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Perfil dos cuidadores de idosos com alterações cognitivas em diferentes contextos de vulnerabilidade social

Profile of the caretakers of elderly people with cognitive alterations in different contexts of social vulnerability

Perfil de los cuidadores de ancianos con alteraciones cognitivas en diferentes contextos de vulnerabilidad social

Resumos

O objetivo deste estudo foi caracterizar os cuidadores de idosos com alterações cognitivas, usuários de Unidades de Saúde da Família (USF), residentes em diferentes contextos de vulnerabilidade social. Foram realizadas entrevistas domiciliárias (N=72), utilizando um instrumento previamente elaborado, contendo dados de caracterização socioeconômica e demográfica. Todos os cuidados éticos foram observados. Os resultados mostram que os cuidadores dos idosos que vivem em contextos de alta vulnerabilidade social são em sua maioria mulheres, adultas, casadas, com ensino fundamental incompleto e não trabalham fora de casa. Moram com o idoso, apresentam relação estreita com ele e não contam com ajuda de profissionais. Dados semelhantes foram encontrados no contexto de baixa vulnerabilidade social, exceto que contam com apoio de um cuidador formal. Considerar o perfil dos cuidadores de idosos com alterações cognitivas morando em diferentes contextos de vulnerabilidade social pode fornecer subsídios para as USF formularem estratégias mais específicas de cuidado aos cuidadores.

Enfermagem geriátrica; Cuidadores; Idoso; Programa Saúde da Família


The purpose of this study is to characterize caretakers of elderly people with cognitive disorders, users of Family Health Units (FHU), that live in different contexts of social vulnerability. Household interviews were conducted (N=72) with the use of an instrument previously designed, containing socioeconomic and demographic characterization data. All ethical cares have been observed. The results show that caretakers of elderly people that live in contexts of high social vulnerability are primarily adult, married women, with incomplete elementary school education, who work at home. These caretakers live with the elderly person they are in charge of, develop a close relationship with them and do not receive help from professionals. Similar data were found in contexts of low social vulnerability, except that in those cases the support of a formal caretaker is available. The study of the profile of caretakers of elderly people with cognitive alterations living in different contexts of social vulnerability can provide FHU with subsidies so that they can formulate more specific care strategies to caretakers.

Geriatric nursing; Caretakers; Elderly; Family Health Program


El objetivo de este estudio fue caracterizar los cuidadores de ancianos con alteraciones cognitivas, usuarios de Unidades de Salud de la Familia (USF), que viven en diferentes contextos de vulnerabilidad social. Fueron realizadas entrevistas domiciliarias (N=72). Utilizando un instrumento previamente elaborado, que contiene datos de caracterización socioeconómica y demográfica. Todos los cuidados éticos fueron observados. Los resultados señalan que los cuidadores de ancianos que viven en contextos de alta vulnerabilidad social son en su mayoría mujeres, están casadas, tienen Educación Primaria incompleta y no trabajan fuera de casa. Viven con el anciano, presentan relación estrecha con el mismo y no reciben ayuda de profesionales. Datos semejantes fueron obtenidos en el contexto de baja vulnerabilidad social, excepto que tienen el apoyo de un cuidador formal. Considerar el perfil de los cuidadores de ancianos con alteraciones cognitivas viviendo en diferentes contextos de vulnerabilidad social puede ofrecer subsidios para que las USF propongan estrategias más especificas de atención a los cuidadores.

Enfermería geriátrica; Cuidadores; Anciano; Programa de salud familiar


ARTIGO ORIGINAL

Perfil dos cuidadores de idosos com alterações cognitivas em diferentes contextos de vulnerabilidade sociala a Extraído da dissertação de Mestrado apresentada em 2009 ao Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).

