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Caracterização sociodemográfica, de saúde e apoio social de idosos usuários de um serviço de emergência

Sociodemográfico, salud y apoyo social de los usuarios ancianos de un servicio de emergencia

Resumos

Este estudo tem como objetivo caracterizar aspectos sociodemográficos, de saúde, e o apoio social de idosos usuários do Serviço de Emergência (SE) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA). Investigação transversal, realizada com amostra aleatória de 220 idosos. Foi utilizado questionário estruturado sobre características sociodemográficas, de saúde e apoio social. Idosos eram, na sua maioria, mulheres, casados, aposentados, procedentes de Porto Alegre, e encontravam-se na faixa etária dos 60 aos 69 anos. Quase a metade referiu ter a saúde ruim ou muito ruim, e as morbidades autorreferidas predominantes eram cardiovasculares. De modo diverso a outros estudos com idosos da comunidade, a maioria declarou receber apoio dos familiares e poucos forneciam. O apoio da rede formal foi pequeno. A assistência necessita ocorrer em rede, a fim de proporcionar suporte ao idoso e à família, evitando o uso frequente dos serviços de emergência e qualificando o cuidado.

Idoso; Serviço Hospitalar de Emergência; Apoio Social; Saúde do Idoso; Enfermagem


Este estudio tiene como objetivo caracterizar los aspectos sociodemográficos, de salud y apoyo social de los usuarios ancianos del Servicio de Emergencia (SE) del Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA). Estudio transversal realizado con una muestra aleatoria de 220 adultos mayores. Se utilizó un cuestionario estructurado sobre características sociodemográficas, de salud y apoyo social. Los sujetos eran en su mayoría mujeres, casados, jubilados, de Porto Alegre y tenían edades entre 60 y 69 años. Casi la mitad reportó tener una salud mala o muy mala y la morbilidad autoinformada prevalente fue la cardiovascular. A diferencia de otros estudios con los ancianos de la comunidad, la mayoría de los informes que reciben apoyo de la familia y pocos la proporcionaban. El apoyo de la red formal era pequeño. El cuidado de los ancianos necesita ocurrir en la red para prestar apoyo a los ancianos y la familia, evitando el uso frecuente de los servicios de emergencia y calificar la atención.

Anciano; Servicio de urgencia en hospital; Apoyo social; Salud del anciano; Enfermería


The aim of this study was to characterize the sociodemographic aspects, health issues and social support offered to the senior users of the Emergency Department of the Hospital de Clinicas in Porto Alegre. A cross-sectional survey was conducted with a random sample of 220 seniors. A structured data form was used to collect data related to the sociodemographic and health characteristics and social support. The majority of subjects were women, married, retired, from Porto Alegre, and aged from 60 to 69 years. Almost half reported having poor or very poor health and the prevalent self-reported morbidities were cardiovascular diseases. Differently from other studies with seniors from the community, the majority reported receiving support from family and few provided support. Social support from the formal network was small. Health care must occur in a comprehensive network to provide support to the seniors and their families and to prevent the frequent use of emergency services and to qualify assistance.

Seniors; Emergency service, hospital; Social support; Health of the elderly; Nursing


ARTIGO ORIGINAL

Caracterização sociodemográfica, de saúde e apoio social de idosos usuários de um serviço de emergência

Sociodemográfico, salud y apoyo social de los usuarios ancianos de un servicio de emergencia

Andreivna Kharenine SerbimI; Ana Valéria Furquim GonçalvesII; Lisiane Manganelli Girardi PaskulinIII

IProfessora Assistente do curso de Enfermagem na Universidade Federal de Alagoas (UFAL) – Campus Arapiraca, Arapiraca, Alagoas, Brasil. Mestre em Enfermagem pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

IIChefe de Unidade do Serviço de Emergência do Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil. Mestre em Enfermagem pela UFRGS

IIIProfessora Adjunta da Escola de Enfermagem da UFRGS, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil. Doutora em Ciências pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP)

Endereço para correspondência Endereço do autor / Dirección del autor / Author's address Andreivna Kharenine Serbim Universidade Federal de Alagoas - UFAL Campus de Arapiraca Av. Manoel Severino Barbosa, s/n, Bom Sucesso 57309-005, Arapiraca, AL E-mail: kharenine@gmail.com

