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Fatores de insatisfação no trabalho segundo a percepção de enfermeiros de um hospital universitário

Factors of work dissatisfaction according to the perception of nurses of a university hospital

Factores de la insatisfacción en el trabajo según la percepción de los enfermeros de un hospital universitario

Resumos

Este estudo tem como objetivo identificar os fatores de insatisfação no trabalho segundo a percepção de enfermeiros de um hospital universitário. Trata-se de um estudo de natureza qualitativa na abordagem descritivo-exploratória. Da análise das entrevistas feitas com seis enfermeiras emergiram duas categorias: Dimensão Pessoal e Dimensão Institucional. A categoria "Dimensão Pessoal" é composta pelas unidades de significado "Sentimentos Relacionados ao Trabalho" e "Atitudes Relacionadas ao Trabalho", enquanto que a categoria "Dimensão Institucional" integra as unidades de significado "Condições de Trabalho" e "Relacionamento Interpessoal". Os fatores de insatisfação identificados nas entrevistas englobam tanto aspectos pessoais como institucionais e mostram correlação positiva com os achados de outros estudos que abordam sobre esse tema. A insatisfação no trabalho não causa repercussões somente na assistência ao paciente, mas também causa impacto no profissional refletindo na qualidade do seu trabalho e na sua produtividade.

Satisfação no emprego; Indicadores de qualidade; Recursos humanos de enfermagem no hospital


This study has the purpose of identifying the factors of work dissatisfaction according to the perception of nurses of a university hospital. This is a qualitative study in descriptive-exploratory approach. From the analysis of the interviews made with 6 nurses came 2 categories "Personal Dimension" and "Institutional Dimension". The category "Personal Dimension" is composed of the units of significance "Sentiments Related to Work" and "Attitudes Related to Work" while the category "Institutional Dimension" included the units of significance "Conditions of Work" and "Interpersonal Relationship". The factors of dissatisfaction identified in the interviews include both personal and institutional aspects, and show positive correlation with the findings of other studies with this subject. The work dissatisfaction does not cause impact only at the assistance for the patient, but causes impact on the professional reflecting on the quality of his work and its productivity too.

Job satisfaction; Quality indicators; Nursing staff, hospital


Este estudio tiene como objetivo identificar los factores de insatisfacción en el trabajo según la opinión de enfermeras de un hospital de la universidad. Es un estudio cualitativo en perspectiva descriptivo-exploratorio. Del análisis de las entrevistas realizadas con 6 enfermeras, 2 categorías fueron rescatadas: "Dimensión Personal" y "Dimensión Institucional". La categoría "Dimensión Personal" es integrada por las unidades de la significación "Sentimientos Relacionados con el Trabajo" y "Actitudes Relacionados con el Trabajo" al paso que la categoría "Dimensión Institucional" integra las unidades de la significación "Condiciones del Trabajo" y "Relación Interpersonal". Los factores de insatisfacción identificados en las entrevistas comprenden tanto aspectos personales como institucionales y muestran una correlación positiva con los resultados de otros estudios que tratan sobre este tema. La insatisfacción en el trabajo no causa impactos sólo en asistencia para el paciente, pero también causa impacto en el profesional reflejando sobre la calidad de su trabajo y su productividad.

Satisfacción en el trabajo; Indicadores de calidad; Personal de enfermería en hospital


ARTIGO ORIGINAL

Fatores de insatisfação no trabalho segundo a percepção de enfermeiros de um hospital universitário

Factores de la insatisfacción en el trabajo según la percepción de los enfermeros de un hospital universitario

Factors of work dissatisfaction according to the perception of nurses of a university hospital

Déborah Ju Young JeongI; Paulina KurcgantII

IBacharel e Licenciada em Enfermagem, Enfermeira Assistencial Bolsista do Hospital do Rim e Hipertensão, São Paulo, Brasil

IIDoutora em Enfermagem, Professora Titular da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, São Paulo, Brasil

Endereço do autor Endereço do autor: Paulina Kurcgant Av. Doutor Enéas de Carvalho Aguiar, 419 05403-000, São Paulo, SP E-mail: pkurcg@usp.br

