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Qualidade de vida de idosos com doença de Alzheimer e de seus cuidadores

Quality of life of elders with Alzheimer's disease and of their caregivers

Calidad de vida de los ancianos con enfermedad de Alzheimer y sus cuidadores

Resumos

O objetivo do estudo foi identificar a qualidade de vida (QV) do cuidador e a do idoso com Doença de Alzheimer (DA). Estudo descritivo-exploratório realizado em Maringá, Paraná, junto a 50 idosos e seus respectivos cuidadores. Os dados foram coletados no período de novembro de 2010 a janeiro de 2011 com aplicação da Escala de Avaliação da Qualidade de Vida na Doença de Alzheimer. A média dos escores totais para pacientes e cuidadores foi respectivamente, 26,36 e 35,04 pontos. Os itens moradia (98%) e família (72%) apresentaram maior satisfação para cuidadores e idosos e os itens memória e tarefas (92%) para os cuidadores e lazer (52%) para os idosos alcançaram maiores índices de insatisfação. Considera-se que a QV do cuidador reflete diretamente no cuidado prestado e, portanto, também deve ser considerada no planejamento e implementação da assistência ao idoso com DA.

Doença de Alzheimer; Qualidade de vida; Cuidadores


The objective of the study was to identify the quality of life (QoL) of elders with Alzheimer`s Disease (AD) and of their caregivers. This is a descriptive-exploratory study carried out with 50 elders and caregivers in the city of Maringá, state of Paraná, Brazil. The data were collected from November, 2010, to January, 2011, with the use of the Quality of Life in Alzheimer's Disease Scale. The average of the total scores for patients and caregivers were 26.36 and 35.04 points, respectively. The fields home (98%) and family (72%) presented greater satisfaction for both caregivers and elders. The fields memory and tasks (92%) for the caregivers, and leisure (52%) for the elders reached larger dissatisfaction indexes. It is considered that the caregiver's QoL reflects directly upon the care and, therefore, it should also be considered in the planning and implementation of care to the elderly with AD.

Alzheimer disease; Quality of life; Caregivers


El objetivo del estudio fue identificar la calidad de vida (CV) del cuidador y la del anciano con Enfermedad de Alzheimer (EA). Estudio descriptivo-exploratorio realizado en Maringá, Paraná, Brasil, junto a 50 ancianos y cuidadores. Los datos fueron recogidos en el período de noviembre de 2010 a enero de 2011 con aplicación de la Escala de Evaluación de la Calidad de Vida en la Enfermedad de Alzheimer. El promedio de los resultados totales para pacientes y cuidadores fue respectivamente, 26,36 y 35,04 puntos. Los ítems vivienda (98%) y familia (72%) presentaron mayor satisfacción de los cuidadores y ancianos y los ítems memoria y tareas (92%) a los cuidadores y ocio (52%) a los ancianos alcanzaron mayores índices de insatisfacción. Se considera que la CV del cuidador refleja directamente en el cuidado prestado y, por lo tanto, también debe ser considerada en el planeamiento e implementación de la asistencia al anciano con EA.

Enfermedad de Alzheimer; Calidad de vida; Cuidadores


ARTIGO ORIGINAL

Qualidade de vida de idosos com doença de Alzheimer e de seus cuidadores

Quality of life of elders with Alzheimer's disease and of their caregivers

Calidad de vida de los ancianos con enfermedad de Alzheimer y sus cuidadores

Ana Carla BorghiI; Anelize Helena SassáII; Paula Cristina Barros de MatosIII; Maria das Neves DecesaroIV; Sonia Silva MarconV

IEnfermeira, Bolsista Apoio Técnico da Fundação Araucária, Grupo de Pesquisa "Os saberes e práticas de cuidado de famílias de idosos Kaingang da Terra Indígena Faxinal, PR", Universidade Estadual de Maringá (UEM), Maringá, Paraná, Brasil

IIEspecialista em Enfermagem Neonatal, Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UEM, Professora da Fundação Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Mandaguari (FAFIMAN), Maringá, Paraná, Brasil

IIIEnfermeira, Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UEM, Maringá, Paraná, Brasil

IVDoutora em Enfermagem, Docente de Graduação e Pós-Graduação da UEM, Maringá, Paraná, Brasil

VDoutora em Filosofia da Enfermagem, Docente de Graduação e Pós-Graduação da UEM, Maringá, Paraná, Brasil