RESUMO

Este estudo tem como objetivo caracterizar aspectos sociodemográficos, de saúde, e o apoio social de idosos usuários do Serviço de Emergência (SE) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA). Investigação transversal, realizada com amostra aleatória de 220 idosos. Foi utilizado questionário estruturado sobre características sociodemográficas, de saúde e apoio social. Idosos eram, na sua maioria, mulheres, casados, aposentados, procedentes de Porto Alegre, e encontravam-se na faixa etária dos 60 aos 69 anos. Quase a metade referiu ter a saúde ruim ou muito ruim, e as morbidades autorreferidas predominantes eram cardiovasculares. De modo diverso a outros estudos com idosos da comunidade, a maioria declarou receber apoio dos familiares e poucos forneciam. O apoio da rede formal foi pequeno. A assistência necessita ocorrer em rede, a fim de proporcionar suporte ao idoso e à família, evitando o uso frequente dos serviços de emergência e qualificando o cuidado.

Descritores: Idoso. Serviço Hospitalar de Emergência. Apoio Social. Saúde do Idoso. Enfermagem.

RESUMEN

Este estudio tiene como objetivo caracterizar los aspectos sociodemográficos, de salud y apoyo social de los usuarios ancianos del Servicio de Emergencia (SE) del Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA). Estudio transversal realizado con una muestra aleatoria de 220 adultos mayores. Se utilizó un cuestionario estructurado sobre características sociodemográficas, de salud y apoyo social. Los sujetos eran en su mayoría mujeres, casados, jubilados, de Porto Alegre y tenían edades entre 60 y 69 años. Casi la mitad reportó tener una salud mala o muy mala y la morbilidad autoinformada prevalente fue la cardiovascular. A diferencia de otros estudios con los ancianos de la comunidad, la mayoría de los informes que reciben apoyo de la familia y pocos la proporcionaban. El apoyo de la red formal era pequeño. El cuidado de los ancianos necesita ocurrir en la red para prestar apoyo a los ancianos y la familia, evitando el uso frecuente de los servicios de emergencia y calificar la atención.

Descriptores: Anciano. Servicio de urgencia en hospital. Apoyo social. Salud del anciano. Enfermería.

INTRODUÇÃO

A velhice associa-se à maior prevalência de doenças crônicas e incapacidades, necessidades de saúde mais complexas e maior utilização dos serviços de saúde, quando comparada a outros grupos etários. Sabe-se também que durante as internações hospitalares, o tempo de ocupação do leito é maior(1).

Estudos nacionais e internacionais sobre o perfil dos usuários de serviços de emergência têm identificado que a proporção de idosos que utilizam estes serviços varia de 12 a 29% e que o número de usuários deste grupo etário vem aumentando(2-4). As possibilidades de buscar atendimentos sem caráter de urgência são maiores para aqueles pacientes que não são referenciados pelos serviços de saúde e que são portadores de danos crônicos(4).

No Brasil, os serviços de emergência compõem uma das portas de entrada ao sistema de saúde(5). Devido à grande complexidade organizacional e às dificuldades na estruturação desses serviços, torna-se importante a compreensão da demanda e do perfil dos usuários, a fim de aperfeiçoar e qualificar o atendimento. Investigar casos de pessoas idosas que procuram serviços de emergência numa situação de agravamento de saúde e conhecer a rede formal e informal com as quais esses idosos contam pode contribuir para identificar aspectos das condições de vida e da assistência em saúde.

O apoio social é considerado um dos mais importantes preditores da saúde física e do bem estar, desde a infância até a senilidade. Ele compreende um processo complexo e dinâmico que envolve os indivíduos e suas redes sociais com o intuito de satisfazer as suas necessidades, prover e complementar os recursos que possuem e, dessa forma, enfrentar novas situações(6). Pode ser definido como a totalidade de recursos oferecidos por outras pessoas. São trocas mútuas nas quais tanto quem recebe quanto quem oferece o apoio é beneficiado por dar um maior sentido à vida(6). O apoio social é composto por uma função e uma estrutura, as quais são aspectos e fenômenos distintos(6). A função é relacionada ao fornecimento de recursos emocionais e práticos(6). A estrutura das relações sociais, ou seja, a rede de apoio social, refere-se à organização do vínculo das pessoas umas com as outras(6). A rede de apoio formal é composta pelas políticas públicas direcionadas à população idosa em geral, agregando serviços de atenção à saúde, instituições jurídicas de garantia dos direitos, órgãos da previdência social, dentre outros. Considera-se como rede informal a família, a comunidade, os amigos e os vizinhos(7).

