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Percepção dos docentes de enfermagem sobre a preservação da intimidade dos utentes pelos estudantes de enfermagem* * Artigo elaborado a partir de tese de doutoramento em enfermagem “Desenvolvimento de competências relacionais na preservação da intimidade durante o processo de cuidar”, Universidade Católica Portuguesa, 2014. .

Resumos

O objetivo deste estudo foi perceber como decorre o ensino-aprendizagem da preservação da intimidade do utente durante o processo de cuidar, pelos estudantes de enfermagem.Estudo descritivo-correlacional, abordagem qualitativa. Amostra não-probabilística por conveniência de 19 docentes de duas escolas. A recolha de dados foi feita através de uma entrevista semi-estruturada. No tratamento dos dados utilizaram-se os Softwares SPSS versão 20 e Alceste 2010. Respeitados os procedimentos éticos. A intimidade foi definida como a classe 3 do corpus das entrevistas. Definimos duas categorias (preservação da intimidade e processo de cuidar) e quatro subcategorias desta classe (preservação, relação empática, competências relacionais e competênciatécnico-científica).Os resultados apontam para a necessidade de se utilizarem metodologias reflexivas através de vivências e exemplos reais no processo de ensino-aprendizagem dos estudantes. Consideramos que a intimidade e a preservação da intimidade devem ser conceitos centrais da formação em enfermagem.

privacidade; competências; educação em enfermagem


The aim of this study was to assess the teaching-learning process related to patient privacy during the care process and the way nursing students’ protect patient privacy. Descriptive/correlational study using a qualitative approach and nonprobability sampling of 19 nurse educators from two schools of nursing. Data was collected using semi-structured interviews. Data analysis was undertaken using the SPSS version 20 and Alceste 2010 programs. The study complied with ethical standards. Two classes were assigned (protection of patient privacy and care process) with four subcategories (protection, empathy, relational competencies and technoscientific competencies).The findings show the need to adopt a reflective approach to the teaching-learning process by using experiential learning activities and real-life activities. We believe that intimacy and the protection of privacy should be core themes of nurse education and training.

privacy; competencies; nurse education


El objetivo de este estudio fue comprender cómo la enseñanza y el aprendizaje se lleva a cabo la preservación de la intimidad de los usuarios durante el proceso de la atención, los estudiantes de enfermería. Estudio descriptivo correlacional, enfoque cualitativo. Muestra no probabilística por conveniencia de 19 maestros de dos escuelas. La recolección de datos se realizó a través de una entrevista semi-estructurada. En el procesamiento de datos con el software SPSS versión 20 y Alceste 2010. Procedimientos éticos respetados. La intimidad se define como la clase 3 del corpus de entrevistas. Se definen dos categorías (de preservación de la intimidad y el proceso de atención) y cuatro subcategorías de esta clase (preservación, habilidades relacionales, empatía y experiencia técnica y científica). Los resultados apuntan a la necesidad de utilizar metodologías reflexivas a través de ejemplos y experiencias reales en el proceso de enseñanza-aprendizaje de los estudiantes. Creemos que la preservación de la intimidad y la intimidad debe ser conceptos centrales en la educación de enfermería.

privacidad; competencias; educación en enfermería


Introdução

A preservação da intimidade do utente é uma vertente do processo de cuidar que faz parte das competências éticas da profissão de enfermagem, porque a intimidade é um direito do utente que se liga à conceção de dignidade da pessoa e que está transcrita em vários documentos oficiais nacionais como internacionais, nomeadamente na Declaração de Lisboa sobre os direitos dos doentes, no código deontológico dos enfermeiros e na constituição Portuguesa.

O termo intimidade tem vários significados e foi analisado sob a visão de diferentes autores(11. Fortin N, Thériault J. Intimité et satisfaction sexuelle. Revue Sexologique [Internet].1995 [citado 01 Fev 2012]; 3 (1): 37-58. Disponível em: http://www.er.uqam.ca/nobel/revsexo/revues/revueSexo_v3n1.pdf
http://www.er.uqam.ca/nobel/revs...
).

Enquanto uns concetualizam a intimidade em termos de processos cognitivos e avaliativos de autorrevelação, outros em termos de interdependência e comportamento e outros ainda em termos de características da relação, tais como confiança, compromisso e afeto. No entanto, em todas estas conceções a presença das relações interpessoais são necessárias para o desenvolvimento de processos de intimidade, ou seja, no processo de cuidar no decurso do desenvolvimento das competências relacionais pode haver invasão da intimidade dos utentes. A intimidade pode ser concebida segundo diferentes dimensões nomeadamente a dimensão individual, relacional e geral, as quais variam consoante a circunstância em que decorre a inter-relação. A intimidade é uma questão de presença, que não tem muito a ver com o ato em si, mas com a qualidade da presença da pessoa em si própria e com a qualidade da presença para o outro(22. Bureau J. L'intimité et l'identité sexuelle: une approche existentielle. Revue Sexologique [Internet].1995 [citado 01 Fev 2012]; 3 (1): 37-58. Disponível em: http://www.er.uqam.ca/nobel/revsexo/revues/revueSexo_v3n1.pdf
http://www.er.uqam.ca/nobel/revsexo/revu...
). Já autores falam da intimidade terapêutica(33. Williams A. A literature review on the concept of intimacy in nursing.JAN[Internet]. 2001 [citado 27 Fev 2009]; 33 (5): 660-667. Disponível em: http://web.ebscohost.com/ehost/pdfviewer/pdfviewer?sid=fd1439d3-d010-4287-95d3-d3964bd6d8d8%40sessionmgr104&vid=2&hid=121
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), ou seja a intimidade que é necessária na relação enfermeiro-utente a qual é fundamental para o bem estar e recuperação do utente.

