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Conceitos de anemia entre mulheres nicaragüenses de baixa renda

Resumos

A anemia e um problema de saúde comum entre as mulheres de todo a mundo inteiro, mas tem havido um mínimo de investigação sobre os conceitos de anemia entre as mulheres. O objetivo deste estudo foi o de analisar os conceitos de anemia em mulheres nicaragüenses com baixos rendimentos. Foi utilizado um desenho qualitativo. Para a coleta de dados, entrevistas semi-estruturadas foram conduzidas, áudio gravadas em espanhol para 14 mulheres. As fitas foram transcritas e tornou-se uma análise conteúdo. Os resultados indicam que poucas mulheres possuem conhecimento biomédico preciso sobre anemia, tal como ingestão de alimentos pobre em ferro. Outras mantiveram outras crenças populares incluindo remédios caseiros, ingestão de leite de égua ou suco de beterraba e certos alimentos como sopa de feijão. A maioria das mulheres não conhecia nenhum sintoma de anemia e poucas relataram que pode progredir para leucemia. Estes conceitos de anemia são esclarecedores para os enfermeiros que trabalham com doentes na Nicarágua e que será muito útil para desenvolver intervenções de enfermagem para minorar o problema de saúde pública.

anemia; Nicarágua; América Latina


Anemia is a common health problem among women throughout the world, however, there has been minimal research on women's concepts of anemia. The purpose of this study was to examine concepts of anemia in low income Nicaraguan women. A qualitative design was used. Audio-taped open-ended interviews in Spanish with 14 women were used to obtain data. Tapes were transcribed and content analyzed. The findings indicate that few of the women had biomedically accurate concepts of anemia, such as that it was due to lack of iron from poor eating. Others held folk medical beliefs including home remedies, for example drinking the milk of a mare or beet juice and eating certain foods such as bean soup. Most of the women did not know any symptoms of anemia and a few reported that it can develop into leukemia. These concepts of anemia are instructive for nurses working with patients from Nicaragua and will be useful in developing nursing interventions to alleviate this public health problem.

anemia; Nicaragua; Latin America


La anemia es un problema de salud común entre las mujeres alrededor del mundo, sin embargo, se han realizado pocas investigaciones sobre los conceptos de anemia entre las mujeres. El propósito de este estudio fue examinar los conceptos de anemia en mujeres Nicaragüenses de bajos ingresos económicos. La investigación fue de orden cualitativa. Para la recolección de datos, se realizaron entrevistas semiestructuradas, grabadas en castellano, con 14 mujeres. Las cintas grabadas fueron transcritas y se realizó un análisis de contenido. Los resultados indican que pocas mujeres poseen conocimientos biomédicos sobre anemia, por ejemplo, la ingestión de alimentos pobres en hierro. Otras expresaron creencias populares, como remedios caseros, ingestión de leche de yegua o jugo de remolacha y ciertos alimentos como sopa de judías. La mayoría de las mujeres no conocía ningún síntoma de anemia y pocas relataron que creían que esta enfermedad podría transformarse en leucemia. Estos conceptos de anemia son instructivos para las enfermeras que trabajan con pacientes en Nicaragua y será de mucha utilidad para desarrollar intervenciones de enfermería para aliviar este problema de salud pública.

anemia; Nicaragua; América Latina


ARTIGO ORIGINAL

Conceitos de anemia entre mulheres nicaragüenses de baixa renda

Rita L. AilingerI; Jean B. MooreII; Lisa PawloskiIII; Lidya Ruth Zamora CortésIV

IEnfermeira, Doutor, Professor, School of Nursing & Health Studies, Georgetown University, Estados Unidos, e-mail: rla22@georgetown.edu

IIEnfermeiro, Doutor, Professor, School of Nursing , George Mason University , Estados Unidos, e-mail: jmoore@gmu.edu

IIIDoutor, Professor Associado, College of Health & Human Studies, George Mason University , Estados Unidos, e-mail: lpawlosk@gmu.edu

IVEnfermeira, Doutor, Vice-reitora, Universidad de Politecnica de Nicaragua, Nicarágua, e-mail: fefema157@hotmail.com

