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Hospitalização durante a gravidez segundo financiamento do parto: um estudo de base populacional

Hospitalización durante el embarazo según la financiación del parto: un estudio de base poblacional

RESUMO

Objetivo

Analisar a ocorrência, o perfil e as principais causas de internação na gravidez por financiamento do parto.

Método

Estudo transversal de base populacional, realizado com puérperas, por meio de amostra estratificada, calculada segundo o hospital e a fonte de financiamento do parto: setor público (SUS) e privado (não SUS). Foram analisados o perfil sociodemográfico, as taxas de intercorrência obstétrica e as causas de internação, codificadas de acordo com normas da Classificação Internacional de Doenças.

Resultados

Foram entrevistadas 928 puérperas, das quais 32,2% relataram pelo menos uma internação na gestação. Aquelas com parto SUS mostraram-se menos favorecidas por ser maioria entre as internadas (57,2%), com maior percentual de adolescentes (18,1%), menor escolaridade (91,8%), baixa renda familiar (39,3%) e menor número de consultas pré-natal (25,3%). As causas mais frequentes de internação foram as “outras doenças da mãe que complicam a gravidez” (24,6%) (com destaque para anemia e influenza), infecção do trato urinário (13,1%), trabalho de parto prematuro (8,7%) e hipertensão (7,2%).

Conclusão

Deve-se prevenir e tratar especialmente anemia, influenza, infecção urinária, trabalho de parto prematuro e hipertensão para evitar internações hospitalares na gravidez, principalmente para gestantes do SUS.

DESCRITORES
Gravidez; Hospitalização; Complicações na Gravidez; Enfermagem Obstétrica; Enfermagem Materno-Infantil

RESUMEN

Objetivo

Analizar la ocurrencia, el perfil y las principales causas de ingreso hospitalario en el embarazo por financiación del parto.

Método

Estudio transversal de base poblacional, realizado con puérperas, mediante muestra estratificada, calculada según el hospital y la fuente de financiación del parto: sector público (SUS) y privado (no SUS). Fueron analizados el perfil sociodemográfico, las tasas de alteraciones obstétricas y las causas de hospitalización, codificadas de acuerdo con las normas de la Clasificación Internacional de Enfermedades.

Resultados

Fueron entrevistadas 928 puérperas, de las que el 32,2% relataron por lo menos una hospitalización en la gestación. Las con parto SUS se mostraron menos favorecidas al ser mayoría entre las hospitalizadas (57,2%), con mayor porcentual de adolescentes (18,1%), menor escolaridad (91,8%), bajos ingresos familiares (39,3%) y menor número de consultas pre natal (25,3%). Las causas más frecuentes de hospitalización fueron las “otras enfermedades de la madre que complican el embarazo” (24,6%) (con énfasis para anemia e influenza), infección del tracto urinario (13,1%), trabajo de parto prematuro (8,7%) e hipertensión (7,2%).

Conclusión

Se debe prevenir y tratar especialmente anemia, influenza, infección urinaria, trabajo de parto prematuro e hipertensión para evitar ingresos hospitalarios en el embarazo, destacándose las gestantes del SUS.

DESCRIPTORES
Embarazo; Hospitalización; Complicaciones del Embarazo; Enfermería Obstétrica; Enfermería Maternoinfantil

ABSTRACT

Objective

To analyze the occurrence, profile and main causes of hospitalization during pregnancy according to the type of childbirth financial coverage.

Method

A cross-sectional population-based study carried out with puerperal women through a stratified sample, calculated according to the hospital and the type of childbirth financial coverage source: public sector (SUS) or private (not SUS). The sociodemographic profile, the rate of obstetric complications and the causes of hospitalization were analyzed, coded according to International Classification of Diseases.

Results

A total of 928 postpartum women were interviewed, of whom 32.2% reported at least one hospitalization during pregnancy. Those with childbirth covered by SUS were less favored because they were the majority among hospitalized women (57.2%), with a higher percentage of adolescents (18.1%), lower education level (91.8%), low family income (39.3%) and fewer prenatal consultations (25.3%). The most frequent causes of hospitalization were “other maternal diseases that complicate pregnancy” (24.6%) (with emphasis on anemia and influenza), urinary tract infection (13.1%), preterm labor (8.7%) and hypertension (7.2%).

Conclusion

Anemia, influenza, urinary tract infection, preterm labor and hypertension should especially be prevented and treated to avoid hospital admissions during pregnancy, especially among pregnant women covered by SUS.

DESCRIPTORS
Pregnancy; Hospitalization; Pregnancy Complications; Obstetric Nursing; Maternal-Child Nursing

INTRODUÇÃO

A internação hospitalar é um evento que repercute negativamente na vida de qualquer indivíduo e quando ocorre durante a gravidez expõe a gestante e sua família à situação de vulnerabilidade e preocupação, pois o esperado é que tudo ocorra de forma natural e sem intercorrências(11. Piveta V, Bernardy CCF, Sodré TM. Perception of pregnancy risk by a group of pregnant women hypertensive hospitalized. Cienc Cuid Saúde. 2016;15(1):61-8.).

