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Conteúdos verbais expressos por mães de bebês prematuros com sintomas emocionais clínicos

Resumos

O objetivo do estudo foi caracterizar os conteúdos verbais maternos expressos durante intervenção de apoio psicológico. A amostra foi composta por 20 mães de neonatos pré-termo com muito baixo peso, internados em UTI Neonatal, distribuída em 10 mães com indicadores clínicos emocionais (MCIE) e 10 mães sem estes indicadores (MSIE), avaliadas pelos Inventários de Depressão de Beck e de Ansiedade Traço-Estado. As verbalizações maternas expressas no grupo de apoio foram gravadas, transcritas e categorizadas. Os resultados mostraram que as categorias sobre sentimentos ou reações maternas com conotação negativa ou conotação positiva e comunicação com a equipe de saúde foram as mais freqüentes. Na comparação entre os grupos, o Grupo MCIE verbalizou mais expressões referentes à primeira categoria quando comparado ao Grupo MSIE. A identificação dos sentimentos e reações de mães de neonatos pré-termo e dos sintomas emocionais clínicos deve ser incluída para adequada intervenção em cuidado desenvolvimental em UTIN.

comportamento verbal; prematuro; ansiedade; depressão; unidades de terapia intensiva


The aim of the present study was to characterize verbal contents expressed by preterm neonates' mothers during psychological support intervention. The sample was composed by 20 mothers of pre-term and very low birthweight neonates, hospitalized in NICU, allocated into two groups: 10 mothers with emotional clinical symptoms (MECS) and 10 mothers with no symptoms (MNECS), assessed by the Beck Depression Inventory and the State-Trait Anxiety Inventory. The verbal behavior expressed by mothers in the psychological support group was recorded, transcribed and categorized. The results show that three verbal categories were more frequent: negative feelings or reactions, followed by positive feelings or reactions and communication with the health staff. The comparison between groups reveals that MECS presented more expressions in the first category in comparison to MNECS. The identification of the feelings and reactions of pre-term neonates' mothers and emotional clinical symptoms should be included for appropriate intervention in developmental care in NICU.

verbal behavior; infant premature; anxiety; depression; intensive care units


El objetivo de este estudio fue caracterizar los contenidos verbales maternos expresados durante una intervención de apoyo psicológico. La muestra estaba compuesta por 20 madres de recién nacidos prematuramente, con un peso abajo de lo normal, internados en una UTI Neonatal; la muestra estaba constituida por 10 madres con indicadores clínicos emocionales (MCIE) y 10 madres sin estos indicadores (MSIE); las expresiones fueron evaluadas por medio de los Inventarios de Depresión de Beck y de Ansiedad Trazo/Estado. Las expresiones verbalizadas por las madres en el grupo de apoyo fueron gravadas, transcritas y clasificadas en categorías. Los resultados mostraron que las categorías sobre los sentimientos o reacciones maternas con connotación negativa o connotación positiva y la comunicación con el equipo de salud fueron las más frecuentes. Comparando los grupos, el Grupo MCIE verbalizó más expresiones referentes a la primera categoría que el Grupo MSIE. La identificación de los sentimientos y reacciones de las madres de neonatos prematuros y de los síntomas emocionales clínicos deben ser incluidas para realizar una adecuada intervención en el desarrollo individualizado del bebé en una UTIN.

conducta verbal; prematuro; ansiedad; depresión; unidades de terapia intensiva


ARTIGO ORIGINAL

Conteúdos verbais expressos por mães de bebês prematuros com sintomas emocionais clínicos

Luciana Leonetti CorreiaI; Ana Emília Vita CarvalhoII; Maria Beatriz Martins LinharesIII

IMestre em Saúde Mental, Doutoranda, e-mail: luleonetti@hotmail.com

IIDoutor em Ciências: Psicologia, Psicóloga da Fundação de Apoio ao Ensino, Pesquisa e Assistência do Hospital das Clinicas

IIIProfessor Doutor, e- mail: linhares@fmrp.usp.br. Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, Brasil