RESUMO

A anemia e um problema de saúde comum entre as mulheres de todo a mundo inteiro, mas tem havido um mínimo de investigação sobre os conceitos de anemia entre as mulheres. O objetivo deste estudo foi o de analisar os conceitos de anemia em mulheres nicaragüenses com baixos rendimentos. Foi utilizado um desenho qualitativo. Para a coleta de dados, entrevistas semi-estruturadas foram conduzidas, áudio gravadas em espanhol para 14 mulheres. As fitas foram transcritas e tornou-se uma análise conteúdo. Os resultados indicam que poucas mulheres possuem conhecimento biomédico preciso sobre anemia, tal como ingestão de alimentos pobre em ferro. Outras mantiveram outras crenças populares incluindo remédios caseiros, ingestão de leite de égua ou suco de beterraba e certos alimentos como sopa de feijão. A maioria das mulheres não conhecia nenhum sintoma de anemia e poucas relataram que pode progredir para leucemia. Estes conceitos de anemia são esclarecedores para os enfermeiros que trabalham com doentes na Nicarágua e que será muito útil para desenvolver intervenções de enfermagem para minorar o problema de saúde pública.

Descritores: anemia; Nicarágua; América Latina

INTRODUÇÃO

A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que a anemia afete mais de 2 bilhões de pessoas em todo o mundo(1). A anemia é um termo genérico que se refere à condição caracterizada pelo anormal baixo nível de glóbulos vermelhos ou hemoglobina saudáveis. Há múltiplas causas para a anemia, que incluem fatores genéticos e dietéticos. O grupo hereditário mais comum é a talassemia. Estas formas de anemia afetam majoritariamente pessoas com descendência Africana, Sudeste Asiática e Mediterrânea. A anemia falciforme é uma forma mais séria de anemia hereditária, que afeta pessoas de descendência Africana e Mediterrânea, podendo causar fadiga crônica e crises falciformes que podem levar à morte. O tipo mais comum de anemia com causas nutricionais é a ferropriva, no entanto, deficiências de ácido fólico, vitamina B12 e C também podem levar a baixos níveis de hemoglobina(2). Os dados deste estudo se referem à anemia medida pela hemoglobina, a OMS estima que 50% dela seja causada pela anemia ferropriva (adiante denominada anemia). As mulheres, especialmente gestantes, e crianças têm maior risco de terem anemia em todo o mundo. A OMS sugere que nos países em desenvolvimento 52% das mulheres grávidas, 42,3% de todas as mulheres, e 48% das crianças são anêmicas. Na América Latina, a anemia é um grande problema que afeta 19% de toda a população, sendo que na maioria das vezes afeta crianças e mulheres(3). A anemia causada por fatores alimentares é uma doença de prevenção e tratamento simples.

Os conceitos das doenças são influenciados por fatores educacionais, econômicos e principalmente culturais. O modo como as pessoas pensam na doença vem de sua experiência cultural em relação à mesma. Quando o conceito de uma doença é diferente para enfermeiro e paciente, devido a variações nas crenças culturais, a discordância pode levar a desentendimentos, problemas no estabelecimento de objetivos e não aderência ao tratamento. Este estudo objetivou explorar o conceito de anemia entre mulheres nicaragüenses de baixa renda, para oferecer uma abordagem culturalmente mais sensível à prevenção e ao tratamento da anemia por enfermeiras e outros provedores de cuidados de saúde.

CONTEXTO

Nos últimos cinco anos, poucos estudos exploraram conceitos divergentes de anemia e nenhum teve como foco mulheres nicaragüenses. Um amplo estudo qualitativo envolvendo oito países conduzido na Bolívia, Burkina Faso, Guatemala, Honduras, Índia, Indonésia, Malauí e Paquistão investigou as percepções de mulheres sobre anemia. O objetivo do estudo foi identificar as barreiras e facilitadores da suplementação férrea para gestantes. Os autores verificaram que as mulheres não conheciam o termo anemia, embora distinguissem seus sintomas, que descreveram como dor de cabeça, tontura, palidez e "sangue ralo", ou "sangue fraco". Cerca de 50% das mulheres pesquisadas acreditava que os sintomas da anemia eram uma prioridade de saúde, enquanto o restante não. As mulheres atribuíram os sintomas à dieta pobre, e metade delas relacionou os sintomas ao trabalho pesado. Em Honduras, a anemia foi relacionada a dormir em excesso. Nos países latino americanos da Guatemala, Honduras e Bolívia, as mulheres sabiam que a anemia podia trazer sérias conseqüências para a mãe e o bebê. As percepções para o tratamento da anemia incluíam comida nutritiva, vitaminas e medicação. O uso de recursos caseiros, como ervas e plantas, foi identificado em Honduras e na Bolívia. Crenças sobre a ingestão de ferro incluíam o receio de que o ferro "pode causar excesso de sangue ou um bebê grande", manchas no rosto do bebê ou outro dano para a criança(4).

