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Competências gerenciais dos enfermeiros na ampliação da Estratégia Saúde da Família * * Extraído da dissertação "Competências gerenciais dos enfermeiros na ampliação da Estratégia Saúde da Família", Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, Universidade Federal do Paraná, 2014.

Resumo

OBJETIVO

Relacionar as competências gerenciais requeridas dos enfermeiros com o processo de mudança vivenciado na ampliação da Estratégia Saúde da Família.

MÉTODO

Pesquisa qualitativa realizada na Atenção Primária à Saúde em um município sul brasileiro, por meio de entrevista com 32 enfermeiros gerenciais e assistenciais. As entrevistas foram processadas nosoftwareIRAMUTEQ. As classes resultantes foram analisadas à luz de cinco competências gerenciais para promover a mudança.

RESULTADOS

As quatro classes que emergiram dos dados foram: o processo de ampliação da Estratégia Saúde da Família; os enfrentamentos e as potencialidades; a mobilização para a mudança; a inovação na consulta médica e na do enfermeiro. As classes foram relacionadas a uma ou mais competências.

CONCLUSÃO

A ampliação da Estratégia Saúde da Família requer competências gerenciais de implementar e sustentar a mudança, negociar acordos e compromissos, usar o poder e a influência com ética e efetividade, patrocinar e vender novas ideias e estimular e promover inovação.

Descritores
Enfermagem; Atenção Primária à Saúde; Estratégia Saúde da Família; Competência Profissional; Gerenciamento da Prática Profissional

Abstract

OBJECTIVE

To relate the managerial competencies required of nurses with the process of change experienced in the expansion of the Family Health Strategy (FHS).

METHOD

A qualitative research conducted in primary health care in a southern Brazilian city, through interviews with 32 managerial and clinical nurses. The interviews were processed by IRAMUTEQ software. The resulting classes were examined under five managerial competencies to promote change.

RESULTS

The four classes obtained from data were: the Family Health Strategy expansion process; confrontations and potentialities; mobilization for the change; innovations in medical and nursing consultations. The classes were related to one or more competencies.

CONCLUSION

The expansion of the Family Health Strategy requires managerial competencies of implementing and sustaining change, negotiating agreements and commitments, using power and influence ethically and effectively, sponsoring and selling new ideas, and encouraging and promoting innovation.

Descriptors
Nursing; Primary Health Care; Family Health Strategy; Professional Competence; Practice Management

Resumen

OBJETIVO

Relacionar las competencias de gestión requeridas de los enfermeros con el proceso de cambio vivido en la ampliación de la Estrategia Salud de la Familia.

MÉTODO

Investigación cualitativa realizada en la Atención Primaria a la Salud en un municipio del sur de Brasil, por medio de entrevista con 32 enfermeros de gestión y asistenciales. Las entrevistas fueron procesadas en elsoftwareIRAMUTEQ. Las clases resultantes fueron analizadas a la luz de cinco competencias de gestión para promover el cambio.

RESULTADOS

Las cuatro clases que emergieron de los datos fueron: el proceso de ampliación de la Estrategia Salude de la Familia: los enfrentamientos y las potencialidades; la movilización para el cambio; y la innovación en la consulta médica y en la del enfermero. Las clases fueron relacionadas con una o más competencias.

CONCLUSIÓN

La ampliación de la Estrategia Salud de la Familia requiere competencias de gestión de implantar y sostener el cambio, negociar acuerdos y compromisos, usar el poder y la influencia con ética y efectividad, patrocinar y vender nuevas ideas y estimular y promover innovación.

Descriptores
Enfermería; Atención Primaria de Salud; Estrategia de Salud Familiar; Competencia Profesional; Gestión de la Práctica Profesional

Introdução

No Brasil, a Atenção Primária à Saúde (APS) resulta da construção e experiência do conjunto de atores envolvidos, entre eles: usuários, movimentos sociais, trabalhadores e gestores. Considerada a principal porta de entrada para o sistema de saúde, coordena e integra os diferentes serviços e oferece atenção voltada à pessoa/família e para a maioria das condições de saúde. A Estratégia Saúde da Família (ESF) é utilizada para reorganizar a APS e já repercutiu positivamente na melhoria das condições de saúde da população, embora ainda esteja em construção e ampliação. A organização da APS com a ampliação de equipes de saúde da família requer mudanças estruturais e organizacionais. Além da existência da equipe mínima multiprofissional, um território definido e outras especificidades, a ESF deve reafirmar, na prática, os princípios da universalidade, acessibilidade, vínculo, continuidade do cuidado, integralidade, responsabilização, humanização, equidade e participação social(11 Brasil. Ministério da Saúde; Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. PNB - Política Nacional de Atenção Básica [Internet]. Brasília; 2012 [citado 2015 fev. 9]. Disponível em: Disponível em: http://189.28.128.100/dab/docs/publicacoes/geral/pnab.pdf
http://189.28.128.100/dab/docs/publicaco...
-22 Silva LA, Casotti CA, Chaves SCL. A produção científica brasileira sobre a Estratégia Saúde da Família e a mudança no modelo de atenção. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2013 [citado 2013 jul. 9];18(1):221-32. Disponível em: Disponível em: http://www.scielosp.org/pdf/csc/v18n1/23.pdf
http://www.scielosp.org/pdf/csc/v18n1/23...
).