RESUMO

O objetivo do estudo foi caracterizar os conteúdos verbais maternos expressos durante intervenção de apoio psicológico. A amostra foi composta por 20 mães de neonatos pré-termo com muito baixo peso, internados em UTI Neonatal, distribuída em 10 mães com indicadores clínicos emocionais (MCIE) e 10 mães sem estes indicadores (MSIE), avaliadas pelos Inventários de Depressão de Beck e de Ansiedade Traço-Estado. As verbalizações maternas expressas no grupo de apoio foram gravadas, transcritas e categorizadas. Os resultados mostraram que as categorias sobre sentimentos ou reações maternas com conotação negativa ou conotação positiva e comunicação com a equipe de saúde foram as mais freqüentes. Na comparação entre os grupos, o Grupo MCIE verbalizou mais expressões referentes à primeira categoria quando comparado ao Grupo MSIE. A identificação dos sentimentos e reações de mães de neonatos pré-termo e dos sintomas emocionais clínicos deve ser incluída para adequada intervenção em cuidado desenvolvimental em UTIN.

Descritores: comportamento verbal; prematuro; ansiedade; depressão; unidades de terapia intensiva

INTRODUÇÃO

O nascimento de um bebê prematuro com muito baixo peso configura situação de “crise psicológica” na família, especialmente para a mãe. Essa é uma situação imprevisível, geradora de sentimentos de impotência e estresse, que aumenta a incidência de sintomas de ansiedade e depressão(1-3). Estudos que avaliaram a ansiedade e a depressão materna mostraram haver co-ocorrência entre esses sintomas, ou seja, altos níveis de ansiedade parecem interagir com altos níveis de depressão materna, representando fatores potenciais de risco para o desenvolvimento do bebê e a relação da díade mãe-bebê(2-3).

No sentido de minimizar o impacto das conseqüências imediatas e desfavoráveis para a relação mãe-bebê pré-termo, hospitalizado em Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN), têm sido propostas mudanças nas práticas de atendimento neonatal(3-4). A abordagem de “Cuidado Desenvolvimental individualizado e centrado na família de bebês pré-termo de muito baixo peso em UTIN” marcou nova era no trabalho interdisciplinar nas UTIN(4-5).

O grupo de apoio psicológico pode constituir-se em espaço facilitador de reflexão de sentimentos e de orientação, no qual são oferecidos apoio e proteção à mãe, a fim de que ela possa desenvolver melhores condições de enfrentamento no período de internação do bebê na UTIN(6). Estudos realizados com o objetivo de analisar os conteúdos temáticos das verbalizações maternas, durante a realização de grupos de apoio psicológico a mães de recém-nascidos hospitalizados em UTIN, são importantes, uma vez que, o relato verbal materno é importante fonte de dados do ponto de vista metodológico(7). Entretanto, até onde se sabe, a investigação da análise do conteúdo das verbalizações em mães de bebês prematuros não tem considerado aspectos de saúde mental.

O presente estudo teve por objetivo caracterizar os conteúdos verbais de mães de neonatos prematuros, expressos durante um contexto de intervenção psicológica, comparando dois grupos de mães, diferenciadas quanto aos indicadores emocionais clínicos.

MÉTODO

Participantes

A amostra foi composta por 20 mães de bebês nascidos pré-termo, com peso ao nascimento igual ou abaixo de 1.500 gramas que participaram no período de junho de 2001 a fevereiro de 2003 do Programa de Apoio Psicológico a mães de bebês pré-termo hospitalizados na Unidade de Tratamento Intensivo Neonatal, promovido pelo Serviço de Psicologia Pediátrica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - USP, junto ao Serviço de Neonatologia. Da amostra inicial de vinte e sete mães, sete foram excluídas, sendo um caso devido ao óbito do bebê e seis mães eram portadoras de distúrbios psiquiátricos (antecedentes e contemporâneos ao nascimento do bebê). O presente estudo contou com a aprovação dos Setores de Neonatologia e de Ginecologia e Obstetrícia e do Comitê de Ética em Pesquisa do HCFMRP-USP.

Instrumentos e materiais

Foram utilizados os seguintes instrumentos e materiais para a seleção dos participantes e coleta de dados: a) SCID Não - Paciente - Entrevista Clínica Estruturada para DSM - III - R(8); b) Inventário de Ansiedade - Traço/Estado - IDATE com tradução e adaptação brasileira(9). Na sub-escala de ansiedade-estado foi solicitado às mães que, ao responderem os itens, pensassem na situação de nascimento do(a) filho(a). Os escores do IDATE foram transformados em percentis e foi adotado o percentil > a 75 para discriminar portador de indicador clínico emocional de ansiedade, do tipo estado ou traço; c) Inventário de Depressão de Beck com tradução e adaptação brasileira(10). O ponto de corte utilizado para identificar portador de indicador emocional de depressão não diagnosticado foi de escore acima de 20(11); d) Lembretes Preciosos para a Mamãe - Manual de Apoio para a Orientação Psicológica de Mães de recém-nascidos pré-termo e < 1.500g”(12); e) Prontuários médicos dos bebês do HCFMRP - USP; f) entrevista para a coleta de informações sociodemográficas das mães e dos bebês(13); g) gravador, fita cassete e pilhas.