Endereço da autora Endereço da autora: Ana Carla Borghi Rua Bragança, 43, ap. 406, Zona 7 87020-220, Maringá, PR E-mail: anacarla.borghi@gmail.com

RESUMO

O objetivo do estudo foi identificar a qualidade de vida (QV) do cuidador e a do idoso com Doença de Alzheimer (DA). Estudo descritivo-exploratório realizado em Maringá, Paraná, junto a 50 idosos e seus respectivos cuidadores. Os dados foram coletados no período de novembro de 2010 a janeiro de 2011 com aplicação da Escala de Avaliação da Qualidade de Vida na Doença de Alzheimer. A média dos escores totais para pacientes e cuidadores foi respectivamente, 26,36 e 35,04 pontos. Os itens moradia (98%) e família (72%) apresentaram maior satisfação para cuidadores e idosos e os itens memória e tarefas (92%) para os cuidadores e lazer (52%) para os idosos alcançaram maiores índices de insatisfação. Considera-se que a QV do cuidador reflete diretamente no cuidado prestado e, portanto, também deve ser considerada no planejamento e implementação da assistência ao idoso com DA.

Descritores: Doença de Alzheimer. Qualidade de vida. Cuidadores.

ABSTRACT

The objective of the study was to identify the quality of life (QoL) of elders with Alzheimer`s Disease (AD) and of their caregivers. This is a descriptive-exploratory study carried out with 50 elders and caregivers in the city of Maringá, state of Paraná, Brazil. The data were collected from November, 2010, to January, 2011, with the use of the Quality of Life in Alzheimer's Disease Scale. The average of the total scores for patients and caregivers were 26.36 and 35.04 points, respectively. The fields home (98%) and family (72%) presented greater satisfaction for both caregivers and elders. The fields memory and tasks (92%) for the caregivers, and leisure (52%) for the elders reached larger dissatisfaction indexes. It is considered that the caregiver's QoL reflects directly upon the care and, therefore, it should also be considered in the planning and implementation of care to the elderly with AD.

Descriptors: Alzheimer disease. Quality of life. Caregivers.

RESUMEN

El objetivo del estudio fue identificar la calidad de vida (CV) del cuidador y la del anciano con Enfermedad de Alzheimer (EA). Estudio descriptivo-exploratorio realizado en Maringá, Paraná, Brasil, junto a 50 ancianos y cuidadores. Los datos fueron recogidos en el período de noviembre de 2010 a enero de 2011 con aplicación de la Escala de Evaluación de la Calidad de Vida en la Enfermedad de Alzheimer. El promedio de los resultados totales para pacientes y cuidadores fue respectivamente, 26,36 y 35,04 puntos. Los ítems vivienda (98%) y familia (72%) presentaron mayor satisfacción de los cuidadores y ancianos y los ítems memoria y tareas (92%) a los cuidadores y ocio (52%) a los ancianos alcanzaron mayores índices de insatisfacción. Se considera que la CV del cuidador refleja directamente en el cuidado prestado y, por lo tanto, también debe ser considerada en el planeamiento e implementación de la asistencia al anciano con EA.

Descriptores: Enfermedad de Alzheimer. Calidad de vida. Cuidadores.

INTRODUÇÃO

As demências são, atualmente, as doenças neurodegenerativas mais impactantes na população acima de 65 anos(1), sendo a Doença de Alzheimer (DA) responsável por aproximadamente 55% dos casos(2,3). Trata-se de doença cerebral crônicodegenerativa, progressiva e irreversível, que tem início insidioso e é marcada por perdas graduais da função cognitiva e distúrbios do comportamento e afeto. A doença apresenta manifestações lentas e evolução deteriorante, prejudicando o paciente nas atividades de vida diária e no desempenho social, tornando-se cada vez mais dependente de cuidados(4).

Diante disso, o idoso dependerá de cuidados, necessitando que outra pessoa, familiar ou não, assuma o papel de cuidá-lo. O cuidador, familiar ou não, é a pessoa que oferece assistência para suprir a incapacidade funcional, temporária ou definitiva. As demandas de cuidados produzidos pela DA comprometem não só a qualidade de vida (QV) do idoso doente como também a de seu cuidador(5).

Atualmente a definição mais divulgada e conhecida é a da Organização Mundial de Saúde (OMS) que descreve QV como a percepção que o indivíduo tem de sua posição na vida dentro do contexto de sua cultura e do sistema de valores de onde vive, e em relação a seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações(6).

