção hospitalar de difícil tratamento, ao isolamento e à restrição de visitas. Outro aspecto se refere à necessidade da precaução de contato (uso de luvas e capotes) pelos profissionais de saúde, o que, além dos gastos financeiros com Equipamentos de Proteção Individual (EPIS), pode ser entendido pelo paciente e pelos familiares como uma situação de maior gravidade.

OBJETIVO

Diante da relevância do tema, esse estudo objetivou descrever os aspectos epidemiológicos que envolvem a colonização e a disseminação de VRE e descrever a evolução dos pacientes.

MÉTODO

Trata-se de um estudo epidemiológico, descritivo e de abordagem quantitativa realizado em um hospital público de grande porte ligado ao ensino e à pesquisa, pertencente à rede de hospitais da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais - FHEMIG. A instituição tem 273 leitos, é referência estadual no atendimento especializado de urgência e emergência à vítima de trauma em acidentes automobilísticos, agressões por arma branca e de fogo, queimaduras, afogamentos, quedas, intoxicações e situações clínicas que envolvem risco iminente de morte.

Apresenta uma média de 8.750 atendimentos ambulatoriais mensais, 710 internações/mês, 353 cirurgias/mês. A instituição conta com 1.617 profissionais: 578 médicos, 126 enfermeiros, 854 auxiliares e técnicos de enfermagem, 42 fisioterapeutas, 20 assistentes sociais.

A população-alvo foi constituída por pacientes internados, portadores de Enterococcus resistente a vancomicina. A identificação inicial do portador de VRE se deu a partir da cultura de vigilância de pacientes críticos, realizada semanalmente, por meio de swabs peri-anal e nasal, conforme rotina da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar.

Tal medida tem como finalidade a detecção precoce dos casos e, sobretudo a busca da redução da disseminação de microrganismos resistentes, tanto no ambiente hospitalar como na comunidade.

Paciente portador foi compreendido como sendo todo aquele que apresentou uma ou mais culturas positiva para VRE, independente do material ou da situação de colonizado ou infectado.

A definição de colonização traduziu-se em condição em que houve crescimento e multiplicação do microrganismo em superfícies epiteliais do organismo, sem provocar resposta imunológica específica, doença ou infecção(8).

Por outro lado a infecção referiu-se à condição em que houve reação tecidual resultante da invasão, multiplicação ou ação de toxinas produzidas por agentes infecciosos no organismo hospedeiro(8).

Para a inclusão dos participantes no estudo, foram considerados os seguintes critérios: a) paciente internado na Instituição, independente da unidade, com identificação de Enterococcus resistente a vancomicina através de exame microbiológico realizado a partir de maio de 2005 até o término da coleta de dados em 30 de outubro de 2007; b) disponibilização dos dados em prontuários, fichas do Serviço de Controle de Infecção Hospitalar e registro no laboratório de microbiologia.

Os pacientes foram avaliados segundo as seguintes variáveis: sexo, idade, procedência, tempo de permanência hospitalar (prévia à identificação do VRE e após a identificação do VRE), grau de dependência do paciente em relação ao cuidado de enfermagem, presença de ferida aberta, uso de procedimento invasivo, uso de antimicrobiano (dias), óbito e se infecção ou colonização por VRE.

Para a classificação do grau de dependência de pacientes ou Sistema de Classificação de Pacientes (SCP), utilizou-se como parâmetros a alimentação, a mobilização, a higiene, o nível de consciência, as eliminações, as medicações e os procedimentos especiais. A utilização do SCP na avaliação dos fatores de risco para colonização ou infecção por Enterococcus resistente a vancomicina, fundamenta-se na presunção de que pacientes mais dependentes são também mais manipulados, aumentando o risco de contaminação por microrganismos resistentes por meio das mãos dos profissionais(8).

Para análise da caracterização do grau de dependência dos pacientes estudados, a categorização dessa variável foi feita segundo a Resolução COFEN 189/1996(9). Foram definidos os seguintes parâmetros: a) Cuidados mínimos: prestados a pacientes estáveis sob o ponto de vista clínico e de enfermagem, fisicamente auto-suficientes quanto ao atendimento das necessidades humanas básicas; b) Cuidados intermediários: prestados a pacientes estáveis sob o ponto de vista clínico e de enfermagem, requerendo avaliações médicas e de enfermagem com parcial dependência dos profissionais de enfermagem para o atendimento das necessidades humanas básicas; c) Cuidados semi-intensivos: prestados a pacientes recuperáveis, sem risco iminente de morte, sujeitos à instabilidade de funções vitais, requerendo assistência de enfermagem e médica permanente e especializada; d) Cuidados intensivos: prestados a pacientes graves e recuperáveis, com risco iminente de morte, sujeitos à instabilidade de funções vitais, requerendo assistência de enfermagem e médica permanente e especializada.