PROCEDIMENTO

Coleta de dados

Seleção dos participantes: a Entrevista Clínica Estruturada para DSM - III - R/SCID Não - Paciente era realizada individualmente pela psicóloga (segunda autora), sem finalidade diagnóstica, a fim de excluir mães que apresentavam histórico psiquiátrico. Após a confirmação do critério de inclusão, era firmado o termo de consentimento livre e esclarecido.

Composição de grupos, de acordo com os sintomas emocionais clínicos: a avaliação psicológica foi realizada de forma a identificar dois grupos de mães, diferenciadas quanto aos indicadores emocionais clínicos, a saber: dez mães com indicadores emocionais (MCIE) e dez mães sem indicadores emocionais (MSIE). Para a composição dos dois grupos de mães, foram aplicados o Inventário de Ansiedade Traço-Estado - IDATE e o Inventário de Depressão de Beck - BDI, pela primeira autora. Foi adotado o nível clínico mencionado no item instrumentos e materiais.

Coleta de dados: os dados foram obtidos em sessões de intervenção psicológica com mães de bebês prematuros, que tinham por objetivo fornecer avaliação, proporcionar apoio psicológico e orientar as mães, durante a internação dos bebês na UTIN. Esse procedimento é realizado rotineiramente na UTIN, em esquema semanal, com o suporte de uma psicóloga (segunda autora). Os dados que serão objeto de análise do presente estudo são constituídos pelos relatos verbais maternos, obtidos em 16 sessões de intervenção psicológica, em contexto de grupo, nas quais foi utilizado os Lembretes Preciosos para a Mamãe - Manual de Apoio para a Orientação Psicológica de Mães de recém-nascidos pré-termo e < 1.500g(12). O manual é organizado em capítulos que apresentam a trajetória de acontecimentos que envolvem freqüentemente os pais de bebês nascidos pré-termo hospitalizados, a saber: o impacto do nascimento pré-termo do bebê; a hora da visita na UTI neonatal; como posso ter contato com o meu bebê?; notícias sobre o bebê internado na UTI neonatal; como amamentar meu bebê internado em UTIN; a hora da alta hospitalar. Cada capítulo é introduzido por trechos, que correspondem a breves relatos de mães, relacionados aos temas abordados nos capítulos. O procedimento relativo ao uso do Lembretes Preciosos para a Mamãe encontra-se descrito em Carvalho(13). Após o consentimento prévio das mães participantes, essas sessões eram audiogravadas, para posterior transcrição literal por uma segunda psicóloga (primeira autora), a qual era “cega” em relação às características e aos resultados das avaliações psicológicas das mães. As sessões duravam, aproximadamente, 60 minutos, sendo, portanto, utilizado para análise o total de 960 minutos de gravação.

Informações sobre a história de saúde do bebê: foi realizada coleta de informações por meio da análise documental dos prontuários médicos, a fim de identificar as seguintes variáveis de risco neonatal do bebê: peso ao nascimento (gramas), idade gestacional (semanas) e tempo de internação na UTIN (dias).

Análise dos dados

Preparação dos dados para a análise: as audiogravações foram transcritas literalmente para posterior análise do conteúdo temático das verbalizações maternas. Essas transcrições foram realizadas pela segunda autora e, posteriormente, foram submetidas à psicóloga responsável pela condução das sessões (primeira autora) para que possíveis falhas de transcrições fossem corrigidas.