Embora os cuidadores familiares tenham importância ímpar nos casos de doença demencial, estudos nacionais mostram que a maioria deles não possui informações e nem suporte necessários para o cuidado. Possuem ainda, pouco conhecimento sobre as características do processo demencial, seu curso e como lidar com problemas diários vivenciados com os idosos acometidos pela doença, o que, em virtude do despreparo para o enfrentamento de tal situação, pode ocasionar desgaste físico e emocional(7,8). Além disso, para tornar possível a convivência com as implicações causadas pela doença, se faz necessário um redimensionamento na vida dos membros familiares e isto provoca uma significativa interferência na QV dos mesmos(9).

Devido ao reduzido número de publicações referentes à QV de portadores da DA e de seus cuidadores, este estudo pretende contribuir para o planejamento de novas estratégias de assistência voltadas a essa população. Desta forma, tem como objetivo caracterizar o perfil dos cuidadores e os idosos segundo variáveis sociodemográficas e identificar a relação entre a QV do cuidador e a do idoso com Alzheimer, ambos sob ótica do cuidador.

MÉTODO

Trata-se de um estudo descritivo-exploratório de abordagem quantitativa, realizado no município de Maringá, localizado na região noroeste do Paraná.

O estudo incluiu a participação dos cuidadores familiares de idosos com o diagnóstico de DA. A coleta de dados foi realizada entre novembro de 2010 a janeiro de 2011. A amostra foi intencional, utilizando a técnica "bola de neve"(10) dada à dificuldade em conseguir acesso aos cuidadores familiares de idosos com o diagnóstico de DA. De acordo com esta, o primeiro entrevistado é alguém que faz parte do círculo de amizade de um dos pesquisadores e esta pessoa indicará outro e assim sucessivamente, até que seja atingido o objetivo do estudo. A pesquisa contou com a participação de 50 cuidadores e os critérios para inclusão na mesma foi ser familiar cuidador principal de idoso com DA residente na cidade de Maringá, Paraná.

O contato inicial com o cuidador foi por meio de telefonema, no qual foram informados os objetivos do estudo, e solicitado sua participação do mesmo. Em caso de concordância, era agendada uma visita domiciliar (VD) conforme a disponibilidade do entrevistado e do pesquisador. Na VD, os objetivos do estudo e o tipo de participação do sujeito na pesquisa foram novamente explicitados, sendo esclarecidas todas as dúvidas.

Os dados foram coletados por meio de entrevista estruturada utilizando dois instrumentos: ficha de caracterização sociodemográfica do idoso com DA e de seu cuidador familiar e a escala de avaliação da QV na doença de Alzheimer (QdV-DA). Trata-se de um instrumento adaptado, traduzido e validado para a cultura brasileira para avaliação da QV de cuidadores e de idosos com DA(11), que possui três versões: uma para o próprio paciente avaliar a sua QV (PQdV-DA), uma para o cuidador avaliar a QV do idoso (CQdV-DA) e outra para o cuidador se autoavaliar (CPQdV-DA). Contudo, devido ao alto grau de comprometimento das funções cognitivas dos pacientes não utilizou a versão na qual o próprio paciente avalia sua QV, somente as outras duas.

Atualmente existem vários instrumentos que avaliam a QV na demência, porém a escolha por esta escala se justifica pelo fato de ser a única traduzida, adaptada e validada para a cultura brasileira e também por ter sido elaborada tanto para os idosos com DA como para seus cuidadores, os quais não apresentam necessariamente problemas de saúde ou idade acima de 60 anos, sendo então adequado para qualquer pessoa(12). Ela foi elaborada para explorar domínios identificados como importantes, incluindo funcionamento interpessoal, ambiental, físico e psicológico. A escala apresenta linguagem simples, abordando aspectos relacionados à memória, relacionamento do paciente com amigos e família, preocupações relativas a finanças, condição física, humor e avaliação global da QV(11). A pontuação varia de 13 a 52 pontos, em que pontuações mais altas predizem melhor QV.