Para fortalecer a APS no município estudado, a gestão propôs ampliar significativamente a ESF(33 Massuda A, Poli Neto P, Drehmer VLFG . A atenção primária à saúde (APS) no SUS Curitiba: um desafio para o Brasil, passar de uma APS programática para uma mais acessível e abrangente. In: Sousa MF, Franco MS, Mendonça AVM, organizadores. Saúde da família nos municípios brasileiros: os reflexos dos 20 anos no espelho do futuro. Campinas: Saberes; 2014. p. 127-77.). Esse processo de mudança requer dos profissionais envolvidos nas diversas esferas de gestão competências gerenciais no planejamento e execução. A ampliação incluiu a reestruturação das Unidades de Saúde (US) denominadas tradicionais, porque não são constituídas por equipes de saúde da família, a reorganização das equipes de saúde (com a inserção das equipes mínimas de saúde da família) e do processo de trabalho, a territorialização da área de abrangência de cada equipe e o fortalecimento do papel assistencial dos profissionais(11 Brasil. Ministério da Saúde; Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. PNB - Política Nacional de Atenção Básica [Internet]. Brasília; 2012 [citado 2015 fev. 9]. Disponível em: Disponível em: http://189.28.128.100/dab/docs/publicacoes/geral/pnab.pdf
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).

O enfermeiro precisa se qualificar para integrar e fomentar ativamente os princípios do sistema de saúde vigente, sobretudo, nas atividades interativas e gerenciais, as quais requerem envolvimento, sistematização e comprometimento com as necessidades da população(44 Souza MG, Mandu ENT, Elias AN. Perceptions of nurses regarding their work in the family health strategy. Texto Contexto Enferm [Internet]. 2013 [cited 2015 May 15]; 22(3):772-9. Available from: Available from: http://www.scielo.br/pdf/tce/v22n3/en_v22n3a25.pdf
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). Portanto, na sua atuação gerencial, como ocorre na ampliação das equipes de saúde da família, este profissional exerce papel fundamental na mudança da estrutura e do processo de trabalho, a partir da mobilização de competências gerenciais em sua prática.

A competência é a capacidade comportamental de agir apropriadamente, utilizando o conhecimento previamente adquirido. O referencial teórico que sustenta este estudo propõe que as competências gerenciais necessárias "promovam a mudança na organização e o estímulo à adaptabilidade"(55 Quinn RE, Faerman SR, Thompson MP, Mcgrath MR, Clair LSS. Competências gerenciais: a abordagem de valores concorrentes na gestão. 5ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2012.)e utiliza o modelo de gestão do sistema aberto, fundamentado na teoria contingencial, com ênfase na adaptação política, resolução criativa de problemas, inovação e gerenciamento de mudanças(55 Quinn RE, Faerman SR, Thompson MP, Mcgrath MR, Clair LSS. Competências gerenciais: a abordagem de valores concorrentes na gestão. 5ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2012.).

Em consonância com o referencial teórico escolhido, a mudança representada neste cenário pela ampliação da ESF aponta para a ressignificação do processo de trabalho da equipe de saúde a partir de uma perspectiva de atendimento integral com foco nas famílias e na produção do cuidado, considerando o contexto sociopolítico que influencia esse processo. Somada a essa realidade, encontrou-se uma lacuna na produção do conhecimento sobre os processos de mudança na APS e as competências necessárias para o seu gerenciamento.

Diante do contexto da APS do município pesquisado, identificou-se um cenário influenciado por adversidades, como recursos financeiros limitados para a ampliação de equipes de saúde da família, restrição no acesso aos serviços de saúde e na sua resolutividade, bem como possibilidades, dentre elas, a estrutura física da maioria das US e a capacidade gerencial e política para organização da assistência à saúde. Portanto, objetivou-se relacionar as competências gerenciais requeridas dos enfermeiros com o processo de mudança vivenciado na ampliação da Estratégia Saúde da Família.

Método

Estudo qualitativo, do tipo descritivo e exploratório, realizado em um município do sul do Brasil. Das oito US que implantaram a ESF em seis distritos sanitários (DS) no primeiro semestre de 2013, selecionou-se uma US de cada DS que possuía em seu quadro funcional enfermeiros que atendiam aos seguintes critérios de inclusão: enfermeiros de ambos os sexos, que atuaram na ampliação da ESF no primeiro semestre de 2013 e que permaneceram no cargo até a coleta de dados. Excluíram-se os enfermeiros afastados por motivo de férias, licença-prêmio ou tratamento de saúde durante o período de coleta de dados.

Os participantes da pesquisa foram 32 enfermeiros que atuavam na APS, envolvidos nesse processo: 16 enfermeiros inseridos nas equipes de saúde da família e 16 enfermeiros em cargos gerenciais dessas US, dos DS e de outros departamentos que participaram da ampliação da ESF. Os enfermeiros assistenciais foram codificados como "assist." e os enfermeiros da gestão, como "gest."

