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Fatores associados à incidência de úlcera por pressão durante a internação hospitalar

Resumo

OBJETIVO

Estimar a taxa de incidência de úlcera por pressão e verificar fatores associados a essa ocorrência em uma coorte de pacientes hospitalizados.

MÉTODO

Trata-se de estudo de coorte no qual o desfecho foi a ocorrência da úlcera por pressão. A estimativa do efeito das variáveis para a proporção de incidência acumulada do desfecho foi realizada utilizando o modelo de riscos proporcionais de Cox. A seleção das variáveis ocorreu por meio do teste de hipóteses Logrank.

RESULTADOS

A amostra foi composta de 442 adultos, com 25 casos incidentes de úlcera por pressão. Pacientes com altos escores na escala de Braden apresentaram maior risco de incidência de úlcera por pressão quando comparados com aqueles classificados na categoria de baixo escore.

CONCLUSÃO

Os resultados reforçam a importância do uso da Escala de Braden para auxiliar na identificação dos pacientes com maior probabilidade de desenvolver úlcera por pressão.

Descritores
Úlcera por Pressão; Pacientes Internados; Incidência; Análise de Sobrevida; Cuidados de Enfermagem.

Abstract

OBJECTIVE

Estimating the incidence rate of pressure ulcers and verifying factors associated with this occurrence in a cohort of hospitalized patients.

METHOD

This is a cohort study in which the considered outcome was the time until pressure ulcer occurrence. Estimated effect of the variables on the cumulative incidence ratio of the outcome was performed using the Cox proportional hazards model. Variable selection occurred via the Logrank hypothesis test.

RESULTS

The sample consisted of 442 adults, with 25 incidents of pressure ulcers. Patients with high scores on the Braden scale presented a higher risk of pressure ulcer incidence when compared to those classified into the low score category.

CONCLUSION

These results reinforce the importance of using the Braden Scale to assist in identifying patients more likely to develop pressure ulcers.

Descriptors
Pressure Ulcer; Inpatients; Incidence; Survival Analysis; Nursing Care.

Resumen

OBJETIVO

Estimar la tasa de incidencia de úlcera por presión y verificar factores asociados a esa ocurrencia en una cohorte de pacientes hospitalizados.

MÉTODO

Se trata de estudio de cohorte en el que el resultado fue la ocurrencia de la úlcera por presión. La estimación del efecto de las variables para la proporción de incidencia acumulada del resultado fue realizada utilizando el modelo de riesgos proporcionales de Cox. La selección de las variables ocurrió mediante el test de hipótesis de Log-Rank.

RESULTADOS

La muestra estuvo compuesta de 442 adultos, con 25 casos incidentes de úlcera por presión. Pacientes con altos puntajes en la escala de Braden presentaron mayor riesgo de incidencia de úlcera por presión cuando comparados con aquellos clasificados en la categoría de bajo escore.

CONCLUSIÓN

Los resultados refuerzan la importancia del empleo de la Escala de Braden para auxiliar la identificación de los pacientes con mayor probabilidad de desarrollar úlcera por presión.

Descriptores
Úlcera por Presión; Pacientes Internos; Incidencia; Análisis de Supervivencia; Atención de Enfermería.

Introdução

As úlceras por pressão (UP) representam importante desafio em relação aos cuidados prestados aos pacientes hospitalizados, pois impactam significativamente a sua morbimortalidade e qualidade de vida11 Gorecki C, Nixon J, Madill A, Firth J, Brown JM. What influences the impact of pressure ulcers on health-related quality of life? A qualitative patient-focused exploration of contributory factors. J Tissue Viability. 2012;21(1):3-12.-22 Moore ZE, Webster J, Samuriwo R. Wound-care teams for preventing and treating pressure ulcers. Cochrane Database Syst Rev. 2015;(9):CD011011.. Além disso, o tratamento dessas feridas é, muitas vezes, prolongado e de alto custo22 Moore ZE, Webster J, Samuriwo R. Wound-care teams for preventing and treating pressure ulcers. Cochrane Database Syst Rev. 2015;(9):CD011011.-33 Chou R, Dana T, Bougatsos C, BlazinaI, Starmer A, Reitel K, et al. Pressure ulcer risk assessment and prevention: comparative effectiveness [Internet]. Rockville: Agency for Healthcare Research and Quality; 2013 [cited 2016 Apr 25]. Available from Available from http://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK143579/
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK143...
e a sua ocorrência é um importante indicador de qualidade assistencial.