A análise estatística foi realizada no programa Statistical Package for Social Sciences (SPSS), versão 13.0, 2004, baseada, inicialmente, na caracterização da amostra. Nessa etapa, foram construídas tabelas de freqüência além da utilização de medidas de tendência central (média, mediana, desvio-padrão) para as variáveis quantitativas e distribuição de freqüências para as variáveis qualitativas.

O estudo foi precedido da avaliação e aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da instituição, e do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais, sob o número ETIC 061/07, de acordo com Resolução 196 de 1996 do Conselho Nacional de Saúde, que regulamenta a pesquisa em seres humanos.

Considerando-se que os dados foram coletados de prontuários e bases de dados do Serviço de Controle de Infecção Hospitalar e na inviabilidade de obtenção dos termos de consentimento informado devido à alta, à transferência ou ao óbito do paciente, a autorização para acesso aos documentos foi obtida da direção do hospital.

RESULTADO

Foram incluídos no estudo 122 pacientes portadores de Enterococcus resistente a vancomicina durante o período de maio de 2005 a outubro de 2007. A Figura 1 apresenta a distribuição do número absoluto de pacientes identificados como portadores de VRE e o número de amostras identificadas segundo o mês e o ano.


Durante o período deste estudo, observou-se um aumento exponencial de culturas positivas para VRE passando de 17 casos em 2005 para 57 casos em 2006. E até outubro de 2007, 48 casos foram identificados.

Características sócio-demográficas dos pacientes portadores de Enterococcus resistentes a vancomicina

Verificou-se um predomínio de pacientes portadores de VRE de 83,6% (102) do sexo masculino, provavelmente em virtude do maior número de vítimas de trauma, referência do hospital em estudo, serem do referido sexo (Tabela 1).

Para a idade dos pacientes estudados, verificou-se uma variação de 1 a 90 anos, média de 43 (DP=18,8) e mediana de 41 anos. (Tabela 1).

O percentual de pacientes externos, ou seja, daqueles sem relato de ter vindo de outra instituição de saúde foi de 56,6% (69), sendo a maioria vítimas de trauma, seguida das taxas de 35,2% (43) para procedentes do domicílio e 8,2% (10) transferidos de outras instituições (Tabela 1).

Os pacientes estudados encontraram-se internados nas Unidades de Terapia Intensiva (UTI) e de forma semelhante na Unidade de Cuidados Progressivos (UCP), provavelmente em virtude de sua semelhança com a terapia intensiva. A UCP é constituída em sua maioria por pacientes que requerem cuidados intensivos/semi-intensivos ou intermediários, sendo que mais de 60% dos pacientes necessitavam de ventilação mecânica e/ou apresentavam alguma seqüela da doença de base, além de ser considerada unidade de longa permanência.

Quanto ao tempo de permanência hospitalar prévia à identificação do VRE entre os pacientes portadores, encontrou-se uma variação de cinco a 892 dias, a média de 55,4 (DP= 86,0) e mediana de 41 dias.

O tempo de internação hospitalar é considerado fator determinante para aquisição de microrganismos resistentes. No presente estudo 8,3% dos pacientes foram identificados com VRE com menos de cinco dias de permanência hospitalar, chegando a 18% identificados em até quinze dias de internação (Figura 2).


Em relação ao tempo de internação em unidade de terapia intensiva, dos 122 pacientes estudados, 82,8% (101) tiveram internação prévia nesta unidade com uma média de 25,6 dias (DP= 37,9) e mediana de 19,5 dias.

Quanto ao grau de dependência do paciente em relação à enfermagem, observou- se que pacientes classificados como dependentes de cuidados intensivos de enfermagem representaram 45% (55) dos casos. Nesta categoria encontraram-se os pacientes clínicos ou cirúrgicos mais graves, necessitando de monitorização e suporte contínuos de suas funções vitais, portadores de doenças ou condições clínicas que geralmente predispuseram à colonização e às infecções pelo VRE (Figura 3).


Chama a atenção que 23,0% (28) dos pacientes necessitaram de cuidados intermediários, 26,3% (32) de cuidados semi-intensivos e apenas 5,7% (7) de cuidados mínimos de enfermagem.

A maioria dos pacientes portadores de VRE deste estudo, 77,9% (95), tinha pelo menos uma ferida aberta. A úlcera de decúbito nesses pacientes correspondeu a 68,0% (83) dos casos de ferida aberta, 44,6% (37) apresentaram mais de um sítio com lesão, sendo a região sacral comum entre pacientes com úlcera de pressão.

A presença de procedimento invasivo entre os pacientes estudados foi verificada em 97,5% (119). Entre os procedimentos, o cateterismo vesical de demora esteve presente em 97,0% (119) dos pacientes portadores de VRE, seguidos da ventilação mecânica em 92,6% (115).