O exercício profissional da enfermagem “centra-se na relação interpessoal entre um enfermeiro e uma pessoa, ou entre um enfermeiro e um grupo de pessoas”, sendo que a relação terapêutica “caracteriza-se pela parceria estabelecida com o cliente, no respeito pelas suas capacidades”(44. Portugal. Ordem dos enfermeiros. Dados Estatísticos 2000-2012[Internet]. 2012[citado 09 jul 2012]. Disponível em: http://www.ordemenfermeiros.pt/membros/dados_estatisticos/index.html#/1/zoomed
http://www.ordemenfermeiros.pt/m...
), o que está acautelado, no artigo 8º do Regulamento do Exercício Profissional dos Enfermeiros (REPE), ponto1, onde é salvaguardado que “os enfermeiros devem adotar uma conduta responsável e ética e atuar no respeito pelos direitos e interesses, legalmente protegidos, dos cidadãos”(55. Portugal. Ministério da Saúde - Decreto-lei 161/96, Diário da República, I série - A, nº 205 de 04 de setembro. Regulamento do Exercício Profissional dos Enfermeiros [Internet]. 1996 [citado 24 Jul 2013]: 2959-2962. Disponível em: http://www.dre.pt/pdf1s/1996/09/205A00/29592962.pdf
http://www.dre.pt/pdf1s/1996/09/...
). O respeito pela intimidade do doente deve ser preservado durante todo o processo de cuidar, nomeadamente durante os cuidados de higiene, as consultas, o ensino, os tratamentos pré e pós operatórios, o transporte em maca e em todos os momentos do seu internamento. A preservação da intimidade é vista como uma componente básica do cuidar, ou seja a privacidade e a intimidade do utente deverão ser sempre asseguradas.

Na formação dos estudantes de Enfermagem, visa-se o desenvolvimento de competências, assentes na compreensão da dimensão ética dos cuidados de forma a “promover o desenvolvimento ético, com respeito pela autonomia das pessoas, pressupõe prudência, reflexão crítica, consciência de cidadania e de responsabilidade”(66. Bettencourt M. Tomada de posição sobre a segurança do cliente. Revista da Ordem dos Enfermeiros. 2008; (29): 57-62. Lisboa: Ordem dos Enfermeiros). Sendo assim, o modelo de formação em enfermagem deve assentar num processo reflexivo que proporcione aos estudantes a aquisição de posturas e condutas que lhe permitam a aquisição de competências profissionais.

Pretendemos, com as entrevistas aos docentes, perceber como decorre o processo de ensino-aprendizagem desta temática tão importante no processo de cuidar.

Método

Estudo descritivo – correlacional de abordagem qualitativa. A abordagem qualitativa é particularmente adequada ao estudo de fenómenos que não se podem tornar objetivos(77. LoBiondo-Wood G, Haber J. Pesquisa em Enfermagem: métodos, avaliação crítica e utilização. Rio de Janeiro: Editora. 2001.), sendo o centro dos métodos qualitativos a experiência humana e o sentido atribuído pelos indivíduos que vivem a experiência.

A população acessível, foram os docentes de uma Escola Superior de Enfermagem integrada numa Universidade (A) e de uma Escola Superior de Saúde integrada num Instituto Politécnico (B). Em relação à amostra do grupo de docentes de ambas as escolas, esta é uma amostragem não-probabilística por conveniência, ou seja foi o grupo de docente que estava acessível na altura em que foram efetuadas as entrevistas e que aceitou participar no estudo.

No total foram realizadas 19 entrevistas a docentes das duas escolas. As perguntas foram feitas de acordo com o guião elaborado, todas as entrevistas foram gravadas em áudio e tiveram uma duração média de cerca de 33 minutos. Foram cumpridos todos os procedimentos éticos e legais da pesquisa com seres humanos. Inicialmente foi pedido um parecer à Comissão de Ética de Saúde e Bem-estar da Universidade de Évora, o qual foi positivo para a realização do trabalho. De seguida foi feito o pedido individual ao diretor da escola A e à diretora da escola B tendo sido autorizada a realização do estudo em ambas as escolas. Em relação aos participantes, foi pedido o consentimento informado para a sua participação no estudo.

A informação obtida foi analisada com recurso ao Software Alceste 2010 (Analyse Lexicale par Contexte d’un Ensenble de Segments de Texte), de análise de dados qualitativos, de forma a fazer uma análise de conteúdo imparcial. A análise de conteúdo efetuada foi construída conjugando um sistema de categorias identificadas pela revisão da literatura e a divisão/categorização efetuada pelo Software.