A coleta de dados ocorreu no período de janeiro a abril de 2014, por entrevista com roteiro parcialmente estruturado no local e turno de trabalho dos enfermeiros. Cada entrevista teve a duração média de 25 minutos e os aspectos éticos de sigilo e codificação dos participantes foram respeitados.

Após a caracterização dos participantes por meio da idade, local de trabalho, tempo de formação, experiência em ESF, atuação no cargo atual e qualificação profissional, buscou-se conhecer o processo de mudança na ampliação da ESF, identificar seus fatores facilitadores e dificultadores, aspectos relacionados à comunicação, às práticas inovadoras e à negociação vivenciados pelos enfermeiros e/ou equipe de trabalho nas diferentes funções, no gerenciamento e na assistência, a fim de relacionar o processo de mudança às competências gerenciais descritas no referencial teórico adotado neste estudo(55 Quinn RE, Faerman SR, Thompson MP, Mcgrath MR, Clair LSS. Competências gerenciais: a abordagem de valores concorrentes na gestão. 5ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2012.). Assim, as cinco competências gerenciais relacionadas ao processo de mudança são: usar o poder e a influência com ética e efetividade, patrocinar e vender novas ideias, estimular e promover inovação, negociar acordos e compromissos e implementar e sustentar a mudança, as quais foram utilizadas como referenciais para análise dos dados.

Para apoiar a análise dos dados da pesquisa qualitativa, foi utilizado osoftwareIRAMUTEQ ( Interface de R pour les Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionnaires). Este programa é livre e ancorado no software R, possibilitando diferentes processamentos e análises estatísticas de textos produzidos. Foi desenvolvido em 2009 por Pierre Ratinaud na língua francesa, e atualmente possui dicionários completos em outras línguas. No Brasil, o seu uso iniciou-se em 2013 e permite análises precisas(66 Lahlou S. Text mining methods: an answer to Chartier and Meunier. Papers Soc Represent [Internet]. 2012 [cited 2015 Feb 9];20. Available from:Available from: http://www.psych.lse.ac.uk/psr/PSR2011/20_39.pdf
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-77 Camargo BV, Justo AM. IRAMUTEQ: um software gratuito para análise de dados textuais. Temas Psicol [Internet]. 2013 [citado 2015 fev. 9];21(2):513-18. Disponível em: Disponível em:http://pepsic.bvsalud.org/pdf/tp/v21n2/v21n2a16.pdf
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), configurando-se como uma inovação para a pesquisa qualitativa em saúde. Para o processamento de dados foi utilizado o método de Classificação Hierárquica Descendente (CHD).

A partir do corpus, foi realizado o dimensionamento dos segmentos de texto ou unidades de contexto elementar (UCE), que possuem em média três linhas, classificados em função dos vocabulários de maior frequência e de valores de qui-quadrado mais elevados na classe, tendo em vista a compreensão de que eram significativos para a análise qualitativa dos dados(77 Camargo BV, Justo AM. IRAMUTEQ: um software gratuito para análise de dados textuais. Temas Psicol [Internet]. 2013 [citado 2015 fev. 9];21(2):513-18. Disponível em: Disponível em:http://pepsic.bvsalud.org/pdf/tp/v21n2/v21n2a16.pdf
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-88 Ratinaud P. IRAMUTEQ: Interface de R pour les analyses multidimensionnelles de textes et de questionnaires [computer software]. 2009 [cited 2015 Feb 5]. Available Available from:http://www.iramuteq.org
http://www.iramuteq.org...
). As UCEs obtidas "apresentam vocabulário semelhante entre si e diferentes das UCEs das outras classes"(77 Camargo BV, Justo AM. IRAMUTEQ: um software gratuito para análise de dados textuais. Temas Psicol [Internet]. 2013 [citado 2015 fev. 9];21(2):513-18. Disponível em: Disponível em:http://pepsic.bvsalud.org/pdf/tp/v21n2/v21n2a16.pdf
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). O teste qui-quadrado é utilizado para verificar a associação da UCEs com determinada classe; portanto, quanto mais alto o seu valor, maior é a associação. Todas as palavras selecionadas possuíam p<0,001, indicando associação significativa(99 Chartier JF, Meunier JG. Text mining methods for social representation analysis in large corpora. Papers Soc Represent [Internet]. 2011 [cited 2015 Feb 5];20. Available from: Available from: http://www.psych1.lse.ac.uk/psr/PSR2011/20_38.pdf
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). A percentagem referente ao conteúdo é a "ocorrência da palavra nos segmentos de texto nessa classe em relação a sua ocorrência no corpus"(1010 Camargo BV, Justo AM. Tutorial para uso do software de análise textual IRAMUTEQ. Universidade Federal de Santa Catarina [Internet]. 2013 [citado 2015 fev. 5]. Disponível em: Disponível em: http://www.iramuteq.org/documentation/fichiers/tutoriel-en-portugais
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).