A maioria dos pacientes que desenvolvem UP tem condições precárias de saúde física ou mental44 Bhattacharya S, Mishra RK. Pressure ulcers: current understanding and newer modalities of treatment. Indian J Plast Surg. 2015;48(1):4-16., ou outros agravos, tornando essas lesões de etiologia multifatorial. Podem ter causas diretas, como a pressão e a fricção nos tecidos; perda de sensibilidade ou imobilidade, e causas indiretas, como a longa permanência em setores de internação; a idade avançada; a presença de distúrbios neurológicos, câncer e outras comorbidades; o uso de drogas vasoativas, além da desnutrição44 Bhattacharya S, Mishra RK. Pressure ulcers: current understanding and newer modalities of treatment. Indian J Plast Surg. 2015;48(1):4-16.

5 Brito PA, Generoso SV, Correia MITD. Prevalence of pressure ulcers in hospitals in Brazil and association with nutritional status: a multicenter, cross-sectional study. Nutrition. 2013;29(4):646-9.

6 Costa ACO, Pinho CPS, Santos ADA, Nascimento ACS. Pressure ulcer: incidence and demographic, clinical and nutrition factors associated in intensive care unit patients. Nutr Hosp. 2015;32(5):2242-52.
-77 Perrone F, Paiva AA, Souza LMI, Faria CS, Paese MCS, Aguilar-Nascimento JE, et al. Estado nutricional e capacidade funcional na úlcera por pressão em pacientes hospitalizados. Rev Nutr (Campinas). 2011;24(3):431-8..

Diante da complexidade desses fatores, são observadas altas incidências de UP em diversos setores hospitalares. Estudo multicêntrico conduzido em unidades de internação no Brasil demonstrou frequência de 17% de pacientes com UP, sendo a maioria portadora de mais de uma lesão, principalmente nas regiões sacral, trocantérica, do calcâneo, costas e cotovelo55 Brito PA, Generoso SV, Correia MITD. Prevalence of pressure ulcers in hospitals in Brazil and association with nutritional status: a multicenter, cross-sectional study. Nutrition. 2013;29(4):646-9.. Em unidades de terapia intensiva, essa proporção pode variar de 29 a 53%66 Costa ACO, Pinho CPS, Santos ADA, Nascimento ACS. Pressure ulcer: incidence and demographic, clinical and nutrition factors associated in intensive care unit patients. Nutr Hosp. 2015;32(5):2242-52.,88 Bezerra SMG, Pereira LC, Luz MHBA, Santana WS. Incidência de úlceras por pressão em uma Unidade de Terapia Intensiva de um hospital público. Rev Enferm UFPI. 2014;2(4):21-7..

Nesse contexto, as altas frequências de UP demandam a identificação precoce dos pacientes com elevada probabilidade de desenvolver tais lesões99 Qaseem A, Mir TP, Starker M, Denberg T. Risk assessment and prevention of pressure ulcers: a clinical practice guideline from the American College of Physicians. Ann Intern Med. 2015;162(5):359-69.. Uma maneira de mensurar esse risco é a utilização da Escala de Braden, que aborda fatores intrínsecos e extrínsecos, tais como a percepção sensorial, umidade, atividade, mobilidade, nutrição, fricção e cisalhamento1010 Borghardt AT, Prado TN, Araújo TM, Rogenski NMB, Bringuente MEO. Evaluation of the pressure ulcers risk scales with critically ill patients: a prospective cohort study. Rev Latino Am Enfermagem. 2015;23(1):28-35.. Essa avaliação tem se mostrado válida na predição de feridas, possibilitando a implementação de medidas preventivas pela equipe multidisciplinar1010 Borghardt AT, Prado TN, Araújo TM, Rogenski NMB, Bringuente MEO. Evaluation of the pressure ulcers risk scales with critically ill patients: a prospective cohort study. Rev Latino Am Enfermagem. 2015;23(1):28-35.-1111 Miller N, Frankenfield D, Lehman E, Maguire M, Schirm V. Predicting pressure ulcer development in clinical practice: evaluation of Braden Scale Scores and nutrition parameters. J Wound Ostomy Continence Nurs. 2016;43(2):133-9..

