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O método funcional na prática da enfermagem abordado através da dinâmica de grupo: relato de uma experiência

The functional method in nursing practice that was about the group dynamic: of an experience

Resumos

Este estudo discute o método funcional na enfermagem, abordado através de uma dinâmica de grupo desenvolvida com mestrandos da EERP-USP, sendo divididos em três grupos. Após a dinâmica, responderam um questionário com 04 perguntas. As respostas do grupo I mostraram desvantagens da modalidade funcional que interferem no trabalho como: relações impessoais, fragmentação de tarefas e centralização das decisões, gerando insatisfação no trabalhador. Os grupos II e III apontaram algumas vantagens quando o trabalho é baseado em equipe, das quais destacamos a troca de experiências, o planejamento participativo e as decisões compartilhadas, sendo estes, fatores que levam à satisfação no trabalho.

Enfermagem prática; Enfermagem; Administração


This study discusses the functional method applied to Nursing, approached through a group dynamics developed with three groups of Master students from the University of Seto Paulo at Ribeirão Preto College of Nursing. After the dynamics, the subjects answered a questionnaire with four questions. The responses of the first group showed the limitations of the functional model that interfere in the work such as: impersonal relationships, fragmentation of tasks, centralization of decisions causing the workers' dissatisfaction. The groups II and III pointed out some advantages when the work is based on a team, such as the exchange of experiences, participant planning and shared decisions, resulting in satisfaction at work.

Nursing practical; Nursing; Administration


ARTIGOS ORIGINAIS

O método funcional na prática da enfermagem abordado através da dinâmica de grupo: relato de uma experiência* * Trabalho apresentado na disciplina Análise Crítica da Assistência de Enfermagem do Curso de Pós-Graduação da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto-USP.

The functional method in nursing practice that was about the group dynamic: of an experience

Carla Aparecida Spagnol; Márcia Simoni Fernandes; Maria Cristina Simões Flório; Regiane Ap. S. S. Barreto; Roberta P de M. Sant'Ana; Viviane T. de Carvalho

Mestrands da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto-USP - Area Enfermagem Fundamental. E-mail:spagnol@enf.ufmg.br

RESUMO

Este estudo discute o método funcional na enfermagem, abordado através de uma dinâmica de grupo desenvolvida com mestrandos da EERP-USP, sendo divididos em três grupos. Após a dinâmica, responderam um questionário com 04 perguntas. As respostas do grupo I mostraram desvantagens da modalidade funcional que interferem no trabalho como: relações impessoais, fragmentação de tarefas e centralização das decisões, gerando insatisfação no trabalhador. Os grupos II e III apontaram algumas vantagens quando o trabalho é baseado em equipe, das quais destacamos a troca de experiências, o planejamento participativo e as decisões compartilhadas, sendo estes, fatores que levam à satisfação no trabalho.

Palavras-chave: Enfermagem prática. Enfermagem. Administração.

ABSTRACT

This study discusses the functional method applied to Nursing, approached through a group dynamics developed with three groups of Master students from the University of Seto Paulo at Ribeirão Preto College of Nursing. After the dynamics, the subjects answered a questionnaire with four questions. The responses of the first group showed the limitations of the functional model that interfere in the work such as: impersonal relationships, fragmentation of tasks, centralization of decisions causing the workers' dissatisfaction. The groups II and III pointed out some advantages when the work is based on a team, such as the exchange of experiences, participant planning and shared decisions, resulting in satisfaction at work.

Keywords: Nursing practical. Nursing. Administration.

I INTRODUÇÃO

A necessidade de organização do processo de traba-lho na enfermagem vem desde a sua institucionalização, quando Florence Nightingale, preocupada com as condições dos hospitais da época, buscou a sua normatização e regulamentação. Além disso, propôs a racionalização da prática da enfermagem, através de um trabalho calcado em bases mais científicas visando à eficiência, economia de tempo e material (BELLATO et al., 1997).