A autora(5) de um estudo com 23 gestantes, desenvolvido em Lagos, Nigéria, afirma que a anemia materna não foi vista como uma prioridade para a gestante, e seu conhecimento sobre anemia era limitado. Também na África, em uma pesquisa com crianças em idade escolar, no Quênia, os autores relataram que havia barreiras culturais para a ingestão de ferro. Eles constataram que a alimentação, culturalmente diferente para os sexos, incluía crenças de que meninas devem comer "comidas leves" como arroz, mingau de cereais e milho, enquanto meninos eram alimentados com "comidas fortes", como carne e feijão(6). Em um estudo etnográfico com mães em Zamzibar, pesquisadores encontraram crenças médicas populares, como beber água vermelha resultante da fervura de folhas de abacate, e crenças na medicina ocidental contemporânea, como comer espinafre e ingerir suplementos de ferro(7). Pesquisadores nos Emirados Árabes relataram que, das mães cujos filhos tinham anemia, menos de 20% tinha conhecimento satisfatório sobre anemia, e mulheres que mencionavam seus sintomas de anemia eram vistas de forma negativa. As mulheres não consideravam a anemia um grande problema(8). Autores de um estudo sobre a percepção de mulheres jordanianas sobre anemia relataram que não havia diferença nas percepções em relação à escolaridade(9).

Autores de estudo que investigou o entendimento sobre anemia entre pais porto-riquenhos vivendo em Hartford, no estado norte americano de Connecticut, relataram que os pais associavam anemia com a dieta, hereditariedade e atividades, mas não tinham certeza de sua gravidade. Pais descreveram os sintomas como fraqueza e falta de apetite. Alguns pais porto-riquenhos perceberam que a anemia podia se tornar leucemia se não tratada, e a tratavam com ovo misturado com suco de uva ou malte(10).

O único estudo recente sobre anemia na Nicarágua evidenciou que 35% das adolescentes que tiveram anemia estavam grávidas, tinham parasitas intestinais ou eram fumantes. Todavia, os autores não avaliaram o conceito de anemia(11).

Resumidamente, estudos com mulheres em países em desenvolvimento e desenvolvidos mostraram que elas possuem diferentes conceitos sobre anemia e seu tratamento, que incluem crenças populares e na medicina ocidental contemporânea.

O presente estudo descreve os conceitos de anemia entre mulheres nicaragüenses de baixa renda, que vivem na capital Manágua, de uma perspectiva êmica. As questões da pesquisa foram: (1) Como mulheres nicaragüenses de baixa renda descrevem alguém com anemia e (2) Que recursos elas usam para tratar o problema?

MÉTODOS

Delineamento

Este estudo usou abordagem qualitativa para avaliar os conceitos de anemia em mulheres nicaragüenses de baixa renda.

Cenário

O estudo foi desenvolvido na Nicarágua, país com 5,4 milhões de habitantes e segundo mais pobre no continente Americano, com renda per capita anual de US$850. A taxa de analfabetismo é de 68% e a de mortalidade infantil 35,50 para cada 1000 nascidos vivos(12).

O cenário do estudo foi uma comunidade que é um antigo assentamento invadido por pessoas que foram vítimas de terremotos, furacões e guerra. Recentemente, muitas pessoas que vivem nesta comunidade receberam a escritura das terras do governo. As casas têm aproximadamente 4,5 m2, são feitas de sobras de madeira, papelão e latão, e poucas possuem energia elétrica. Nos últimos três anos a população teve acesso à água potável algumas horas por dia. Os problemas de saúde mais comuns são diarréia, infecções respiratórias agudas(13) e desnutrição em garotas(14).

A primeira autora trabalhou durante 13 anos, duas semanas por ano, como professora de estudantes norte-americanos que desenvolviam estágios clínicos em saúde da comunidade e populações vulneráveis naquela comunidade. Enfermeira antropóloga, fluente em Espanhol, realizou vasta observação participativa no contexto em que se desenvolveu o presente estudo. O segundo e terceiro autores fizeram extensa pesquisa em anemia em adolescentes nicaragüenses(15-16). A quarta autora é uma enfermeira Nicaragüense.

Amostra e Procedimento

Catorze mulheres que freqüentavam reuniões de um programa de microcrédito foram convidadas a participar da pesquisa. Assim como seus vizinhos, todas eram de baixa renda. A idade média das mulheres era 35 (DP=8,6) anos, e tinham em média quatro (DP=1,6) filhos. A primeira autora tinha estabelecido contato com as mulheres durante os anos anteriores, elas atendiam aos critérios de baixa renda e estavam dispostas a serem entrevistadas. Entrevistas individuais foram feitas em uma pequena sala na clínica de enfermagem da comunidade.