Destaca-se que esse processamento no softwareIRAMUTEQ teve a duração de 59 segundos, o que é uma vantagem significativa nessa etapa em relação a outras formas de análise de dados qualitativos. Obtiveram-se 2627 UCEs, com um aproveitamento de 93,8% do corpus. Após o dimensionamento dessas UCEs, definiram-se as classes, que foram apresentadas no dendograma da CHD.

Os elementos centrais de cada classe foram analisados à luz das cinco competências gerenciais do referencial teórico(55 Quinn RE, Faerman SR, Thompson MP, Mcgrath MR, Clair LSS. Competências gerenciais: a abordagem de valores concorrentes na gestão. 5ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2012.)para o processo de mudança, e a relação entre as classes e competências gerenciais foi apresentada por meio de figura esquemática contendo ao centro as classes obtidas, envolvidas pelas competências gerenciais e relacionadas aos elementos centrais dos corporatextuais de cada classe em caixas.

O estudo foi realizado de acordo com as diretrizes e normas regulamentadoras da Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde/MS, sobre Pesquisas Envolvendo Seres Humanos e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa de uma universidade do Paraná, sob o Parecer nº 606.957-0. A viabilidade para o campo de pesquisa na Secretaria Municipal de Saúde foi aprovada pelo seu Comitê de Ética em Pesquisa. Todos os participantes aceitaram participar voluntariamente da pesquisa, mediante assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Resultados

Os resultados serão apresentados em três aspectos: a caracterização dos enfermeiros participantes; a análise textual e apresentação das classes referentes ao processo de mudança vivenciado pelos enfermeiros na ampliação da ESF, e a relação entre as classes e as competências gerenciais à luz do referencial teórico.

Quanto à caracterização dos enfermeiros participantes, dentre os 32 participantes, somente um era do sexo masculino e a faixa etária variou entre 31 e 58 anos. O tempo de formação foi entre 5 e 32 anos. Entre os enfermeiros assistenciais, o tempo de atuação nas US foi menor que um ano, devido à política de remanejamento adotada no município. Quanto aos enfermeiros gerenciais, predominou o tempo de um a dois anos no atual cargo e local de trabalho. O período de experiência com a ESF foi maior entre os enfermeiros assistenciais e a qualificação dos enfermeiros gerenciais em curso de pós-graduaçãolatoe stricto sensufoi maior do que dos assistenciais.

Para análise textual e apresentação das classes referentes ao processo de mudança, o corpusfoi dividido em dois sub-corpus; de um dos sub- corpus, obteve-se a Classe 4, constituída de 790 UCEs, e que concentra 32,1% das UCEs docorpustotal. Do outro sub- corpus, obteve-se a Classe 3, com 497 UCEs, que corresponde à 20,2% das UCEs, e mais duas repartições que originaram as Classes 2 e 1 com 303 e 874 UCEs, respectivamente, correspondente a 12,2% na Classe 2 e 35,5% na Classe 1 do total das UCEs, conforme o dendograma da Figura 1.

Figura 1
Dendograma das classes - ampliação da Estratégia Saúde da Família - Curitiba, PR, Brazil, 2014

A Classe 1, o processo de mudança na ampliação da ESF, teve maior número de UCEs, conforme mostra a Figura 1. Essa classe revelou aspectos relacionados à percepção e/ou vivência dos enfermeiros e da equipe de trabalho no processo de ampliação da ESF, observados nas seguintes UCEs:

Eu acho que a mudança mais significativa, que é boa para a população, é a equipe ser realmente responsável pela população(Gest.15).

Eu acho que o enfermeiro atuou muito como mediador. Mediador entre equipe de auxiliares de enfermagem, entre a equipe dos médicos, entre a chefia e a equipe, a maioria das coisas passa pela gente(Assist.14).

Então a gente vê que eles (usuários) gostaram, um novo profissional, e é diferente o atendimento, o profissional de ESF tem outra visão do que o médico clínico...(Assist.5).

Na Classe 2, denominada enfrentamentos e potencialidades na ampliação da ESF, conforme consta na Figura 1, as UCEs evidenciaram, predominantemente, a remuneração dos profissionais, as características e (des)conhecimento sobre a ESF, além de limitações e potencialidades do processo de mudança.

Então eles (auxiliares de enfermagem) não têm problema conosco, mas a revolta deles é a questão salarial, porque quem está na ESF ganha o dobro quase...(Assist.8).

Se os próprios funcionários não entendem ao certo qual que é a importância... como eles vão convencer a população de que aquilo (ESF) é melhor para eles?(Gest.15).

(...) mas são profissionais que... acreditam na saúde pública, saúde coletiva, ESF, compraram a ideia(Gest.8).

A Classe 3, a mobilização para a mudança, apresentada na Figura 1. A reunião foi uma das estratégias que predominou para informar e mobilizar a equipe da US, a população e o Conselho Local frente às mudanças a serem instituídas, e referenciaram aspectos relacionados à gestão e à comunicação.

(...) sucessivas reuniões, conversas com a equipe... para fazer uma mobilização com a comunidade. Foram várias reuniões com o Conselho Local e com participantes ali dos usuários, da comunidade, para explicar esse processo(Gest.5).