Para o nosso conhecimento, no Brasil existem poucos estudos longitudinais que avaliam os determinantes da UP e a sua incidência em pacientes internados em setores específicos. Diante dessa realidade, torna-se necessário o entendimento dos fatores associados ao desenvolvimento da UP na clínica médica, cujo tempo de permanência do paciente é maior que em clínicas de cuidado agudo. Acredita-se que pesquisas relacionadas à temática possam otimizar o planejamento de medidas preventivas na assistência oferecida pelos profissionais de enfermagem e promover a redução do evento adverso úlcera por pressão.

Portanto, propõe-se, com este estudo, estimar a taxa de incidência de UP em uma coorte de pacientes hospitalizados na clínica médica e verificar os fatores associados a essa ocorrência.

Método

Trata-se de estudo de coorte prospectivo. Os participantes foram recrutados em um hospital universitário integrado ao Sistema Único de Saúde (SUS), na cidade de Belo Horizonte, Minas Gerais. A população foi constituída por todos os pacientes adultos, internados nos 67 leitos de Unidade de Internação. A amostra de conveniência foi composta por uma coorte aberta de todos os pacientes internados no período de maio a novembro de 2012.

A coleta de dados foi realizada durante seis meses por uma equipe de dois enfermeiros, funcionários do hospital em estudo e uma estudante do curso de graduação em enfermagem, todos devidamente treinados. Foi utilizado formulário estruturado com questões relacionadas aos aspectos sociodemográficos e clínicos, registrados no prontuário dos pacientes e por meio de observação direta.

Ressalta-se que a supervisão de campo foi realizada por docentes e pesquisadores enfermeiros, assim como o treinamento dos entrevistadores para a coleta de dados. Tal treinamento se constituiu de uma etapa teórica e outra prática. O questionário foi testado previamente ao início da coleta de dados, inclusive por meio do teste Kappa para concordância da aplicabilidade da Escala de Braden entre os entrevistadores.

A UP foi definida como “uma ferida na pele ou tecido subjacente, geralmente localizada sobre uma proeminência óssea, como resultado da pressão nesta área ou da pressão em combinação com cisalhamento” ou fricção ou da combinação das três forças1212 National Pressure Ulcer Advisory Panel; European Pressure Ulcer Advisory Panel and Pan Pacific Pressure Injury Alliance. Prevention and treatment of pressure ulcers: quick reference guide. Cambridge Media: Osborne Park; 2014..

O desfecho ou variável dependente foi o tempo até o aparecimento da UP. A variável evento foi o aparecimento de UP, que assumiu valor 1, se o evento ocorreu, e 0, se foi censurado (perdas de observação durante o seguimento ou alta). Foi realizada análise comparativa entre as perdas e a amostra final e não foram verificadas diferenças significativas entre elas.

O método utilizado para o cálculo das estimativas de incidência de UP foi a densidade de incidência, na qual o denominador foi o número de pacientes-dia, considerado a partir do 1o dia da internação de cada paciente em Unidade de Internação até o aparecimento da UP. A coorte foi acompanhada por pelo menos 10 dias de hospitalização e por, no máximo, 80 dias.

As variáveis independentes incluídas neste estudo foram: faixa etária (adultos ‒ entre 18 e 60 anos e idosos ‒ indivíduos com mais de 60 anos de idade); sexo (masculino ou feminino); cor de pele autorreferida (branca ou parda + negra); tabagismo (não fumante, fumante ou ex-fumante); escores da Escala de Braden e índice de massa corporal (IMC).

A pontuação máxima da Escala de Braden é 23 e a mínima, 6, sendo consideradas as faixas de classificação de risco: > 18, sem risco; 15 a 18, risco baixo; 13 a 14, risco moderado; 10 a 12, risco alto; e abaixo ou igual a 9, risco muito alto1313 Brasil. Ministério da Saúde; Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Programa Nacional de Segurança do Paciente. Protocolo para Prevenção de Úlcera por Pressão. Brasília: Fiocruz; 2013.. Neste estudo, foi considerado o escore original da Escala de Braden, conforme os valores validados, mas também considerando a mediana da variável. Assim, posteriormente, optou-se pela união das categorias de classificação em baixo risco (13 a 18 ou mais) e alto risco (inferior a 13).

O IMC, por sua vez, foi calculado e categorizado segundo recomendações preconizadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS)1414 World Health Organization. Physical status: the use and interpretation of anthropometry. Geneva: WHO; 1995. . Esse dado foi utilizado para avaliação do estado nutricional dos pacientes internados: foram considerados pacientes desnutridos os com IMC < 18,5; eutróficos os com IMC ≥ 18,5 e < 25 e com excesso de peso aqueles com IMC ≥ 25 kg/m2.