RESUMO

Este estudo tem como objetivo identificar os fatores de insatisfação no trabalho segundo a percepção de enfermeiros de um hospital universitário. Trata-se de um estudo de natureza qualitativa na abordagem descritivo-exploratória. Da análise das entrevistas feitas com seis enfermeiras emergiram duas categorias: Dimensão Pessoal e Dimensão Institucional. A categoria "Dimensão Pessoal" é composta pelas unidades de significado "Sentimentos Relacionados ao Trabalho" e "Atitudes Relacionadas ao Trabalho", enquanto que a categoria "Dimensão Institucional" integra as unidades de significado "Condições de Trabalho" e "Relacionamento Interpessoal". Os fatores de insatisfação identificados nas entrevistas englobam tanto aspectos pessoais como institucionais e mostram correlação positiva com os achados de outros estudos que abordam sobre esse tema. A insatisfação no trabalho não causa repercussões somente na assistência ao paciente, mas também causa impacto no profissional refletindo na qualidade do seu trabalho e na sua produtividade.

Descritores: Satisfação no emprego. Indicadores de qualidade. Recursos humanos de enfermagem no hospital.

RESUMEN

Este estudio tiene como objetivo identificar los factores de insatisfacción en el trabajo según la opinión de enfermeras de un hospital de la universidad. Es un estudio cualitativo en perspectiva descriptivo-exploratorio. Del análisis de las entrevistas realizadas con 6 enfermeras, 2 categorías fueron rescatadas: "Dimensión Personal" y "Dimensión Institucional". La categoría "Dimensión Personal" es integrada por las unidades de la significación "Sentimientos Relacionados con el Trabajo" y "Actitudes Relacionados con el Trabajo" al paso que la categoría "Dimensión Institucional" integra las unidades de la significación "Condiciones del Trabajo" y "Relación Interpersonal". Los factores de insatisfacción identificados en las entrevistas comprenden tanto aspectos personales como institucionales y muestran una correlación positiva con los resultados de otros estudios que tratan sobre este tema. La insatisfacción en el trabajo no causa impactos sólo en asistencia para el paciente, pero también causa impacto en el profesional reflejando sobre la calidad de su trabajo y su productividad.

Descriptores: Satisfacción en el trabajo. Indicadores de calidad. Personal de enfermería en hospital.

ABSTRACT

This study has the purpose of identifying the factors of work dissatisfaction according to the perception of nurses of a university hospital. This is a qualitative study in descriptive-exploratory approach. From the analysis of the interviews made with 6 nurses came 2 categories "Personal Dimension" and "Institutional Dimension". The category "Personal Dimension" is composed of the units of significance "Sentiments Related to Work" and "Attitudes Related to Work" while the category "Institutional Dimension" included the units of significance "Conditions of Work" and "Interpersonal Relationship". The factors of dissatisfaction identified in the interviews include both personal and institutional aspects, and show positive correlation with the findings of other studies with this subject. The work dissatisfaction does not cause impact only at the assistance for the patient, but causes impact on the professional reflecting on the quality of his work and its productivity too.

Descriptors: Job satisfaction. Quality indicators. Nursing staff, hospital.

INTRODUÇÃO

O presente estudo integra o projeto de pesquisa "Construção de indicadores de qualidade para avaliação de serviços de enfermagem de hospitais universitários e de ensino", que foi desenvolvido em hospitais universitários e de ensino da região sudeste do país, campos de prática da área do ensino de administração em enfermagem.

Um dos resultados da primeira etapa dessa pesquisa considerou "Satisfação/Insatisfação no Trabalho" como um provável indicador de qualidade de gerenciamento de recursos humanos.

Nesse contexto, indicadores são considerados ferramentas destinadas a monitorar e avaliar a qualidade de um serviço propiciando, no âmbito gerencial, a identificação de problemas reais e potenciais, a fim de se implementar ações efetivas, juntamente com o monitoramentos destas(1). São, ainda, no caso da área de saúde, "uma medida quantitativa que pode ser empregada como um guia para monitorar e avaliar a qualidade dos cuidados providos ao usuário e às atividades dos serviços ou como uma chamada que identifica ou dirige a atenção para assuntos específicos de resultados dentro de uma organização de saúde, que devem ser motivos de revisão"(2).

