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Coping: significados, interferência no processo saúde-doença e relevância para a enfermagem

Coping: significance, influence in health and illness process and importance to nursing

Resumos

Artigo de revisão bibliográfica que aborda o tema Coping na perspectiva do Modelo Interacionista Cognitivo, e apresenta como objetivos traçar um paralelo entre esse referencial da psicologia com o processo saúde-doença, e pontuar a relevância do assunto e os caminhos possíveis de serem trabalhados pelo enfermeiro, entendendo ser este um referencial importante que o orienta no desenvolvimento de suas ações assistenciais.

Coping; Saúde-doença; Enfermagem


This article is a bibliographic review about Coping in a cognitive-interactionist model. The goal is to analyse this psychologycal referencial within the health-illness process and stress its importance and the possible ways to be worked by nurses, understanding that it can be an important model which direct them in the development of their assistencial works.

Coping; Health-illness; Nursing


ARTIGOS ORIGINAIS

Coping: significados, interferência no processo saúde-doença e relevância para a enfermagem

Coping: significance, influence in health and illness process and importance to nursing

Eliane Corrêa ChavesI; Nágela Valadão CadeII; Maria de Fátima MontovaniII; Rita de Cássia Burgos de OLeiteII; Wilza Carla SpireII

IProfessora doutora da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo -SP

IIDoutoRandas da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo - SP

RESUMO

Artigo de revisão bibliográfica que aborda o tema Coping na perspectiva do Modelo Interacionista Cognitivo, e apresenta como objetivos traçar um paralelo entre esse referencial da psicologia com o processo saúde-doença, e pontuar a relevância do assunto e os caminhos possíveis de serem trabalhados pelo enfermeiro, entendendo ser este um referencial importante que o orienta no desenvolvimento de suas ações assistenciais.

Palavras-chave: Coping. Saúde-doença. Enfermagem.

ABSTRACT

This article is a bibliographic review about Coping in a cognitive-interactionist model. The goal is to analyse this psychologycal referencial within the health-illness process and stress its importance and the possible ways to be worked by nurses, understanding that it can be an important model which direct them in the development of their assistencial works.

Keywords: Coping. Health-illness. Nursing.

INTRODUÇÃO

Na década de 30, SELYE postulou que o organismo na vigência de estímulos (estressores) desencadeava reações neuroendócrinas (respostas biológicas) e comportamentais com o objetivo de restaurar seu equilíbrio, o que ele denominou por Síndrome de Adaptação Geral. Esses estímulos não tinham especificidade, podendo ser de ordem física (infecção, trauma) ou emocional decorrentes das relações interpessoais (CHAVES, 1994). Com os estudos sobre coping, foi possível compreender o stress além da esfera biológica, como um processo com componentes também de ordem psíquica, cognitiva e comportamental entendido não somente como nossas ações, mas também os pensamentos que emitimos.

Coping1 1 Coping vem do verbo inglês "Cope" que significa lutar, competir, enfrentar e no Brasil é utilizada no sentido de enfrentamento", forma como lidamos ou comportamos frente determinadas situações. Neste trabalho será mantida a palavra de origem por compreendermos que já faz parte de nossa comunidade científica. é um conceito que tem sido importante em psicologia nos últimos 40 anos.Nas décadas de 40 e 50 sua compreensão subsidiou a avaliação clínica, sendo atualmente bastante utilizado em psicoterapias e programas educacionais com o objetivo principal de desenvolver habilidades para enfrentar situações estressoras, ansiogênicas ou problemáticas, cada vez mais freqüentes em nosso dia-a-dia (GOLDBERGER; BREZNITZ, 1982).

Objetiva-se com este estudo fazer uma revisão bibliográfica sobre a temática coping para melhor compreensão da mesma e fazer a ligação entre este assunto com o processo saúde-doença e como a enfermagem pode utilizar-se deste conceito em sua prática profissional.

CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE COPING

As respostas neuroendócrinas que ocorrem no indivíduo estressado são consideradas um processo adaptativo ao ambiente interno ou externo na tentativa de restabelecer o equilíbrio do organismo e os mecanismos de coping encontram-se entre o estímulo estressor e as conseqüências deste sobre a pessoa, sendo um determinante primordial na produção do stress (FOLKMAN, 1986).