Elaboração do sistema de categorias para análise do conteúdo verbal: a análise do conteúdo temático das verbalizações maternas transcritas foi realizada por meio de um sistema de análise quantitativo-interpretativo(14). A elaboração do sistema de categorias para análise do conteúdo verbal materno encontra-se descrita em Correia(15). Para aferição da fidedignidade, o sistema de categorias para análise do conteúdo verbal materno foi submetido ao estabelecimento do índice de fidedignidade entre dois avaliadores independentes, treinados e experientes em observação sistemática do comportamento e análise de verbalizações quanto ao conteúdo temático. O índice de fidedignidade obtido entre avaliadores foi de 85%. Em seguida, o sistema de categorias e subcategorias para análise do conteúdo verbal materno foi ajustado para esclarecer os desacordos entre os avaliadores e aplicado em todos os dados da amostra do estudo. A seguir, encontram-se as categorias e subcategorias do sistema de análise do conteúdo verbal materno.

I - Sentimentos/reações maternas com conotação positiva: amor ou orgulho pelo bebê; felicidade ao ver, visitar e cuidar do bebê; desejo da sobrevivência do bebê; adaptação, aceitação, superação, esperança ou tranqüilidade diante da condição de prematuridade do bebê; necessidade ou vontade de estabelecer contato, de aproximar ou tocar o bebê; vontade de amamentar; desejo da alta hospitalar e vontade de cuidar do bebê após a alta; atenção ao bebê. II - Sentimentos/reações maternas com conotação negativa: II.1 - Reações negativas: medo de aproximação, de prejudicar ou de estabelecer contato com o bebê; mal-estar, ansiedade, apreensão, nervosismo, angústia ou insegurança; susto, choque, surpresa, pânico, espanto ou aflição; choro ou tristeza; rejeição, revolta, negação ou distanciamento do seu bebê pré-termo; impaciência ou inquietude; II.2 - dúvidas e comentários em relação à condição de nascimento e ao estado de saúde do bebê pré-termo; III - Sentimentos/reações maternas com conotação de oscilação ou ambivalência. IV - Sentimentos maternos de culpa: culpa atribuída pelo outro; isenção de culpa; auto-atribuição duvidosa de culpa. V - Expectativas maternas em relação à condição de nascimento do bebê e a equipe de saúde: V.1 - expectativas em relação à condição de nascimento do bebê: expectativa em relação ao estado de saúde do bebê; expectativa relativa ao peso “normal”; expectativa relativa ao tamanho “normal”; expectativa relativa ao nascimento a termo; expectativa relativa ao sexo do bebê. V.2- Expectativas em relação à equipe de saúde. VI - Percepções maternas em relação ao desenvolvimento, evolução e saúde do bebê: positivas ou negativas; VII - Concepções maternas sobre a prematuridade do bebê: impotência de desempenhar o papel materno; indiferença materna; dependência materna em relação ao bebê; dependência do bebê em relação à mãe. VIII - Comparações com outros bebês e mães: positivas ou negativas. IX - Comunicação e relação materna com a equipe de saúde: comunicação omitida; comunicação fornecida; busca ativa materna por informação; medo ou vergonha de perguntar notícias do bebê; ajuda ou auxílio da equipe de saúde; proibição da equipe quanto a ver ou visitar o bebê; oposição ou insegurança em relação à equipe de saúde. X - Menção de fé-religiosa. XI - Descrições da relação mãe-bebê. XII - Identificação com o material utilizado no programa de intervenção: identificação ou não identificação. XIII - Incentivo e suporte de amigos e parentes. XIV - Comparações com o pai. XV - Comparação com os outros irmãos.

Análise dos dados: primeiramente, foi realizada a análise estatística descritiva, por meio de freqüência, porcentagem e mediana, de acordo com a natureza dos dados. A análise quantitativa descritiva dos dados das categorias verbais temáticas foi realizada em termos de freqüência e porcentagem dos conteúdos verbais maternos. A freqüência de cada categoria ou subcategoria correspondia à emissão do número de vezes em que essas foram expressas pelas mães. A porcentagem de cada categoria, por sua vez, foi calculada dividindo-se a freqüência total das verbalizações maternas da categoria pela freqüência total das verbalizações maternas expressas no conjunto das sessões de intervenção. A porcentagem de cada subcategoria foi calculada dividindo-se a freqüência de verbalizações da subcategoria pelo total da freqüência das verbalizações da categoria correspondente. Posteriormente, as mães foram identificadas quanto aos níveis de indicadores clínicos emocionais e foram analisados os conteúdos verbais maternos, encontrados no Grupo MCIE e no Grupo MSIE, respectivamente. A análise comparativa entre os grupos (MCIE vs MSIE) visou caracterizar e identificar possíveis diferenças entre os grupos estudados quanto aos sentimentos, pensamentos e reações maternas expressos verbalmente. As variáveis contínuas foram tratadas utilizando-se o teste não-paramétrico de Mann Whitney e, para as variáveis discretas, utilizou-se o teste de qui-quadrado ou teste Exato de Fisher. Foram analisadas as relações entre as variáveis neonatais do bebê (peso ao nascimento, o índice de risco clínico para bebês - CRIB - e o tempo de internação do bebê em UTIN), em ambos os grupos, utilizando-se o teste de correlação de postos de Spearman. Para o tratamento estatístico dos dados utilizou-se o Statistical Package for Social Sciences (SPSS) para Windows na versão 12.0. Foi adotado no estudo o nível de significância de 5%.