Por outro lado, pelo fato da qualidade se tratar de um conceito abstrato e subjetivo, necessita de subsídios concretos e consensuais para ser adotada como ferramenta de avaliação de decisões e ações gerenciais(3). É nessa perspectiva, que o uso de indicadores tem sido adotado como ferramenta de medição para avaliação da qualidade em saúde(4).

Na literatura relacionada à área da saúde, há trabalhos acerca da satisfação/insatisfação do paciente sob diversos aspectos e em diferentes serviços. Entretanto, é contraditória a preocupação com a satisfação dos clientes e ignorar a dos profissionais de saúde sendo que a atuação destes influencia na qualidade do atendimento àqueles. É "incoerente preocupar-se apenas com os riscos a que os clientes estão expostos ou com os danos sofridos e não investir no combate à causa maior do erro, que são o despreparo técnico, as más condições de trabalho e a remuneração insuficiente, que levam à dupla ou à tripla jornada de trabalho diário de muitos profissionais"(5).

Ainda, em relação à qualidade do gerenciamento de recursos humanos em saúde, deve-se levar em conta o fator humano como aspecto influenciador imprescindível para o alcance das metas institucionais. Desconhecer, ignorar ou considerar esse fator de forma inadequada, tem resultado em fracasso em muitos programas de qualidade(6).

Os recursos humanos em Enfermagem constituem o maior contingente da força de trabalho na área da saúde, é o grupo profissional mais amplamente distribuído nas instituições de saúde sendo, aproximadamente, 60,2% dos vínculos de emprego de profissionais de saúde em 2004, e é o grupo profissional que desempenha os mais diversos papéis, funções e responsabilidades(7,8).

Assim, pelo quantitativo de profissionais na área da enfermagem e pela sua importância na prestação de serviços de saúde com qualidade, é imprescindível que esses profissionais estejam satisfeitos e motivados para a realização de seu trabalho.

O presente estudo parte do pressuposto de que a satisfação no trabalho é uma variável que "influencia o desempenho do trabalhador e pode atuar sobre inúmeras facetas do comportamento, desde o profissional até o social, interferindo em sua saúde mental"(9).

Sendo assim, tornam-se necessários estudos mais aprofundados em relação à insatisfação do enfermeiro no desenvolvimento dos processos de trabalho como uma variável que interfere na vida do trabalhador e no seu trabalho e, conseqüentemente, no seu bem estar e produtividade.

Nesse contexto, o presente estudo tem como objetivo identificar os fatores de insatisfação no trabalho, segundo a percepção de enfermeiros de um Hospital Universitário.

MÉTODO

O presente trabalho, de natureza qualitativa na abordagem descritivo-exploratória, foi realizado em um Hospital Universitário (HU) do Município de São Paulo, cuja missão é desenvolver atividades de ensino e pesquisa na área de saúde e assistência hospitalar de média complexidade, preferencialmente às populações de um Distrito de Saúde e de uma Comunidade Universitária.

A população do estudo foram seis enfermeiras, de um total de 12, lotadas em uma unidade da Clínica Médica do HU que conta, no seu quadro total de pessoal, com 188 enfermeiros. Para a determinação da população deste estudo, foram considerados: o fato de estarem sendo desenvolvidos estudos, na mesma temática, em outras unidades do HU e o fenômeno da invariância do método adotado, ou seja, o número de enfermeiras entrevistadas cessou quando a análise dos dados coletados mostrou similitude no conteúdo das falas resgatadas.

Para a coleta de dados, que ocorreu no período de fevereiro a junho de 2009, foi adotada a técnica da entrevista semi-estruturada com a adoção de um roteiro contendo informações sobre os dados sócio-demográficos dos participantes e as seguintes questões norteadoras: "Na sua opinião, qual o significado de insatisfação no trabalho" e "O que você considera como fatores de insatisfação no trabalho".

As participantes foram informadas acerca dos objetivos da pesquisa, foram garantidos o anonimato das entrevistadas e o sigilo das informações coletadas e, as colaboradoras foram nomeadas com as letras e números de E1 a E6.