Para TREVIZAN (1988) a divisão do trabalho na enfermagem entre os que pensam (as enfermeiras) e os que executam (o pessoal de nível médio), foi concretizada por Florence Nightingale que formava as ladies nurses para se responsabilizarem pela administração da enfermagem e as nurses para prestarem os cuidados aos pacientes.

A enfermeira para organizar o trabalho em uma unidade de internação hospitalar, visando à prestação de cuidados ao paciente internado, necessita de pessoas qualificadas, recursos materiais e financeiros, definição dos processos a serem realizados, instru-mentos administrativos e métodos de distribuição do trabalho.

Observamos que as formas de organização do trabalho são influenciadas por determinantes políticos, econômicos e sócio-culturais de cada época. Para organizar o trabalho na enfermagem, alguns métodos foram propostos e são classificados de acordo com vários autores, seguindo os critérios recursos físicos, humanos e materiais disponíveis, sendo denominados como: modalidade funcional ou por tarefas, cuidado integral ou global (método de casos) e trabalho de equipe (ALVES, 1991).

A fim de obter maior eficiência no seu trabalho, a enfermagem adotou dentre outros, o método funcional. Este método nasceu no berço da Administração Científica, que teve como precursor Frederick Winslow Taylor, e visava economia de tempo, garantindo maior agilidade na execução das tarefas. Portanto, a enfermagem, buscando a implantação de métodos e processos de racionalização de seu trabalho, inspirou-se nos princípios tayloristas, desenvolvendo a sua prática dentro da modalidade funcional, enfatizando a divisão do trabalho.

Na enfermagem o método funcional apresenta-se como aquele em que se atribui a cada servidor a execução de determinados trabalhos, assim, a um servidor é designada a verificação dos sinais vitais de todos os pacientes, a outro a administração de medicamentos e, a outro, a prestação de cuidados de higiene e assim por diante (CARVALHO, 1993). Apresenta as seguintes características: preocupação com o "como fazer" a tarefa, nítida divisão do trabalho, padronização das tarefas, escalas diárias de tarefas, assistência de enfermagem fragmentada, impessoalidade nas relações e ênfase nos procedimentos.

Com a finalidade de refletirmos sobre a forma de organização do trabalho da enfermagem e os métodos de distribuição do trabalho que vêm sendo adotados, tivemos a oportunidade de desenvolver este estudo na disciplina Análise Crítica da Assistência de Enfermagem ministrada no Curso de Pós-Graduação da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (EERP-USP), que tem o objetivo de proporcionar aos alunos momentos de reflexão sobre a prática de enfermagem correlacionando os fatores que deter-minam as transformações nesta prática. Este espaço de discussão contribuirá para uma análise crítica da profissão, buscando cada vez mais o aperfeiçoamento da assistência de enfermagem.

A DINÂMICA DE GRUPO COMO ESTRATÉGIA DE ENSINO APRENDIZAGEM

A fim de levar o aluno a participar do seu processo de ensino-aprendizagem, utilizam-se diferentes estratégias para desenvolver o conteúdo programático. Segundo ANTUNES (1996) "as técnicas pedagógicas constituem extraordinário instrumento de motivação, uma vez que transformam o conhecimento a ser assimilado em um recurso de ludicidade...". Destaca ainda, que as técnicas além de serem motivadoras, contribuem também para o desenvolvimento da criatividade, desinibição e fixação dos conhecimentos adquiridos.

De acordo com ALMEIDA (1973) "somente o trabalho em grupo possibilita a realização de uma atividade em comum", permitindo na escola, tornar a ação educativa mais agradável e proporcionando maior comunicação.

Com a introdução de novas técnicas de ensino, em específico a dinâmica de grupo, a escola "deixou de ser simplesmente o local onde se pratica apenas a transmissão de conhecimentos, para assumir um papel de transformadora de atitudes" (VITIELLO; GONÇALVES, 1997). Como uma técnica de ensino utilizada no meio escolar, propõe a ser um trabalho prático de sensibilização que possibilita maior envolvimento dos participantes em seu processo de aprendizagem. Além disso, possibilita o enriquecimento de experiências e vivências dos elementos do grupo (ALMEIDA, 1973).