Resultados

Em termos de caracterização, os docentes entrevistados das duas Escolas, foram maioritariamente do sexo feminino (89,5%), apresentando na sua maioria entre 41-50 anos com uma média de 47,6 anos e o grau académico de mestre (57,9% respetivamente). A maioria dos docentes tem como categoria profissional Professor Adjunto (84,2%), estando também a maioria na docência há 6-10 anos (52,6%), com uma média de 14,5 anos.

O processamento realizado no Software Alceste ocorreu em quatro etapas. Na primeira etapa o Software faz a leitura do corpus e o cálculo dos dicionários Unidades. No nosso estudo usamos duas classificações sucessivas, a classificação hierárquica descendente (CHD) e a classificação Hierárquica Ascendente (CHA). Após os resultados detalhados desta análise verificámos que há uma riqueza de vocabulário de 98,94%, o que corresponde à quase totalidade do corpus.

Na segunda etapa, após a análise do vocabulário, o Software Alceste passa ao corte do texto e à classificação em que “são selecionadas as formas reduzidas com frequência maior ou igual a 04”(88. Nascimento ARA, MenandroPRM. Análise lexical e análise de conteúdo: uma proposta de utilizaçãoconjugada [Internet]. Estudos e Pesquisas em Psicologia.2006 [citado 23 nov 2013]; Ano 6 (2): 72-88. Rio de Janeiro: Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Disponível em: http://www.revispsi.uerj.br/v6n2/artigos/pdf/v6n2a07.pdf
http://www.revispsi.uerj.br/v6n2...
).

Depois da fase de classificação, passamos à terceira etapa da análise do corpus, na qual obtemos o número de classes. No nosso estudo o Software estabeleceu 76 UCE, no mínimo, para definir cada classe e promoveu a distribuição do conjunto dos dados textuais em 3 classes diferentes por descendência hierárquica, numa percentagem de UCE classificado em 86%, correspondendo ao aproveitamento do material exposto à análise (Figura 1), portanto foram rejeitados 14% após análise.

Figura 1
Dendrograma da divisão das UCE em classes e classificação hierarquica descendente (Fonte: Alceste)

No que diz respeito aos percentuais definidores das classes, a classe 1 é composta por 669 UCE, representando 51% do total de UCEs, seguida da classe 3 com 452 UCE, representando 35% e por último a classe 2 com 178 UCE, representando 14% (totalizando 100% das unidades de contexto elementares). Verificámos também que a classe que mais UCE agrupou foi a classe 1 com 51%. As três classes originadas pela CHD abrangem contextos léxicos específicos, sendo cada uma denominada com um título: Classe 1 – Competências; Classe 2 – Relacional; Classe 3 – Intimidade

Esta etapa é das mais importantes da análise, pois ilustra as relações entre as classes, apresentando o dendrograma da CHD e a análise fatorial de correspondência realizada a partir da CHD(99. Camargo BV. Alceste: um programa informático de análise quantitativa de dados textuais, in: Moreira ASP, Camargo BV, Jesuíno JC, Nóbrega SM, organizadores. Perspectivas Teórico-metodológicas em representações sociais[Internet]. Editora Universitária – UFPB, Brasil. 2005 [citado 19 jul 2013] capitulo 17: 511-539.Disponível: http://www.laccos.org/pdf/Camargo2005_alc.pdf
http://www.laccos.org/pdf/Camarg...
).

As classes geradas abrangem contextos semânticos específicos, demostrados pelo valor do qui-quadrado, que se refere à raiz semântica da palavra que mais interferiu na classe. Portanto, quanto maior o valor do qui-quadrado, mais importante é a palavra para construção da classe. Relativamente à nossa temática apenas vamos recorrer à análise da classe 3 – Intimidade. Verificámos que as palavras aglutinadas nesta classe com maior carga fatorial são, pesso+, cuid+, intimid+, privacidade, preserv+. Nesta classe o centro está na raiz da palavra “pesso+” (Figura 2).

Figura 2
Rede de palavras da classe 3 (Fonte: Alceste)

A quarta etapa, é um prolongamento da etapa anterior, em que o software fornece as UCEs mais características de cada classe de palavras e ainda as Classificações Hierárquicas Ascendentes (CHAs) para cada classe (Fig. 3), permitindo assim o estudo das relações dos elementos interclasses(99. Camargo BV. Alceste: um programa informático de análise quantitativa de dados textuais, in: Moreira ASP, Camargo BV, Jesuíno JC, Nóbrega SM, organizadores. Perspectivas Teórico-metodológicas em representações sociais[Internet]. Editora Universitária – UFPB, Brasil. 2005 [citado 19 jul 2013] capitulo 17: 511-539.Disponível: http://www.laccos.org/pdf/Camargo2005_alc.pdf
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).