Estima-se que em 2011 mais de quatro milhões de gestantes entre 15 e 49 anos foram hospitalizadas nos Estados Unidos da América (EUA)(22. Ewing AC, Datwani HM, Flowers LM, Ellington SR, Jamieson DJ, Kourtis AP. Trends in hospitalizations of pregnant HIV-infected woman in the United States: 2004 through 2011. Am J Obstet Gynecol. 2016;215(4):499.e1-8. DOI: 10.1016/j.ajog.2016.05.048
https://doi.org/10.1016/j.ajog.2016.05.0...
). No Brasil, estudo realizado no estado do Paraná mostrou que a cada 100 partos ocorreram 37,8 internações no período da gestação por intercorrências obstétricas em 2010(33. Veras TCS, Mathias TAF. Hospitalizations leading causes for maternal disorders. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(3):401-8. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0080-623420140000300003
http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342014...
), as quais podem ser ocasionadas por fatores biológicos, socioeconômicos ou assistenciais.

Gestantes adolescentes ou com idade avançada, de classes sociais desfavoráveis e com baixa escolaridade são mais propensas a desenvolver complicações mais graves durante a gestação. Intercorrências como hipertensão, pré-eclâmpsia, infecção do trato urinário (ITU), parto prematuro e restrição de crescimento fetal são descritas como as principais causas de hospitalização para tratamento e prevenção de consequências indesejáveis(44. Cavazos-Rehg PA, Krauss MJ, Spitznagel EL, Bommarito K, Madden T, Olsen MA, et al. Maternal age and risk of labor and delivery complications. Matern Child Health J. 2015;19(6):1202-11. DOI: 10.1007/s10995-014-1624-7.
https://doi.org/10.1007/s10995-014-1624-...

5. Oliveira RR, Melo EC, Falavina LP, Mathias TAF. The growing trend of moderate preterm births: an ecological study in one region of Brazil. PLoS One. 2015;10(11):e0141852.

6. Socolov DG, Iorga M, Carauleanu A, Ilea C, Blidaru I, Boiculese L, et al. Pregnancy during adolescence and associated risks: an 8-year hospital-based cohort study (2007–2014) in Romania, the country with the highest rate of teenage pregnancy in Europe. Bio Med Res Int. 2017;2017:9205016. DOI:10.1155/2017/9205016
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-77. Novaes ES, Oliveira RR, Melo EC, Varela PLR, Mathias TAF. Perfil obstétrico de usuárias do Sistema Único de Saúde após implantação da Rede Mãe Paranaense. Cienc Cuid Saúde. 2015;14(4):1436-44.), como a morbimortalidade materna, fetal e infantil.

Estudo com dados do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), por meio de coleta contínua de dados de todas as gestantes com nascidos vivos de 32 centros de saúde participantes, evidenciou que, em 20 estados dos EUA, a ITU ocorreu em 17,3% das gestantes, e, destas, 3,8% precisaram de hospitalização(88. Whitehead NS, Callaghan W, Johnson C, Williams L. Racial, ethnic, and economic disparities in the prevalence of pregnancy complications. Matern Child Health J. 2009;13(2):198-205. DOI: 10.1007/s10995-008-0344-2
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). No Brasil, uma pesquisa feita no município de Rio Grande – RS, com todas as mães de nascidos vivos em 2010, encontrou que 2,9% delas precisaram ser hospitalizadas para tratamento da ITU(99. Hackenhaar A, Albernaz EP. Prevalência e fatores associados a internação hospitalar para tratamento da infecção do trato urinário durante a gestação. Rev Bras Ginecol Obstet. 2013; 35(5):199-204.).

A hipertensão gestacional também é caracterizada como uma das intercorrências mais comuns na gestação. Esse agravo, quando não tratado adequadamente, pode levar a episódios de atendimento de emergência, de hospitalização e levar ao near miss materno(1010. Liyew EF, Yalew AW, Afework MF, Essén B. Incidence and causes of maternal near-miss in selected hospitals of Addis Ababa, Ethiopia. PloS One. 2017;12(6):e0179013. DOI: 10.1371/journal.pone.0179013
https://doi.org/10.1371/journal.pone.017...
), devido às suas complicações, como a pré-eclâmpsia, eclâmpsia e síndrome HELLP, potenciais causas de mortalidade materna(1111. Nakimuli A, Nakubulwa S, Kakaire O, Osinde MO, Mbalinda SC, Kakande N, et al. The burden of maternal morbidity and mortality attributable hypertensive disorders in pregnancy: a prospective cohort study from Uganda. BMC Pregnancy Childb. 2016;16:205. DOI: 10.1186/s12884-016-1001-1
https://doi.org/10.1186/s12884-016-1001-...
-1212. World Health Organization. Maternal mortality [Internet]. Geneva: WHO; 2016 [cited 2016 Dec 22]. Available from: http://www.who.int/mediacentre/factsheets/fs348/en/
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).