O homem não é um ser passivo frente às contingências da vida. Ele percebe, emite pensamentos e ações para modificar, minimizar ou controlar as demandas2 2 Demandas podem ser compreendidas como "um estímulo interno ou externo o qual é percebido pelo indivíduo como sendo algo que necessita de resposta adaptativa", como por exemplo, mudança de emprego, de residência, morte e doença na família, ansiedade. (CLARKE, 1984). sobre ele com isso, podemos dizer que há mediadores não só biológicos responsáveis pelas respostas frente ao stress.

Dentre alguns destes mediadores já conhecidos, está a avaliação cognitiva eliciada quando o indivíduo percebe um evento, recebe um estímulo. LAZARUS;FOLKMAN (1984) a definiram como "um processo de categorização de um encontro e suas várias facetas com respeito a esse significado para o bem-estar", sendo considerada como um determinante importante no processo de stress, pois não será a qualidade do evento mas a forma que o percebemos que o categorizará como estressor ou não. O processo avaliativo se dá nas estruturas do sistema límbico que tem funções interrelacionadas entre cognição, emoção e comportamento automático.

A primeira avaliação, primária, constitui-se em uma avaliação mais rápida, grotesca e intuitiva da situação, onde o indivíduo subjetivamente avalia o significado de determinado estímulo ambiental quanto ser algo irrelevante ou não, a possibilidade de perigo ou um dano real, se é um evento positivo ou negativo e qual a possibilidade do evento ser influenciado pela pessoa. Quanto menos controle sobre o evento ou maior possibilidade de perigo, maior será a reação do organismo na tentativa de minimizar a situação (LAZARUS; FOLKMAN, 1984).

A avaliação secundária é mais refinada, reflexiva e utiliza informações contidas na memória sobre o self e sobre o mundo para levantar possibilidades de ação frente ao problema, o que é realizado tomando-se também em consideração, as opções e recursos da pessoa. Para GOLDBERGER; BREZNITZ (1982) esta fase é denominada por "avaliação de coping".

Estes dois diferentes tipos de avaliação -primária e secundária -são interdependentes, ocorrendo mutuamente e funcionando num processo de feedback, apesar dos ensaios científicos tentarem compreendê-las de forma separada, com o objetivo de conhecer as diferentes posições das variáveis que atuam no stress e em sua adaptação.

Após a avaliação, vem a fase de julgamento, quando o indivíduo analisa se as demandas externas (ambiente) ou as internas (ansiedade, medo) são maiores do que os esforços pessoais para modular a experiência de stress. Esta fase é entendida como um conflito entre as demandas e os esforços emitidos para atuar sobre elas e é denominada por coping (GOLDBERGER; BREZNITZ, 1982).

A partir de novas informações vindas do ambiente o indivíduo pode reavaliar a situação e modificar suas ações e pensamentos. Nesta fase a pessoa interpreta um dado evento de maneira mais positiva ou negocia com as ameaças e riscos presentes, minimizando os aspectos negativos da situação.

Há várias concepções teóricas sobre coping. Para o Modelo Animal, coping é um resultado, resumindo-se em comportamentos de fuga ou luta frente a uma situação de ameaça. Para a Psicologia Analítica do Ego, coping é um traço ou estilo de agir que controla e resolve o conflito da situação, e para o Modelo Interacionista Cognitivo proposto por LAZARUS; FOLKMAN (1984), coping é um processo, definido como "uma constante mudança cognitiva e esforços comportamentais para manusear específicas demandas externas e/ ou internas que são avaliadas como algo que excede os recursos da pessoa".

O coping como "processo" é dinâmico e modifica-se de acordo com as avaliações e reavaliações feitas continuamente sobre o evento. Desta forma, os mecanismos de coping devem ser compreendidos dentro de um contexto específico (HYMOVICH; HAPOGIAN, 1992; LAZARUS; FOLKMAN, 1984)

No que diz respeito às funções de coping LAZARUS; FOLKMAN (1984) classificam em duas importantes divisões: coping centrado no problema e coping centrado na emoção.