Por outro lado, verificámos que de acordo com as variáveis podemos saber quem mais contribuiu para a presença ou ausência de termos significativos que podem caracterizar cada classe. Relativamente à classe 3 – Intimidade - também se verificou a ausência de determinados termos, que parece estarem relacionados com a classe 1, tais como ano, ensin+, clin+, compet+, estud+, avali+. Para a construção da classe contribuíram maioritariamente sujeitos da Escola A, no intervalo de idades 31-40 anos, com o grau académico de licenciado, a categoria de professor coordenador e no intervalo de tempo na docência de 26-30 anos e 6-10 anos. Os que menos contribuíram foram os sujeitos da Escola B, com a categoria de professor adjunto, com o doutoramento, no intervalo de tempo na docência 21-25 anos e no intervalo de idades 41-50 anos.

Subsequentemente foi analisada a inserção da palavra no contexto dos discursos dos sujeitos em cada classe, através da análise de conteúdo, procurando “descobrir o conteúdo profundo, o significado verdadeiro”(1010. Sousa AB. Investigação em educação. Lisboa: Livros Horizonte, Lda. 2009.) de cada palavra identificada. As categorias definidas são descritivas(1010. Sousa AB. Investigação em educação. Lisboa: Livros Horizonte, Lda. 2009.) ou seja, não se introduziram interpretações do investigador, limitando-se a atribuir nomes às classes definidas pelo Software Alceste, assim como às subcategorias.

Relativamente à Classe 3 – Intimidade - e também através da CHA (Figura 3) verificou-se a divisão em categorias e subcategorias desta classe, havendo diferenças em relação à quantidade de palavras significativas para cada classe e subclasse.

Figura 3
Dendrograma da Classificação Hierárquica Ascendente da Classe 3 (Fonte: Alceste)

A utilização do Software Alceste, permitiu-nos fazer uma análise imparcial do corpus e foi o próprio sistema que selecionou as classes, das quais emergiram as categorias, conforme Tabela 1I.

Procedemos de seguida à discussão das UCE com maior significado retirados das entrevistas e que dão forma a análise de conteúdo do corpus.

Tabela 1
Categorias e subcategoria oriundas da classe 3

Os dados sociodemográficos dos docentes vão ao encontro do estudo publicado(1111. Portugal. Direção-Geral do Ensino Superior; Direção de Serviços de Suporte à Rede do Ensino Superior. INDEZ 2010: Pessoal no ensino superior público [Internet]. Lisboa: Direcção-Geral do Ensino Superior. 2011[citado 28 fev 2013]. Disponível em: http://www.dges.mctes.pt/NR/rdonlyres/99CEE606-990E-4CB4-A8AC-ACFAF7AAD58B/5817/EstudoINDEZ2010V13.pdf
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) em que a maioria do pessoal docente em instituições de natureza politécnica pertence à categoria de Professor Adjunto, apresentam como habilitações académicas maioritariamente a licenciatura (40%) e o mestrado (40%) e apenas 20% têm doutoramento, sendo o sexo feminino o mais representado e verificando-se que a faixa etária mais representada é a dos 36-45 anos.

Num dos estudos consultado(1212. Neto MCBRRV. Representação do cuidar em enfermagem: uma visão de professores e estudantes [Internet]. Dissertação de Mestrado em Estudos Sobre as Mulheres. Lisboa: Universidade Aberta. 2006 [citado 16 jan 2013].Disponível em: http://repositorioaberto.uab.pt/bitstream/10400.2/554/1/LC176.pdf
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) os docentes estavam em igualdade em termos de sexo, as idades apresentavam uma média mais baixa de 45,75 anos e os anos de docência tinham uma variação entre 2 e 20 anos. Um outro autor(1313. Mestrinho MG. Profissionalismo e competências dos professores de enfermagem [Tese Doutoramento em Enfermagem online], Lisboa: Universidade de Lisboa. 2011 [citado 07 jul 2012]. Disponível em: http://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/4227/2/ulsd061143_td_Maria_Mestrinho.pdf
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) diz-nos que os docentes pertenciam a cada categoria em igualdade, no entanto verificou que também a maioria era do sexo feminino, estava na docência há mais de 10 anos e a sua média de idades era de 49,4 anos. Também em outro estudo(1414. Carvalho AL. Avaliação da aprendizagem em ensino clínico da licenciatura em enfermagem. Lisboa: Instituto Piaget. 2004.) se verificou que a maioria dos docentes pertencia ao sexo feminino com idade média de 49,3 anos, tendo a amostra 57,1% de docentes com mestrado e 42,9% com licenciatura, a categoria profissional Professor Adjunto (78,6%) e estavam na docência, em média, há 17,6 anos.

Os docentes de enfermagem, no nosso estudo, fazem parte de uma das variáveis relatada como uma das mais importantes em Educação, a variável “professor”(1010. Sousa AB. Investigação em educação. Lisboa: Livros Horizonte, Lda. 2009.), ou seja é uma das variáveis mais importantes do processo ensino-aprendizagem, a qual pode influenciar os resultados da aquisição /desenvolvimento de competências dos estudantes. Em educação em enfermagem o docente tem um grande peso nos resultados da aprendizagem, tanto teóricos como práticos, fator que pode estar relacionado quer com a metodologia utilizada, quer com a atuação do docente. A sua principal responsabilidade, neste âmbito, é a de fazer a ligação entre o conhecimento científico e o contexto real onde o estudante irá contactar no seu processo de aprendizagem.