Quando uma gestante necessita de atendimento e tratamento hospitalar é sinal de maior gravidade da intercorrência(88. Whitehead NS, Callaghan W, Johnson C, Williams L. Racial, ethnic, and economic disparities in the prevalence of pregnancy complications. Matern Child Health J. 2009;13(2):198-205. DOI: 10.1007/s10995-008-0344-2
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). Os casos graves de hospitalização na gestação, por motivos obstétricos ou não, como hemorragias, infecções, trabalho de parto prematuro e hipertensão, podem contribuir para a mortalidade materna. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que diariamente cerca de 800 mulheres, morrem no mundo por causas relacionadas à gravidez e ao parto, e a maioria desses agravos poderia ser evitada(1212. World Health Organization. Maternal mortality [Internet]. Geneva: WHO; 2016 [cited 2016 Dec 22]. Available from: http://www.who.int/mediacentre/factsheets/fs348/en/
http://www.who.int/mediacentre/factsheet...
).

Estudos que analisam as hospitalizações por todas as causas durante a gestação e que as estratificam segundo a fonte de financiamento do parto são escassos na literatura e devem ser realizados para melhor aprofundamento do tema. Não se sabe ao certo se existem diferenças no perfil sociodemográfico das gestantes internadas, na frequência e nos motivos de internações em gestantes com parto financiado pelo sistema público de saúde, comparado ao sistema privado de saúde.

Considerando-se que a internação hospitalar é necessária quando ocorrem doenças ou sintomas mais graves durante a gestação, e que estes, por sua vez, podem potencializar desfechos negativos para a saúde da mãe e do feto, conhecer as principais causas de internação nesse período pode representar uma importante ferramenta para avaliar e propor estratégias de adequação na atenção pré-natal e melhorar o cuidado à saúde da gestante. O objetivo deste estudo foi analisar a ocorrência, o perfil das mulheres e os principais motivos de internação na gestação, segundo o financiamento público e privado do parto. Parte-se do pressuposto de que as mulheres cujo parto foi financiado pelo setor público apresentam características desfavoráveis, quer seja no perfil sociodemográfico, no maior número de internações, ou nos motivos de internação.

MÉTODO

Estudo transversal, de base populacional, realizado com puérperas internadas para o parto em instituições hospitalares que atendem pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e pelo sistema privado (não SUS) no município de Maringá-PR. Maringá é o terceiro maior município do Paraná, com 403.063 habitantes em 2016, IDH de 0,808 e grau de urbanização de 98,2%(1313. Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social. Municípios e Regiões. Perfil Avançado do Município de Maringá [Internet]. Curitiba; 2016 [citado 2016 maio 23]. Disponível em: http://www.ipardes.gov.br/perfil_municipal/MontaPerfil.php?codlocal=309&btOk=ok
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). É sede da 15ª Regional de Saúde do Estado, com abrangência de 30 municípios e polo regional para o atendimento à saúde, à educação, ao comércio e aos serviços. A rede de atenção primária possui 33 Unidades Básicas de Saúde e 71 equipes de Estratégia Saúde da Família, com cobertura de 66% da população. A atenção secundária e terciária conta com duas Unidades de Pronto Atendimento e seis hospitais que atendem ao parto, dos quais um é hospital regional escola, 100% público, um hospital, cujos leitos são 70% destinados ao SUS e 30% destinados a planos de saúde ou particular (não SUS), e quatro hospitais que atendem exclusivamente à rede privada de saúde(1414. Brasil. Ministério da Saúde. DATASUS. Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde [Internet]. Brasília; 2017 [citado 2017 jul. 31]. Disponível em: http://cnes.datasus.gov.br
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).

A amostra foi calculada utilizando-se do número de nascidos vivos de mulheres residentes no município de Maringá no ano de 2012, estratificados por financiamento do parto: SUS − parto financiado pelo setor público de saúde − e não SUS − parto financiado por planos de saúde, convênios ou particulares. Dos 4.656 nascimentos vivos ocorridos em 2012, 2.121 ocorreram pelo SUS (45,5%) e 2.535 pelo não SUS (54,5%). Após aplicação da técnica de amostragem estratificada, considerando-se erro alfa de 5%, frequência relativa de 50%, erro máximo de estimação de 3% e acrescidos 10% para possíveis perdas, a amostra representativa das gestantes residentes em Maringá foi composta por 928 puérperas.

A coleta de dados foi realizada por meio de entrevistas realizadas por quatro entrevistadoras no período de outubro de 2013 a fevereiro de 2014, em todas as instituições que atendem ao parto no município, utilizando instrumento elaborado em formato eletrônico por meio do aplicativo Google Docs. Todas as entrevistas foram conferidas diariamente.

Para puérperas que informaram pelo menos uma internação durante a gravidez, foi perguntado o motivo da internação, e, se a puérpera foi internada mais de uma vez, todos os motivos foram coletados e posteriormente codificados de acordo com os agrupamentos e categorias de diagnósticos conforme normas da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde − 10a Revisão (CID-10), principalmente no capítulo XV, das doenças da gravidez, parto e puerpério (códigos O00 a O99).