Talvez se nós tivéssemos conversado mais... sobre o que ia acontecer, talvez nós pudéssemos nos ajudar mais e entender mais o processo...(Gest.6).

Por fim, a Classe 4, a inovação na consulta médica e na do enfermeiro, exposta naFigura 1, evidenciou práticas consideradas inovadoras pelos enfermeiros e que estavam relacionadas à consulta médica, à valorização da consulta do enfermeiro, à consulta compartilhada entre ambos os profissionais e à organização do serviço com ampliação do acesso à população.

Então essa mudança de médico também foi bem trabalhosa. Agora que a gente está começando a conseguir fazer com que eles entendam qual o benefício deles de estarem consultando com o médico da área(Assist.15).

Agora está sendo muito mais aprofundado porque o paciente que está na minha frente, eu tenho que saber o que ele tem para eu optar se eu vou mandar para uma consulta médica, ou se eu atendendo vou resolver o caso dele(Assist.4).

(...) que ele (enfermeiro) possa realmente realizar a sua consulta, ter o apoio do médico e possa ser resolutivo nessa questão. Tanto é que houve o aumento até do registro disso(Gest.2).

A Figura 2apresenta a relação entre as classes e as competências gerenciais expostas no referencial teórico adotado(55 Quinn RE, Faerman SR, Thompson MP, Mcgrath MR, Clair LSS. Competências gerenciais: a abordagem de valores concorrentes na gestão. 5ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2012.): implementar e sustentar a mudança (Classe 1), negociar acordos e compromissos (Classe 2), usar o poder e a influência com ética e efetividade (Classes 2 e 3), patrocinar e vender novas ideias (Classe 3), e estimular e promover a inovação (Classe 4), e os respectivos elementos-chave definidos na análise doscorpustextuais das classes obtidas.

Figura 2
Competências gerenciais referenciadas para o processo de ampliação da ESF a partir dos dados das quatro classes analisadas - Curitiba, PR, Brasil, 2014

Discussão

No que se refere às competências gerenciais no processo de mudança e suas relações com as classes obtidas na análise textual, pode-se dizer que as competências gerenciais, segundo o referencial adotado, visam à efetividade no processo de mudança(55 Quinn RE, Faerman SR, Thompson MP, Mcgrath MR, Clair LSS. Competências gerenciais: a abordagem de valores concorrentes na gestão. 5ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2012.), e, nesse estudo, o enfermeiro é considerado um de seus protagonistas. Conforme estabelecido pela Política Nacional de Atenção Básica, uma das atribuições do enfermeiro na APS é a atividade gerencial da equipe multiprofissional(11 Brasil. Ministério da Saúde; Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. PNB - Política Nacional de Atenção Básica [Internet]. Brasília; 2012 [citado 2015 fev. 9]. Disponível em: Disponível em: http://189.28.128.100/dab/docs/publicacoes/geral/pnab.pdf
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).

A competência gerencial implementar e sustentar a mudança está relacionada com a classe 1, que apresentou as percepções e vivências dos profissionais de saúde na ampliação da ESF: mudanças no processo de trabalho, na aplicação dos princípios e diretrizes da APS, o impacto financeiro, entre outras características do processo. Dentre as vantagens, os participantes do estudo citaram a importância da equipe de referência e o perfil do profissional generalista. A ESF possibilita a implantação de um modelo de atenção que atende aos princípios e diretrizes do SUS, possui maior potencial para que os profissionais generalistas conheçam e se aproximem do contexto dos usuários. No entanto, um estudo sobre a assistência à saúde das crianças em US com e sem equipes de saúde da família identificou a necessidade de ampliar o acesso, a longitudinalidade, a integração de cuidados, entre outros atributos essenciais para APS, o que é desafiador para consolidar o modelo de atenção(1111 Oliveira VBCA, Veríssimo MLÓR. Children's health care assistance according to their families: a comparison between models of Primary Care. Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2015 [cited 2015 July 10];49(1):30-6. Available from:Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v49n1/0080-6234-reeusp-49-01-0030.pdf
http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v49n1/00...
).

Para obter sucesso ao implementar e sustentar a mudança na ampliação da ESF, o enfermeiro precisa avaliar quais mudanças são necessárias e considerar as influências que ocorrem no ambiente externo, como as políticas e econômicas, além do contexto da US, tanto estrutural como organizacional. O enfermeiro, ao considerar que as influências externas podem potencializar o seu trabalho gerencial precisa se instrumentalizar para se contrapor às influências externas que não estão alinhadas às diretrizes e princípios da APS, e consequentemente, ao modelo de atenção que atenda às necessidades dos usuários. A avaliação das mudanças realizadas a fim de sustentá-las compõe esse processo e precisa ser realizada continuamente para o aprimoramento da APS(1212 Lancet. Making primary care people-centred: a 21st century blueprint. Lancet. 2014;384(9940):281.).