Em qualquer nível de atenção à saúde, enfermeiros e demais profissionais da área devem identificar os recursos utilizados pelos idosos como apoio, a fim de planejar ações de cuidado. No contexto de atenção aos idosos em serviços de emergência, surgem questões como: qual o perfil de saúde e socioeconômico dos idosos que utilizam serviço hospitalar de urgência? Quais são as demandas de apoio dos idosos que utilizam esse serviço? Quem esses idosos podem ter como referência quando necessitam de apoio?

Analisar as redes de apoio implica preparar, acompanhar e amparar a família, a comunidade e os grupos de voluntários que se envolvem na tarefa de cuidado aos idosos. Significa também gerir locais, equipamentos e técnicas que favoreçam o bem-estar dos idosos e daqueles que respondem por eles(7).

Este estudo é um recorte de uma dissertação de mestrado que investigou as redes e o apoio social percebido por idosos usuários de um serviço de emergência(8). O objetivo da presente investigação é caracterizar os aspectos sociodemográficos, de saúde e o apoio social de idosos usuários do Serviço de Emergência (SE) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA). Ressalta-se que existem poucos estudos sobre o perfil de usuários atendidos nas emergências no contexto nacional(9-10). Com este estudo pretende-se contribuir para o conhecimento das características dos idosos usuários do SE, trazendo informações para a efetividade organizacional do serviço e para a qualificação da assistência.

MÉTODOS

Inquérito de serviço, transversal e observacional, com abordagem quantitativa. O estudo foi realizado no SE do HCPA. Este serviço tem cadastrado junto ao gestor municipal 49 leitos adultos e 15 pediátricos e atualmente está estruturado nas seguintes áreas: acolhimento com avaliação e classificação de risco, pediatria, sala de observação verde, sala de observação laranja, sala de internação e unidade vascular. No período da coleta de dados, o SE utilizava um Protocolo de Avaliação com Classificação de Risco canadense, que possuía cores para parâmetros de gravidade e atendimento: roxo para atendimento imediato; vermelho, alto risco; amarelo, risco intermediário e verde, baixo risco. Em setembro de 2011, o protocolo de Manchester passou a ser adotado na Instituição.

A população do estudo foi composta pelos idosos que utilizaram o SE do HCPA. A amostra aleatória de 220 idosos foi baseada nos resultados obtidos em estudo populacional com idosos, no qual foi identificado que 29,3% dos respondentes recebiam algum tipo de apoio(11). Foi considerada uma margem de erro de seis pontos percentuais e um nível de significância de 95%.

Os critérios de inclusão da amostra foram: ser usuário com 60 anos ou mais que procurou o SE; obter 13 pontos ou mais no Mini Exame do Estado Mental (MEEM). No caso de o idoso obter 12 pontos ou menos no MEEM foi utilizado o informante substituto para realização da entrevista. Esta opção permitiu caracterizar os idosos que não puderam responder o instrumento por maior fragilidade. Os critérios de exclusão foram: idosos sem acompanhante e sem condições de responder à entrevista; que foram à óbito ou transferidos para outros locais imediatamente após admissão no SE.

A coleta foi realizada em 2011, durante 60 dias, em todos os dias da semana. A fim de garantir a aleatoriedade da amostra, foram entrevistados um paciente no turno da manhã, dois pacientes no turno da tarde (horário de maior demanda de pacientes) e um paciente no turno da noite. Os horários, dentro de cada um dos três turnos, também foram alternados de modo sistemático. O horário das 23h até 8h não foi utilizado em função do pequeno número de pacientes que procuram o serviço neste horário, conforme levantamento prévio realizado.

A coleta de dados dos usuários idosos classificados como baixo risco (verde) e de risco intermediário (amarelo) foi realizada no setor de classificação de risco do SE, em espaços que garantiam a privacidade. Os pacientes classificados como graves (roxo) e de alto risco (vermelho) tiveram a entrevista realizada 24h após a chegada ao SE.

Além do MEEM foi também utilizado um questionário sobre características sociodemográficas, de saúde e apoio social (apoio recebido/fornecido).

O programa Statistical Package for Social Sciences (SPSS), versão 18.0, foi usado para o gerenciamento dos dados. Na análise, as variáveis categóricas foram expressas como frequência absoluta e relativa e as variáveis contínuas foram expressas como média±desvio padrão(DP).