Perfil de los cuidadores de ancianos con alteraciones cognitivas en diferentes contextos de vulnerabilidad social

Profile of the caretakers of elderly people with cognitive alterations in different contexts of social vulnerability

Ariene Angelini dos SantosI; Sofia Cristina Iost PavariniII

IMestre em Enfermagem pela UFSCar, Membro do Grupo de Pesquisa Saúde e Envelhecimento, São Carlos, São Paulo, Brasil

IIDoutora em Educação, Professora Associada do Departamento de Enfermagem da UFSCar, Coordenadora do Programa do Idoso da Unidade Saúde Escola, Líder do Grupo de Pesquisa Saúde e Envelhecimento, São Carlos, São Paulo, Brasil

Endereço da autora Endereço da autora: Ariene Angelini dos Santos Rua Luis Turri, 47, Jardim Planalto 37800-000, Guaxupé, MG E-mail: arieneangelini@yahoo.com.br

RESUMO

O objetivo deste estudo foi caracterizar os cuidadores de idosos com alterações cognitivas, usuários de Unidades de Saúde da Família (USF), residentes em diferentes contextos de vulnerabilidade social. Foram realizadas entrevistas domiciliárias (N=72), utilizando um instrumento previamente elaborado, contendo dados de caracterização socioeconômica e demográfica. Todos os cuidados éticos foram observados. Os resultados mostram que os cuidadores dos idosos que vivem em contextos de alta vulnerabilidade social são em sua maioria mulheres, adultas, casadas, com ensino fundamental incompleto e não trabalham fora de casa. Moram com o idoso, apresentam relação estreita com ele e não contam com ajuda de profissionais. Dados semelhantes foram encontrados no contexto de baixa vulnerabilidade social, exceto que contam com apoio de um cuidador formal. Considerar o perfil dos cuidadores de idosos com alterações cognitivas morando em diferentes contextos de vulnerabilidade social pode fornecer subsídios para as USF formularem estratégias mais específicas de cuidado aos cuidadores.

Descritores: Enfermagem geriátrica. Cuidadores. Idoso. Programa Saúde da Família.

RESUMEN

El objetivo de este estudio fue caracterizar los cuidadores de ancianos con alteraciones cognitivas, usuarios de Unidades de Salud de la Familia (USF), que viven en diferentes contextos de vulnerabilidad social. Fueron realizadas entrevistas domiciliarias (N=72). Utilizando un instrumento previamente elaborado, que contiene datos de caracterización socioeconómica y demográfica. Todos los cuidados éticos fueron observados. Los resultados señalan que los cuidadores de ancianos que viven en contextos de alta vulnerabilidad social son en su mayoría mujeres, están casadas, tienen Educación Primaria incompleta y no trabajan fuera de casa. Viven con el anciano, presentan relación estrecha con el mismo y no reciben ayuda de profesionales. Datos semejantes fueron obtenidos en el contexto de baja vulnerabilidad social, excepto que tienen el apoyo de un cuidador formal. Considerar el perfil de los cuidadores de ancianos con alteraciones cognitivas viviendo en diferentes contextos de vulnerabilidad social puede ofrecer subsidios para que las USF propongan estrategias más especificas de atención a los cuidadores.

Descriptores: Enfermería geriátrica. Cuidadores. Anciano. Programa de salud familiar.

ABSTRACT

The purpose of this study is to characterize caretakers of elderly people with cognitive disorders, users of Family Health Units (FHU), that live in different contexts of social vulnerability. Household interviews were conducted (N=72) with the use of an instrument previously designed, containing socioeconomic and demographic characterization data. All ethical cares have been observed. The results show that caretakers of elderly people that live in contexts of high social vulnerability are primarily adult, married women, with incomplete elementary school education, who work at home. These caretakers live with the elderly person they are in charge of, develop a close relationship with them and do not receive help from professionals. Similar data were found in contexts of low social vulnerability, except that in those cases the support of a formal caretaker is available. The study of the profile of caretakers of elderly people with cognitive alterations living in different contexts of social vulnerability can provide FHU with subsidies so that they can formulate more specific care strategies to caretakers.

Descriptors: Geriatric nursing. Caretakers. Elderly. Family Health Program.

INTRODUÇÃO

Vivemos um momento de transição demográfica no Brasil. Embora seja um país jovem, vem apresentando mudanças na pirâmide populacional, devido à acentuada queda da mortalidade, diminuição da fecundidade e aumento da expectativa de vida, resultando no envelhecimento da população(1).

Associada a essa transição demográfica, presenciamos uma modificação no cenário das doenças e agravos mais prevalentes, que atualmente, são crônicos e não transmissíveis(2). No Brasil, estima-se que 85% dos idosos apresentam pelo menos uma doença crônica, e destes, no mínimo, 10% com co-morbidades(1).