Os dados foram tabulados e analisados em planilha do Excel®. Para identificar a presença de relação entre a QV do cuidador e a QV do idoso com Alzheimer, ambas sob a ótica do cuidador, foi aplicado o teste de correlação linear de Pearson, baseado nos escores finais sobre a QV do idoso e do cuidador. Foi utilizado como referencia para significância o nível de 5% (p < 0,05), com intervalo de confiança de 95%, e para identificar a força da relação (r) encontrada foram considerados os parâmetros estatísticos no qual o valor de r pode variar entre -1,00 e 1,00, passando pelo 0,00. Quanto mais próximo de 0,00, menor é a evidência de correlação entre as variáveis estudadas e os valores próximos a 1,00 ou -1,00 sugerem alto grau de relacionamento, indicando se a correlação é positiva ou negativa.

O desenvolvimento do estudo seguiu os preceitos éticos disciplinados pela Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde(13) e o projeto foi apreciado e aprovado pelo Comitê Permanente de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Estadual de Maringá (parecer nº 581/2010). Todos os sujeitos participantes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido, em duas vias.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Perfil sociodemográfico dos idosos com doença de Alzheimer e de seus cuidadores familiares

A média de idade dos idosos com DA em estudo foi de 79,85 anos (± 7,41, x mín =71, x máx =91). Observa-se na Tabela 1, que a maioria dos idosos era do sexo feminino (66%), viúvos (66%), com baixo nível de instrução (84%). Os cuidadores tinham média de idade de 53.83 (± 14.52, x mín =26, x máx =80), possuíam mais de quatro anos de estudo (66%), eram em sua maioria, mulheres (82%) e casadas (58%).

A maioria dos idosos apresentou tempo de diagnóstico inferior a cinco anos (70%) e famílias constituída de no máximo três pessoas (70%). Por sua vez, os cuidadores, em sua maioria, ocupavam a posição de filhas (60%) ou cônjuges do doente (16%), exerciam outras atividades além do cuidar (38 %) e 56% eram aposentados.

O grupo de cuidadores apresentou perfil típico descrito na literatura tanto no âmbito nacional quanto internacional: mulheres, casadas, geralmente filhas ou esposas, com idade média de 50 anos, residentes no mesmo domicílio e com dedicação exclusiva ao cuidado do familiar doente(3). Tal achado enfatiza que as mulheres desempenham esta atividade obedecendo a normas culturais em que cabe a ela a organização da vida familiar, o cuidado dos filhos e o cuidado necessários às atividades de vida diária dos demenciados(14).

Diferente dos achados em outros estudos(15,16), nesta pesquisa verificou-se que a maioria dos cuidadores possuía alto nível de escolaridade, tendo 30% (n = 15) concluído o ensino superior. Esta diferença pode ser atribuída às características da população participante e ao método escolhido para coleta de dados, em que se utilizou a técnica bola de neve, na qual um cuidador indicava outro e dessa forma, pessoas com grau de instrução semelhante pertenciam ao mesmo circulo de amizade.

A média de tempo como cuidador foi de 4,63 anos, com o mínimo de 15 dias e o máximo de 12 anos. Dos cuidadores, 34 (68%) se dedicavam ao portador de DA em tempo integral e 16 (32%) parcialmente, visto que tinham que trabalhar e também pelo fato de seus entes apresentarem relativa autonomia, apenas com alguns problemas de memória. Assim, pode-se inferir que a dedicação exclusiva por parte do cuidador se dá nos casos mais graves da DA.

Como todos os cuidadores eram familiares residentes no mesmo domicílio dos idosos com DA, os dados referentes à renda familiar foram calculados realizando a junção da renda do idoso com a do cuidador. Os dados revelaram que a maior parte (62%) das pessoas estudadas vive com renda < a cinco salários mínimos, fato que gerou questionamentos acerca das condições de vida e acesso ao serviço público de saúde das famílias menos favorecidas economicamente. Assim, supondo que estas famílias enfrentam maiores dificuldades para cuidar de seu familiar e ter acesso aos serviços de saúde e ainda, considerando que não existe um serviço formal de suporte aos cuidadores na rede pública de saúde, faz-se necessário que os profissionais desta área viabilizem propostas de intervenção que valorizem as condições de vida e de acesso aos serviços de assistência e que as mesmas sejam condizentes com as necessidades específicas desta população.

A carga financeira da DA representa mais um fator estressante na gama de tarefas do cuidador, já que ele passa a administrar as questões financeiras do idoso além das suas. Por esta razão é que, frequentemente os cuidadores contabilizam sua renda em conjunto com a dos idosos como medida de facilitar o manejo dos recursos(7).

Qualidade de vida dos idosos com DA e cuidadores, segundo o relato dos cuidadores familiares

Os resultados obtidos por meio da QdV-DA na versão CQdV-DA e CPdV-DA são apresentados, em frequência e porcentagem, nas Tabela 2 e 3.