Quando analisamos a perceção dos docentes de enfermagem sobre a forma como os estudantes de enfermagem preservam a intimidade dos utentes verifica-se, no corpus analisado, que os docentes não relacionam a intimidade como um elemento das competências éticas.

A intimidade foi definida como a classe 3 do corpus das entrevistas em que o Software Alceste agrupou nesta classe palavras relacionadas com a intimidade do utente. Definimos a categoria preservação da intimidade a partir da leitura do corpus, destacando-se as palavras com raiz em, pesso+, intimidad+, privacidade, preserv+ e respeit+ com maior valor de qui quadrado.

No decurso das entrevistas pediu-se aos docentes que descrevessem o que significava para eles preservar a intimidade dos utentes, qual a importância que atribuíam a esse facto na prestação de cuidados, o que influencia ou não a preservação da intimidade e como transmitem e abordam os conhecimentos sobre preservação da intimidade.

Alguns docentes pronunciam-se sobre a intimidade como um cuidado que exige competências específicas e para outros significa respeitar o utente durante todo o processo de cuidar, não esquecendo o ambiente onde se prestam cuidados. Salientam ainda as diversas formas de comunicação que se utilizam (e como se utilizam) e acima de tudo relatam que a intimidade não é só física mas está presente em todas as dimensões do ser humano.

"(…) para mim é um cuidado, preservar e intimidade versos privacidade é um cuidado faz parte dos cuidados que nos temos que prestar e faz parte das competências dos enfermeiros portanto tem que ser uma competência do enfermeiro ele preservar a privacidade daquele (…)"

uce n° 110 Khi2 = 5 (uci n° 2 : *suj_02 *id_3 *sexo_2 *grauacad_2 *tempdoc_2 *catprof_1 *loc_1 *K_1)

A categoria preservação da intimidade foi dividida em duas subcategorias preservação e relação empática que se estabelece com o utente durante todo o processo de cuidar.

Relativamente à preservação as palavras associadas remetem todas elas para a própria categoria - o processo de cuidar o utente.

Na opinião dos docentes a privacidade é extremamente importante porque tem a ver com o que é de mais íntimo na pessoa e relacionam-na com o que se refere ao corpo, o que se refere aos aspetos da vida íntima da pessoa ou aquilo que a pessoa nos conta do seu histórico. Consideram também que os estudantes têm que ser preparados, ter competências para lidar com essa privacidade e perceber a sua importância, pois é um direito que faz parte das relações interpessoais, que é necessário preservar, “o direito aponta o seguinte: respeita o outro, mesmo que te seja estranho, promove o bem comum, não faças nada para o prejudicar”(1515. Ferreira M, Dias MO. Ética e profissão: relacionamento interpessoal em enfermagem. Loures: Lusociência - Edições Técnicas e Cientificas, Lda. 2005.). Por outro lado, também salientam que preservar a intimidade é respeitar o outro como um todo, um ser com ideias que tem os seus princípios, o seu modo de ser e de agir.

A preservação da intimidade transmite aos cuidados uma dimensão humana, podendo ser considerada um princípio ético e um valor inerente ao ato de cuidar.

"(…) privacidade da pessoa o respeito pela pessoa e pelo processo de cuidados portanto eu acho que faz todo o sentido é algo inerente ao próprio processo de cuidados portanto a importância que atribuo é elevadíssima significa assim cuidar de (…)"

uce n° 687 Khi2 = 10 (uci n° 11: *suj_11 *id_3 *sexo_2 *grauacad_3 *tempdoc_3 *catprof_1 *loc_2 *K_1)

"(…) que nos estamos a lidar com a intimidade da pessoa algo muito pronto que e da própria pessoa que nos temos que respeitar e temos que perceber até onde e que podemos ir e de facto tentar estabelecer uma relação de modo a deixar a pessoa mais (…)"

uce n° 964 Khi2 = 7 (uci n° 14 : *suj_14 *id_3 *sexo_2 *grauacad_3 *tempdoc_2 *catprof_1 *loc_2 *K_2)

A metodologia utilizada pelos docentes centra-se essencialmente nas vivências e exemplos reais. No entanto, se há docentes que referem algumas dificuldades em abordar esta temática, há outros que revelam que primeiro abordam as conceções dos conceitos de intimidade e de privacidade, para de seguida partir para a reflexão através de situações concretas. Também se referem a momentos de laboratório em ambiente artificial com os manequins e momentos em contexto de prestação de cuidados com os utentes. Para reduzir a divergência entre teoria e prática devem-se promover reflexões sobre as temáticas apresentadas teoricamente e as aprendizagens em contexto real de cuidados de modo a promover a eficácia na docência(1313. Mestrinho MG. Profissionalismo e competências dos professores de enfermagem [Tese Doutoramento em Enfermagem online], Lisboa: Universidade de Lisboa. 2011 [citado 07 jul 2012]. Disponível em: http://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/4227/2/ulsd061143_td_Maria_Mestrinho.pdf
http://repositorio.ul.pt/bitstre...
).