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (USP), encaminhado à Câmara de Pesquisa do Hospital Universitário (HU) e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do HU (SISNEP CAAE: 0005.0.198.196-09).

As normas éticas para a realização desse estudo seguiram a Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde(10) que subsidiou a elaboração do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, o qual foi assinado pela pesquisadora e pelas colaboradoras da pesquisa.

Para a análise de dados, foi adotada a técnica da análise de conteúdo que consiste em "um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter por procedimentos sistemáticos e objectivos de descrição do conteúdo das mensagens indicadores (quantitativos ou não) que permitem a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens"(11).

APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Em relação aos dados sócio-demográficos das colaboradoras da pesquisa, todas são enfermeiras assistenciais, do sexo feminino, com média de idade de 34 anos e desenvolvem atividades nos turnos da manhã, tarde e noite

Os achados e a análise das narrativas permitiram o resgate de Unidades de Significado (US) que, agrupadas por similaridade de significados, possibilitaram a construção das Categorias Dimensão Pessoal e Dimensão Institucional. A primeira integra as US Sentimentos Relacionados ao Trabalho e Atitudes Relacionadas ao Trabalho, e a segunda é composta pelas US Condições de Trabalho e Relacionamento Interpessoal.

Estes achados são referendados na literatura, quando considera que o ser humano, para desempenhar qualquer atividade, utiliza-se de fatores internos e/ou externos(12), sendo os internos aqueles que levam à percepção do trabalho como uma forma de satisfação, auto-valorização e realização pessoal(13), enquanto que os externos estão ligados aos aspectos do local de trabalho, ou seja, do contexto onde o trabalhador se insere na instituição.

O trabalho da enfermagem pode ser considerado "na ambigüidade das convergências e divergências, que ocorrem na relação de trabalho entre indivíduo e organização. Embora o indivíduo e a organização sejam elementos integrantes "do" e, interdependentes, "no" processo de trabalho, de forma contínua, tendem a gerar um desequilíbrio de forças nessa relação"(3). Os problemas no trabalho, somados aos pessoais, geram uma sensação de impotência e insatisfação pessoal(3).

Na Categoria Dimensão Pessoal, tratando-se de insatisfação no trabalho, não há como dissociar o mundo pessoal do mundo do trabalho. Assim, além dos conhecimentos teóricos e práticos próprios da dimensão técnica, existem os sentimentos e as atitudes de cada indivíduo que também norteiam o exercício e o desempenho profissional.

Quanto à US Sentimentos Relacionados ao Trabalho, são resgatados aspectos referentes ao relacionamento intrapessoal, pois não basta o profissional ter conhecimentos teóricos e técnicos atualizados se não estiver satisfeito no seu trabalho, seja com as atividades que exerce ou pelo fato de não se sentir à vontade no ambiente onde trabalha. Esses fatores podem levar a um desempenho profissional de baixa qualidade e, conseqüentemente, prejudicar o resultado do seu trabalho e até mesmo causar a evasão desse trabalho.

Um dos sentimentos para evitar a evasão do trabalho, é a presença do prazer ou afinidade pelo que faz, no cargo que exerce(14). Diante disto, pode-se afirmar a importância de se considerar, no gerenciamento de recursos humanos, os sentimentos do enfermeiro em relação à sua profissão e ao seu trabalho.

Quando você vem trabalhar completamente sem vontade de estar aqui [...]. Porque você não sente o menor prazer em estar neste ambiente. Isso é insatisfação, pra mim, seria uma insatisfação se eu tivesse que vir pra cá meio que, não me sentindo a vontade aqui (E2).

Eu já tive uma comparação de quando saí do hospital, saí da faculdade, ir para um Hospital Psiquiátrico, por exemplo, não é minha área, eu não via a hora de ir embora [...] (E3).

Acho que é tudo o contrário que é satisfação. Se você faz o que você não gosta [...] (E4).

[...] quando você faz o que você não gosta, aí é um motivo muito grande de insatisfação. Eu acho que fatores de insatisfação, primeiro quando você não está contente com aquilo que você trabalha, segundo com a função que você desenvolve (E5).