A análise descritiva das variáveis categóricas foi apresentada por meio da frequência absoluta e percentual e, das variáveis contínuas, por meio da mediana e do intervalo interquartílico (IQ), devido à ausência de distribuição simétrica.

Para calcular a densidade de incidência de UP (análise univariada), foram obtidas estimativas não paramétricas por meio da técnica de análise de sobrevida de Kaplan-Meier (KM) e o teste Logrank para comparação das curvas acumuladas de incidência.

O modelo multivariado de fatores associados à incidência de UP foi construído por meio da técnica de regressão de Cox, tendo como medida de associação o HR (Hazard Ratio) e intervalos de confiança de 95%. A seleção prévia de potenciais variáveis de confusão foi estabelecida com valores de p < 0,20, entretanto, no modelo final foram mantidas apenas as variáveis que obtiveram o nível de significância p < 0,05. As técnicas estatísticas foram realizadas com o auxílio do programa estatístico Stata, versão 14.0.

A realização do estudo foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais (Parecer nº 02297412.1.0000.5149), e aos pacientes ou responsáveis foram solicitadas aprovação para participarem do estudo, leitura e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. O estudo seguiu a regulamentação descrita na Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde.

Resultados

A amostra foi composta de 442 adultos e a mediana de permanência de internação hospitalar foi de 22 dias (IQ=16-35). Foram registrados 25 casos incidentes de UP, sendo 10.324 o número de pacientes-dia. Desta forma, a densidade de incidência foi de 2,42/1.000 pessoas-dia (IC95%=1,63-3,58).

A descrição das variáveis e a incidência de UP na amostra encontram-se na Tabela 1. Deve-se esclarecer que, devido às diferentes taxas de não respostas para as variáveis estudadas, os totais dos números de pacientes podem variar.

Verificou-se que a mediana do IMC foi de 23,44 kg/m2 (IQ=20,76-27,34). Observou-se o predomínio de indivíduos com faixa etária entre 18 e 60 anos (275 ou 62,22%), do sexo feminino (243 ou 54,98%), da cor de pele parda e negra (223 ou 51,15%), não tabagistas (225 ou 51,96%), sem risco, conforme escores originais da Escala de Braden (265 ou 59,95%), e de eutróficos (179 ou 49,04%).

Tabela 1
Descrição das variáveis e incidência de UP na amostra - Belo Horizonte, MG, Brasil, 2012

A Tabela 2 mostra as densidades de incidência da variável desfecho de acordo com as variáveis independentes do estudo.

Tabela 2
Densidades de Incidência da variável desfecho, segundo variáveis independentes do estudo - Belo Horizonte, MG, Brasil, 2012.

Na Figura 1 é apresentada a função de risco acumulado de UP, que estima o risco de desenvolvimento da UP durante um período específico de tempo para a população total.

Figura 1
Proporção de risco acumulado de UP - Belo Horizonte, MG, Brasil, 2012.

A proporção de risco acumulado dos indivíduos com idade superior a 60 anos de idade não foi estatisticamente maior quando comparada com os de 18 a 60 anos. Também não houve significância estatística quando se comparou os pacientes quanto ao sexo, cor da pele, tabagismo e estado nutricional.

Na Figura 2 são apresentadas as funções de risco acumulado de UP, segundo as categorias dos escores da Escala de Braden. Verificou-se, com significância estatística (p<0,01), maior proporção de risco acumulado nos indivíduos de alto risco (escore inferior a 13) em relação à outra categoria (baixo risco - escore de 13 a 18 ou mais). Situação similar foi verificada com as categorias do escore original da Escala de Braden (p<0,01) (figura não apresentada).

Figura 2
Proporção de risco acumulado de UP, segundo as categorias dos escores agrupados da Escala de Braden - Belo Horizonte, MG, Brasil, 2012

Na Tabela 3 são apresentados Razões de Hazard Ratio (HR) e IC95% para UP. Não foram observadas diferenças estatisticamente significativas em relação à incidência de UP em pacientes hospitalizados, exceto para algumas das categorias da Escala de Braden (p<0,001).

Tabela 3
Razões de hazards e IC95% para úlcera por pressão - Belo Horizonte, MG, Brasil, 2012.