A competência negociar acordos e compromissos está relacionada predominantemente aos resultados da Classe 2. Os enfermeiros expressaram a necessidade da reorganização do processo de trabalho e os enfrentamentos entre gestores, profissionais das equipes de saúde e usuários, demandando negociações que ocorreram tanto na formalidade durante reuniões como na informalidade. Os conflitos gerados entre gestores e profissionais são comuns no dia a dia da US, e segundo estudo sobre a tipologia de conflitos em uma US, podem estar relacionados ao processo de trabalho, comportamento do profissional, infraestrutura, entre outros(1313 Carvalho BG, Peduzzi M, Ayres JRCM. Concepções e tipologia de conflitos entre trabalhadores e gerentes no contexto da atenção básica no Sistema Único de Saúde (SUS). Cad Saúde Pública [Internet]. 2014 [citado 2015 jul. 7];30(7):1453-62. Disponível em: Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/csp/v30n7/0102-311X-csp-30-7-1453.pdf
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), o que requer a mediação e muitas vezes a negociação. Esta inclui o diálogo, e consiste em resolver algo "por meio do compartilhamento ponderado de pontos de vista"(55 Quinn RE, Faerman SR, Thompson MP, Mcgrath MR, Clair LSS. Competências gerenciais: a abordagem de valores concorrentes na gestão. 5ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2012.). A mediação de conflitos e a negociação são instrumentos gerenciais de apoio do enfermeiro na tomada de decisão(1414 Paula M, Peres AM, Bernardino E, Eduardo EA, Macagi STS. Processo de trabalho e competências gerenciais do enfermeiro da estratégia saúde da família. Rev RENE [Internet]. 2013 [citado 2015 jul. 6]:14(4):980-7. Disponível em: Disponível em: http://www.revistarene.ufc.br/revista/index.php/revista/article/view/1248/pdf
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).

A competência usar o poder e a influência com ética e efetividade está relacionada à identificação das fontes de poder e às diferentes táticas que podem ser usadas para influenciar os outros, descritas nas Classes 2 e 3. O poder existe em nível de organização, de grupo ou equipe e também em nível individual ou pessoal. Embora na maioria das vezes seja visto como algo negativo, sua utilização na mobilização de pessoas e recursos para alcançar os objetivos institucionais pode ser positiva(55 Quinn RE, Faerman SR, Thompson MP, Mcgrath MR, Clair LSS. Competências gerenciais: a abordagem de valores concorrentes na gestão. 5ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2012.).

O remanejamento de profissionais para compor as equipes de saúde da família, evidenciado na Classe 2 abalou a estrutura de uma equipe já formada nas US pesquisadas, bem como a restrição na possibilidade de integrar a equipe mínima de saúde da família e obter melhorias salariais, o que levou ao convívio de duas equipes com cargas horárias e salários diferenciados. Entender a dimensão da mudança no âmbito pessoal, que envolve razões e emoções, é tão necessário quanto entender os motivos que levam a realizar a mudança(55 Quinn RE, Faerman SR, Thompson MP, Mcgrath MR, Clair LSS. Competências gerenciais: a abordagem de valores concorrentes na gestão. 5ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2012.)

A mobilização para a mudança, conforme os enfermeiros relataram nas UCEs da Classe 3 também oportunizou o uso do poder e a influência. Ao analisar o território das US e como se dão as relações de poder entre gestores e profissionais de saúde, e/ou entre esses e os usuários, há de se considerar as disputas entre interesses, no entanto, o trabalho deve ter o compromisso com as necessidades de saúde dos usuários. Nessa interação entre todos os atores é que a ética profissional, os saberes sobre as relações entre o trabalhador e o usuário evidenciam a importância deste trabalho vivo(1515 Fertonani HP, Pires DEP, Biff D, Scherer MDA. The health care model: concepts and challenges for primary health care in Brazil. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2015 [cited 2015 July 10];20(6):1869-78. Available from:Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v20n6/en_1413-8123-csc-20-06-1869.pdf
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-1616 Feuerwerker LCM. Micropolítica e saúde: produção do cuidado, gestão e formação. Porto Alegre: Rede Unida; 2014.).

Nos discursos dos participantes, referentes à Classe 2 e à Classe 3 e que foram relacionados a essa competência, percebe-se a fragilidade política. Ao remeter o foco no processo de mudança, surge a reflexão sobre o poder e a influência, no entanto, a negociação para realizar acordos raramente tem êxito se o poder for utilizado de forma autoritária. São indicadas algumas estratégias não controladoras para aumentar o poder e a influência no espaço do trabalho, entre as quais estão o encorajamento para compartilhar ideias e o reconhecimento pelo bom desempenho e dessas frente aos seus superiores, o que define a competência gerencial patrocinar e vender novas ideias, a qual está ligada à Classe 3, por meio dos elementos-chave reunião, gestão e comunicação(55 Quinn RE, Faerman SR, Thompson MP, Mcgrath MR, Clair LSS. Competências gerenciais: a abordagem de valores concorrentes na gestão. 5ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2012.).

A reunião foi o meio mais citado pelos entrevistados para que houvesse comunicação entre as partes envolvidas no processo de mudança, o que necessitou tempo significativo sobre vários aspectos, tais como: recursos humanos, composição e atribuições das equipes, variação da remuneração, reforma na estrutura física, territorialização, processo de trabalho, entre outros. Os enfermeiros referiram lacunas nessa mobilização para a mudança, ao afirmarem que deviam ter interagido mais para entender as mudanças propostas.