Coping centrado no problema refere-se aos esforços para administrar, ou alterar o problema, ou melhorar o relacionamento entre a pessoa e o seu meio. São estratégias mais voltadas para a realidade e, portanto, são consideradas mais adaptativas por alguns autores, pois são capazes de modificar as pressões. ambientais, por tentativa de remover ou abrandar a fonte estressora. Elas podem estar dirigidas ao ambiente, quando relacionam-se com uma fonte externa de stress, e/ ou dirigidas ao self.As estratégias dirigidas ao ambiente constituem-se na definição do problema, levantamento e avaliação de soluções para solução de problemas e habilidades sociais alternativas, escolha de alternativas e ação. (competências). As outras categorias são mais Já as estratégias dirigidas ao self são ambientais e incluem: recursos sociais (rede de direcionadas para a fonte interna do stress, suporte social) e materiais (financeiros).

modificando os estados motivacionais e cognitivos da pessoa, como por exemplo, a alteração no nível de aspiração com conseqüente diminuição do envolvimento, busca de outros canais alternativos de gratificação e desenvolvimento de novas habilidades e comportamentos. Para LAZARUS; FOLKMAN (1984) e stas e straté gias não são propriamente ditas para resolução de problema, mas dão um suporte para que isto aconteça.

O coping centrado na emoção descreve a tentativa de substituir ou regular o impacto e mocional do stre ss no indivíduo. Se gundo HYMOVICH; HAGOPIAN (1992), as estratégias de coping focalizando a emoção derivam principalmente de processos defensivos, o que faz com que os indivíduos evitem confrontar conscientemente com a realidade de ameaça.

LAZARUS; FOLKMAN (1984) não associam coping ao insconsciente, mas referem que este tipo de coping, é por muitas vezes uma "reavaliação cognitiva", pois o indivíduo realiza uma série de manobras cognitivas com o objetivo de modificar o significado da situação, não importando se isto é feito de forma realista ou com distorção da realidade. Este tipo de coping não modifica a situação propriamente dita, mas serve para o indivíduo negociar com as emoções, e assim, manter uma auto-estima positiva, manter a esperança e o bem-estar. Algumas destas estratégias seriam a esquiva, distanciamento ou minimização do problema, atenção seletiva ao problema, fazer comparações positivas e atribuir valores positivos aos eventos negativos.

Mas nem todas as estratégias de coping centrado na emoção, podem ser consideradas como reavaliação cognitiva, pois algumas não apresentam a propriedade de modificar o significado do evento, como por exemplo, negar um fato ou esquivar-se dele, o que pode ser entendido como uma forma das pessoas se protegerem, quando há possibilidade de grande ameaça e não acreditarem que possam modificar a situação (LAZARUS; FOLKMAN, 1984).

As formas pelas quais as pessoas utilizam os mecanismos de coping dependem em muito dos recursos que estão disponíveis e as forças que inibem o uso destes recursos. McHAFFIE (1992) nos informa que recursos é o que está disponível para as pessoas construírem seus próprios repertórios de coping.

Há recursos que são propriedades da pessoa e estes incluem: saúde física e mental (recurso físico), crenças positivas (recurso psicológico), capacidade

Existem controvérsias entre algumas asserções que permeiam o coping, considerando os modelos mais tradicionais e o modelo interacionista de LAZARUS; FOLKMAN (1984). Dentre alguns tópicos de discórdia, os mais debatidos constituem-se em considerar coping como traço ou estilo3, dificuldade em distinguir coping de comportamentos automatizados, e comparação entre coping e resultados.

LAZARUS; FOLKMAN (1984) não descartam que indivíduos apresentam formas de coping com alguma estabilidade para as mesmas fontes de stress e de acordo com determinado ciclo de vida, mas considera o coping com mudanças constantes de acordo com as demandas e conflitos específicos, e não como traço orientado, fixo e estático.

Um dos exemplos de estilo de coping seria o comportamento tipo A, compreendido como um sistema de crenças e valores sobre si próprio e sobre o mundo, que a pessoa carrega direcionando sua motivação, compromisso, envolvimento com as situações, e emissão de comportamentos típicos em vários contextos do dia-a-dia.