Os dados foram analisados segundo características sociodemográficas e assistenciais (idade, escolaridade, raça/cor, renda familiar mensal per capita, estado civil, número de consultas de pré-natal), taxa de intercorrência obstétrica (TIO) e por tipo de financiamento do parto, SUS e não SUS. A TIO é um dos parâmetros assistenciais do SUS definido em portaria do Ministério da Saúde (Portaria n. 1.631, de 1° de outubro de 2015)(1515. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria n. 1.631, de 1° de outubro de 2015. Aprova critérios e parâmetros para o planejamento e programação de ações e serviços de saúde no âmbito do SUS [Internet]. Brasília; 2015 [citado 2017 jul. 31]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2015/prt1631_01_10_2015.html
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis...
) e representa o percentual de internações por intercorrências obstétricas em relação ao número total de partos. Neste estudo a TIO foi calculada por diagnóstico e fonte de financiamento do parto. Para verificar o risco relativo (RR) para internação durante a gestação, segundo o financiamento do parto, foi considerado risco as puérperas com parto financiado pelo SUS, com nível de significância de 5%. Todas as puérperas assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Foram cumpridos os preceitos éticos da Resolução 466/2012, do Conselho Nacional de Saúde, com aprovação do projeto pelo Comitê de Ética da Universidade Estadual de Maringá-PR (n.° 800.748/2013).

RESULTADOS

Das 928 puérperas entrevistadas, 52,7% (489) tiveram parto financiado pelo SUS, e 47,3% (439), por planos privados/particulares de saúde – não SUS. A ocorrência de pelo menos uma internação durante a gestação foi relatada por 32,2% (299) das puérperas, com maior proporção para as que realizaram o parto pelo SUS (57,2%). Puérperas que realizaram o parto pelo SUS também foram internadas com maior frequência durante a última gestação − uma internação: 38,8% SUS e 33,4% não SUS, duas internações: 10,0% SUS e 5,4% não SUS e três ou mais internações: 8,4% SUS e 4,0% não SUS (Tabela 1).

Tabela 1
Distribuição das internações segundo fonte de financiamento do parto – Maringá, PR, Brasil, 2013-2014.

Em relação às variáveis sociodemográficas, a Tabela 2 mostra as diferenças de perfil das puérperas que tiveram pelo menos uma internação durante a gestação, segundo fonte de financiamento. Aquelas com parto financiado pelo SUS apresentaram características menos favoráveis, como: maior proporção de gestantes adolescentes (18,1% SUS e 5,5% não SUS), gestantes com baixa renda (39,3% SUS e 7,1% não SUS), com menor escolaridade (91,8% SUS e 49,2% não SUS), raça/cor preta e parda (63,2% SUS e 31,3% não SUS) e com menos de sete consultas de pré-natal (25,3% SUS e 7,8% não SUS). Em relação ao risco relativo, observou-se também que as puérperas com parto SUS e renda menor que três salários mínimos tiveram maior risco de serem internadas, comparadas às não SUS com a mesma renda familiar mensal (RR=1,8; IC=1,01-3,12). Todavia, as puérperas adolescentes com parto SUS tiveram menor risco de internação durante a gestação, comparadas às não SUS (RR=0,5; IC=0,83-0,25) (Tabela 2).

Tabela 2
Distribuição das puérperas por variáveis sociodemográficas e financiamento do parto, risco relativo (RR) e intervalo de confiança (IC) – Maringá, PR, Brasil, 2013-2014.

As internações distribuídas segundo causa de internação, por agrupamentos e categorias da CID-10 e financiamento do parto, estão dispostas na Tabela 3. Ocorreram 345 internações durante a gestação, 196 internações relatadas por puérperas que realizaram o parto pelo SUS e 149 por puérperas com parto não SUS. A taxa de intercorrência obstétrica (TIO) foi de 37,2 internações para cada 100 partos, 40,1 para o SUS e 33,9 para não SUS. Quanto às causas, destacaram-se as outras afecções obstétricas não classificadas em outra parte (27,8% e TIO de 10,3 por 100 partos), os outros transtornos maternos relacionados predominantemente com a gravidez (24,7% e TIO de 9,2 por 100 partos) e a assistência à mãe por motivos ligados ao feto e à cavidade amniótica e por possíveis problemas relativos ao parto (23,8% e TIO de 8,8 por 100 partos).

Tabela 3
Distribuição das internações segundo causas* * Por agrupamentos e categorias mais frequentes da CID-10. e financiamento do parto – Maringá, PR, Brasil, 2013-2014.

Os principais motivos de hospitalização foram: para o total de internações, SUS e não SUS, outras doenças da mãe, classificadas em outra parte que complicam a gravidez, o parto e o puerpério (24,6%), infecção do trato urinário − ITU (13,1%), trabalho de parto pré-termo (8,7%) e hipertensão gestacional (7,2%) (Tabela 3). Em relação às categorias de diagnósticos, observaram-se diferenças entre as puérperas do SUS e não SUS. As puérperas com parto SUS internaram-se com maior frequência por outras doenças da mãe, classificadas em outra parte que complicam a gravidez, o parto e o puerpério (23,5%) (com destaque para dor em baixo ventre, influenza e anemia), ITU (15,8%), trabalho de parto pré-termo (10,2%) e hipertensão gestacional (8,7%). Já as puérperas com partos não SUS relataram mais episódios de internações por outras doenças da mãe, classificadas em outra parte que complicam a gravidez, o parto e o puerpério (26,2%) (com destaque para anemia, virose e influenza), anormalidades da contração uterina (10,1%), vômitos excessivos na gravidez e ITU (9,4% cada) (Tabela 3).