Dentre as doenças crônicas não transmissíveis, podemos citar a demência. Sabe-se que a prevalência de demência aumenta em grupos etários mais avançados, podendo chegar a 47% dos idosos com mais de 85 anos. Dentre todas as causas de demências, a Doença de Alzheimer é a mais freqüente e acomete de 8% a 15% da população mundial com mais de 65 anos(2,3).

Esse aumento da prevalência de demência em grupos etários mais avançados é preocupante, uma vez que idosos com demência são considerados pessoas vulneráveis. A vulnerabilidade na velhice pode ser de ordem biológica, socioeconômica, psicológica ou resultante da interação entre estes três aspectos(4).

O termo vulnerabilidade é um construto multidimensional entendido como um processo de estar em risco para alteração na condição de saúde, resultante de recurso econômico, social, psicológico, familiar, cognitivo ou físico inadequado(5). Pessoas idosas em contextos de pobreza parecem ser altamente vulneráveis aos estressores, ficando mais expostas a problemas de saúde.

A vulnerabilidade social combina-se com a psicológica e caracteriza-se por alterações na saúde mental, risco aumentado para demências, perda de autonomia, de identidade e de dignidade. A vulnerabilidade social também se combina com a vulnerabilidade física e caracteriza-se pelo aparecimento ou agravamento de doenças crônicas, de incapacidade física e cognitiva(4). Os principais determinantes da vulnerabilidade social dos idosos são a aposentadoria, a redução da renda, a discriminação etária, a idade e o morar sozinho. Esses fatores podem se refletir em exclusão social, pobreza, perda de autonomia, baixa qualidade de vida e em escassez de cuidados à saúde(4).

Dessa forma, a situação de cronicidade de problemas de saúde aliada à maior expectativa de vida pode contribuir para o aumento de idosos brasileiros limitados funcionalmente(1). Assim, há um aumento da demanda por cuidados ao idoso, que geralmente são cada vez mais complexos(6). No Brasil, geralmente, esses cuidados são realizados pela família e pela comunidade, sendo o domicílio o espaço sociocultural escolhido(1).

Vários motivos contribuem para que uma pessoa seja eleita a cuidadora primária do idoso com alterações cognitivas. Os que mais se destacam são: fatores geracionais, de gênero, grau de parentesco, morar na mesma casa que o idoso, ter condições financeiras, dispor de tempo, a ausência de outras pessoas para a tarefa de cuidar, a criação de laços afetivos, a relação de intimidade entre o idoso e o possível cuidador, a proximidade geográfica entre eles, a personalidade do cuidador, sua história de relacionamento com o idoso e com outros membros da família, sua motivação e sua capacidade de doação(7).

Geralmente, na família, quem desempenha as tarefas de cuidar é a mulher, uma vez que prestar cuidado é secularmente uma atribuição feminina. Ao homem cabe o dever de manutenção financeira da família, e à mulher a organização dela(7).

Estudos mostram que o cuidar de um idoso com alterações cognitivas pode acarretar sobrecarga física e emocional à vida do cuidador. Isso ocorre devido à perda da capacidade do idoso em realizar as atividades de vida diária, tornando-se dependente, fato que exige do cuidador atenção, carinho e cuidado físico. Essa sobrecarga emocional vivenciada pelo cuidador pode interferir no cuidado prestado ao paciente(8,9).

Neste contexto de sobrecarga física e emocional, para os cuidadores de idosos que vivem em contextos de pobreza, essa situação tende a se agravar. A vulnerabilidade social determina carências de recursos individuais, familiares e sociais para atender as necessidades dos idosos. Quanto maior essa vulnerabilidade, maiores serão os prejuízos à qualidade de vida e ao bem estar dos idosos(4). Torna-se necessário que os profissionais de saúde estejam aptos a fornecer suporte às famílias que cuidam de idosos no domicílio, principalmente as que apresentam maior dificuldade econômica(10).