Ainda, em se tratando da dimensão pessoal, a US Atitudes Relacionadas ao Trabalho refere-se às situações onde a insatisfação não está ligada ao que o trabalhador sente na sua relação com o trabalho, mas às condições em que o trabalho está sendo executado.

Insatisfação é quando, pra mim, é quando você não consegue centrar naquele objetivo que você está querendo, você não consegue fazer tudo que você tem que fazer no decorrer do plantão, ou por uma intercorrência com paciente. Você não conseguir fazer o que você tem de melhor prestar assistência da maneira que você gostaria. E isso, às vezes, me frustra (E3).

Insatisfação [...] eu acho assim, a parte mais difícil que eu vejo na enfermagem [...] é essa parte da supervisão, eu acho um pouco difícil, às vezes você se sente um pouco insatisfeita de não conseguir aplicar tudo o que você gostaria [...] a correria, você não consegue supervisionar tudo o que você deveria e, às vezes, falta alguma coisa e essa falta alguma coisa, me deixa um pouco insatisfeita (E6).

Muitas vezes, os enfermeiros não conseguem realizar tudo o que gostariam ou que deveriam desenvolver em um plantão. Esse fato também pode tornar o trabalho rotineiro, sem espaço para avanço ou transformação.

Talvez a dinâmica, às vezes, atrapalha um pouco, a gente, de vez em quando, acaba naquela coisa sistematizada, de ter que fazer as práticas e acaba não dando tempo de você procurar além disso, você quer fazer a medicação, o banho, evolução, o SAE, alguma coisa além disso, às vezes fica, a gente não consegue atingir algumas vezes (E6).

A sobrecarga de trabalho também restringe o convívio com a família que, juntamente com a proximidade dos plantões e insuficiência de pessoal e de material, causa desgaste no trabalhador(13). Dessa forma, um fator de insatisfação pode levar a outro, tornando-se um ciclo vicioso. Assim como a carga de trabalho pode interferir no convívio familiar, os problemas pessoais, inclusive com a família, podem interferir no trabalho, como é explicitado na fala a seguir:

[...] quando está com algum problema pessoal, que você não consegue separar e você fica insatisfeita querendo estar aqui e querendo estar em outro lugar (E5).

A falta de autonomia e o fato de se sentir insegura também são fatores de insatisfação que foram citados e são referendados na literatura que considera que a falta de autonomia pode levar o enfermeiro à insatisfação(15). Em um estudo sobre indicadores para avaliação de qualidade de gerenciamento de recursos humanos em enfermagem, levantou-se a importância da participação coletiva no processo decisório como ferramenta gerencial tanto para a qualidade do resultado da decisão tomada como para a satisfação do enfermeiro pela participação no planejamento, monitoramento e transformação do seu processo de trabalho(3).

Eu me vejo mesmo insatisfeita, eu quero mesmo fazer uma coisa aqui, eu não consigo porque tem que pedir pra não sei quem, tem que pedir pra não sei lá [...] (E3).

Eu acho que fatores de insatisfação [...] quando você se sente insegura [...] (E5).

Na Categoria Dimensão Institucional, os fatores institucionais que levam o profissional a faltar ao trabalho, a deixar ou trocar o emprego e a adoecer são considerados, pelos enfermeiros, como fatores geradores de insatisfação no trabalho(6).

Os aspectos intrínsecos como o reconhecimento, responsabilidade e autonomia são os mais responsáveis pela satisfação do enfermeiro enquanto os extrínsecos como o salário, qualidade de supervisão, relacionamento com a equipe e condições de trabalho são os mais assinalados no que diz respeito à insatisfação desse profissional(15). Este fato corrobora o maior número de fatores ligados à dimensão institucional em detrimento dos ligados à dimensão pessoal levantados nos discursos das colaboradoras.

Assim, a US Condições de Trabalho, refere-se à escassez, precariedade e/ou inadequação de recursos humanos e materiais como condições organizacionais identificadas pelas colaboradoras como fatores de insatisfação.