Outro aspecto a ser comentado como uma tendência para agir é o Locus de Controle introduzido por ROTTER apud HYMOVICH; HAGOPIAN (1992). Este defende a existência de constructos psicológicos que fazem as pessoas acreditarem que as ações podem ser modificadas por elas próprias ou por condições externas a ela. Pessoas com locus de controle interno acreditam que podem agir em determinada ação utilizando seus próprios recursos pessoais, do tipo esforço e capacidade, enquanto que, pessoas com locus de controle externo acreditam que o controle da situação encontra-se nas mãos do destino, da sorte, em Deus ou no poder de outras pessoas.

No que diz respeito aos comportamentos automatizados, indivíduos aprendem habilidades que ao longo da vida e com a repetição, tornam-se automáticas. A fase inicial da aquisição da habi-lidade requer maior esforço e concentração, e posteriormente, tornam-se automatizadas, deixando de ser coping, pois esse exige esforço. Há dificuldade em diferenciar coping de respostas automáticas, mas o autor conside ra que à me dida que ocorre aprendizagem de uma habilidade, ela torna-se automatizada deixando de ser coping (LAZARUS; FOLKMAN, 1984).

Definições sobre coping incluem tentativas para manipular situações ou necessidades estressantes, independentemente dos resultados, se os efeitos são 3 Estilo são formas da pessoa interagir com o ambiente (negativas, reprimidas, controladoras, dependentes, amigáveis, comportamento tipo A), e traço são características das pessoas que as fazem reagir de determinada maneira (raiva internalizada, rudeza). LAZARUS; FOLKMAN (1984). melhores ou piores. O coping modifica de alguma forma a evolução do stress, seja evitando a situação ou confrontando-a. Por vezes, as estratégias de coping podem não ter sucesso ou porque a situação é difícil ou pela escolha dos mecanismos de coping,fazendo com que os resultados tornem-se outras fontes de stress (HYMOVICH; HAGOPIAN, 1992).

A despeito das dificuldades de mensurar o coping, alguns autores, LAZARUS; FOLKMAN (1984), MILLER (1983), estabelecem alguns parâmetros de efetividade das estratégias de coping: a) uma avaliação que seja condizente com a situação e sem ambigüidades; b) estar de prontidão para reagir a certos tipos de situação e ter recursos pessoais e ambientais suficientes para tal; c) os esforços de coping devem ajustar-se às metas, crenças, valores e estilo da pessoa, mantendo sua integridade e a habilidade para relacionar-se, desenvolver seus papéis sociais e manter a auto-estima e a esperança; d) nível de satisfação e bem-estar com a situação; e) compreender que há situações difíceis de serem mudadas e isto não significa que o coping seja inefetivo.

COPING NO PROCESSO SAÚDE-DOENÇA E COMO REFERENCIAL NA PRÁTICA DO ENFERMEIRO

Dentre alguns estudos nestas áreas, postula-se que o coping interfere mais no processo saúde-doença do que a existência ou não de stress e pesquisas têm buscado elucidar como o coping pode predispor ou desencadear doenças e interferir na evolução da mesma.

Segundo GOLD EBERGER; BREZNITIZ (1982), o coping pode afetar a saúde mediante três mecanismos. O primeiro a ser comentado, é a alteração dos padrões de resposta neuroendócrina para o stress que interferem diretamente no processo saúde-doença. Se os mecanismos de coping, sejam eles focalizados no problema ou na emoção, forem ineficazes em prevenir as situações estressoras ou em resolver os problemas decorrentes destas, pode ocorrer exacerbação das respostas de stress sobre os processos celulares e metabólicos do organismo, causando descompensação do mesmo ou levando a desordens somáticas específicas.

Outra forma do coping influenciar o processo saúde-doença é quando alguns comportamentos emitidos pelo indivíduo frente à doença como discriminação dos sintomas, procurar recursos terapêuticos e a freqüência em utilizá-los, são usados como forma de coping, ou seja, estes comportamentos podem ser emitidos com função de minimizar um conflito familiar, ou para obter ganhos secundários como forma de chamar atenção.

danosos à saúde do tipo aumento do consumo de cigarro ou da ingestão de bebida alcóolica, que apesar de reduzirem a tensão podem predispor ou agravar doenças - doença cardíaca coronariana, doença pulmonar obstrutiva crônica, úlcera péptica e outras.

