Acessibilidade / Reportar erro

Um perfil geo-histórico de São Paulo e de Lyon (França) do final do século XIX até 1930

Neste número publicamos a segunda parte do dossiê da pesquisa de caráter interdisciplinar intitulada “Dinâmicas de urbanização e representações espaciais: abordagem geo-histórica dos territórios com Sistemas de Informação Geográfica (SIG)”, resultado da parceria entre o Département de Géographie et Aménagement du Territoire, da Université Jean Moulin (Lyon 3), da França, e diversas unidades da Universidade de São Paulo - USP (Programa de Pós-Graduação em História Social, Laboratório de Estudos de Cartografia Histórica da Cátedra Jaime Cortesão, Programa de Pós-Graduação em Geografia Humana, todos da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas - FFLCH; Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo - FAU; e Programa de Pós-Graduação Culturas e Identidades Brasileiras do Instituto de Estudos Brasileiros - IEB).

Sua proposta se inseriu no campo da geo-história, área de estudos eminentemente interdisciplinar, que contempla abordagens em diferentes escalas, através da construção retrospectiva de realidades histórico-espaciais, fazendo uso de técnicas cartográficas. Essa cartografia digital geo-histórica é resultado do cotejo sistemático de uma multiplicidade de tipologias documentais, visuais e não visuais. Assim, as fontes textuais ganham novas possibilidades de identificação das dinâmicas sociais e de interpretação quando as narrativas, as informações e os dados que elas trazem se manifestam por meio da linguagem gráfica dos mapas.

Nesta segunda parte do dossiê (a primeira parte consta na Revista do Instituto de Estudos Brasileiros n. 64) estão sendo publicados outros sete artigos que resultam de dois anos de trabalhos e pesquisas referentes às cidades de São Paulo e de Lyon tendo como base as dinâmicas e ritmos de crescimento das duas cidades desde finais do século XIX até os anos 1930, período no qual elas sofreram transformações estruturais. O objetivo principal da cooperação foi compartilhar experiências sobre os métodos de reconstrução geo-histórica dessas cidades. Tais exercícios possibilitaram a espacialização de dados sociodemográficos ainda inéditos, permitindo visualizações de redes que operavam nas cidades, dando oportunidade de rever suas lógicas e impactos.

O primeiro artigo foi escrito pelos geógrafos Jaime Tadeu Oliva, do IEB/USP, e Fernanda Padovesi Fonseca, da FFLCH/USP, que descrevem e interpretam o modelo de expansão da cidade de São Paulo no período compreendido entre a virada do século XIX e as primeiras décadas do século XX, tendo como referência uma dada história da urbanidade da cidade, identificando e apontando o que foi denominado como elementos urbanos dispersores ou descompactadores, constitutivos de uma urbanidade frouxa que caracteriza essa cidade até os dias atuais.

O artigo de Eduardo Dutenkefer, geógrafo e doutorando do PPGH/USP, apresenta proposta metodológica da cartografia digital geo-histórica aplicável na compreensão das relações dos objetos espaciais presentes em mapas históricos produzidos em diferentes épocas. Tal metodologia é diferente de outras metodologias orientadas na precisão cartográfica e em posições absolutas, pois opta por estabelecer um georreferenciamento relativo, isto é, estabelecer relações de feições, lugares e trajetórias que o mapa antigo possa ter com os mapas contemporâneos sem, contudo, distorcer significativamente as feições originais do mapa em estudo.

Já o artigo da historiadora do urbanismo Sheila Schneck, doutora pelo programa de História e Fundamentos da Arquitetura e do Urbanismo, da FAU/USP, nos leva a conhecer e compreender de que maneira o bairro do Bexiga se inseriu no movimento de redefinição dos espaços produtivos e sociais da cidade ao abrigar parte das atividades deslocadas do centro, atividades produtivas aparentemente “menores” do ponto de vista da macroeconomia, mas fundamentais para o funcionamento da cidade e seu processo de reespacialização social e das funções urbanas e suas conexões com o espaço urbano mais amplo.

Fechando a parte brasileira do dossiê, temos o artigo de Mônica Balestrin Nunes, arquiteta, geógrafa e analista de infraestrutura do Ministério das Cidades. Através de uma abordagem da leitura das paisagens por meio dos mapas e da aproximação da cartografia com a geografia humanista, o artigo trata dos mapas urbanos e como eles podem ser ferramentas na produção das cidades, com a devida distinção entre mapas que produzem espaço e mapas que são produzidos pelo espaço, num estudo da cidade de São Paulo entre 1930 e 1980.

O bloco de artigos relativos a Lyon é aberto com o texto de Damien Petermann, historiador e doutorando em Geografia e Planejamento da Université Jean Moulin Lyon 3, que trata dos meios de construção e evolução da imagem turística de Lyon na primeira metade do século XX através de seus guias de viagem. A evolução das representações espaciais de Lyon ao longo do tempo é analisada através da busca e identificação das mudanças no discurso turístico dos guias, principalmente no que se refere ao aparecimento e desaparecimento de objetos de uma edição a outra. As informações espaciais extraídas dos guias são integradas num SIG, o que permite realizar diferentes tratamentos e cruzamentos de dados.

Na sequência, o artigo de Olivier Chareire, geógrafo e professor da Université Jean Moulin Lyon 3, que apresenta e discute as fontes para a análise, no tempo longo, das atividades comerciais na cidade de Lyon. Conforme esclarece o professor, através da metodologia proposta por Bernard Gauthiez (apresentada na primeira parte deste dossiê), os almanaques editados nos séculos XIX e XX permitem criar, pelos conteúdos e disponibilidade, layers de localização das atividades comerciais para um SIG geo-histórico. É importante observar que o tipo de fonte utilizada - almanaques editados nos séculos XIX e XX - é o mesmo, para São Paulo, utilizado por Sheila Shneck nas suas análises do Bexiga.

Por último, e fechando esta segunda parte do dossiê, o artigo dos pesquisadores Fabien Mazenod e Vanessa Moura de Lacerda Teixeira, do Laboratório Environnement Ville Société da Université Jean Moulin Lyon 3, e de Carolina Moretti Fonseca, doutoranda em Geografia e Planejamento, da mesma universidade, que propõem explorar os métodos e as fontes dos dados que tratam da produção da cidade em diferentes trabalhos de campo na França, na Itália e no Brasil, tendo em conta o ator social envolvido, os meios e o território. Esses níveis possibilitaram estruturar questões específicas, a fim de explorar dados diferentes, de forma a contribuir para uma compreensão global dos fenômenos acerca da produção da cidade.

Boa leitura!

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Dec 2016
Instituto de Estudos Brasileiros Espaço Brasiliana, Av. Prof. Luciano Gualberto, 78 - Cidade Universitária, 05508-010 São Paulo/SP Brasil, Tel. (55 11) 3091-1149 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revistaieb@usp.br