"(…) como transmito para já há a parte teórica, por assim dizer que expressada oralmente, as vezes, damos exemplos práticos, nas aulas práticas pela demonstração de como e que se pode fazer sem, nomeadamente na prestação de cuidados de higiene nas mobilizações nas mudanças de posicionamento quando se fazem determinados procedimentos mais invasivos obviamente que se reforça essa ideia nas aulas práticas há também os tais exemplos (…)"

uce n° 784 Khi2 = 0 (uci n° 12 : *suj_12 *id_3 *sexo_2 *grauacad_2 *tempdoc_2 *catprof_1 *loc_2 *K_3)

Nos discursos dos docentes outra das palavras que associam à preservação da intimidade é o respeito que se deve ter pelo utente no processo de cuidar e assim, alguns realçam a falta de maturidade dos estudantes para compreenderem este aspeto e por outro lado a formação pessoal de cada estudante que é também muito importante para adquirirem esta competência.

Ainda na categoria preservação da intimidade definimos a subcategoria relação empática. Em enfermagem o cuidar fundamenta-se numa inter-relação entre o utente e o cuidador, sendo esta relação o eixo central do processo de cuidar, pois o utente torna-se uma pessoa vulnerável que requer cuidados humanizados e personalizados baseados em conhecimentos e atitudes adequadas que exigem ao estudante um cuidado de qualidade, aliando o “saber fazer”, o “saber estar” e o “saber ser” e é precisamente nesta última competência que se inclui a empatia. A relação empática é um dos requisitos mais importantes na inter-relação com o utente. A empatia tem como finalidade compreender o utente e manifestar essa compreensão, para isso é necessário manter o respeito pelo utente, preservando assim a sua intimidade(1616. Lazure, H. Viver a relação de ajuda, Lisboa: Lusodidacta. 1994.).

"(…) respeito que o profissional tem para com a outra pessoa. Cuidar de forma humanizada é cuidar entendendo ao outro nas suas e varias vertentes isso nos dizemos que somos humanos somos seres humanos isso agora a questão do termo humanizado tem sido muito falado ultimamente mas para mim o cuidar de (…)"

uce n° 451 Khi2 = 8 (uci n° 7 : *suj_07 *id_3 *sexo_2 *grauacad_2 *tempdoc_2 *catprof_1 *loc_1 *K_3)

Nesta subcategoria emergem também outras exigências para a relação empática, nomeadamente a humanização dos cuidados prestados pelos estudantes. Efetivamente, o respeitar o utente é aceitar humanamente a sua realidade, com as suas experiências e demonstrando-lhe verdadeira consideração, aceitando-o como ele é, como ser único.

Na categoria processo de cuidar em enfermagem definimos duas subcategorias de acordo com a divisão feita pelo programa Alceste, competências relacionais e competência técnico-científica. Nesta categoria processo de cuidar, o cuidar depende de um processamento de cuidados que se constrói a partir de uma mobilização de competências que interagem entre si com o objetivo de satisfazer as necessidades do utente(1717. Collière MF. Promover a vida: da prática das mulheres de virtude aos cuidados de enfermagem. Lisboa: Sindicato dos Enfermeiros Portugueses. 1989.). Portanto, compreender o significado da vida para o utente no processo de cuidar, inclui não somente competências técnicas, mas também a competência de compreensão e aceitação do utente como ele é, como está no seu mundo e como desenvolve a sua identidade(1818. Bettinelli LA, Waskievicz J, Erdmann AL. Humanização do cuidado no ambiente hospitalar. In: O Mundo da Saúde. [Internet]. 2003 [citado 18 mai 2012]. Ano 27. 27(2): 231-239 Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/is_digital/is_0403/pdf/IS23(4)111.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/is...
).

A prestação de cuidados não pode estar desvinculada e descontextualizada do utente na sua totalidade e da especificidade das suas necessidades. Logo devemos valorizar o utente como um todo pois se isto acontecer não estamos a prestar cuidados atendendo às suas dimensões física, psíquica, social e espiritual.

"(…) mais uma boa prestação de cuidados e um todo portanto nos não podemos estar a dividir essa prestação de cuidados em partes ou avaliarmos a atuação daquele aluno, a prestação de cuidados daquele aluno ao utente globalmente e percebermos que ele manipula também os aspetos técnicos como manipula bem os aspetos que estão inerentes as questões relacionais portanto isto-e um dois em um não podemos separar (…)"

uce n° 294 Khi2 = 9 (uci n° 4 : *suj_04 *id_4 *sexo_2 *grauacad_2 *tempdoc_5 *catprof_2 *loc_1 *K_3)

Alguns docentes salientam, nos seus discursos, que a privacidade é inerente e fundamental em todo o processo de cuidar. Se o enfermeiro não atender a esta dimensão do cuidar, então não se trata de um cuidado de enfermagem.