A média de dias de uso de antimicrobiano prévio a identificação do VRE foi de onze dias (DP=14), com mediana de dez. Dentre os agentes antimicrobianos utilizados destacaram-se a vancomicina 62,3% (média de 19 dias, DP= 14,2), as cefalosporinas de quarta geração 50,8% (média de 11,3 dias, DP= 7,4), as cefalosporinas de terceira geração 45,9% (média de 11,3 dias, DP= 7,0), as quinolonas 40,2% (média de 11,3 dias, DP= 5,73) e os carbapenêmicos em 32,8% (média de 14,5 dias, DP= 8,1).

Perfil microbiológico do VRE isolados e Infecções causadas pelo VRE

Entre os 122 pacientes portadores de VRE foram isoladas 135 cepas de Enterococcus resistente a vancomicina, sendo oito pacientes colonizados por duas espécies diferentes de Enterococcus. Foram identificadas cinco espécies de VRE, sendo: E. faecalis (76), E. faecium (39), E. gallinarium (6), E. avium (6), E. casseiliflavus (1). E em sete Enterococcus isolados não foi identificada a espécie.

Dentre os pacientes estudados, 22 (18,04) desenvolveram infecção hospitalar por VRE e 81,96% colonização. Apesar de terem sido isoladas cinco espécies de VRE, apenas E. faecalis (63,6%) e o E. faecium (31,8%) foram relacionadas às infecções. Observou-se que, dos pacientes caracterizados com infecção por VRE, o sítio mais freqüente foi o trato urinário, correspondendo a 72,8% (16) seguido da infecção da corrente sanguínea 9,9% (2), infecção de partes moles 9,0% (2), trato respiratório 4,5% (1) e infecção cirúrgica 4,5% (1).

Evolução clínica dos pacientes portadores de VRE

A média de permanência dos pacientes após a identificação do VRE foi de 48 dias (DP= 62,9), mediana de 28,5 e desvio padrão de 63 dias. Em relação à evolução dos pacientes, 50,8% (62) dos casos evoluíram a óbito, 34,4% (42) tiveram alta para domicílio e 4,9% (6) foram transferidos para outra instituição de saúde. No final da coleta de dados em 30 de outubro, 9,8% (12) dos pacientes ainda permaneciam internados.

Dos 62 pacientes que evoluíram a óbito, apenas 6,5% (4) tinham evidências que permitiram relacioná-los à presença do Enterococcus resistente a vancomicina, uma vez que esses pacientes, no momento do óbito, estavam com infecção causada por tal microrganismo.

DISCUSSÃO

O aumento de pacientes colonizados por VRE constitui um problema mundial(10). Estudo envolvendo países da Europa, da América Latina e da América do Norte, no período de 1998 a 2004, encontrou crescimento no número de pacientes com Enterococcus resistente a vancomicina, apresentando taxas duas vezes mais altas em sete anos na América do Norte, de 8,6% em 1998 para 14,8% em 2004. Na Europa o crescimento foi menos expressivo até 2003, e em 2004 houve crescimento de 6,3% em relação ao ano anterior(11). No Brasil ainda não se tem idéia precisa da situação epidemiológica do VRE.

O tempo de internação é sabidamente um fator de risco para a aquisição do VRE e, em casos de internação em CTI superior a sete dias, também foi verificado como fator de risco para aquisição de VRE, (p < 0,05)(11-12). Apesar da reconhecida relação entre a permanência hospitalar e a aquisição de VRE, no presente estudo não foi possível estabelecer uma associação estatisticamente significativa entre essas duas variáveis. Outro aspecto relacionado a permanência hospitalar, porém não avaliado no presente estudo, mas que merece atenção se deve ao fato desta poder atuar como um fator facilitador da transferência de VRE por meio das mãos dos profissionais de saúde. As mãos podem se tornar contaminadas com VRE a partir de objetos ou da pele do paciente, superfícies intactas, bem como a transferência destes organismos para outras superfícies, que podem ser confirmadas por culturas, tipagem molecular dos isolados, e acompanhamento da adesão aos protocolos de prevenção e controle infecção. Assim, o tempo de permanência pode significar ainda a maior possibilidade de transmissão horizontal causadas pelo contato do profissional-paciente, profissional- ambiente e ainda paciente-ambiente contaminados(11).

A partir disso, há também que se destacar a importância do grau de dependência do paciente em relação à enfermagem, que consiste na classificação do nível de atenção quantitativa/qualitativa requerida pela situação de saúde em que o cliente se encontra(9).

Apesar de ser uma análise do grau de dependência voltado para enfermagem também expressa de forma indireta a necessidade de avaliação e manipulação do paciente em relação a toda equipe multiprofissional.