As participantes receberam um termo de consentimento esclarecido em espanhol, escrito em linguagem acessível, explicando o propósito do estudo e a natureza confidencial e voluntária da participação. Não houve recusas à participação. O estudo foi aprovado por um Comitê norte americano para pesquisas envolvendo seres humanos e pela Escola de Enfermagem que administra a clínica em Manágua. A primeira autora entrevistou as mulheres individualmente, em espanhol, utilizando um roteiro de entrevista com questões abertas sobre anemia. A entrevista foi gravada. As questões incluíam:

- Como se desenvolve a anemia?

- Quais são os sintomas?

- Que recursos caseiros você usa para combatê-la?

- Que outros tratamentos são usados?

- O que pode acontecer a alguém com anemia?

Números de identificação foram usados nas fitas; nenhum nome foi utilizado. A transcrição das entrevistas foi feita por uma pessoa cuja língua nativa é o espanhol.

As transcrições foram lidas enquanto se escutavam as fitas para garantir a exatidão e para desenvolver idéias preliminares sobre categorias e relações contextuais(17). Posteriormente, as transcrições foram analisadas através da análise de conteúdo latente. As categorias emergiram a partir dos dados, como resultado deste processo indutivo. As categorias foram resumidas em temas, "uma entidade abstrata que traz significados e identidade a uma experiência recorrente"(18). A análise qualitativa foi auxiliada pelo uso do software The Ethnograph (Versão 5.0). Os dados foram analisados em espanhol para conservar a linguagem contextual, antes de traduzir os temas para inglês.

RESULTADOS

Desenvolvimento da Anemia

Quando as mulheres foram questionadas sobre como a anemia se desenvolve, elas responderam com os temas dieta pobre e carência de vitaminas. Por exemplo, uma mulher relatou: Nós temos este hábito na Nicarágua, também por causa da pobreza, buscamos encher nossos estômagos, sem olhar todas as comidas que nos fazem bem, apenas enchemos nossos estômagos com arroz e feijão. Outra disse é uma falta de ferro devido à má alimentação e ao invés de beber suco, as pessoas bebem café e isto não é bom, tira as vitaminas. Outra mulher citou que a anemia se desenvolve porque eles não recebem vitaminas e ferro, que são essenciais para proteger o sangue. Uma das mulheres relatou que a anemia ocorre pela mulher ser deficiente em ferro, uma pessoa deve comer alimentos que contenham ferro para não ter anemia. Nenhuma das mulheres soube diferenciar os vários tipos de anemia.

Sintomas da Anemia

A maioria das mulheres não sabia nenhum dos sintomas da anemia. Várias mencionaram falta de apetite, uma citou tontura e fraqueza, e outra disse que os olhos ficam amarelados.

Recursos Caseiros

Quando as mulheres foram questionadas quais recursos caseiros usam para anemia, as respostas permearam o tema de comer certos alimentos. Quase metade das mulheres mencionou sopa de feijão como um recurso contra anemia. Outras citaram beber leite de égua, comer sementes de porongo, suco de beterraba, suco de laranja, suco de cenoura, comer frutas, comer carne quando você pode e se não pode comer carne, tomar leite porque é mais barato. Muitos relataram usar a cássia-gigante, cujo nome científico é Cassia grandis. Os frutos desta árvore têm uma espécie de melaço que também é usado para aliviar problemas respiratórios. O Jatobá (nome científico Hymenea courbari) também era usado, assim como a Salsaparrilha, ou Japecanga, (nome científico Similax spp), que é uma solução com propriedades analgésicas(18).

Outros Tratamentos

A busca de cuidado na unidade pública de saúde foi outro tema presente nas respostas das participantes. Vá à unidade e eles lhe dão um remédio que vem de outro país, foi a resposta de uma das mulheres. Algumas outras participantes disseram quando você vai à unidade eles lhe dão vitaminas que são como ferro.

Efeitos da anemia

A maioria das mulheres não sabia o que pode acontecer a alguém com anemia. Contudo, duas mulheres mencionaram que pode ser tornar leucemia.

DISCUSSÃO

Os achados deste estudo salientam a pluralidade dos conceitos de anemia entre estas mulheres de baixa renda. Algumas das crenças e recursos vinham de conhecimentos populares, enquanto outras estavam de acordo com o modelo biomédico, como a anemia ser decorrente da má nutrição. Os conceitos de anemia entre mulheres nicaragüenses não eram diferentes das percepções de anemia das mulheres investigadas no estudo desenvolvido em oito países latino-americanos ou naquele com pais porto-riquenhos em Hartford, EUA. Sintomas de tontura, fraqueza e maus hábitos alimentares foram mencionados em diversos estudos com participantes latino-americanos e, embora os recursos caseiros usados divergissem algumas vezes, seu uso era acentuado nos grupos estudados. O consumo de arroz e feijão foi mencionado como um recurso pelos entrevistados latinos; embora sopa de feijão tenha sido apontada mais freqüentemente pelas mulheres nicaragüenses.