"(…) E assim se nos cuidados o humanizado já devia estar implícito no cuidar portanto não pode ser separado portanto quando se cuida o humano está lá dentro portanto cuidar de forma humanizada para mim é pleonasmo não pode haver cuidar de forma humanizada (…)"

uce n° 103 Khi2 = 19 (uci n° 2: *suj_02 *id_3 *sexo_2 *grauacad_2 *tempdoc_2 *catprof_1 *loc_1 *K_1)

Existe uma linha ténue entre o que se deve ou não fazer e dizer no contacto com o utente e isso, por vezes, é uma barreira difícil de manter pelos estudantes de enfermagem. Tal como verificámos anteriormente, alguns não a conseguem manter e ultrapassam-na invadindo a intimidade dos utentes, mas esta é uma invasão muitas vezes inconsciente, mas que apesar disso deixa o utente vulnerável na sua condição de ser humano, num ambiente adverso. A enfermagem é baseada numa relação simétrica, em que por parte do estudante se traduz numa necessidade para humanizar o processo de cuidar(1818. Bettinelli LA, Waskievicz J, Erdmann AL. Humanização do cuidado no ambiente hospitalar. In: O Mundo da Saúde. [Internet]. 2003 [citado 18 mai 2012]. Ano 27. 27(2): 231-239 Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/is_digital/is_0403/pdf/IS23(4)111.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/is...
). Logo, é importante que a nível da sua formação esta seja uma temática abordada e constitua um dos objetivos do ensino-aprendizagem, pois aquisição de uma competência requer, “o domínio prévio ou paralelo dos fundamentos teóricos dessa competência”(1717. Collière MF. Promover a vida: da prática das mulheres de virtude aos cuidados de enfermagem. Lisboa: Sindicato dos Enfermeiros Portugueses. 1989.).

"(…) é uma das coisas logo fundamentais que nos abordamos com os estudantes portanto e importância de manter portanto a intimidade da pessoa e de respeitar a pessoa. Cuidar de forma humanizada significa cuidar olhar portanto cuidar da pessoa como uma pessoa o ser o ser que ela e é portanto não olhar apenas em termos físicos mas sim também em termos do que a pessoa esta a sentir quando estamos a prestar (…)"

uce n° 957 Khi2 = 9 (uci n° 14: *suj_14 *id_3 *sexo_2 *grauacad_3 *tempdoc_2 *catprof_1 *loc_2 *K_2)

A primeira subcategoria foi nomeada de competências relacionais, de onde se salientam as palavras com raiz em modo, chav+, inerente, cuid+, humaniz+, fis+, signific+, cuidados e prest+. Para alguns docentes a humanização dos cuidados é uma palavra “chavão”, pois segundo os mesmos aos cuidados de enfermagem está sempre inerente a humanização. O enfermeiro ao ser responsável pela humanização dos cuidados tem o dever de conceder uma prestação total de cuidados ao utente, inserido na família e na comunidade, criando também um ambiente adequado para o desenvolvimento das capacidades do utente(44. Portugal. Ordem dos enfermeiros. Dados Estatísticos 2000-2012[Internet]. 2012[citado 09 jul 2012]. Disponível em: http://www.ordemenfermeiros.pt/membros/dados_estatisticos/index.html#/1/zoomed
http://www.ordemenfermeiros.pt/m...
). A palavra humanizar está ligada ao cuidado e no corpus das entrevistas está patente esta relação, pois quando os docentes falam em cuidado, esta vem sempre acompanhada da palavra humanizar.

"(…) cuidar de forma humanizada, humanização é um chavão e humanizar também é um chavão no entanto esse conceito esta muito ligado ao personalizar e individualizar para isso é importante conhecer a pessoa e conhecer as necessidades daquela pessoa para corresponder (…)"

uce n° 347 Khi2 = 16 (uci n° 5: *suj_05 *id_3 *sexo_2 *grauacad_2 *tempdoc_2 *catprof_1 *loc_1 *K_1)

"(…) cuidado humanizado competências relacionais assim em poucas palavras, e saber estar com o outro e compreender o outro e no fundo o outro perceber que esta a ser cuidado e que esta a ser ajudado não só ele mas também a família sobretudo."

uce n° 453 Khi2 = 13 (uci n° 7 : *suj_07 *id_3 *sexo_2 *grauacad_2 *tempdoc_2 *catprof_1 *loc_1 *K_3)

O cuidado de enfermagem deve ser um cuidado humanizado e que tem em conta a intimidade do utente. Podemos verificar que alguns docentes realçam que o cuidado é humanizado, mas por outro lado realçam a importância da intimidade ou seja fazem uma distinção entre a humanização e a preservação da intimidade do utente, como se o cuidado humanizado não significasse prestar cuidados tendo em conta a intimidade do utente. No entanto, outros consideram a palavra humanização uma redundância, pois nela está incluído o cuidar tendo sempre em conta a intimidade do utente.

A subcategoria competência técnico-científica definida a partir da categoria (processo de cuidar), foi definida com base no discurso dos docentes e tem como palavras dados, lugar, higiene, corpo, exposição, entend+, cliente, atend+ e expor, sendo as mais importantes corpo e atend+, ou seja com qui-quadrado mais elevado.