Com a finalidade de refletirmos sobre a forma de organização do trabalho da enfermagem e os métodos de trabalho que vêm sendo adotados, tivemos a oportunidade de desenvolver este estudo na disciplina Análise Crítica da Assistência de Enfermagem ministrada no Curso de Pós-graduação da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (EERP-USP).

Por se tratar de um tema complexo, porém bastante discutido na enfermagem e diante das considerações acerca das diferentes técnicas de ensino que podemos utilizar para proporcionar momentos de reflexão sobre a prática da enfermagem, resolvemos abordar o método funcional através de uma dinâmica de grupo. Esta técnica teve a finalidade de desinibir os alunos, motivando-os a participarem das discussões em sala, relacionando uma situação fictícia com situações do cotidiano profissional.

Portanto, este trabalho objetivou: discutir questões acerca do método funcional na prática de enfermagem utilizando uma técnica de dinâmica de grupo, desenvolvida com os pós-graduandos da EERP-USP durante a disciplina Análise Crítica da Assistência de Enfermagem.

METODOLOGIA

Para discutirmos, as características do método funcional e outras formas de organização do trabalho que venham confrontar com o este método, utilizamos uma dinâmica de grupo que foi extraída do Guia Curricular para a formação do auxiliar de enfermagem - área hospitalar (SANTOS, 1995) adaptada por BRITO (s/d) que a utiliza no Curso de Graduação em Enfermagem para discutir com seus alunos as características dos métodos de trabalho utilizados na enfermagem (funcional, equipe e integral).

A dinâmica de grupo foi aplicada junto aos alunos da Pós-Graduação da EERP-USP, matriculados na disciplina Análise Crítica da Assistência de Enfermagem, realizada no segundo semestre de 1998. Após o desenvolvimento da dinâmica de grupo, distribuímos um questionário (anexo 1anexo 1) aos 22 alunos que concordaram e aceitaram responder o instrumento de coleta de dados. Este instrumento possuía uma questão aberta acerca dos itens: comunicação, satisfação pessoal, planejamento e tomada de decisão, relacionados à atividade desenvolvida, que tinha por finalidade apreender as opiniões dos alunos que participaram da dinâmica de grupo. Todos os 22 alunos devolveram o questionário.

Após a coleta, os dados foram tabulados utilizando-se freqüência simples para calcular a porcentagem das respostas e analisados à luz do referencial teórico das Teorias Gerais da Administração e da Administração em Enfermagem.

DESCRIÇÃO DA DINÂMICA DE GRUPO UTILIZADA

Para desenvolver a dinâmica proposta preparamos e organizamos previamente os seguintes materiais: cartolina, molde de uma boneca em cartolina, cola, tesoura, canetas coloridas, envelopes grandes e sucatas (fitas, lã, copos descartáveis, potes de plástico, papel, retalhos de pano, etc.) que foram utilizados em sala de aula durante a realização da atividade.

Preparo da Dinâmica de Grupo:

1)Construir o molde de uma boneca em cartolina;

2)A partir do molde construído, desenhar as partes da boneca separadamente, olhos, boca, pernas, braços, cabeça, vestido, blusa, e assim por diante. Deve-se fazer 02 cópias das partes desenhadas.

GRUPO I:

•Colocar dentro de envelopes as partes da boneca (a primeira cópia). O número de envelopes vai variar de acordo com o tamanho do grupo, de maneira

que cada envelope poderá conter uma ou mais partes da boneca. Enumerar cada envelope e escrever o número do grupo (por exemplo- envelope 1/ grupo 1, envelope 2/ grupo 1, envelope/ 3 grupo 1 ... etc.). Além das partes da boneca deve-se colocar a seguinte instrução dentro dos referidos envelopes:

Instruções ao grupo 1 para a construção da boneca

• Posicionamento do grupo: em fila; cada elemento do grupo, em ordem numérica, deverá seguir as instruções contidas no seu envelope; a montagem do objeto deverá seguir rigorosamente o modelo apresentado; após concluir a tarefa determinada, cada indivíduo deverá transferir imediatamente o objeto, juntamente com o modelo, ao elemento seguinte, para que o mesmo possa dar continuidade ao trabalho; a atividade deverá ser realizada dentro do menor período de tempo possível; É terminantemente proibida a comunicação entre os elementos do grupo, mesmo após a conclusão da atividade; após o término da atividade, o objeto produzido deverá ser imediatamente entregue ao instrutor.