Os temas identificados por estas mulheres carentes, como maus hábitos alimentares e carência de vitaminas, poderiam ser usados por enfermeiros que ensinam pessoas da Nicarágua ou ainda com outras mulheres de baixa renda de países da América do Sul e Central, em seus países ou nos EUA. A anemia ferropriva pode ser prevenida e tratada. Conhecendo os conceitos culturais dessas mulheres, enfermeiros podem ajustar sua comunicação para incluir o conceito na transmissão de ensinamentos de saúde.

Como exemplo, algumas mulheres acreditavam que sopa de feijão era eficaz no combate à anemia. Na realidade, no preparo da sopa de feijão os grãos são deixados de molho por algumas horas e depois fervidos na mesma água em que estiveram de molho. Apesar de o feijão ser uma fonte significante de ferro, este processo de cozimento na realidade pode aumentar o risco de anemia ferropriva. Deixar o feijão de molho pode liberar taninos encontrados na casca do feijão nesta água. Consumir taninos com ferro limita a biodisponibilidade de ferro e pode diminuir sua absorção, aumentando o risco de anemia ferropriva. Quando as mães foram indagadas sobre descartar a água do molho e usar uma nova água para ferver, a maioria achou que isto deixaria a sopa mais insossa e, em uma comunidade com escassez de água, seria muito mais difícil preparar o alimento. Assim, poucas pareceram entender a conexão entre dieta e anemia ferropriva, mas para tanto também precisariam de mais ensinamentos em saúde sobre técnicas de processo destes alimentos. Esta instrução seria dificultada pela questão do sabor, custo dos ingredientes e preferências alimentares pessoais.

Nenhum sujeito mencionou que tomar café durante as refeições, uma prática comum na Nicarágua e em outros países latino-americanos, interfere na absorção de ferro. Isto não é surpreendente considerando o nível educacional dos participantes e a preferência por café em todas as refeições. No entanto, esta pode ser uma oportunidade para educar. A ingestão de alimentos ricos em vitamina C com o intuito de aumentar a absorção de ferro também não foi mencionada. Todos estes hábitos devem ser considerados na educação em saúde com pessoas na América Latina ou com imigrantes latino-americanos nos EUA.

Diversas mulheres nicaragüenses relataram ir à unidade pública de saúde para obterem receitas para vitaminas e ferro para tratar anemia, entretanto, a prevenção do problema não foi observada da mesma maneira. O desenvolvimento de leucemia como conseqüência da anemia não tratada foi mencionado por diversas mulheres nicaragüenses, assim como havia sido notado no estudo com pais porto-riquenhos. As crenças sobre as conseqüências maiores da anemia ferropriva persistente derivavam de crenças populares ou falta de educação em saúde sobre as causas e conseqüências da anemia.

Esta pesquisa identificou algumas crenças culturais específicas às quais enfermeiros devem estar atentos quando interagem com clientes que são imigrantes nicaragüenses ou latino-americanos. Os enfermeiros podem incorporar crenças culturais que atenuam a anemia, como ingerir alimentos ricos em ferro (feijão, carne e leite, entre outros), na educação de clientes sobre a prevenção e o tratamento da anemia. Médicos clínicos também devem estar atentos às técnicas locais de preparação de alimentos, custos e disponibilidade de ingredientes, e ter conhecimento geral sobre as preferências alimentares e facilidade de obtenção destes alimentos para fazerem recomendações proveitosas e plausíveis.

Pesquisas futuras devem focar a prevenção da anemia através da educação, especialmente educação em nutrição e outros fatores que contribuem para a anemia. Estudos adicionais sobre as perspectivas de mulheres sobre anemia em outros países também ajudariam médicos que trabalham nestes países ou com imigrantes originários destas regiões.

REFERÊNCIAS

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  • Concepts of anemia among low income Nicaraguan women

    Rita L. AilingerI; Jean B. MooreII; Lisa PawloskiIII; Lidya Ruth Zamora CortésIV
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      15 Jun 2009
    • Data do Fascículo
      Abr 2009

    Histórico

    • Recebido
      24 Jun 2008
    • Aceito
      03 Mar 2009
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