Discussão

O presente estudo revelou taxa de incidência de UP em pacientes hospitalizados de 2,42/1.000 pessoas-dia (IC95%=1,63-3,58). Outro achado deste trabalho evidencia que, em pacientes hospitalizados, fatores sociodemográficos e clínicos não se mostraram associados à incidência de UP no modelo multivariado ajustado. Entretanto, pacientes que foram classificados como de risco mais elevado na escala de Braden apresentaram mais de seis vezes o risco de incidência de UP quando comparados com aqueles classificados na categoria de baixo risco.

Estudo de incidência e de prevalência de UP demonstra o quão é comum esse agravo22 Moore ZE, Webster J, Samuriwo R. Wound-care teams for preventing and treating pressure ulcers. Cochrane Database Syst Rev. 2015;(9):CD011011.. Os índices de incidência de UP em países de todo o mundo variam de 1,9% a 71,6%, sendo que a média de incidência no contexto das unidades de cuidado de longa permanência, por exemplo, em unidades de clínica médica, chega a 6,6%22 Moore ZE, Webster J, Samuriwo R. Wound-care teams for preventing and treating pressure ulcers. Cochrane Database Syst Rev. 2015;(9):CD011011.,1515. Moore Z, Johanssen E, Van Etten M. A review of PU prevalence and incidence across Scandinavia, Iceland and Ireland (Part I). J Wound Care. 2013;22(7):361-8..

Apesar da taxa de incidência, ou densidade de incidência, consistir em análise mais consistente dos dados de incidência, poucos são os estudos encontrados na literatura nacional relacionados à UP. Neste estudo, verificou-se que 2,42/1.000 pacientes-dia internados na unidade de clínica médica desenvolvem UP. Em outro estudo, sobre a densidade de incidência de UP em idosos institucionalizados no sul de Minas Gerais, a cada 1.000 dias, havia 5,7 idosos com a lesão1616. Souza DMST, Santos VLCG. Risk factors for pressure ulcer development in institutionalized elderly. Rev Latino Am Enfermagem. 2007;15(5):958-64.. E o segundo estudo encontrado, realizado em unidades de clínica médica de dois hospitais públicos da Bahia, demonstrou densidades de incidência de UP de 70/1.000 pessoas-dia e 32/1.000 pessoas-dia, respectivamente1717 Anselmi ML, Peduzzi M, França Júnior I. Incidência de úlcera por pressão e ações de enfermagem. Acta Paul Enferm, 2009;22(3):257-64..

Vale salientar que alta incidência de UP tem sido observada em ambientes onde as estratégias organizacionais para prevenção de UP são inadequadas ou inexistentes1818 Igarashi A, Yamamoto-Mitani N, Gushiken Y, Takai Y, Tanaka M, Okamoto Y. Prevalence and incidence of pressure ulcers in Japanese long-term-care hospitals. Arch Gerontol Geriatr. 2013;56(1):220-6..

Em relação à variável independente tabagismo, não foram identificadas diferenças estatisticamente significativas entre pacientes tabagistas e não tabagistas, assim como estudo realizado na cidade de São Paulo1919 Campanili TC, Gonçalves F, Santos VLCG, Strazzieri-Pulido KC, Thomaz PBM, Nogueira PC. Incidence of pressure ulcers in cardiopulmonary intensive care unit patients. Rev Esc Enferm USP. 2015;49(n.spe):7-13.. Sabe-se que, apesar desses resultados, o tabagismo prejudica a função de várias células, compromete a oxigenação dos tecidos e tem efeitos na fisiologia das feridas crônicas, além de prolongar o período de tratamento2020 McDaniel JC, Browning KK. Smoking, chronic wound healing, and implications forevidence-based practice. J Wound Ostomy Continence Nurs. 2014;41(5):415-23..