GRUPO II:

•Colocar dentro de envelopes as partes da boneca (a segunda cópia). O número de envelopes vai variar de acordo com o tamanho do grupo, de maneira que cada envelope poderá conter uma ou mais partes da boneca. Enumerar cada envelope e escrever o número do grupo (por exemplo- envelope 1/ grupo 2, envelope 2/ grupo 2, envelope/ 3 grupo 2 ... etc.); 2). Além das partes da boneca deve-se colocar a seguinte instrução dentro dos referidos envelopes:

Instruções ao grupo 2 para a construção da boneca

• Posicionamento do grupo: em círculo; cada elemento do grupo, em ordem numérica, deverá seguir às instruções contidas no seu envelope; a comunicação entre os elementos do grupo pode acontecer sem restrições; o grupo terá 10 minutos para a realização da atividade (conforme tempo disponível para a realização da dinâmica); após a conclusão da tarefa, não há necessidade de entregar de imediato o objeto produzido ao instrutor.

GRUPO III:

• Este grupo receberá sucatas para construir a boneca e as seguintes instruções por escrito:

Instruções ao grupo 3 para a construção da boneca

• Posicionamento do grupo: livre escolha; o grupo deverá, a seu critério, criar uma boneca; o material disponível poderá ser utilizado sem restrições;

o tempo disponível para a realização da atividade: 10 minutos (conforme tempo disponível para a realização da dinâmica); após concluir a atividade, a boneca não precisa ser entregue, de imediato, ao instrutor.

Desenvolvimento da Dinâmica de Grupo:

1)Uma pessoa coordenará a dinâmica; 2) Ao iniciar a dinâmica de grupo, coloca-se para os alunos que os mesmos serão trabalhadores de uma fábrica e terão como objetivo a construção de uma boneca; 3) Explique que para isso, serão utilizadas 03 formas de organização do trabalho na "fábrica de bonecas"; 4) A sala deverá ser dividida em 03 grupos e cada um receberá o material descrito anteriormente, com as respectivas instruções e um vidro de cola, acrescentando 01 tesoura para o grupo III; 5) O coordenador deverá ler as instruções para os três grupos; 6)As atividades devem ocorrer simul-taneamente (grupo 1, 2 e 3); 7) Após o término da atividade dos três grupos o coordenador levantará as opiniões dos membros dos grupos acerca da dinâmica realizada, anotando no quadro negro ou em papel Kraft, os pontos relevantes para discussão.

APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

A apresentação, discussão e análise dos dados do grupo I (8 alunos) foram realizadas separadamente, tendo em vista que os resultados deste grupo estão relacionados ao método funcional e este ser o foco de estudo deste trabalho. Já os dados obtidos nos grupos II e III (14 alunos) foram agrupados e apresentados em tabelas conjuntamente, sendo feito posteriormente a discussão e a análise dos mesmos, uma vez que as respostas obtidas apareceram de forma muito semelhante.

A situação fictícia apresentada através da dinâmica de grupo mostrou nitidamente as características do método funcional e outras formas de organização do trabalho, tais como o trabalho em equipe. Mesmo não estando ligada diretamente à enfermagem, pois se tratava de uma "fábrica de bonecas", a atividade desenvolvida permitiu aos alunos que a associassem ao trabalho da enfermagem. Portanto, na análise dos resultados deste estudo, faremos um paralelo da atividade desenvolvida com as formas de organização do trabalho da enfermagem.

A atividade desenvolvida pelo grupo I enfatizava a divisão das tarefas, sendo que para construir a boneca cada elemento deveria seguir rigidamente as instruções e o modelo fornecido. Os integrantes do grupo eram proibidos de se comunicar. A forma de organização desta atividade apresentava caracte-rísticas semelhantes à do método funcional.