Com o propósito de subsidiar o treinamento específico dos cuidadores no âmbito da Estratégia Saúde da Família para lidarem melhor com a situação de cuidar de idosos com declínio cognitivo e conhecerem a rede de suporte social disponível nesses casos é necessário que se conheça o perfil dessa população e suas reais necessidades. Assim, o presente estudo objetivou caracterizar os cuidadores de idosos com alterações cognitivas, usuários de Unidades de Saúde da Família (USF), que residem em diferentes contextos de vulnerabilidade social em um município do interior do Estado de São Paulo.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo descritivo, transversal, baseado no método quantitativo de investigação. Foi realizado no município de São Carlos, São Paulo, sendo originado de uma dissertação de Mestrado(11).

Foi considerado o Índice Paulista de Vulnerabilidade Social (IPVS). O IPVS classifica os setores censitários do Estado de São Paulo segundo níveis de vulnerabilidade social a que estão sujeitos os seus residentes, com base nas características socioeconômicas e demográficas dos residentes. Seis grupos foram criados: IPVS 1 (nenhuma vulnerabilidade social), IPVS 2 (Vulnerabilidade Muito Baixa), IPVS 3 (Vulnerabilidade Baixa), IPVS 4 (Vulnerabilidade Média), IPVS 5 (Vulnerabilidade Alta) e IPVS 6 (Vulnerabilidade Muito Alta)(12).

Nesse estudo, levou-se em consideração o IPVS da USF onde o idoso estava cadastrado.

Primeiramente, foi realizado o levantamento das USF do município e identificado o setor censitário com o seu respectivo IPVS. Foi localizado o setor censitário da USF, através do endereço. Nessa etapa, contou-se com o apoio da unidade do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no município para conferir os dados relacionados ao setor censitário daquele endereço. Em seguida, foi realizada a consulta ao mapa do IPVS, com o Índice Paulista de Vulnerabilidade Social atribuído àquele setor censitário. As USF que não possuíam o IPVS foram excluídas.

Não participaram desse estudo as unidades que não possuíam vulnerabilidade social. Foram incluídas as unidades inseridas em diferentes contextos de vulnerabilidade social, ou seja, IPVS 2 até o IPVS 6(12).

Em seguida, os idosos com alterações cognitivas foram identificados junto à equipe de Saúde da Família e através de um banco de dados do Grupo de Pesquisa Saúde e Envelhecimento da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), que possui apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Para o rastreio dos idosos com alterações cognitivas foi reaplicado o instrumento denominado Mini Exame do Estado Mental (MEEM), que foi traduzido, adaptado e validado em um estudo(13). Os idosos que apresentaram resultado abaixo da nota de corte, de acordo com o grau de escolaridade foram considerados portadores de alterações cognitivas. As notas de corte usadas foram: para analfabetos 18 pontos, um a três anos de escolaridade 21 pontos, quatro a sete anos de escolaridade 24 pontos e oito anos de escolaridade ou mais 26 pontos. Os cuidadores foram selecionados a partir dos idosos em questão(13).

Nas seis USF selecionadas para esta pesquisa, havia 1578 idosos cadastrados. Destes, uma amostra de 755 idosos foram avaliados em um estudo anterior dos quais 195 apresentaram resultados no MEEM abaixo da nota de corte. Uma amostra de 88 idosos definida por critérios estatísticos representou os idosos com alterações cognitivas cadastrados nas seis unidades estudadas. Destes 88 idosos, 72 possuíam um cuidador.

Foram sujeitos desta pesquisa 72 cuidadores primários de idosos com alterações cognitivas cadastrados em USF de regiões com diferentes índices de vulnerabilidade social. Os critérios de inclusão dos sujeitos foram: ser o cuidador principal referido pelo idoso; assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido; estar em uma região com IPVS diferente de um.

Todos os cuidados éticos que regem pesquisas com seres humanos foram observados, segundo a Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde(14). O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFSCar (Parecer 253/2008). A coleta de dados teve início após a leitura e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Foram realizadas entrevistas individuais e domiciliares previamente agendadas, nas residências dos 72 cuidadores de idosos com alterações cognitivas. Os dados foram coletados no período de julho a dezembro de 2008. A coleta de dados consistiu de uma entrevista estruturada, utilizando-se um instrumento previamente elaborado contendo dados como idade, sexo, estado civil, escolaridade, renda, morbidade referida, co-residência com o idoso, tipo de ligação com o idoso, recebe ajuda para cuidar do idoso e a relação de parentesco com o idoso.