DISCUSSÃO

Este estudo mostrou que, para cada 100 gestantes residentes no município de Maringá, em 2013 e 2014, 32,2 tiveram pelo menos uma internação durante a gestação, e que a ocorrência de internação foi maior entre as gestantes com partos financiados pelo setor público de saúde. Resultado semelhante foi encontrado para o estado do Paraná sobre hospitalização por transtornos maternos, onde, a cada 100 partos, 38,7 gestantes foram hospitalizadas(33. Veras TCS, Mathias TAF. Hospitalizations leading causes for maternal disorders. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(3):401-8. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0080-623420140000300003
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). Não foram encontrados na literatura mais estudos que utilizam a TIO para mensurar o risco de internação, e, nesse sentido, este estudo traz resultado inédito para o município de Maringá e reforça a importância da utilização deste parâmetro estabelecido pelo Ministério da Saúde (MS), que tem por finalidade servir de referência para orientar os gestores no diagnóstico e planejamento de ações prioritárias para a saúde materno-infantil(1515. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria n. 1.631, de 1° de outubro de 2015. Aprova critérios e parâmetros para o planejamento e programação de ações e serviços de saúde no âmbito do SUS [Internet]. Brasília; 2015 [citado 2017 jul. 31]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2015/prt1631_01_10_2015.html
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).

Destaca-se a alta frequência de internações (três vezes ou mais) em gestantes do SUS (8,4% contra 4,0% do não SUS), evidenciando que essa população é mais vulnerável, no sentido de necessitar de maior número de atendimentos hospitalares. Isso deve ser levado em consideração durante a oferta de pré-natal na rede pública de saúde, com intensificação do cuidado no acompanhamento, a fim de evitar o desenvolvimento de situações mais graves que evoluam para a morbimortalidade materna.

Neste estudo, evidenciou-se que o perfil sociodemográfico de gestantes que foram hospitalizadas no município de Maringá diferiu de acordo com o financiamento do parto. A maior parte das gestantes adolescentes estava concentrada no grupo SUS, assim como as com baixa renda e escolaridade, de etnia preta e parda, e as que fizeram menos de sete consultas de pré-natal. Este resultado configura-se um achado inédito no município, pois ainda não foram elucidadas as diferenças no perfil de gestantes hospitalizadas de acordo com o financiamento do parto, e também indica que o financiamento do parto pode ser uma variável utilizada como proxy de nível econômico desta população.

Quanto ao perfil sociodemográfico, houve poucas diferenças para o risco de internação. Destaca-se apenas a pequena diferença para as adolescentes do SUS, com menor risco de internação na gravidez comparadas às não SUS, mas essa diferença deve ser considerada com cautela pelo número pequeno de adolescentes entre as puérperas com partos não SUS. Outros estudos conseguiram identificar que gestantes com extremos de idade são mais propensas a desenvolver complicações que levem à hospitalização, além de tal fator apresentar desfechos negativos também para a saúde do feto, como prematuridade, sofrimento fetal e restrição do crescimento intrauterino(44. Cavazos-Rehg PA, Krauss MJ, Spitznagel EL, Bommarito K, Madden T, Olsen MA, et al. Maternal age and risk of labor and delivery complications. Matern Child Health J. 2015;19(6):1202-11. DOI: 10.1007/s10995-014-1624-7.
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5. Oliveira RR, Melo EC, Falavina LP, Mathias TAF. The growing trend of moderate preterm births: an ecological study in one region of Brazil. PLoS One. 2015;10(11):e0141852.
-66. Socolov DG, Iorga M, Carauleanu A, Ilea C, Blidaru I, Boiculese L, et al. Pregnancy during adolescence and associated risks: an 8-year hospital-based cohort study (2007–2014) in Romania, the country with the highest rate of teenage pregnancy in Europe. Bio Med Res Int. 2017;2017:9205016. DOI:10.1155/2017/9205016
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).

Quanto aos motivos de internação, as outras doenças da mãe classificadas em outra parte que complicam a gravidez, parto e puerpério, a ITU, o TPP e a hipertensão foram os mais frequentes. As outras doenças da mãe classificadas em outra parte que complicam a gravidez, parto e puerpério é um achado importante deste estudo, pois mostrou que inúmeros motivos aconteceram em menor proporção, mas juntos sinalizam complicações que podem colocar a gestação em risco, a ponto de necessitar de hospitalização. Os motivos agregados nessa categoria foram, principalmente, gripe, pneumonia, corrimento vaginal com tratamento por prescrição médica, dor abdominal, asma e anemia.