Outros trabalhos corroboraram os resultados do presente estudo ao não encontrar, entre os sexos, diferenças significativas no desenvolvimento de UP2121 Freitas JPC, Alberti LR. Application of the Braden Scale in the home setting: incidence and factors associated with pressure ulcers. Acta Paul Enferm. 2013;26(6): 515-21.-2222 Soares DAS, Vendramin FS, Pereira LMD, Proença PK, Marques MM. Analysis of the incidence of pressure ulcers at Hospital Metropolitano de Urgência e Emergência in Ananindeua, PA. Rev Bras Cir Plást. 2011;26(4):578-81.. Entretanto, dados demográficos demonstram que as mulheres apresentam maior expectativa de vida que os homens (78,6 e 71,3 anos, respectivamente)2323 Brasil. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão; Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Tábua completa de mortalidade para o Brasil-2013: breve análise da mortalidade nos períodos 2012‐2013 e 1980‐2013. Rio de Janeiro: IBGE; 2014. e, por conseguinte, vivem longos períodos com incapacidades e doenças crônicas, o que poderia elevar a incidência de UP no sexo feminino2121 Freitas JPC, Alberti LR. Application of the Braden Scale in the home setting: incidence and factors associated with pressure ulcers. Acta Paul Enferm. 2013;26(6): 515-21..

Sobre a associação entre idade e UP, alguns autores afirmam que a faixa etária superior a 60 anos é fator de risco para o desenvolvimento de UP, devido às mudanças na pele e em tecido subcutâneo, inerentes ao envelhecimento2121 Freitas JPC, Alberti LR. Application of the Braden Scale in the home setting: incidence and factors associated with pressure ulcers. Acta Paul Enferm. 2013;26(6): 515-21.,2424 Horn SD, Barrett RS, Fife CE, Thomson B. A predictive model for pressure ulcer outcome: the Wound Healing Index. Adv Skin Wound Care. 2015;28(12):560-72.-2525 Gould L, Abadir P, Brem H, Carter M, Conner-Kerr T, Davidson J, et al. Chronic wound repair and healing in older adults: current status and future research. J Am Geriatr Soc. 2015;63(3):427-38.. Tais lesões podem ser consideradas preditoras de mortalidade em indivíduos de idades avançadas, independentemente de outros fatores de risco2626 Gené BJ, Borràs SA, Contel SJC, Terén CA, González LC, Ramírez EL, et al. Predictors of mortality among elderly dependent home care patients. BMC Health Serv Res. 2013;13:316.. Embora não tenha sido encontrada associação significativa entre faixa etária e UP neste estudo, cabe ressaltar a importância da atuação multidisciplinar na prevenção e no tratamento de UP em idosos, principalmente aqueles em situação de fragilidade, imobilidade e desnutrição. Reduzir a incidência de UP relacionada ao envelhecimento populacional se configura como um desafio aos profissionais e ao sistema de saúde, sendo a educação continuada da equipe multiprofissional fundamental para se atingir a assistência qualificada.

Apesar do estado nutricional do paciente ser considerado um potencial fator de risco para o desenvolvimento de UP2424 Horn SD, Barrett RS, Fife CE, Thomson B. A predictive model for pressure ulcer outcome: the Wound Healing Index. Adv Skin Wound Care. 2015;28(12):560-72.-2525 Gould L, Abadir P, Brem H, Carter M, Conner-Kerr T, Davidson J, et al. Chronic wound repair and healing in older adults: current status and future research. J Am Geriatr Soc. 2015;63(3):427-38.,2727. Meehan A, Loose C, Bell J, Partridge J, Nelson J, Goates S. Health system quality improvement: impact of prompt nutrition care on patient outcomes and health care costs. J Nurs Care Qual. 2016;31(3):217-23., neste estudo não foi demonstrada associação significativa. As evidências de que intervenções dietéticas e suplementos alimentares podem efetivamente prevenir ou acelerar o processo de cicatrização de UP são conflituosas e requerem mais pesquisas científicas2727. Meehan A, Loose C, Bell J, Partridge J, Nelson J, Goates S. Health system quality improvement: impact of prompt nutrition care on patient outcomes and health care costs. J Nurs Care Qual. 2016;31(3):217-23.. Porém, a atuação dos membros da equipe multidisciplinar, como os da enfermagem e da nutrição, é essencial para se atingir um IMC adequado e, dessa forma, prevenir distúrbios metabólicos que levam ao aparecimento de UP e outros agravos, os quais, na maioria das vezes, podem piorar o estado geral dos pacientes.