Para LAZARUS; FOLKMAN (1984), coping influencia os padrões de respostas neuroquímica da reação do stress pelos seguintes mecanismos: 1) falha em prevenir as condições de risco ambientais que se referem à inadequação do coping focalizado no problema, seja pela complexidade do ambiente ou por deficiência nos recursos de coping; 2) o uso de estratégia de coping focalizando a emoção pode prejudicar a saúde por impedir em alguns casos, os comportamentos adaptativos frente à doença. Diante de uma recusa ou esquiva que podem ocorrer frente ao stress, a pessoa evita enfrentar o problema realisticamente, e desta forma, não toma atitudes condizentes com a patologia ou quadro clínico; 3) a pessoa pode expressar valores e ter um estilo de vida e/ ou estilo de coping considerado prejudicial para a saúde, como por exemplo pessoas com comportamento tipo A podem liberar mais catecolaminas, o que prejudicaria o coronariopata e o hipertenso. Pessoas com Locus de Controle externo apresentam dificuldade em assumir responsa-bilidades sobre sua doença, depositando-as nos profissionais de saúde ou na família.

A maneira da pessoa perceber e conviver com as demandas provenientes da manutenção da saúde e restauração da doença também podem alterar o curso deste processo. Alguns aspectos a serem observados e trabalhados pelo profissional são: que tipo de comportamentos são emitidos em relação à procura do serviço de saúde; quais são as práticas utilizadas na prevenção e tratamento; fazem uso de auto medicação ou optam por práticas alternativas; quais os facilitadores e dificultadores em realizar comportamentos que beneficiam todo o processo; quais os reforçadores desses comportamentos ou por que motivo os comportamentos não se mantém.

Considerando o contexto específicos, como no caso de doença, vários têm sido os estudos tentando conhecer as estratégias utilizadas pelos pacientes e familiares. HYMOVICH; HAGOPIAN (1992) pesquisaram e listaram as seguintes estratégias de coping relacionadas à manipulação do problema: a) procurar informação sobre sua condição; b) procurar habilitar-se para o autocuidado (administração de insulina); c) buscar e usar recursos em serviços de saúde ou redes de suporte social; d) auto monitorização dos sinais e sintomas (verificar a pressão arterial, fazer registro da dor); e) aderir à terapia indo às consultas, fazendo uso da medicação e controlando os comportamentos de risco para a doença; f) ajustar-se ao estilo de vida familiar; g) organizar e distribuir o tempo para realizar atividades não só referentes à saúde, mas também aquelas relacionadas ao desenvolvimento

Coping: significados, interferência no processo saúde-doença... Eliane Corrêa Chaves et al. social e ao lazer; h) modificar os papéis sociais e o ambiente de acordo com a necessidade.

Quanto às estratégias de coping relacionadas à emoção HYMOVICH; HAGOPIAN (1992) citam: a) sentimentos de incerteza, ansiedade, apreensão frente ao diagnóstico médico, aos procedimentos de diagnóstico e tratamento; b) pensar sobre o significado da doença e o provável impacto dessa em seu cotidiano; c) atribuir causas a doença e possíveis resultados como forma de ter controle sobre a situação; d) ter pensamentos irreais como pensar que pode controlar sua condição de saúde, quando isto não é possível; e) fazer comparações com situações piores; f) apresentar sentimento de ambigüidade, quando tenta passar uma imagem falsa para os outros com o objetivo de ser aceito; g) manter a esperança de que o amanhã pode ser melhor e h) usar mecanismos de defesa.

Apesar de compreendermos que as estratégias de coping constituem necessidades adaptativas do indivíduo, emitindo comportamentos na tentativa de neutralizar ou miniminar suas emoções negativas, não estando, portanto, relacionadas as expectativas dos profissionais de saúde, admitimos que algumas estratégias vão ao encontro dos objetivos traçados pelos enfermeiros para melhor condução da doença e tratamento. Com isso, faz-se necessário que o enfermeiro compreenda todo o processo que envolve stress - coping adaptação para interferir neste de forma positiva, tanto no que diz respeito aos resultados sobre a saúde, mas principalmente, em promover maior adaptação ao stress, o que muitas vezes é incompatível com a situação clínica.