Após a coleta, os dados foram analisados segundo as freqüências absolutas e relativas, sendo apresentados sob a forma de tabela.

RESULTADOS

As características predominantes dos 72 cuidadores participantes dessa pesquisa serão descritas a seguir, na Tabela 1.

Nas regiões de muito baixa, baixa e média vulnerabilidade social, a maioria dos cuidadores dos idosos é do sexo feminino (89%). Houve predomínio da faixa etária dos 41 aos 60 anos de idade (36%), com média de idade de 50,42 anos. A maior parte dos cuidadores morava na mesma casa que o idoso (69%).

A maioria dos cuidadores (67%) é casada ou vive com companheiro, seguido pelos solteiros (25%). Somente 6% deles são viúvos e os outros 3% são separados, desquitados ou divorciados. Os dados mostram que 53% dos cuidadores afirmam possuir ligação estreita com o idoso.

Observa-se uma significativa porcentagem de cuidadores com ensino fundamental incompleto (47%), seguidos de 25% de cuidadores com ensino fundamental completo, 14% com ensino médio completo, 6% com ensino superior completo, 3% analfabetos, 3% de cuidadores com alfabetização de adultos e 3% com ensino médio incompleto.

Com relação à renda, 39% relatam não possuir renda, 59% possuem de meio a dois salários mínimos.

Quarenta e sete por cento dos cuidadores afirmam que o cuidado é exercido por vontade, desejo próprio e 47% por ser a única pessoa disponível para realizar tal tarefa.

Sessenta e seis por cento dos cuidadores dos idosos dizem não apresentar doença ou condição referida no momento da coleta de dados, 26% relatam hipertensão arterial, 3% diabetes, 3% osteoporose.

O item referente à ajuda recebida para cuidar dos idosos mostra que 44% dos cuidadores afirmam não receber ajuda para o cuidado destinado aos idosos.

Os cuidadores dos idosos que vivem em contextos de alta e muito alta vulnerabilidade são predominantemente mulheres (86%), na faixa etária dos 41 aos 60 anos de idade (42%), com média de idade de 49,67 anos.

A maioria dos cuidadores (58%) é casada ou vive com companheiro, seguido pelos solteiros (22%). Somente 6% deles são viúvos e os outros 14% são separados, desquitados ou divorciados.

Os dados dessa pesquisa mostram que a maior parte dos cuidadores morava na mesma casa que o idoso (83%).

A maioria dos cuidadores possui ensino fundamental incompleto (39%), seguidos de 25% de analfabetos, 22% com ensino médio completo, 11% com ensino fundamental completo e 3% com ensino superior incompleto.

Trinta e quatro por cento dos cuidadores relatam não possuir renda, 40% possuem de meio a um salário mínimo. A maioria (83%) não trabalha fora de casa.

Os dados mostram que 53% dos cuidadores afirmam possuir ligação estreita com o idoso, 31% ligação próxima, 14% ligação normal e 3% ligação distante.

Quando os cuidadores foram questionados sobre o motivo pelo qual cuidam destes idosos, 53% afirmam que o cuidado é exercido por vontade, desejo próprio e 36% por ser a única pessoa disponível para realizar tal tarefa.

Os dados revelam que 56% dos cuidadores dos idosos dizem não apresentar doença ou condição referida no momento da coleta de dados, 28% relatam hipertensão arterial, 5% diabetes, 5% osteoporose, 3% artrite/artrose e 3% alcoolismo.

A maioria dos cuidadores (58%) afirma não receber ajuda para o cuidado destinado aos idosos.

DISCUSSÃO

O predomínio de mulheres cuidadoras, casadas, donas de casa e em média com 50 anos também são características freqüentes encontradas em diversos estudos tanto nacionais quanto internacionais(15,16).

Esses resultados reforçam o papel social da mulher, historicamente determinado, ou seja, quem desempenha as tarefas de cuidar em família é uma mulher, uma vez que prestar cuidado é secularmente uma atribuição feminina, quer seja esposa, filha ou irmã(16).