Em relação ao item comunicação, 100% dos participantes do grupo I, disseram que a comunicação entre os membros do grupo no método de trabalho adotado foi inexistente. Esse dado pode ser comparado as características observadas na modalidade de trabalho funcionalista, em que a comunicação horizontal é dificultada e às vezes até inexistente, pois há um predomínio da comunicação vertical, ou seja, são comunicadas aos subordinados somente ordens que devem ser cumpridas. Taylor acreditava que à direção das empresas competia controlar e vigiar o trabalhador, impedindo por todos os meios à articulação e comunicação horizontal entre as pessoas no interior do espaço de produção (TREVIZAN, 1988).

Outro aspecto a ser ressaltado no método funcional é que a comunicação nessa modalidade de trabalho, em sua maioria acontece de forma escrita, através de memorandos, circulares, cartas de advertência, entre outros, dificultando ainda mais a comunicação verbal entre as pessoas, tornando cada vez mais impessoal as relações no trabalho.

Segundo KURCGANT (1991) a enfermagem inserida nas instituições de saúde rigidamentehierarquizadas, reproduz na sua estrutura o modelo maior da instituição. Portanto, acreditamos que em muitos Serviços de Enfermagem, a comunicação aindaacontece de forma verticalizada, dificultando as relações pessoais e informais. Acreditamos que a desvalorização das relações interpessoais nodesenvolvimento do trabalho acarreta em desmotivação e insatisfação por parte dos trabalhadores.

Graduação (EERP USP), participantes do grupo I, relativas ao item satisfação pessoal. Ribeirão Preto-SP, 1998.

Quanto ao item satisfação pessoal, evidenciamos que 62,5% dos participantes do grupo I, responderam que se sentiram insatisfeitos durante a realização da atividade proposta, conforme demonstra a tabela 1.

Alguns autores colocam que a insatisfação podeser gerada por diversos fatores, dentre eles a falta de participação efetiva em todo o processo de trabalho.Para BELLATO (1997) "com a fragmentação dotrabalho ocorrida na enfermagem, as categorias profissionais subalternas à enfermeira se distanciam do todo, que é o cuidado de enfermagem, para se fixar nas partes, que são as tarefas, ficando sua atuação profissional reduzida a um 'que fazer' rotineiro e desmotivador”, isto pode gerar insatisfação nestes trabalhadores. A fragmentação do trabalho é uma característica típica do método funcional, observado na dinâmica de grupo e utilizado pela enfermagem em algumas instituições de saúde.

FÁVERO (1996) descreve que o cotidiano daenfermagem está cercado por uma série de dificuldadesno desenvolvimento do trabalho, dentre elasdestacamos a falta de motivação e insatisfação porparte dos trabalhadores, devido a fatores tais como:desenvolvimento de tarefas limitadas e repetitivas,falta de oportunidade para participarem nas decisões que envolvem suas tarefas, entre outros. Diante das considerações da autora, podemos inferir que um dosfatores que gera insatisfação nos trabalhadores aodesenvolverem suas atividades laborais é a forma de organização e execução do trabalho.

Ao perguntarmos aos alunos participantes da dinâmica de grupo suas opiniões acerca do item planejamento durante o desenvolvimento da atividade, a tabela 2 mostra que 75% dos integrantes do grupo I consideraram que a atividade realizada foi planejada pelo coordenador, sem a participação dos membros do grupo, sendo que eles deveriam somente seguir rigidamente as instruções e o modelo da boneca que foi entregue.

Observamos que a dicotomia entre a concepção e a execução do trabalho, também é uma característica presente no método funcional. Nessa forma de organização do trabalho, Taylor "procurou tirar do operário o direito de escolher a sua maneira pessoal de executar a tarefa para impor-lhe um método de trabalho planejado e estudado por um profissional especializado no planejamento das tarefas" (CHIAVENATO, 1994).