A gripe é uma infecção viral comum, e, especificamente quando causada pelo vírus H1N1, torna-se motivo de grande preocupação para a população de gestante, que é considerada suscetível, comumente necessitando de hospitalização(1616. Rasmussen SA, Jamieson DJ. 2009 H1 N1influenza and pregnancy: 5 years later. N Engl J Med. 2014;371(15):1373-75. DOI: 10.1056/NEJMp1403496
https://doi.org/10.1056/NEJMp1403496...
). Estudos mostram o impacto causado pelo vírus influenza HIN1 em gestantes e recém-nascidos, com grande número de hospitalizações, mortes maternas e nascimentos prematuros(1717. Louie JK, Salibay CJ, Kang M, Glenn-Finer RE, Murray EL, Jamieson DJ. Pregnancy and Severe Influenza Infection in the 2013-2014 Influenza Season. Obstet Ginecol. 2015;125(1): 184-92.-1818. Silva AA, Ranieri TMS, Torres FD, Vianna FSL, Paniz GR, Sanseverino PB, et al. Impact on pregnancies in south Brazil from Influenza A (H1N1) pandemic: cohort study. PLoS One. 2014;9(2):e88624. DOI:10.1371/journal.pone.0088624
https://doi.org/10.1371/journal.pone.008...
). A vacinação contra a influenza é uma medida importante para a redução do número de casos, é assegurada pelo SUS e deve ser incentivada durante o pré-natal para todas as gestantes(1616. Rasmussen SA, Jamieson DJ. 2009 H1 N1influenza and pregnancy: 5 years later. N Engl J Med. 2014;371(15):1373-75. DOI: 10.1056/NEJMp1403496
https://doi.org/10.1056/NEJMp1403496...
).

Em relação ao corrimento vaginal, relatado pelas gestantes como um motivo frequente de hospitalização, é importante salientar que o aumento do fluxo vaginal em gestantes é comum, porém o corrimento vaginal pode ser um sinal de alerta para a presença de infecções que podem complicar a gestação e o parto, como candidíase, clamídia, tricomoníase e vaginose bacteriana. Assim, o diagnóstico precoce dessas infecções nas gestantes é essencial para evitar complicações, especialmente para os recém-nascidos(1919. Casillas-Vega N, Morfín-Otero R, Garcia S, Llaca-Díaz J, Rodríguez-Noriega E, Camacho-Ortiz A, et al. Frequency and genotypes of Chlamydia trachomatis in patients attending the obstetrics and gynecology clinics in Jalisco, Mexico and correlation with sociodemographic, behavioral and biological factors. BMC Women's Health. 2017;17:83. DOI: 10.1186/s12905-017-0428-5.
https://doi.org/10.1186/s12905-017-0428-...
).

A ITU representou o segundo motivo principal de hospitalização na gestação neste estudo, resultado semelhante ao encontrado no estado da Califórnia, onde as admissões hospitalares de gestantes por ITU somaram 13,2%(22. Ewing AC, Datwani HM, Flowers LM, Ellington SR, Jamieson DJ, Kourtis AP. Trends in hospitalizations of pregnant HIV-infected woman in the United States: 2004 through 2011. Am J Obstet Gynecol. 2016;215(4):499.e1-8. DOI: 10.1016/j.ajog.2016.05.048
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), no entanto, este resultado foi superior ao encontrado em estudo no município de Rio Grande − RS, cuja prevalência de internação para tratamento da ITU autorreferida pelas 2.288 gestantes do estudo foi de 2,9%(99. Hackenhaar A, Albernaz EP. Prevalência e fatores associados a internação hospitalar para tratamento da infecção do trato urinário durante a gestação. Rev Bras Ginecol Obstet. 2013; 35(5):199-204.). Neste trabalho, a alta proporção de internações por ITU vai ao encontro do achado de outros autores, que detectaram a infecção como uma das principais complicações ocorridas durante o ciclo gravídico-puerperal na cidade de Natal − RN (10,7%)(2020. Rosendo TMSS, Roncalli AG. Prevalência e fatores associados ao Near Miss Materno: inquérito populacional em uma capital do Nordeste Brasileiro. Cien Saúde Colet. 2015;20(4):1295-304.).

É importante ressaltar que a ITU está associada a complicações, como o nascimento prematuro(2121. Agger WA, Siddiqui D, Lovrich SD, Callister SM, Borgert AJ, Merkitch KW, et al. Epidemiologic factors and urogenital infections associated with preterm birth in a midwestern U.S. population. Obstet Gynecol. 2014;124(5):969-77.), e, considerando-se que a própria gestação pode ocasionar modificações que favorecem o desenvolvimento da infecção, como estase urinária e aumento da produção de urina(2222. Brasil. Ministério da Saúde; Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Atenção ao pré-natal de baixo risco [Internet]. Brasília; 2013 [citado 2017 jun. 28]. Sisponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/cadernos_atencao_basica_32_prenatal.pdf
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), é necessária a oferta de um pré-natal voltado para o diagnóstico e tratamento dessa intercorrência, incluindo orientações dos profissionais para as gestantes, como medidas de higiene e identificação precoce de sinais e sintomas(2323. Abdel-Aziz Elzayat M, Barnett-Vanes A, Dabour MF, Cheng F. Prevalence of undiagnosed asymptomatic bacteriuria and associated risk factors during pregnancy: a cross-sectional study at two tertiary centres in Cairo, Egypt. BMJ Open. 2017;7(3):e01319. DOI: 10.1136/bmjopen-2016-013198.
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).