Dentre algumas funções específicas do enfermeiro no processo stress - coping -adaptação, enumeramos algumas, que compreendemos serem um passo inicial para trabalharmos com esta perspectiva. Os caminhos para operacionalizar estas funções são complexos, e não nos compete neste momento tentar enumerá-los, mas pontuar as vias pelas quais o enfermeiro pode contribuir para melhor adaptação do paciente frente ao stress, considerando os comportamentos de coping.

O primeiro passo constitui a identificação das estratégias de coping que estão sendo emitidas pelo paciente e qual sua implicação para o indivíduo e para a evolução clínica. As estratégias reduzem as emoções negativas ou as exarcebam? E quais os e feitos sobre a doe nça? Há possibilidade de minimizar sintomas ou agravar o curso da mesma?

GALDINO (2000) estudou os estilos de coping em idosos e sua relação com a ansiedade e sintomas depressivos e encontrou em sua amostra, que coping "emotivo" relaciona-se com o estado emocioanal de ansiedade e de depressão e que naqueles que resolvem seus problemas de forma isolada, sem envolverem a rede de suporte social apresentam mais depressão.

Conhecendo as estratégias, seu efeito sobre o indivíduo e relacionando-as ao contexto torna-se possível levantar os recursos internos e/ ou externos disponíveis e melhorar as habilidades do indivíduo para melhor enfrentamento das situações, considerando tanto a doença como suas necessidades pessoais.

PESSUTO (1999) procurou conhecer os mecanismos de coping em portadores de hipertensão arterial e como estes interferem na adaptação do indivíduo à doença hipertensiva e ao seu tratamento. Ainda propoz um plano de intervenção quando era diagnosticado coping ineficaz para a hipertensão na tentativa de revertê-lo e levantou os dificultadores e facilitadores para o uso de coping mais efetivo para a doença.

Há recursos terapêuticos destinados-se a facilitar o processo de coping, e, conseqüentemente, reduzir os custos somáticos e psicológicos decorrentes do stress (GOLDEBERGER; BREZNITZ, 1982). Há duas grandes abordagens terapêuticas nesta área -a fisiológica e a psicológica - as quais apresentam objetivos e encaminhamentos muito distintos.

As fisiológicas compreendem o relaxamento, a meditação, o condicionamento físico quanto dieta e exercícios, dentre outros, e apesar de serem procedimentos controvertidos quanto sua eficácia, segundo alguns autores, é sabido que causam bem-estar e possibilitam que as pessoas controlem as respostas físicas provenientes do estressor.

LIPP; ROCHA (1994) enfatizam a relevância em reduzir os sintomas decorrentes do stress, para que o organismo tenha tempo para preparar-se e organizar-se mais adequadamente para lidar com o mesmo.

AMORIM (1999) avaliou o efeito do relaxamento sobre o sistema imonológico de mulheres com câncer de mama e constatou correlação entre atividade das células natural Killer, responsáveis pela defesa imunológica contra metástases, com a intervenção proposta, melhorando a forma destas mulheres enfrentarem a doença. Já quanto ao coping avaliado com instrumento de medida, não mostrou relação com a atividade das células natural Killer.

Em outro trabalho desta natureza, DOBBRO (1998) constatou que a musicoterapia promoveu redução significativa da intensidade e percepção da dor em mulheres com fibromialgia e relaxamento físico mediante redução da tensão muscular, da pressão arterial e da frequência cardíaca. Ainda, a análise qualitativa pontuou melhora no estado de ânimo e liberação das emoções, contribuindo desta forma para melhor enfrentamento da doença.

Quanto às terapêuticas psicológicas, objetivam principalmente, a modificação dos pensamentos e dos comportamentos que agravam e mantém as respostas ao stress e avaliação das estratégias de coping potencialmente úteis para minimizar o stress (GOLDEBERGER; BREZNITZ, 1982).