O que Taylor preconizava, também pode ser observado na prática da enfermagem, uma vez que na maioria dos hospitais o enfermeiro assume o planejamento das atividades, deixando claro para os demais membros da equipe como a tarefa deve serA atividade desenvolvida pelo grupo I deixa nítida a divisão da tarefa, em que cada elemento colou uma parte da boneca e somente o último integrante do grupo teve a visão da boneca no todo. Podemos inferir que este exercício realizado com os alunos do mestrado permitiu que os mesmos emitissem suas opiniões, associando-as à vivência em sala de aula, uma vez que em muitos hospitais o trabalho da enfermagem ainda é parcelado, não propiciando a participação de todos da equipe no planejamento da assistência ao paciente.

Em relação às respostas referentes ao item tomada de decisão (tabela 3), observamos que 75% dos participantes do grupo I, afirmaram que seus membros não participaram da tomada de decisão durante a montagem da boneca, pois, não cabia a eles a decisão do trabalho, uma vez que as ordens já estavam determinadas.

No método de trabalho funcionalista, tambémencontramos a característica acima, em que otrabalhador age impelido por ordens autocraticamente FERRAZ (1995) cita que o aspecto primordial da gerência científica é o conceito de controle, pois o administrador determina ao trabalhador uma maneira rigorosa de executar as atividades, deixando explícita a anulação de qualquer decisão deste sobre o seu trabalho. Notamos que no dia-a-dia, o enfermeiro é quem decide sobre as questões do gerenciamento da unidade e do cuidado de enfermagem, delegando para os demais membros da equipe, a execução das tarefas já determinadas. Este profissional tem assumido um nítido papel de controlador do trabalho da equipe de enfermagem, sendo visto apenas como o profissional que "checa" as atividades a serem executadas.

Atualmente observamos que estão ocorrendo na sociedade rápidas e intensas transformações políticas, econômicas, sociais e culturais, que podem trazer modificações significativas no processo de trabalho das instituições. Isto faz com que as organizações, entre elas, as de saúde, busquem novos modelos de

gestão para responderem cada vez mais às exigências atuais. Notamos que outras formas de organizar o trabalho, que enfatizem a cooperação e criatividade dos trabalhadores, podem estar contribuindo para o enfrentamento das conseqüências negativas e desvantagens apresentadas no método funcional.

Destacamos que hoje, as pessoas que fazem parte de um processo de trabalho inseridas em uma instituição, apresentam algumas necessidades como: interação pessoal; desenvolvimento da criatividade e das potencialidades de cada um; valorização pessoal e do trabalho realizado; humanização no trabalho e nas relações com o cliente. Assim, os trabalhadores não querem mais ser tratados como parte de uma "máquina", como rege a concepção taylorista. Estes aspectos podem ser encontrados nas respostas dos informantes dos grupos II e III ao desenvolverem as atividades propostas durante a dinâmica de grupo.

Na atividade desenvolvida pelo grupo II oselementos recebiam as instruções da tarefa, contudo tinham a liberdade para montar a boneca levando em consideração as opiniões do grupo, quer dizer, poderiam se comunicar e não tinham um modelo a ser seguido. Já no grupo III, a atividade foi desenvolvida sem normas e modelo a serem seguidos e a comunicação também era livre. As atividades dos grupos II e III foram organizadasconsiderando o trabalho em equipe, a cooperação einteração dos integrantes, conformando uma forma deorganização do trabalho que contrapõe ao métodofuncional. Neste sentido, as respostas dos membros destes grupos apresentaram certas semelhanças, que vêm contrastar com as opiniões dos elementos do grupo I.

Quanto ao item comunicação nos grupos II e III, 35,7% das respostas emitidas apontaram que a comunicação permitiu compartilhar idéias e trocar experiências havendo intensa interação entre os membros dos grupos. Para os integrantes destes grupos a possibilidade da comunicação compartilhada proporciona relações de trabalho mais personalizada e humana.

Em relação ao item satisfação pessoal, 100% dos participantes dos grupos II e III, disseram que ficaram satisfeitos ao desenvolver a atividade proposta, pois puderam participar ativamente e de forma prazerosa, exercendo a criatividade no momento da concepção e execução do trabalho.