Para evitar os casos de ITU, o MS do Brasil preconiza, por meio de rotinas de pré-natal, a realização de dois exames de urina 1 e dois de urocultura, ambos no primeiro e terceiro trimestres da gestação(2222. Brasil. Ministério da Saúde; Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Atenção ao pré-natal de baixo risco [Internet]. Brasília; 2013 [citado 2017 jun. 28]. Sisponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/cadernos_atencao_basica_32_prenatal.pdf
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). Um estudo realizado em duas maternidades do município de Rio Grande − RS mostrou que 23,6% das gestantes que frequentaram o pré-natal não haviam feito pelo menos dois exames de urina(99. Hackenhaar A, Albernaz EP. Prevalência e fatores associados a internação hospitalar para tratamento da infecção do trato urinário durante a gestação. Rev Bras Ginecol Obstet. 2013; 35(5):199-204.). O estado do Paraná oferece às gestantes de médio e alto risco, através do programa Rede Mãe Paranaense, a realização de exames de urina 1 e urocultura em todos os trimestres da gestação, o que diferencia e qualifica o estado em relação aos demais estados do país(2424. Paraná. Secretaria de Estado da Saúde. Linha Guia: Rede Mãe Paranaense [Internet]. Curitiba; 2012 [citado 2017 jun. 28]. Disponível em: http://www.saude.pr.gov.br/arquivos/File/ACS/linha_guia_versao_final.pdf
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).

A alta prevalência de internações na gestação por ITU encontrada neste estudo evidencia ineficácia no atendimento pré-natal, pois tal infecção é considerada sensível às ações de saúde prestadas na atenção primária. Vale salientar o maior acometimento de gestantes com parto SUS por essa intercorrência. Um estudo no município de Francisco Beltrão, que avaliou o perfil epidemiológico de gestantes do SUS classificadas como alto risco, identificou 14,8% de prevalência de ITU(2525. Costa LD, Cura CC, Perondi AR, França VF, Bertoloti DS. Perfil epidemiológico de gestantes de alto risco. Cogitare Enferm. 2016;21(2):1-8.). O serviço público precisa estar preparado para atender a essa população e garantir os exames de urina estabelecidos a todas as gestantes.

O trabalho de parto pré-termo (TPP) foi o terceiro principal motivo de hospitalização, com 8,7% das hospitalizações e ocorreu também em maior proporção em gestantes com parto SUS. Essa intercorrência pode aumentar o risco de óbito neonatal(2626. Demitto MO, Gravena AAF, Dell'Agnolo CM, Antunes MB, Pelloso SM. High risk pregnancies and associated with neonatal death. Rev Esc Enferm USP. 2017;51:e03208. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1980-220X2016127103208
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), além de causar o nascimento prematuro. Alguns fatores de risco para o nascimento precoce já são elucidados na literatura, como os extremos de idade materna, a gravidez por técnicas de reprodução assistida, as condições socioeconômicas precárias, a violência doméstica e o tabagismo, por isso é preciso atentar ao que já se sabe ser causa dessa intercorrência(55. Oliveira RR, Melo EC, Falavina LP, Mathias TAF. The growing trend of moderate preterm births: an ecological study in one region of Brazil. PLoS One. 2015;10(11):e0141852.). Aos enfermeiros, especialmente, cabe esse papel de perceber gestantes de risco, de orientá-las a identificar possíveis sinais de TPP, a fim de prevenir um parto precoce e suas consequências.

Neste estudo, a hipertensão foi o quarto maior motivo de internação, com 7,2% do total, e mais frequente em gestantes com parto SUS. Por representar alto risco de morbidade e mortalidade materna(1010. Liyew EF, Yalew AW, Afework MF, Essén B. Incidence and causes of maternal near-miss in selected hospitals of Addis Ababa, Ethiopia. PloS One. 2017;12(6):e0179013. DOI: 10.1371/journal.pone.0179013
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,2727. Madeiro AP, Rufino AC, Lacerda EZG, Brasil LG. Incidence and determinants of severe maternal morbidity: a transversal study in a referral hospital in Teresina, Piaui, Brazil. BMC Pregnancy Childb. 2015;15:210. DOI: 10.1186/s12884-015-0648-3
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), os distúrbios hipertensivos merecem atenção dos profissionais de saúde durante o acompanhamento pré-natal. Monitorar os níveis de pressão arterial em cada consulta, e quando necessário, é essencial para identificação precoce de transtornos hipertensivos, que podem ter consequências mais sérias(33. Veras TCS, Mathias TAF. Hospitalizations leading causes for maternal disorders. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(3):401-8. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0080-623420140000300003
http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342014...
,1010. Liyew EF, Yalew AW, Afework MF, Essén B. Incidence and causes of maternal near-miss in selected hospitals of Addis Ababa, Ethiopia. PloS One. 2017;12(6):e0179013. DOI: 10.1371/journal.pone.0179013
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).