A escassez nos recursos materiais, humanos e físicos implica em uma diminuição da qualidade no atendimento ao cliente além de demandar maior esforço dos trabalhadores, de natureza psíquica ou física, podendo levar inclusive a acidentes de trabalho, e conseqüente insatisfação. "Do exposto vem a hipótese de que os esforços e as precárias condições de trabalho a que submetem trabalhadores de enfermagem contribuem para ocorrência de acidentes"(16).

[...] quando as minhas necessidades não são atendidas, eu não posso até trabalhar em condições ideais (E1).

[...] se você trabalha com em condições assim [...] com condições precárias, que não é o caso daqui, de materiais, de funcionários (E4).

Trabalhar nos finais de semana, feriados e plantões noturnos também foram considerados como fatores de insatisfação pelas colaboradoras e considerados fatores que podem prejudicar o convívio social, e no caso de plantões noturnos, pode até acarretar distúrbios psicossomáticos(17). Além disso, um estudo referente a turno de trabalho mostra que 58,3% das enfermeiras consideram que o melhor horário para trabalhar é no turno da manhã, 41,6% optaram pelo turno da tarde, enquanto que nenhuma optou pelo período da noite(18). As falas , a seguir, corroboram esta realidade:

Carga horária, principalmente, carga horária e escalamento. É isso que [...] trabalhar de final de semana, na verdade. É isso que tem me atrapalhado, que tem me feito insatisfeita na profissão (E1).

Ter que trabalhar de sábados, domingos e feriados [...]. Isso eu passava mesmo quando eu trabalhava no período da noite também (E2).

A restrição física de alguns funcionários para exercer atividades como empurrar cadeira ou levar paciente para realizar raio-x, exemplos citados pela E3 na entrevista, acarreta sobrecarga de trabalho aos demais, inclusive aos enfermeiros, gerando insatisfação. Essa limitação física é advinda, na maior parte das vezes, da natureza do próprio trabalho, pelo excesso de esforço físico que os profissionais de enfermagem despendem na assistência a pacientes com peso excessivo ou inconscientes, e que pode ser equiparada, nas suas consequências, ao absenteísmo quando acarreta sobrecarga aos trabalhadores presentes ao trabalho, gerando um ciclo vicioso de desgaste e desajuste mental(16).

[...] isso está deixando tanto os enfermeiros, como os técnicos e auxiliares de enfermagem sobrecarregados porque as pessoas que estão com restrição, elas não têm culpa, lógico, mas acaba que sobrecarrega os outros [...] isso me deixa insatisfeita sim (E3).

[...] a gente está tentando remodelar a escala mas está difícil porque tem mais funcionário com restrição no plantão do que os próprios funcionários que estão bem e isso é uma insatisfação tanto pra mim como pro grupo [...] (E3).

Outro fator citado nas falas das colaboradoras refere-se ao salário que pode ser considerado como um fator de insatisfação. O salário é considerado o maior fator gerador de insatisfação por parte dos enfermeiros por não ser coerente com a responsabilidade e funções desempenhadas por esse profissional(12). Há um consenso quanto à opinião de que o enfermeiro é um trabalhador mal remunerado(15), apesar da fala abaixo explicitar que este não é o caso do hospital em estudo.

Claro que o salário também se for, cada vez que aumenta, é melhor, né? Mas, o salário aqui do HU não é considerado salário ruim (E4).

[...] quando você sente que o salário está ruim [...] (E5).

Ainda na Categoria Dimensão Institucional, a US Relacionamento Interpessoal evidencia que as relações interpessoais também foram consideradas, pelas participantes, como fator de insatisfação no trabalho.

A insatisfação no trabalho também diz respeito ao relacionamento interpessoal e intersetorial(12). No presente estudo, as relações interpessoais estão relacionadas tanto à equipe de enfermagem, inclusive à chefia, como ao restante da equipe de saúde e da instituição.

Acho que tem, às vezes, um grupo mais difícil, quando você pega uma equipe de enfermagem mais difícil, onde as pessoas não se conversam, onde as pessoas não se ajudam, isso é complicado, acho que, principalmente quando as enfermeiras não conversam entre si, não chegam ao acordo sobre condutas, sobre como vão levar as situações, aí cada uma fala uma coisa, cria um ambiente muito difícil dentro da equipe. Isso é uma coisa que me traz bastante insatisfação (E2).