As respostas relativas ao item planejamento, dos grupos II e III, mostram um percentual de 57,1% evidenciando que a atividade desenvolvida foi planejada de forma participativa, respeitando as opiniões sugeridas por todos os elementos do grupo.

Com relação ao item tomada de decisão, 100% dos informantes responderam que ocorreu de forma coletiva e participativa, de comum acordo, em que cada membro do grupo foi sugerindo e/ou acatando as idéias dos demais.

Os resultados encontrados nas respostas dos grupos II e III contradizem as respostas do grupo I, evidenciando os contrapontos existentes nas diferentes formas de organização do trabalho. Diante dos efeitos negativos do trabalho organizado nos moldes funcionalista, verificamos a necessidade de repensar a organização do trabalho da enfermagem, buscando novas concepções gerenciais e de organização do processo de trabalho.

De acordo com MOGGI; BURKHARD (1996) o modelo mecanicista de gestão vigente é lento e não consegue mais dar respostas às transformações atuais. Para isso, MOTTA (1993) propõe modelos de gestão com as seguintes características: estruturas organizacionais flexíveis, redução de linhas hierárquicas, gerência baseada no processo descentralização das decisões, trabalho em equipe, comunicação eficiente, entre outras.

Assim, gostaríamos de chamar a atenção paraas características que têm surgido nas abordagensgerenciais contemporâneas, que devem ser "observadascuidadosamente" pelo enfermeiro, na tentativa debuscar outras formas de organizar o trabalho diferente do método funcional.

Estas mudanças que estão ocorrendo na sociedade e nas organizações de um modo geral estão incentivando os trabalhadores a buscarem novas formas de inserção no trabalho. Por isso, o enfermeiro enquanto gerente da equipe de enfermagem deveria participar da reformulação dos modelos de gestão das organizações, procurando contribuir com propostas alternativas que devem contemplar as necessidades dos seus funcionários e elevar o padrão de qualidade da assistência prestada.

Neste sentido, FÁVERO (1996) aponta que a administração da assistência de enfermagem deve criar espaços que possibilitem a participação de todos da equipe na reorganização do trabalho, de forma que se torne uma prática mais flexível, mais crítica e humana, consequentemente mais criativa e inovadora.

A busca de novas formas gerenciais na enfermagem reflete a necessidade da organização do trabalho considerar questões relativas ao trabalhador e execução do cuidado prestado por eles. Assim, a enfermeira busca uma forma de organização do trabalho, não pela divisão deste em tarefas, que traz a divisão do ser humano em partes, mas pelo cuidado de enfermagem prestado da forma integral, e onde a qualidade deste cuidado seja mais importante do que a padronização dos procedimentos (BELLATO et al. 1997).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir da realização deste estudo, observamos que a dinâmica de grupo desenvolvida foi uma técnica facilitadora que possibilitou aos enfermeiros, alunos de Pós-graduação, discutirem o método funcional, correlacionando a situação fictícia com a sua prática, refletindo pontos críticos da profissão, na tentativa de buscarmos novas formas de gerência para organizar o trabalho da enfermagem.

Os enfermeiros participantes do grupo I emitiram respostas que mostraram os efeitos do trabalho organizado nos princípios do método funcional, explicitando que este traz conseqüências negativas tais como: ausência de interação grupal, relações impessoais, fragmentação do trabalho, centralização das decisões, que geram insatisfação no trabalhador. Acreditamos que esses fatores podem influenciar de forma negativa na assistência de enfermagem prestada ao cliente. Assim, não devemos reproduzir tudo que nos é imposto pelo modo de produção vigente, uma vez que temos um compromisso de buscarmos uma prática mais refletida, mais consciente e comprometida com a sociedade.

Por outro lado, evidenciamos que os integrantes dos grupos II e III apontaram algumas vantagens quando o trabalho foi baseado em equipe, das quais destacamos a troca de experiências e idéias, o planejamento realizado de forma participativa e as decisões compartilhadas, sendo estes, dentre outros, considerados fatores que levam os trabalhadores a terem prazer e satisfação no ambiente de trabalho.