Logo, traduz que pacientes mais graves são mais manipulados, necessitando de maior atenção de profissionais de saúde, seja por meio da maior adesão aos equipamentos de proteção individual, indispensáveis nos casos de pacientes portadores de microrganismos resistentes (luva e capote), sobretudo na atenção à higienização das mãos antes e após o contato com esses e todos os demais pacientes e/ou ainda na realização de procedimentos.

Pode se dizer ainda que os dados observados em relação ao grau de dependência dos pacientes aos cuidados da enfermagem ressaltam o papel que esses profissionais representam no controle e na prevenção de microrganismos resistentes dentro da instituição de saúde, contribuindo especificamente para a enfermagem como parâmetro para o cálculo de pessoal e no planejamento da assistência(9,13).

Estudos apontam que o contato com pacientes colonizados por VRE, favorece a contaminação dos profissionais de saúde, assim como o contato com superfícies contaminadas em enfermarias em que se encontram pacientes portadores de Enterococccus resistente a vancomicina. O número de procedimentos realizados também é associado à aquisição de VRE pelos profissionais. Apesar de não avaliarem o tipo de cuidado com o risco de colonização por VRE, estudos reforçam que o contato com paciente colonizado é um fator de risco para a disseminação desse patógeno nas unidades de saúde, principalmente entre pacientes e profissionais(11,14).

Em relação ao uso de antimicrobiano, esse é apontado na literatura como um fator importante para o desenvolvimento de Enterococcus resistente a vancomicina. Estudo realizado em 2001 registrou que a prevalência de VRE foi fortemente associada à utilização de vancomicina e, em um modelo de regressão linear, vancomicina (p<0,001) e cefalosporina de terceira geração (p=0,02) foram independentemente associados à prevalência de VRE (12).

De acordo com a literatura observa-se que a freqüência das espécies isoladas pode variar com a população estudada. Estudo envolvendo 49 laboratórios em 27 países europeus encontraram um predomínio de E. faecium, e, na Letônia e Turquia, um terço dos VRE eram E. cassaliflavus e dois terços E.gallinarium(15).

Uma análise da prevalência de VRE em pacientes transplantados renais encontrou uma freqüência de 50% de E. faecium e E. faecalis e 28,9% de E. Gallinarum(16).

CONCLUSÃO

Em relação aos aspectos epidemiológicos que envolveram a ocorrência do VRE, verificou-se um aumento exponencial de culturas positivas passando de 17 casos em 2005 para 57 casos em 2006. E até outubro de 2007, 48 casos foram identificados.

A maioria dos pacientes com VRE eram do sexo masculino, com idade média de 43 anos (DP= 18,8) e vítimas de algum trauma. Foi predominante a internação em unidade de terapia intensiva e em unidade de cuidados progressivos, correspondendo a pacientes com maior morbidade e longa permanência.

Dentre os pacientes portadores de VRE apenas E. faecalis e o E. faecium foram relacionadas às infecções.

O antimicrobiano mais usado previamente à identificação do VRE foi a vancomicina. A maioria dos pacientes estudados usou procedimentos invasivos e quase metade deles eram dependentes de cuidados intensivos de enfermagem.

No que se refere à evolução, metade dos pacientes estudados evoluíram a óbito sendo baixa a associação com VRE (6,5%).

Concluindo, torna-se evidente a importância da divulgação de taxas e do perfil epidemiológico dos microrganismos resistentes nas diversas unidades hospitalares. E, uma atenção cuidadosa às medidas de prevenção e controle da resistência bacteriana e, sobretudo da disseminação do VRE, com a participação de todos os profissionais envolvidos na assistência.

E ainda, um programa de educação permanente, com a monitorização de medidas tais como higienização das mãos, culturas de vigilância ativa (culturas à internação hospitalar, semanais e de pacientes de alto risco) e, conseqüente isolamento do pacientes VRE positivos. Além da discussão de casos e divulgação dos resultados das estratégias adotadas, bem como seu impacto na prática clinica em reuniões clínicas e/ou seminários temáticos abertos a toda equipe multiprofissional.

Recebido: 16/09/2008

Aprovado: 04/11/2009

* Extraído da dissertação "O paciente portador de enterococcus resistente a vancomicina em um Hospital Público de Belo Horizonte: aspectos demográficos, epidemiológicos e microbiológicos", Escola de Enfermagem, Universidade Federal de Minas Gerais, 2008.

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  • Correspondência:
    Adriana C. Oliveira
    Av. Alfredo Balena, 190 - Santa Efigênia
    CEP 30130-100 - Belo Horizonte, MG, Brasil
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      07 Out 2010
    • Data do Fascículo
      Set 2010

    Histórico

    • Recebido
      16 Set 2008
    • Aceito
      04 Nov 2009
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