Das 13 dimensões testadas pela escala de QV dos idosos na versão CQdV-DA, foi possível verificar que os cuidadores avaliaram nove delas como negativas (ruim e regular) e quatro positivas (bom e excelente). Pode-se observar que os itens com maior insatisfação foram memória e capacidades de fazer tarefas (92%), seguido de capacidades para atividades de lazer (90%).

Com a progressão da demência, além da perda da memória e das atividades da vida diária instrumentais, como administrar finanças e medicamentos, o cuidador tem um aumento das responsabilidades em tarefas básicas, como as relacionadas com o cuidado pessoal de higiene, e alimentação(17), esta observação corrobora nossos resultados. Além disso, estudos mostram que cuidar de um idoso com dependência pode acarretar sobrecarga física e emocional à vida do cuidador, podendo interferir no cuidado prestado ao paciente(18).

Em relação aos itens positivos, a moradia (98%) e a família (72%) foram os de maior satisfação, diferente de outros estudos de avaliação da QV, os quais mostravam que a maior satisfação correspondia às relações sociais, como família, casamento e amigos(15,16). Como pode ser observado nesse estudo, 33 (66%) idosos eram viúvos o que difere o resultado do escore casamento. Quanto às amizades, a participação social reduz com o passar da idade, pois nesta fase as limitações próprias do processo de envelhecimento estão presentes de forma mais contundente, fazendo com que eles passem maior tempo junto à família(19). Além disso, as limitações da DA influenciam sua relação com os amigos, e neste estudo 35 (70%) cuidadores consideraram este item insatisfatório.

Em relação à sua própria QV, os cuidadores consideraram positivos doze itens da escala, destacando-se moradia (98%), você em geral e a vida em geral (86%). A única avaliação negativa foi referente à capacidade para atividades de lazer, pois 58% dos entrevistados se mostraram insatisfeitos. Este dado possivelmente está relacionado à sobrecarga que limita o cotidiano do familiar e altera a rotina que antes incluía programas de lazer. As demandas de cuidados produzidas pela DA e pelas necessidades de saúde do idoso passam a influenciar o cotidiano do cuidador, transformando seu contexto de vida(7).

A literatura mostra que pessoas que possuem atividades sociais e de lazer apresentam um nível de QV mais elevado e que cuidadores de idosos doentes são prejudicados nesse aspecto. Cuidadores sobrecarregados e desgastados têm sua QV ameaçada devido ao estresse, advindo da responsabilidade de cuidar, apresentando, em muitas situações, sentimentos de impotência, problemas de saúde, cansaço e irritabilidade(7,18).

Vale destacar que o item casamento, foi avaliado por apenas 29 cuidadores, visto que os demais idosos eram solteiros ou divorciados. Notase que desses, 40% consideravam sua relação positiva. A presença de um companheiro pode trazer benefícios, tais como minimizar sentimentos de solidão e aumentar a percepção de apoio(20).

O aspecto "moradia" foi o item que alcançou melhor satisfação. Este dado contesta o que tem sido descrito na literatura, na qual dimensões como família e casamento são melhores avaliadas pelos cuidadores, devido à tendência de subestimarem essas dimensões, pois esses são membros da família, e se consideravam bons para com seus idosos(15,16). Contudo, o fato da maioria dos doentes corresidirem com seus cuidadores, pode ter levado a esse resultado, pois os familiares consideravam suas residências satisfatórias e confortáveis para ambos.

Observou-se, em termos gerais, que a média dos escores de QV dos idosos foi de 26,36 pontos (± 5,60, xmín =17, xmáx =43) e dos cuidadores de 35,04 pontos (± 6,08, xmín =18, xmáx =46). Portanto, na opinião dos cuidadores eles têm melhor QV do que os idosos, embora ambos apresentem baixo escore de QV.

No entanto, ao aplicar o teste de correlação linear de Pearson apresentado na Figura 1, foi possível identificar que a QV do cuidador acompanha a QV do idoso, com coeficiente r= (+)356 e p=0,01. Estes valores indicam a presença de relação moderada, positiva e proporcional entre as variáveis, demonstrando que, sob a ótica do cuidador, a baixa QV atribuída a ele acompanha a QV atribuída ao idoso, e vice-versa.