Entendemos que as intensas transformações ocorridas na sociedade e no mundo do trabalho estão pressionando as instituições, inclusive as de saúde, buscarem modelos mais flexíveis de gerência, baseados numa administração mais participativa. Além disso, está surgindo uma série de necessidades dos trabalhadores, em que o homem almeja ser visto de forma mais holística. Quando estas questões forem consideradas, maior será a satisfação pessoal no trabalho, a produtividade e a participação de todos com responsabilidade.

Nesta perspectiva, a enfermagem necessita buscar novas abordagens administrativas, com maior flexibilidade, possibilitando à enfermeira gerenciar a equipe, tendo em vista o compartilhamento de idéias, decisões tomadas em conjunto e a valorização dos trabalhadores de maneira mais humanizada. Isso contribuí na busca de soluções para os problemas do cotidiano melhorando a qualidade da assistência prestada.

Portanto, consideramos que a enfermagem necessita conquistar o seu espaço, na tentativa de romper com os princípios mecanicistas do método funcional, buscando novas formas de organizar o trabalho. Neste sentido, entendemos que outros estudos devam ser elaborados na tentativa de buscarmos subsídios para o desenvolvimento de uma prática mais crítica e reflexiva.

Artigo recebido em 10/09/99

Artigo aprovado em 03/09/01

INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS

Este instrumento faz parte de um estudo que será realizado pelas alunas do Curso de Mestrado da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, o qual abordará o método funcional. Neste sentido, contamos com a sua preciosa colaboração respondendo este instrumento para fins da coleta de dados. Esclarecemos que será muito importante a sua resposta e solicitamos por gentileza não deixar nenhuma resposta em branco. Reforçamos que sem a sua participação não será possível a realização deste estudo, o qual pretende contribuir para uma análise crítica da profissão, buscando cada vez mais o aperfeiçoamento da assistência prestada ao cliente. Após a dinâmica de grupo que possibilitou o desenvolvimento da atividade - "produção da boneca" em sala de aula como você percebeu:

• O processo de comunicação durante a realização da atividade

• Sua satisfação durante a realização da atividade

• O processo de planejamento durante a realização da atividade

• A tomada de decisão durante a realização da atividade.

  • ALMEIDA, PN. O ensino globalizante em dinâmicas de grupo. Săo Paulo: Saraiva, 1973.
  • ALVES, M. Organizaçăo do trabalho na enfermagem. Belo Horizonte, 1991. Dissertaçăo (Mestrado) - Faculdade de Administraçăo e Cięncias Econômicas, Universidade Federal de Minas Gerais.
  • ANTUNES, C. Manual de técnicas de dinâmica de grupo, de sensibilizaçăo, de ludopedagogia. 10° ed. Petrópolis: Vozes, 1996.
  • BELLATO, R et al. Algumas reflexőes sobre o método funcional no trabalho da enfermagem. Rev latino-am enfermagem, v.5, n.1, p.75-81, 1997.
  • BRITO, MJM. Instruçőes para dinâmica de grupo - adaptada do Guia Curricular para formaçăo de auxiliar de enfermagem-área hospitalar: área curricular V: participando da organizaçăo do processo produtivo em unidades hospitalares. Belo Horizonte, Escola de Enfermagem da UFMG. sd.(mimeografado)CARVALHO, H. Reorganizaçăo do serviço de enfermagem em unidade hospitalar. Enferm Rev, v.1, n.2, p.5-13, 1993.
  • CHIAVENATO, I. Administraçăo, teoria, processo e prática. 2.ed. Săo Paulo: Makron Books, 1994.
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  • KURCGANT, P. (coord.) Administraçăo em enfermagem, Săo Paulo: EPU, 1991.
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  • VITIELLO, N; GONÇALVES, ACC. Manual de dinâmicas de grupo, Săo Paulo: Iglu, 1997.

anexo 1

  • *
    Trabalho apresentado na disciplina Análise Crítica da Assistência de Enfermagem do Curso de Pós-Graduação da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto-USP.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      15 Dez 2008
    • Data do Fascículo
      Jun 2001

    Histórico

    • Aceito
      03 Set 2001
    • Recebido
      10 Set 1999
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