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do HCPA (n.110023). Os idosos/acompanhantes assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

RESULTADOS

Na amostra de idosos estudada (n=220), a média do MEEM foi 18,1 pontos (DP=10,4 pontos). Dos 220 entrevistados, 160 (72,7%) eram idosos e os outros 60 (27,3%) eram acompanhantes. Dos 60 acompanhantes, destacaram-se os filhos (63,3%), os cônjuges (18,3%) os amigos e outros familiares (18,3%). Dos 60 idosos que não responderam à entrevista, 40(66,6%) estavam sem condições de responder à mesma e 20(33,3%) apresentaram um escore ≤ 12 pontos no MEEM.

Com relação à classificação de risco dos idosos do estudo, 31 (14%) foram classificados como verde, 174 (79%) como amarelo, 11 (5%) como vermelho e quatro (1,8%) idosos tiveram a classificação de risco roxa.

Quanto ao sexo, 114 (51,8%) eram mulheres. O percentual de idosos jovens (60-69 anos) foi de 45%, de meio idosos (70-79 anos) foi de 37,3% e em menor proporção, os idosos de 80 anos ou mais com 17,7%.

A maioria dos idosos era procedente do município de Porto Alegre, como mostra a Tabela 1. Quanto ao estado conjugal, 94 (42,7%) eram casados. Grande parte era aposentada e os idosos possuíam, em média, 4,4 anos de estudo (DP=3,8 anos). Quanto à renda familiar, predominavam aquelas de até dois salários mínimos.

Os idosos tinham em média 3,5 filhos (DP= 2,46). Verificou-se ainda que 38 (16,9%) moravam sozinhos e entre os que residiam acompanhados, 46 (21%) moravam com o cônjuge (domicílio unigeracional), 60 (27,4%) idosos moravam com filhos e genros ou noras (domicílio com duas gerações) e 61 (27,9%) moravam com netos e bisnetos (domicílio com três gerações ou mais). Observou-se também que 12 (5,5%) idosos moravam com outros parentes (mãe, sobrinho, irmão) e que três (1,4%) eram institucionalizados. O domicílio em que o idoso morava teve como média 2,9 residentes(DP= 1,7).

Ao questionar o estado de saúde autorreferido , a maioria dos respondentes relatou ter a saúde ruim ou muito ruim (Tabela 2). Os idosos da amostra referiram serem portadores de, em média, 1,8 morbidades (DP=1,0). Quanto às morbidades autorreferidas, as mais citadas foram doenças do aparelho circulatório.

Na Tabela 3 estão descritas as principais formas de apoio recebidas e fornecidas pelos idosos estudados. Observa-se que 175 (90,2%) idosos relataram receber apoio da família. Já 153 (81,5%) idosos relataram fornecer apoio para a família.

Quanto ao apoio formal, 159 (72,3%) participantes relataram receber apoio de uma instituição formal, sendo mais citados os serviços de saúde. Durante as entrevistas observou-se que a maior parte referiu como serviço de saúde uma unidade de atenção básica, sendo citada ainda a farmácia de medicamentos especiais do Governo do Estado e a farmácia popular.

DISCUSSÃO

No presente estudo a proporção de idosos com déficit cognitivo foi de 9,0%. Ao comparar os resultados com estudo populacional(12) que avaliou a deterioração cognitiva de idosos do município São Paulo, a proporção foi de 6,9%, demonstrando que os idosos que utilizavam o SE apresentavam maiores necessidades de saúde devido ao déficit cognitivo.

Com relação às classificações de risco dos idosos do estudo, verificou-se que a proporção foi semelhante à classificação de risco dos usuários adultos do SE no ano de 2011, conforme dados do Sistema de Informações Gerenciais do HCPA, predominando os usuários classificados como amarelo (79%), seguidos dos classificados como verde (14%), vermelho (11%) e roxo (1,8%). É possível que com a utilização do Protocolo de Manchester o número de idosos classificados como amarelos seja superior à proporção dos adultos em geral, considerando que este protocolo discrimina melhor a gravidade das queixas dos usuários atendidos como urgentes e pouco urgentes.

Observou-se que o número de idosas foi ligeiramente superior aos homens, o que vai ao encontro a estudos sobre perfil da população que utiliza os serviços de emergência(9-10). Destaca-se ainda uma quantidade significativa de idosos com 80 anos ou mais, semelhante a estudos internacionais(2) que pode estar associada ao aumento da população idosa do município de Porto Alegre(13). A tendência é de que a proporção de idosos mais velhos que procuram o SE aumente e este deve estar preparado para atender as especificidades deste grupo etário, na qual a ocorrência de fragilidade é maior.