No intuito de diminuir as intercorrências, o MS estabelece para o serviço público de saúde que a gestante faça no mínimo seis consultas de pré-natal, e, além disso, a rede básica deve realizar todos os exames de rotina, diagnosticar e tratar as intercorrências da gestação, classificar e estratificar a mulher grávida conforme o risco na primeira consulta e nas subsequentes e oferecer às gestantes, classificadas como alto risco, vínculo e acesso à unidade de referência para atendimento ambulatorial e/ou hospitalar especializado(2222. Brasil. Ministério da Saúde; Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Atenção ao pré-natal de baixo risco [Internet]. Brasília; 2013 [citado 2017 jun. 28]. Sisponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/cadernos_atencao_basica_32_prenatal.pdf
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). Apesar dessas recomendações, para grande parte das intercorrências gestacionais identificadas neste estudo e que foram motivos de internações hospitalares, as gestantes da rede pública foram mais acometidas quando comparadas às da rede privada no município de Maringá.

É importante frisar que a prevalência de 32% de internações na gestação, detectada neste estudo, representa apenas uma parte do perfil de morbidade durante a gestação, já que descreve apenas aquelas doenças que, com sintomas mais graves, levaram à internação hospitalar. Por isso, a atenção durante a gestação, independentemente do financiamento do parto, deve ser de qualidade para monitorar esses agravos e evitar complicações e necessidade de atendimentos hospitalares.

Algumas limitações devem ser consideradas ao interpretar os resultados deste estudo, como o fato de as informações sociodemográficas, sobre o número de internações e os motivos serem autorreferidas pela puérpera. Mas se acredita que, ao realizar a entrevista no período pós-parto, esse viés pode ter sido contornado, levando-se em conta que a puérpera ainda se recordava dos eventos que aconteceram em sua gestação. Por terem sido autorreferidas, não foi possível assegurar se houve internação de emergência, ou se as mulheres ficaram em enfermaria ou apenas em observação por menos do que 12 horas.

Além disso, não foram analisadas a gravidade da internação e a média de permanência hospitalar, que poderiam ser mais um dado para diferenciar os dois grupos de puérperas. Sugere-se que outros estudos sobre internações na gestação de acordo com o financiamento do parto sejam realizados em diferentes regiões do Brasil, devido à escassez de dados na literatura que evidencie as diferenças no perfil dessas populações. Dessa forma, será possível ampliar o conhecimento acerca do tema e então contribuir para a melhoria da assistência à mulher no período gestacional. Recomenda-se ainda que para futuros estudos o tempo de internação seja analisado, para descobrir quais as intercorrências tornam a hospitalização mais longa e verificar se o tempo de permanência no hospital repercute na saúde da gestante e do feto.

CONCLUSÃO

O estudo identificou elevada prevalência de hospitalização na gestação, especialmente em gestantes com parto financiado pelo setor público de atenção à saúde, mostrando a maior vulnerabilidade destas, reforçada pelos diagnósticos com taxas de intercorrência obstétricas mais elevadas. Nesta mesma população foi encontrada maior prevalência de gestantes adolescentes, com baixa escolaridade, de raça/cor não branca, com baixa renda e com menor número de consultas de pré-natal. A frequência de internações também foi maior entre as gestantes do SUS.

Os resultados permitiram constatar que, em geral, os motivos principais de hospitalização para todas as gestantes foram outras doenças da mãe classificadas em outra parte que complicam a gravidez, parto e puerpério, ITU, trabalho de parto prematuro, hipertensão, hemorragia, vômitos e descolamento prematuro de placenta.

A taxa de intercorrência obstétrica utilizada neste estudo mostrou que, a cada 100 partos SUS, 40,1 gestantes precisaram ser hospitalizadas, e, a cada 100 partos não SUS, 33,9 gestantes necessitaram de atendimento hospitalar. A utilização da TIO como parâmetro assistencial estabelecido pelo Ministério da Saúde deve ser incentivada para ajudar gestores de saúde a identificar padrões de morbidade materna e desenvolver ações de prevenção.

A respeito das evidências encontradas neste estudo, as puérperas com parto financiado pelo setor público de saúde – SUS − apresentaram condições socioeconômicas desfavoráveis e maior número de internações e também dos motivos de internações. Por isso, a atenção à saúde dessa população deve ser intensificada nas unidades básicas de saúde do município de Maringá. Espera-se que outros estudos do mesmo caráter sejam realizados em outras regiões do país, a fim de possibilitar a ampliação do conhecimento sobre a saúde da gestante de acordo com o financiamento do parto e colaborar para a promoção de uma maternidade mais segura.

  • Apoio Financeiro
    Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Processo 473708/2012-4.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2018

Histórico

  • Recebido
    07 Ago 2017
  • Aceito
    05 Dez 2017
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