A comunicação é considerada uma competência necessária para resolver complexos problemas de saúde(1717 Olson DK. Competency to collaboration: an interactive process for cross-sectoral development [abstract]. Lancet Global Health. 2014;2 Suppl 1:S39). Para analisar a comunicação gerencial há de se considerar seus quatro tipos básicos: as mensagens relacionais, para construir a confiança; as mensagens informativas, para fornecer os fatos; as promocionais, para direcionar a ação; e as transformacionais, que servem para estimular a mudança. As mensagens transformacionais buscam uma ação(55 Quinn RE, Faerman SR, Thompson MP, Mcgrath MR, Clair LSS. Competências gerenciais: a abordagem de valores concorrentes na gestão. 5ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2012.). Ao considerar o contexto do SUS, a caracterização da formação dos seus profissionais e a gestão participativa, as mensagens consideradas relacionais são essenciais no processo comunicativo de mudança.

Numa revisão bibliográfica sobre liderança e o relacionamento interpessoal na equipe de saúde, evidenciou-se a importância da comunicação no gerenciamento e que a dificuldade de abordar o tema entre a equipe limita a sua valorização(1818 Blanco BM, Valente GSC, Lima CA, Oliveira ACL, Correa MB. The importance of nursing leadership in managing interpersonal relationships among health team. J Res Fundam Care [Internet]. 2013[cited 2015 July 6];5(3):211-17. Available from: http://www.seer.unirio.br/index.php/cuidadofundamental/article/view/1496
http://www.seer.unirio.br/index.php/cuid...
). Dessa forma, há necessidade de aprimorar a organização dos serviços de saúde mediante as dificuldades de comunicação entre os profissionais de diferentes níveis de atenção, considerando a fragmentação da assistência prestada por cada um(1919 Silva SA, Nogueira DA, Paraízo, CMS, Fracolli LA. Assessment of Primary Health Care: health professionals perspective.. Rev Esc Enferm USP [Internet] 2014 [cited 2015 May 15];48(n.spe):126-32. Available from: Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v48nspe/0080-6234-reeusp-48-esp-126.pdf
http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v48nspe/...
).

A competência de estimular e promover a inovação relaciona-se com a Classe 4, denominada a inovação na consulta médica e na do enfermeiro, a qual tem como elementos relevantes a valorização da consulta do enfermeiro, do médico generalista e compartilhada entre enfermeiro e médico. A inovação se refere a um produto, serviço ou melhoria que não precisa ser necessariamente criado, mas a transposição de uma ideia para outro contexto também é algo inovador(55 Quinn RE, Faerman SR, Thompson MP, Mcgrath MR, Clair LSS. Competências gerenciais: a abordagem de valores concorrentes na gestão. 5ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2012.).

As mudanças consideradas inovadoras pelos enfermeiros entrevistados, relacionadas às consultas realizadas de forma compartilhada por um médico de família e por um enfermeiro, visam ampliar o acesso e vínculo da população com o serviço e com os profissionais, e contribuir para o modelo assistencial orientado para o cuidado integral e às necessidades de saúde, o que ainda constitui um desafio para os profissionais na APS(1515 Fertonani HP, Pires DEP, Biff D, Scherer MDA. The health care model: concepts and challenges for primary health care in Brazil. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2015 [cited 2015 July 10];20(6):1869-78. Available from:Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v20n6/en_1413-8123-csc-20-06-1869.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csc/v20n6/en_14...
). O agendamento de um número predeterminado de consultas médicas buscava o atendimento de metas estabelecidas e as consultas de enfermagem não faziam parte da rotina de trabalho em muitas US, ou eram realizadas em número restrito. A proposta de atender à demanda do dia e não restringir o número de consultas leva à reorganização da agenda dos profissionais e do processo de trabalho(2020 Knight A, Lembke T. Appointments 101 How to shape a more effective appointment system. Rev AFP [internet]. 2013 [cited 2015 Apr 22]; 42(3):152-56. Available from: Available from:http://www.racgp.org.au/download/Documents/AFP/2013/March/201303knight.pdf
http://www.racgp.org.au/download/Documen...
).