Com relação à cidade de origem, dados semelhantes foram encontrados em estudos realizados com usuários adultos de serviços de emergências em Florianópolis(10), São Paulo(14) e Campinas(9) no qual a maior parte dos usuários era procedente da cidade na qual se situava o serviço, mas com uma quantidade significativa de usuários de outras cidades. Apesar de não ter sido formulada uma questão específica sobre o motivo de busca por atendimento em Porto Alegre, durante as entrevistas, observou-se relatos frequentes que no SE os problemas de saúde eram resolvidos e que nos outros municípios onde os idosos viviam, o atendimento dos serviços de saúde era precário. Outro motivo relatado pelos idosos era de já realizarem acompanhamento no ambulatório da Instituição.

No presente estudo predominaram os idosos casados e aposentados como encontrados em outros estudos populacionais realizados no município de Porto Alegre(15-16)* * Pela ausência de informações publicadas sobre usuários idosos dos serviços de emergência, optou-se por comparar os resultados com dados populacionais ou de outros serviços. . Este achado pode significar um fator de proteção para os idosos que utilizam o serviço, considerando que os mesmos dispõem do cônjuge para apoiá-los ou um fator de maior vulnerabilidade, considerando que são idosos cuidando de idosos. Verificou-se ainda que as aposentadorias, pensões ou benefícios dos idosos do presente estudo eram rendas que, apesar de pequenas, contribuíam para o suporte material e financeiro das famílias. A média dos anos de estudo dos idosos do presente estudo foi um pouco menor que a média dos idosos gaúchos em 2009, que foi de cinco anos(17). Os achados são semelhantes aos dados das pesquisas nacionais por amostra de domicílios (PNAD) da última década, nas quais os idosos dependentes com baixa renda auxiliavam ou sustentavam suas famílias, fato que lhes conferia algum empoderamento para que fossem cuidados pelas mesmas(18).

Com relação ao número de filhos observa-se que ainda é um número razoável para dar apoio aos idosos, mas sabe-se que nem sempre este fato representa suporte a eles(19). Quanto ao número de idosos morando sozinhos, os valores são semelhantes a resultados de pesquisa nacional para a região Sul. Salienta-se que o sul do Brasil possui uma das maiores proporções de em domicílios unipessoais entre idosos(18). Essas informações podem ter implicações para os serviços de emergência, à medida que idosos que têm menos filhos e que moram sozinhos poderiam receber menos apoio e, consequentemente vivenciar situações ou agravos á saúde em que necessitem utilizar mais os serviços de emergência, como quedas ou até a agudização de problemas crônicos.

Em relação ao estado de saúde autorreferido, os resultados encontrados divergem dos estudos populacionais(15,20), nos quais a maior parte dos idosos mencionou ter saúde boa ou muito boa, possivelmente por estarem apresentando menores necessidades de cuidado naquele momento. Em relação ao número de morbidades autorreferidas, os resultados do estudo assemelham-se às frequências nacionais. Em um estudo populacional brasileiro(20), quase um terço dos idosos citaram ter uma doença; o restante, duas ou mais doenças. Em contrapartida, 24,9% dos idosos da PNAD declararam não possuir nenhuma patologia, evidenciando a diferença entre os dados coletados na comunidade e no serviço de emergência. Essa disparidade entre dados demonstra que os idosos portadores de danos crônicos apresentam agudização de seus problemas e necessitam de cuidados de alta intensidade no momento em que buscam um serviço de emergência.

Frente aos dados levantados, percebe-se que muitos idosos optam pelo serviço de emergência para acompanhamento dos danos crônicos e não utilizam os demais serviços de saúde. Além disso, 7,3% dos entrevistados relataram, apesar de não relatarem nenhuma doença, procurar o serviço de emergência. Acredita-se que o acesso resolutivo a outros serviços, que compõe a própria Portaria referente à rede de urgências, poderia dar conta das demandas destes usuários(5). Entre as morbidades autorreferidas, destacaram-se as doenças do aparelho circulatório e as neoplasias de modo semelhante aos principais grupos de causas de mortalidade no Brasil e no Rio Grande do Sul(18).