Dentre algumas ações realizadas pelo enfermeiro, estão aquelas que contribuem para a reavaliação cognitiva; quando se propõem atuar na percepção do paciente sobre o problema mediante informações dadas sobre a condição clínica e tratamento (Mc HAFFIE, 1992). As informações devem ser progressivas e após cada etapa avaliar os efeitos sobre o paciente e como este altera sua percepção sobre o evento, pois as informações podem causar efeitos neutros ou deletérios ao indivíduo.

Outro aspecto seria trabalhar com o paciente no sentido que ele tenha controle sobre si e sobre sua doença, dando oportunidade de fazer opções pelo tratamento que melhor atenda suas necessidades e que possa obter ganhos com o mesmo. Permitir que o paciente faça escolhas e tome decisões sobre si aumenta a percepção sobre seu corpo e o faz refletir sobre suas expectativas e o que pode ser feito para sentir-se melhor, percebendo-se como um ser responsável por ele próprio, com capacidade para intervir no problema.

O enfermeiro pode também, contribuir neste processo incentivando e estimulando a externalização das emoções e compreendendo-as como uma tentativa de adaptação. Deve-se motivar o paciente a expressar seu pensamento e sentimento, pois quando este verbaliza uma emoção, pensará sobre a mesma, aumentando a possibilidade de reflexão sobre o assunto. Ainda pode ser averiguada a existência de distorção cognitiva sobre si e sua condição e neste caso, deve-se proporcionar a reestruturação das cognições prejudiciais ao indivíduo.

Outro aspecto a ser pontuado diz respeito ao enfermeiro propor formas e etapas de tratamento condizentes com a estratégia de coping identificada. Após ser comunicado sobre a necessidade de um certo procedimento clinico, o paciente pode ficar ansioso e procurar alguém de seu relacionamento para conversar. Essa pessoa que funciona como um sistema de apoio, pode ser envolvida no tratamento e tornar-se um elemento importante como agente de autocuidado, como também ter funções como educador, repassando as informações para um paciente com dificuldade de aprendizagem devido a ansiedade, depressão ou outro sentimento que prejudique a cognição.

Outra ação do enfermeiro constitui a prevenção ou redução das demandas sobre o paciente, oriundas da doença, tratamento e hospitalização. A literatura de enfermagem é extensiva sobre a importância de observação do paciente como um todo, desenvolvimento de relação interpessoal entre cliente e profissional, humanização no local de trabalho, procedimentos técnicos que proporcionam maior conforto, enfim, há uma variedade de possibilidades, bem documentadas, com vistas a prestar uma assistência centrada no paciente, em suas necessidades, e conseqüentemente, à medida que individualiza-se o cuidado, maior é a possibilidade de redução dos estressores.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Es te e studo buscou re gistra r aspe ctos conceituais sobre coping para melhor compreensão desta temática, visto que o processo adaptativo do paciente sempre foi foco de interesse da enfermagem. O processo stress-coping-adaptação é um referencial recente na literatura, que pela sua relevância nos dias de hoje, passou a ser de conhecimento primordial para o enfermeiro.

Este é mais um referencial que pode contribuir para a enfermagem atuar no binômio saúde-doença, pois a doença geralmente é interpretada como um momento de crise, gerando moções negativas, que se não forem bem conduzidas agravam o estado se saúde e diminuem a qualidade de vida do indivíduo por interferirem nas múltiplas faces do viver - social, afetivo, existencial, e outras. Com isto, há necessidade das pessoas envolvidas mobilizarem recursos para minimizarem as dificuldades o que nem sempre é possível sem a ajuda de um profissional.

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    Coping vem do verbo inglês "Cope" que significa lutar, competir, enfrentar e no Brasil é utilizada no sentido de enfrentamento", forma como lidamos ou comportamos frente determinadas situações. Neste trabalho será mantida a palavra de origem por compreendermos que já faz parte de nossa comunidade científica.
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    Demandas podem ser compreendidas como "um estímulo interno ou externo o qual é percebido pelo indivíduo como sendo algo que necessita de resposta adaptativa", como por exemplo, mudança de emprego, de residência, morte e doença na família, ansiedade. (CLARKE, 1984).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Dez 2008
    • Data do Fascículo
      Dez 2000
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