A categoria de risco mais elevado da Escala de Braden se mostrou associada ao desenvolvimento de UP. Este resultado corrobora o encontrado em outros trabalhos1111 Miller N, Frankenfield D, Lehman E, Maguire M, Schirm V. Predicting pressure ulcer development in clinical practice: evaluation of Braden Scale Scores and nutrition parameters. J Wound Ostomy Continence Nurs. 2016;43(2):133-9.,2828. Rogenski NMB, Kurcgant P. The incidence of pressure ulcers after the implementation of a prevention protocol. Rev Latino Am Enfermagem. 2012;20(2): 333-9.. Foi demonstrado, em estudo prévio, que a escala é adequada ferramenta para predição de risco para o aparecimento de UP1111 Miller N, Frankenfield D, Lehman E, Maguire M, Schirm V. Predicting pressure ulcer development in clinical practice: evaluation of Braden Scale Scores and nutrition parameters. J Wound Ostomy Continence Nurs. 2016;43(2):133-9. e, além disso, estudo revelou alta sensibilidade na avaliação de feridas, sendo o instrumento considerado adequado para triagens e importante para a prática clínica1010 Borghardt AT, Prado TN, Araújo TM, Rogenski NMB, Bringuente MEO. Evaluation of the pressure ulcers risk scales with critically ill patients: a prospective cohort study. Rev Latino Am Enfermagem. 2015;23(1):28-35..

Foi observada associação estatisticamente significativa entre risco e presença de UP em duas unidades hospitalares, evidenciando que há maior percentual de pacientes com alto risco no grupo de pacientes com UP quando comparado ao grupo sem UP, em ambas as unidades. Ao realizar uma análise de regressão logística para verificar a influência da pontuação da Escala de Braden na presença de UP, observou-se que, na clínica cirúrgica, os pacientes com alto risco têm cerca de 10 vezes mais chances de desenvolver UP quando comparados aos pacientes de baixo e moderado risco. Na Unidade de Terapia Intensiva, por sua vez, os pacientes com alto risco têm 25,5 vezes mais chance de desenvolver UP do que os pacientes de baixo e moderado risco2828. Rogenski NMB, Kurcgant P. The incidence of pressure ulcers after the implementation of a prevention protocol. Rev Latino Am Enfermagem. 2012;20(2): 333-9..

As diferenças de risco de desenvolvimento de UP entre estudos podem ser explicadas, dentre outras especificidades dos métodos utilizados, pelo local de estudo. Afinal, é sabido que a incidência de UP em unidades de cuidado agudo é superior àquelas de cuidado prolongado.

Esses resultados revelam que a utilização sistemática da escala de Braden traduz-se em estratégia importante no cuidado de pacientes, e o uso desta escala deve ser entendido como um parâmetro de boas práticas de enfermagem e que pode contribuir para a melhoria do indicador de processo para a prevenção de UP1313 Brasil. Ministério da Saúde; Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Programa Nacional de Segurança do Paciente. Protocolo para Prevenção de Úlcera por Pressão. Brasília: Fiocruz; 2013..

Ademais, deve ser assegurado dimensionamento de pessoal de enfermagem nas instituições de saúde que permita não só o uso da escala como também a implementação de medidas preventivas para o desenvolvimento de UP, como a mudança de decúbito periódica, utilização de insumos necessários, tais como colchões apropriados; e equipe multidisciplinar envolvida para prestar cuidados diferenciados aos pacientes com maior risco.

Estudos como este contribuem para que esses cuidados sejam reforçados junto à equipe multidisciplinar. Ainda que o risco de UP tenha seus limites relacionados aos fatores aqui identificados, a melhora na qualidade assistencial é fator que deve ser levado em consideração, visando à segurança do paciente.

Finalmente, é importante considerar algumas limitações deste estudo, dentre elas o tamanho amostral reduzido, que pode ter influenciado a ausência de significância estatística em alguns dos resultados apresentados. Ressalta-se, entretanto, que a população atendida em hospitais públicos universitários pode ter características sociodemográficas pouco distintas, o que dificulta identificar diferenças entre grupos.

Conclusão

Pacientes hospitalizados classificados como de alto risco, na escala de Braden, mostraram maior incidência de UP quando comparados com aqueles classificados como de baixo risco. Fatores sociodemográficos e clínicos no cenário estudado não mostraram diferenças significativas na incidência de UP. Este fato reforça a importância do uso desta escala para auxiliar na identificação dos pacientes com maior probabilidade de desenvolver UP. Assim, esses resultados podem alertar as instituições de saúde a primar pelo seu uso e proporcionar as condições necessárias para sua implantação, por meio de treinamentos e educação continuada, a fim de otimizar a assistência e qualidade de vida do paciente.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2017

Histórico

  • Recebido
    11 Maio 2016
  • Aceito
    26 Jan 2017
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