No processo de cuidar existem procedimentos técnicos e relacionais, sendo por isso um processo dinâmico que se desenvolve na interação entre os dois tipos de procedimentos e sem os quais não se poderia satisfazer as necessidades do utente. Há autores que se referem ao enfermeiro como “estar em relação”(1616. Lazure, H. Viver a relação de ajuda, Lisboa: Lusodidacta. 1994.) a qual significa não só a presença física, mas também todo o seu ser, ou seja as suas competências em todas as suas dimensões. Nesta subcategoria, os docentes relatam que a privacidade dos utentes deve ser salvaguardada em todas as etapas do processo de cuidar, desde a colheita de dados através da entrevista inicial até à prestação dos cuidados e avaliação dos mesmos. Os estudantes devem ser despertos para a necessidade e importância de respeitarem a privacidade quando prestam cuidados aos utentes qualquer que seja o cuidado, tendo igualmente atenção o ambiente, o que perguntam e à forma como perguntam, não esquecendo o tom de voz, assim como a postura que adotam perante o utente. Em qualquer momento deste processo para além das competências técnicas e das competências relacionais bem desenvolvidas devem ter em atenção a intimidade dos utentes.

"(…) relacionais da relação interpessoais em todos os momentos a privacidade e necessária não sei se se refere a questão do guardar os dados o que eu estava a querer dizer e que de uma forma geral a privacidade e sempre imprescindível quer sejam (…)"

uce n° 533 Khi2 = 13 (uci n° 8: *suj_08 *id_4 *sexo_2 *grauacad_3 *tempdoc_5 *catprof_2 *loc_1)

Nos discursos dos docentes verificámos que um dos cuidados que mais dificuldades, apresenta para os estudantes, são os cuidados de higiene, pois são cuidados em que os estudantes têm que manipular o corpo do utente e em que a preocupação com o domínio da técnica, dificulta a capacidade de se centrarem simultaneamente na componente relacional. Sabemos que no processo de cuidar existem procedimentos técnicos e relacionais, sendo por isso um processo dinâmico que se desenvolve na interação entre os dois tipos de procedimentos e sem os quais não se poderia satisfazer as necessidades do utente.

Emerge assim, uma outra conotação para o processo relacional do cuidado, que é a intimidade e a necessidade de em todo o processo de cuidar, respeitar o utente na sua globalidade e não apenas quando se está a expor alguma parte do corpo. Aos estudantes deverá ser transmitido que a intimidade não está apenas presente na exposição do corpo, mas em todo o processo de prestação de cuidados e em todo o envolvimento direto indireto e comunicação verbal ou não verbal.

Conclusão

Ao longo da formação devemos considerar sempre o estudante como uma pessoa que está em mudança através do processo ensino-aprendizagem já que “aprender é um termo cujo significado complexo envolve processos de maturidade, pensamento, comportamento e mudança”(1919. Ferreira M. Formar Melhor Para Um Melhor Cuidar [Internet].Millenium - Revista do ISPV. 2004 [citado 18 jul 2012]; (30): 123-137. Disponível em: http://www.ipv.pt/millenium/millenium30/10.pdf
http://www.ipv.pt/millenium/mill...
) que estimulam a aprendizagem e influenciam a forma como esta se processa ao longo do curso. A aprendizagem pode considerar-se como o resultado do método de aprender, o qual leva à modificação do comportamento, podendo abarcar transformações no modo de pensar, de sentir ou de agir do estudante de enfermagem(1919. Ferreira M. Formar Melhor Para Um Melhor Cuidar [Internet].Millenium - Revista do ISPV. 2004 [citado 18 jul 2012]; (30): 123-137. Disponível em: http://www.ipv.pt/millenium/millenium30/10.pdf
http://www.ipv.pt/millenium/mill...
).

Dos discursos dos docentes ressalta a complexidade na abordagem da temática da preservação da intimidade com a conotação que deve ter a nível do processo de cuidar, pois percebe-se que ao serem abordados temas relacionados com as competências relacionais ou com a componente instrumental dos cuidados, não é estabelecida a relação com a preservação da intimidade do utente e os cuidados a ter nesse sentido.

Salvaguarda-se precisamente a importância da formação para o desenvolvimento de competências e capacidades mentais fundamentais para a prática de cuidados de enfermagem humanizados(2020. Abreu WC. Identidade, formação e trabalho: das culturas locais às estratégias identitárias dos enfermeiros. Coimbra: Formasau-formação e saúde, Lda. 2001.). Nesta perspetiva, considera-se de extrema importância a presença desta temática na formação dos estudantes, para que vão “interiorizando” como realizar a preservação da intimidade ao longo da sua formação e mesmo do seu percurso profissional. O processo de ensino-aprendizagem nunca estará completo se os estudantes não adquirirem competências relacionais e habilidades que lhes permitam preservar a intimidade dos utentes em todo o processo de cuidar.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Dez 2014

Histórico

  • Recebido
    30 Abr 2014
  • Aceito
    16 Jul 2014
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