A escolaridade é predominantemente baixa nessa pesquisa e em diversos outros estudos com cuidadores(1,6,16). O baixo nível de escolaridade interfere, direta ou indiretamente, na prestação de cuidados aos idosos, havendo uma queda na qualidade do serviço prestado. Além disso, pode apresentar-se como barreira no processo da educação em saúde. Quando o conhecimento do cuidador é insuficiente, é necessária atenção redobrada dos profissionais aos cuidadores, a fim de ensiná-los a prevenir possíveis enganos, exigindo, portanto, que os profissionais de saúde utilizem os mais variados recursos para alcançar os objetivos desejados(17).

Nesse estudo, a maioria dos cuidadores residiam com o idoso. Esse dado está de acordo com a literatura encontrada(6,7). Algumas pesquisas apontam que, ser escolhido ou decidir assumir as tarefas de cuidar pode depender de alguns eventos, dentre eles, morar na mesma casa que o idoso(7). A co-residência pode ser considerada uma estratégia das famílias para beneficiar tanto as gerações mais velhas como as mais jovens, podendo significar melhora nas condições de vida(18).

Dados semelhantes foram encontrados em relação aos motivos pelos quais o cuidado é exercido, podendo ser realizado por uma questão de caridade e pelo cuidador se sentir obrigado a realizar esta função(8).

Pesquisadores afirmam que entre os motivos atribuídos pelos cuidadores em assumir a responsabilidade pelo idoso, destacam-se a dignificação como pessoa, a obrigação moral ou prática e princípios religiosos, o reconhecimento do próprio idoso com manifestação de gratidão, o reconhecimento da família e da comunidade, e também como sendo a única opção(1).

Dentro do contexto familiar existem relações afetivas e pessoais na construção histórica de cada um de seus membros, que precisam ser analisadas. A qualidade dessas relações familiares pode influenciar na qualidade do cuidado. Sabe-se que o vínculo emocional entre o idoso e seu cuidador é importante para que se construa uma relação de intimidade e confiança. Esse cuidado, porém, pode ser penoso e inadequado, tanto para o cuidador quanto para o idoso, quando as relações familiares se baseiam em tensão, crises e conflitos(19).

Em relação às co-morbidades que afetam os cuidadores, a de maior prevalência foi a hipertensão arterial. Pesquisas revelam que cuidadores de idosos com alterações cognitivas possuem maiores chances de ter problemas de saúde devido à sobrecarga a que estão submetidos, pois geralmente, não recebem ajuda de outra pessoa na tarefa de cuidar do idoso. Muitas vezes, o cuidador descuida de si próprio, ao dedicar a maior parte do seu tempo no cuidado ao idoso e, quanto maior for o tempo dispensado ao cuidado, maior é o impacto que o cuidador sofre. Assim, surgem doenças como a hipertensão arterial, desordens digestivas, problemas osteomusculares, propensão a infecções, que são os problemas mais comumente encontrados entre os cuidadores. Vale ressaltar também que cuidadores com idade avançada estão mais susceptíveis a problemas de saúde(3,7).

A maioria dos cuidadores relatou não receber ajuda de outras pessoas. Estudos mostram que o estresse maior está relacionado à falta de ajuda por parte dos familiares. O cuidador, ao assumir sozinho os cuidados do idoso no domicílio, manifesta frequentemente seu desconforto e sentimento de solidão, quando não sente apoio de outros membros da família(8).

Nossos achados apontam duas diferenças entre os cuidadores de idosos que vivem em contextos de baixa e média vulnerabilidade social e naqueles que estão em contextos de pobreza. Relacionam-se à renda e ao grau de parentesco do cuidador com o idoso. Em relação à renda, a maioria dos cuidadores que estão em contextos de pobreza não trabalham fora de casa.

Um estudo realizado em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, mostrou que 33,3% dos cuidadores não apresentavam outra ocupação além de cuidar do idoso e que 30,5% realizavam atividades domésticas além de cuidar do idoso(5). Além disso, estudos apontam que algumas cuidadoras de idosos relataram não poder assumir empregos extradomiciliares devido aos cuidados que devem ser dispensados integralmente e diariamente ao idoso(19).