Estudos sobre as transferências de apoio entre idosos no Brasil são restritos. Ao se comparar uma investigação(11) que avaliou a percepção de 329 idosas de uma localidade de baixa renda no município do Rio de Janeiro, sobre o tipo de apoio recebido e oferecido à família, apenas 29,3% das idosas declararam receber apoio da família e 58,3% forneciam, contrastando com os dados da presente investigação na qual os resultados foram superiores. Entretanto, o tipo de apoio recebido (cuidado pessoal, auxílio para se locomover e moradia) e fornecido (dinheiro e moradia) foi semelhante ao presente estudo. Outro fato que deve ser levado em consideração é que aquele estudo foi realizado apenas com mulheres, que tendem a fornecer mais apoio do que receber. Verifica-se ainda, no presente estudo, que essas transferências de apoio intergeracionais não ficaram restritas apenas à co-residência. É possível que os tipos de apoio sejam semelhantes pela baixa renda familiar, evidenciando a importância das transferências de apoio entre as gerações.

Comparando ainda os resultados do estudo carioca com a presente investigação quanto ao apoio formal verifica-se que as idosas daquele estudo também relatavam receber pouco apoio. Parece que a estruturação de redes de apoio formal para os idosos é um grande desafio para vários municípios brasileiros que já vêm enfrentando o processo de envelhecimento populacional.

Nos resultados do presente estudo, observou-se citada como tipo de apoio oferecido pelos serviços de saúde apenas a distribuição de medicamentos e não outros tipos que poderiam ser oferecidos pela rede de atenção básica, como visitas domiciliares, consultas com a equipe de saúde, grupos. Isso sugere que a população que utilizou o serviço de emergência possivelmente não o fez de modo sistemático e que o tipo de apoio recebido está mais relacionado a ações pontuais do que a ações de cuidado profissional.

Um estudo internacional(2) identificou que idosos que recebem suporte da atenção primária utilizam os serviços de emergência com menor frequência. Na presente investigação, os únicos serviços de saúde citados foram o próprio hospital e uma Unidade Básica de Saúde, evidenciando o vínculo estabelecido entre os idosos e o serviço hospitalar. Outro aspecto importante é a questão da integralidade e da própria função da rede de apoio formal voltada para o provimento de renda ou produtos que se mostrou pontual. Apesar de importante, o suporte financeiro e fornecimento de medicações não pode ser a única forma de suporte.

CONCLUSÕES

Verifica-se no presente estudo que os idosos usuários do serviço de emergência apresentam vulnerabilidades sociais e de saúde tais como baixa escolaridade, renda familiar reduzida, percepção de saúde ruim ou muito ruim, presença de danos crônicos agudizados e comorbidades. Por outro lado muitos eram idosos jovens e pareciam contar com a rede de apoio informal, pois grande parte era casada, possuía filhos e residia em domicílios intergeracionais.

Com relação ao apoio recebido, a maior parte dos idosos declarou receber apoio da família para o cuidado pessoal, o auxílio para se locomover, o dinheiro e a moradia. Um número menor de respondentes relatou oferecer algum tipo de apoio à família, destacando-se o dinheiro, cuidado dos netos e serviços.

Apesar das relações de troca terem ocorrido nos dois sentidos, o fluxo foi muito maior no sentido da família para os idosos. Por isso, alternativas de apoio devem ser buscadas para dar suporte ao idoso e seus cuidadores. As necessidades de saúde de pessoas idosas são complexas e necessitam ser conhecidas e trabalhadas nos serviços de saúde.

Quanto ao apoio formal, quase três quartos dos idosos declararam receber apoio de uma instituição, mas os tipos de apoio restringiam-se ao fornecimento de medicamentos, ao Benefício de Prestação Continuada e a cesta básica, o que se considera aquém do necessário.

Considerando o aumento da população idosa e de suas necessidades, será crescente a utilização dos serviços de saúde e as demandas de cuidado. A rede informal já vem enfrentando este desafio e não dará conta deste cuidado isoladamente. Acredita-se que os enfermeiros que atuam em todos os níveis de atenção, tendo por base o cuidado integrado e responsável, precisam auxiliar a rede informal a enfrentar os desafios e planejar/executar ações destinadas a este grupo populacional nos serviços de saúde. Pesquisas na área devem ser incentivadas a fim de ampliar a análise do perfil e das redes de apoio por pessoas idosas.

Recebido em: 05.05.2012

Aprovado em: 15.01.2013

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    Pela ausência de informações publicadas sobre usuários idosos dos serviços de emergência, optou-se por comparar os resultados com dados populacionais ou de outros serviços.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      03 Abr 2013
    • Data do Fascículo
      Mar 2013

    Histórico

    • Recebido
      05 Maio 2012
    • Aceito
      15 Jan 2013
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