RESULTADOS

Verifica-se, na Tabela 1, que as características maternas e as neonatais dos bebês quando analisadas não apresentaram diferenças estatisticamente significativas entre os grupos MCIE e MSIE. Em relação às variáveis maternas, em ambos os grupos as mães eram, em sua maioria, jovens, possuíam poucos filhos, união civil estável e haviam cursado o primeiro grau escolar. Em relação à ocupação profissional, a maior parte dessas mães não trabalhava fora de casa. Em relação às variáveis neonatais dos bebês, em ambos os grupos, os bebês tinham idade gestacional mediana ao nascimento igual a 28 semanas e o valor mediano do peso de nascimento situou-se em torno de 1.000 gramas. Os grupos apresentaram alto escore mediano no índice de Apgar e o índice de risco neonatal, medido pelo CRIB, situou-se igual ou abaixo da mediana de três pontos, indicando gravidade neonatal moderada dos bebês. Os índices do Apgar e do CRIB apresentaram grande amplitude de variação nos escores, sugerindo variação individual dos bebês com relação a esses aspectos. A maioria dos bebês de ambos os grupos classifica-se como “pequeno para a idade gestacional”, ou seja, tinha peso ao nascimento abaixo do esperado para a idade gestacional. O tempo de internação na UTIN e o tempo total de internação do bebê apresentaram valores medianos semelhantes, com ampla variação em ambos os grupos.

Complementando os dados da Tabela 1, verificou-se que, em ambos os grupos, houve correlação positiva significante entre o tempo de internação do bebê na UTIN e o índice do CRIB; quanto maior o índice de risco clínico neonatal, maior o tempo de internação na UTIN (r=0,74 [p < 0,02]; r=0,87 [p < 0,002], respectivamente). Por outro lado, foi encontrada correlação negativa significante entre o tempo de internação na UTIN e o peso ao nascimento; quanto menor o peso ao nascimento, maior o tempo de internação (r=-0,72 [p < 0,01]; r=0,69 [p < 0,02], respectivamente).

Verifica-se, na Tabela 2, que as três categorias mais freqüentes em ambos os grupos, em ordem de maior ocorrência, foram: sentimentos ou reações maternas com conotação negativa, sentimentos ou reações maternas com conotação positiva e comunicação e relação materna com a equipe de saúde. Quanto às verbalizações maternas sobre sentimentos ou reações maternas com conotação negativa, verifica-se que as subcategorias reações negativas foram mais verbalizadas do que aquelas sobre dúvidas e comentários, em ambos os grupos. Quanto às verbalizações sobre reações negativas, as verbalizações sobre o medo de aproximação, de prejudicar ou de estabelecer contato com o bebê foram as que mais se destacaram em ambos os grupos. O grupo MCIE verbalizou mais sobre a rejeição, revolta, negação ou distanciamento do bebê do que o Grupo MSIE. Em relação às verbalizações maternas sobre sentimentos/reações maternas com conotação positiva, observa-se que as mães do Grupo MCIE tenderam a verbalizar menos do que as mães do grupo MSIE sobre as subcategorias de adaptação, aceitação, superação, esperança ou tranqüilidade diante da condição de prematuridade do bebê e de necessidade ou vontade materna de estabelecer contato, de se aproximar ou tocar o bebê. Entretanto, as mães do grupo MCIE falaram mais sobre o desejo da alta hospitalar e vontade de cuidar do bebê após a alta quando comparadas às mães do grupo MSIE. Observa-se que, em relação à categoria comunicação e relação materna com a equipe de saúde, as mães do grupo MCIE verbalizaram mais que as mães do grupo MSIE sobre expressões relativas à comunicação de informações fornecidas a elas e expressões relacionadas à busca ativa de informação sobre o bebê por parte da mãe.