Um dos aspectos que comprometem o cotidiano da maioria das famílias cuidadoras da camada mais pobre da população é a dificuldade financeira. Muitos cuidadores estão desempregados e sobrevivem dos recursos provenientes da própria aposentadoria do idoso que, em muitos casos, são insuficientes para atender as necessidades básicas do próprio idoso e também dos membros de uma família multigeracional(1).

A aposentadoria tem-se transformado na única fonte de renda de 12 milhões de famílias brasileiras, nas quais os idosos mais pobres se mostram mais ativos na dinâmica familiar, seja sustentando ou ajudando no sustento dos membros da família, sendo o idoso um provedor fundamental(20).

Em muitos casos, o idoso é o provedor do sustento ou exerce o papel de cuidar dos netos enquanto os outros membros da família trabalham fora do espaço doméstico. Estudos recentes sobre a população idosa brasileira têm mostrado a existência de um importante e crescente fluxo de apoio do idoso à família, e que, muitas vezes, chega a se equiparar em intensidade ao apoio que vai da família ao idoso(20).

Apesar do idoso brasileiro nos estratos mais pobres contribuir com sua renda para o sustento da família, nem sempre ele recebe o respaldo de que necessita, tanto por insuficiência de recursos quanto pelas dificuldades da família no cuidado, assim como por necessidades materiais, emocionais ou de informação. Dessa forma, participar das relações de troca com seus familiares, seja com dinheiro ou no cuidado dos netos, não garante ao idoso que a família irá apoiá-lo(21).

A segunda diferença existente entre os dois grupos de cuidadores refere-se ao grau de parentesco do cuidador com o idoso. Em contexto de pobreza, nossos dados mostram que quem exerce a tarefa de cuidar é a filha do idoso ou o cônjuge. Em contextos de baixa e média vulnerabilidade social, a família conta com o apoio de um profissional para o cuidado. Isso pode ser explicado devido às melhores condições socioeconômicas existentes nesse contexto que não se trata de pobreza. A literatura aponta que em famílias de nível socioeconômico mais baixo, há maior probabilidade de recebimento de auxílio familiar (filhas, esposas, noras) do que nas classes média e alta(7).

A qualidade do apoio familiar no cuidado de um idoso frágil pode ser extremamente importante para a longevidade desse idoso, uma vez que as famílias num contexto de pobreza parecem não possuir recursos financeiros suficientes para suprir as necessidades básicas dos membros e, menos ainda, para contratar serviços de terceiros para apoiar o idoso, tendo assim maiores dificuldades de amparar o idoso(12,20).

CONCLUSÕES

Os resultados mostram que os cuidadores dos idosos que vivem em contextos de muito baixa, baixa ou média vulnerabilidade social são em sua maioria do sexo feminino, casados, com 41 a 60 anos de idade, com ensino fundamental incompleto e sem renda mensal, moram com o idoso, apresentam relação estreita com ele e não apresentavam patologia no momento da coleta de dados. Relataram não receber ajuda para cuidar do idoso. O cuidador geralmente é a filha ou um profissional.

Os cuidadores dos idosos que vivem em contextos de alta ou muito alta vulnerabilidade social são predominantemente do sexo feminino, casados, com 41 a 60 anos de idade, com ensino fundamental incompleto, com renda mensal de até um salário mínimo. Relataram também não possuir patologias no momento da entrevista. O cuidador geralmente é a filha ou o cônjuge.

Os resultados encontrados nesse estudo poderão fornecer subsídios para os serviços de atenção básica de saúde, como as USF, para a formulação de estratégias adequadas voltadas aos cuidadores de idosos com declínio cognitivo, levando-se em consideração que geralmente os cuidadores são pessoas do sexo feminino.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos o apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).

Recebido em: 13/07/2009

Aprovado em: 09/03/2010

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  • Endereço da autora:
    Ariene Angelini dos Santos
    Rua Luis Turri, 47, Jardim Planalto
    37800-000, Guaxupé, MG
    E-mail:
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    Extraído da dissertação de Mestrado apresentada em 2009 ao Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      19 Out 2010
    • Data do Fascículo
      Mar 2010

    Histórico

    • Recebido
      13 Jul 2009
    • Aceito
      09 Mar 2010
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