Na APS o enfermeiro é caracterizado e reconhecido por compreender o ser humano na sua integralidade, e também por prestar assistência integral após o acolhimento e a identificação das suas necessidades e expectativas, tanto individuais como coletivas. Integra os diferentes saberes profissionais, dos usuários e da comunidade e busca a otimização das intervenções de cuidado(44 Souza MG, Mandu ENT, Elias AN. Perceptions of nurses regarding their work in the family health strategy. Texto Contexto Enferm [Internet]. 2013 [cited 2015 May 15]; 22(3):772-9. Available from: Available from: http://www.scielo.br/pdf/tce/v22n3/en_v22n3a25.pdf
http://www.scielo.br/pdf/tce/v22n3/en_v2...
). Uma avaliação da APS na Espanha sobre as variáveis que condicionam a utilização da consulta do enfermeiro concluiu que os critérios de necessidade e condições de acessibilidade respondem pelas diferenças no seu uso e que incluem o atendimento à demanda direta e imediata do usuário e não só a pré-agendada(2121 Martín-Fernández J, Rodríguez-Martínez G, Ariza-Cardiel G, Vergel Gutierrez MA, Hedalgo Escudero AV, Conde-López JF. Variables que condicionan la utilización de la consulta de enfermería em centros de salud de la comunidad de Madrid. Rev Esp Salud Publica [Internet]. 2013 [citado 2015 maio 15]; 87(4):383-92. Disponíble en: Disponíble en:http://scielo.isciii.es/pdf/resp/v87n4/08_original_6.pdf
http://scielo.isciii.es/pdf/resp/v87n4/0...
).

O incentivo à consulta do enfermeiro convive com a desconstrução da centralidade na consulta médica. Estudo sobre as percepções dos enfermeiros sobre o seu trabalho na ESF aponta para a prática no modelo biomédico dominante, e o desafio de consolidar o trabalho compartilhado da equipe multiprofissional(44 Souza MG, Mandu ENT, Elias AN. Perceptions of nurses regarding their work in the family health strategy. Texto Contexto Enferm [Internet]. 2013 [cited 2015 May 15]; 22(3):772-9. Available from: Available from: http://www.scielo.br/pdf/tce/v22n3/en_v22n3a25.pdf
http://www.scielo.br/pdf/tce/v22n3/en_v2...
). Tal como ocorre no apoio matricial(2222 Prates MML, Garcia VG, Moreno DMFC. Equipe de apoio e a construção coletiva do trabalho em Saúde Mental junto à Estratégia de Saúde da Família: espaço de discussão e de cuidado. Saúde Soc [Internet]. 2013 [citado 2015 fev. 4];22(2):42-52. Disponível em: Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/sausoc/v22n2/v22n2a31.pdf
http://www.scielo.br/pdf/sausoc/v22n2/v2...
), a consulta compartilhada entre o enfermeiro e o médico promove a sua integração, a troca e utilização do conhecimento e experiências durante as consultas.

As inovações relatadas não caracterizam exclusivamente o trabalho nas US com ESF, mas buscam melhorar o acesso, o vínculo, a continuidade e a resolutividade no cuidado à população. Ao refletir sobre a assistência e gestão da saúde, e considerando a evolução na concepção da transmissão de conhecimentos e soluções para a produção do conhecimento pelo referencial da problematização, os profissionais são capazes de propor soluções e inovações(2323 Falkenberg MB, Mendes TPL, Moraes EP, Souza EM. Educação em saúde e educação na saúde: conceitos e implicações para a saúde coletiva. Ciênc Saúde Coletiva [Internet] 2014 [citado 2015 jul. 10];19(3):847-52379-401. Disponível em: Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/csc/v19n3/1413-8123-csc-19-03-00847.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csc/v19n3/1413-...
).

Frente à ampliação da ESF, as classes obtidas evidenciaram que as competências gerenciais são requeridas, conforme a Figura 2e que, didaticamente, pode-se relacionar cada classe analisada com uma ou duas competências. Contudo, a prática profissional relatada pelos participantes é complexa e dinâmica e não permite essa segregação. Dessa forma, todas são importantes e serão mais ou menos utilizadas conforme a situação vivenciada pelo profissional.

Conclusão

O estudo evidenciou aspectos que extrapolam características exclusivas da ampliação da ESF para um olhar mais amplo que caracteriza a APS. Relacionaram-se as competências gerenciais do enfermeiro no processo de mudança, as quais não excluem outras apontadas no referencial teórico, já que a mudança não ocorre de forma isolada, portanto, diferentes competências são utilizadas concomitantemente.

Ao analisar o processo de ampliação da ESF no cenário de pesquisa e relacioná-lo às competências gerenciais dos enfermeiros para implementar as mudanças necessárias, este estudo pode contribuir para o planejamento da continuidade da ampliação da ESF e o fortalecimento da APS.

Embora os participantes da pesquisa não tenham mencionado a educação como ponto-chave para a mudança, reflete-se que a busca de estratégias de educação permanente não pode ser negligenciada no processo de sustentação da atuação dos enfermeiros e demais profissionais de saúde no gerenciamento das mudanças.

Recomenda-se que o referencial de competências gerenciais advindo da Administração seja utilizado em outras pesquisas na área da saúde, em diferentes contextos e por outros profissionais. Destaca-se ainda, o caráter inovador do apoio do softwareIRAMUTEQ no processamento dos dados na pesquisa qualitativa em saúde, pois o seu uso é recente no Brasil. Por ser uma ferramenta ágil, facilita a pesquisa e oportuniza análises mais consistentes e confiáveis.

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    Extraído da dissertação "Competências gerenciais dos enfermeiros na ampliação da Estratégia Saúde da Família", Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, Universidade Federal do Paraná, 2014.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Dez 2015

Histórico

  • Recebido
    10 Mar 2015
  • Aceito
    23 Set 2015
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