[...] quando você não tem uma chefia que te respalde [...] (E5).

A insatisfação na relação com os outros membros da equipe multiprofissional, principalmente com a equipe médica, também aparece nas falas. O enfermeiro é um profissional que, freqüentemente, encontra dificuldades de relacionamento com a equipe médica(15).

E eu fico insatisfeita quando a gente trabalha com aluno de medicina, 6ºano, 3ºano, trabalha com assistente, a gente trabalha com gente formada já e tem a coisa do relacionamento, né, essa coisa muito difícil porque cada um pensa de uma maneira [...] (E3).

Estudo considera que "no Brasil de maneira geral a relação saúde-trabalho é muito problemática, devido especialmente à inexistência de condições de vida e trabalho satisfatórias"(18).

Nesse contexto, a correlação positiva existente entre as condições institucionais onde o trabalho se desenvolve e a satisfação/insatisfação do trabalhador, no desempenho das atividades laborais, mostra que os profissionais que são afetados pelos fatores de insatisfação, também têm seus processos de trabalho afetados, pois a qualidade do atendimento ao cliente não depende só das condições da instituição, mas também, dos profissionais que ali trabalham, interferindo tanto na realização como nos resultados desse trabalho(19).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pela análise das entrevistas, concluí-se que os fatores geradores de insatisfação no trabalho segundo a percepção dos enfermeiros da Clínica Médica deste hospital universitário, englobam tanto aspectos pessoais como institucionais.

Fica evidenciada, no estudo realizado, a presença obrigatória dos dois pólos constitutivos de toda organização de saúde, trabalhador/instituição, uma vez que a existência dessas organizações depende desses dois elementos essenciais. Fica evidente também, a luta ambígua que ocorre entre esses dois pólos seja pela detenção de maior poder ou pela obtenção de mais e melhores recursos organizacionais.

Assim, na dimensão pessoal emergiram sentimentos relacionados ao significado do trabalho e ao modo como este está sendo executado. A falta de afinidade com o trabalho, seja pelo ambiente ou pela função que o trabalhador exerce, a falta de autonomia, a presença de sentimentos de insegurança e frustração apontam para a falta de condições institucionais que permitam o desempenho de um trabalho realizador e reconhecido.

Quanto à dimensão institucional, a jornada de trabalho e os turnos, a sobrecarga das atividades desenvolvidas, o salário não compatível com a responsabilidade e a restrição física de alguns profissionais para a execução de atividades demandadas, além de serem fatores geradores de insatisfação colocam em risco a própria assistência prestada o que também resulta em fator de insatisfação no trabalho. No referente às dificuldades de relacionamento interpessoal, surgiram fatores relacionados tanto à equipe de enfermagem, que inclui a chefia, como ao restante da equipe multiprofissional.

Os fatores de insatisfação resgatados neste estudo mostram correlação positiva com os achados de outros estudos que abordam a insatisfação do enfermeiro no trabalho.

Diante do exposto, as insatisfações no trabalho não causam repercussões somente na assistência ao paciente, mas também causam impacto no profissional refletindo na qualidade do seu trabalho e na produtividade. Fica evidente que os fatores geradores de insatisfação não podem ser analisados de forma isolada ou fragmentados, ou seja, tem que ser considerados no contexto das políticas e diretrizes organizacionais, bem como nas decisões e ações gerenciais,

Concluindo, é imprescindível que os gerentes conheçam os fatores geradores de insatisfação no trabalho, mas é imperativo que busquem ações coletivas que minimizem e resolvam os problemas por eles gerados.

Recebido em: 06/04/2010

Aprovado em: 07/12/2010

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  • Endereço do autor:
    Paulina Kurcgant
    Av. Doutor Enéas de Carvalho Aguiar, 419
    05403-000, São Paulo, SP
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      03 Jun 2011
    • Data do Fascículo
      Dez 2010

    Histórico

    • Recebido
      06 Abr 2010
    • Aceito
      07 Dez 2010
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