DISCUSSÃO

Analisando-se o conjunto de conteúdos verbais maternos expressos no contexto de grupo de apoio psicológico a mães de bebês nascidos prematuramente e internados em UTIN, verificou-se que a amostra de mães manifestou, predominantemente, expressões sobre sentimentos ou reações com conotação negativa, independentemente dos sintomas emocionais clínicos de ansiedade e depressão. As mães com indicadores clínicos emocionais tenderam a apresentar mais expressões de sentimentos ou reações maternas com conotação negativa quando comparadas às mães que não apresentaram esses indicadores; essas, por sua vez, apresentaram tendência a verbalizar mais sobre expressões de sentimentos ou reações com conotação positiva e sobre a comunicação e relação com a equipe de saúde, quando comparadas às mães do grupo MCIE. Possivelmente, a presença de indicadores emocionais clínicos maternos de ansiedade e depressão pode ter estimulado maior número de ocorrências de verbalização acerca de sentimentos e reações com conotação negativa. Essas verbalizações, no entanto, são esperadas devido ao impacto que o nascimento pré-termo e a internação precoce do bebê em UTIN representam para as mães, nesse contexto(3).

Embora aparentemente seja paradoxal o fato de as mães de ambos os grupos terem verbalizado tanto sobre sentimentos e reações negativas quanto positivas, esses dados sugerem que as mães de bebês prematuros podem experimentar sentimentos ambíguos. O repertório comportamental do indivíduo em crise compreende oscilações e ambivalências de sentimentos e reações, desencadeadas por situações inesperadas, como exatamente ocorre com o nascimento pré-termo do bebê e a hospitalização precoce dos mesmos em UTIN(1). No presente estudo, para a reestruturação do equilíbrio emocional materno e no sentido de minimizar as conseqüências desfavoráveis da presença de indicadores emocionais maternos, o fornecimento de suporte psicológico por meio de grupo de apoio às mães, no período neonatal, reveste-se de suma importância, pois constitui contexto favorecedor, no qual são oferecidos apoio e proteção à mãe, a fim de que ela possa desenvolver melhores condições de enfrentamento no período de internação do bebê na UTIN(5) e contribui para redução significativa dos níveis clínicos emocionais maternos de ansiedade e depressão(2).

Os resultados da análise dos relatos verbais maternos sugerem que o nascimento pré-termo e a hospitalização precoce do bebê em UTIN são, por si só, variáveis que podem comprometer o equilíbrio emocional materno e familiar, corroborando os estudos anteriores(3,5); entretanto, verbalizações maternas negativas relacionadas ao nascimento e à hospitalização do bebê tenderam a ocorrer mais em mães com indicadores emocionais de ansiedade ou depressão que em mães que não apresentaram esses indicadores.

O contexto do presente estudo traz a vantagem de ter sido realizado em um contexto natural aplicado, o que confere “validade ecológica” aos resultados encontrados, ou seja, a análise das representações maternas verbalizadas procedeu de um contexto de experiência imediata ao nascimento prematuro do bebê e de sua internação na UTIN. No entanto, seus resultados referem-se a uma amostra pequena, selecionada em um hospital universitário, o que requer cuidados em relação à generalização dos achados para outras amostras de mães. Finalizando, o avanço na análise das verbalizações maternas sobre prematuridade dos bebês pode melhorar a compreensão do universo psicológico da mãe, cuidadora primária e de longo prazo desses bebês vulneráveis.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A investigação acerca de indicadores emocionais maternos é relevante para a prática clínica. Durante a internação hospitalar o foco do atendimento clínico é o bebê prematuro e sua evolução. Porém, na medida em que se introduzem ações que dependem da mãe para promover o bem-estar e a saúde do bebê, tais como a amamentação, as visitas, o contato pele a pele e o Método Canguru, o conhecimento acerca dos pensamentos, sentimentos e crenças maternas ajudam a orientar a adequada implementação de estratégias de intervenção facilitadoras do cuidado desenvolvimental individualizado do bebê.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Recebido em: 6.11.2006

Aprovado em: 3.10.2007

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    31 Mar 2008
  • Data do Fascículo
    Fev 2008

Histórico

  • Aceito
    03 Out 2007
  • Recebido
    06 Nov 2006
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