A QV do cuidador esta relacionada com a QV do idoso, pois é o cuidador quem tem mais possibilidade de expor o idoso a condições que altere positiva ou negativamente as diversas dimensões da QV estudadas. É também o cuidador quem está mais próximo do idoso, e assim, o responsável por proporcionar ao mesmo, momentos de distração, alimentação saudável, interação com outras pessoas e cuidados relativos à administração de medicamentos, entre outros.

A relação encontrada pode ser influenciada pelo fato de somente o cuidador ter participado como respondente do questionário, sendo que sua avaliação em relação a QV dele e a do idoso são analisados na mesma percepção/ótica de realidade e de experiência vivida diante da doença de Alzheimer. Assim, é preciso considerar que o cuidador e o idoso compartilham de uma mesma experiência, porém esta pode ser vivenciada de maneiras diferentes por cada um deles.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo indicou que os cuidadores familiares de pacientes com DA se mostraram insatisfeitos apenas com um item da escala - capacidade de realizar atividades de lazer - o que possivelmente está relacionado ao cotidiano do familiar, que é limitado devido à doença e a sobrecarga consequente da mesma e também pela falta de divisão da tarefa de cuidar. Se não houver na família uma pessoa que possa substituir e trocar com o cuidador primário, a tarefa de cuidar se torna muito mais desgastante. Neste sentido, é ressaltada a importância de um trabalho de intervenção, que valorize e envolva outros familiares no cuidado ao idoso com DA. Desta forma, será possível conscientizá-los sobre a importância do apoio, direitos, deveres e principalmente da condição da pessoa que assume sozinha todas as responsabilidades relacionadas com o cuidado, favorecendo assim que outros membros familiares se disponham a ajudar nesta tarefa, o que sem dúvidas poderá contribuir para a melhoria do cuidado prestado ao idoso e nas condições de vida de seu cuidador principal.

Embora tenha sido encontrado apenas um item desfavorável à QV, os fatores positivos não podem ser ignorados, pois a maioria dos estudos enfoca os aspectos negativos e deixam de valorizar àqueles que podem ser úteis no desenvolvimento de estratégias específicas de enfrentamento. Tal achado também pode estar relacionado aos padrões de referência utilizados pelos pesquisados.

Já em relação à QV dos idosos, os cuidadores consideraram desfavoráveis nove itens (memória, capacidades de realizar tarefas, capacidade para atividades de lazer, saúde física, disposição, humor, amigos, casamento e a vida em geral). Foi observada uma tendência do cuidador em perceber a QV do idoso pior que a dele próprio e notou-se que as percepções positivas em relação a QV dos doentes de Alzheimer valorizavam aspectos como família, moradia e dinheiro, pois os cuidadores eram membros da família, residiam juntos e se consideravam bons para com seus idosos tanto nos cuidados como na situação financeira em que viviam.

Diante dos resultados, conclui-se pela necessidade de uma assistência que beneficie não só o doente, mas também o cuidador, uma vez que este estando com uma QV satisfatória garantirá melhor assistência ao idoso e consequentemente uma melhoria em sua QV. O cuidador é fundamental para a pessoa idosa no enfrentamento da dependência que a DA impõe. Portanto, ações dos profissionais voltadas ao bem-estar deste grupo podem ajudá-los a vencer as dificuldades inerentes a esse processo.

Este estudo possui a limitação de não ter sido possível averiguar a QV do idoso sob sua própria avaliação, o que possibilitaria a comparação entre percepção da QV atribuída a ele por seu cuidador e sua própria percepção. Desta forma, sugerem-se novas investigações abordando também idosos com DA que tenham condições cognitivas para participar, maior número de participantes, utilização de outros instrumentos para avaliar a QV, relação entre a qualidade de vida do cuidador familiar e o grau de dependência do paciente, além de fatores subjetivos relacionados ao processo de cuidar. Os resultados provenientes de tais pesquisas poderiam nortear novas abordagens e servirem de base para o planejamento de programas voltados às necessidades principais dessa população, a fim de tornar a QV tanto dos idosos como dos cuidadores mais satisfatória.

Recebido em: 20/07/2011

Aprovado em: 25/11/2011

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  • Endereço da autora:

    Ana Carla Borghi
    Rua Bragança, 43, ap. 406, Zona 7
    87020-220, Maringá, PR
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Jan 2012
    • Data do Fascículo
      Dez 2011

    Histórico

    • Aceito
      25 Nov 2011
    • Recebido
      20 Jul 2011
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