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Percepção de poder de enfermeiras frente ao seu papel clínico

Resumos

Este artigo relata estudo sobre a percepção de poder clínico de enfermeiras, antes e após a implementação de uma classificação de diagnósticos de enfermagem. Sessenta enfermeiras (idade média = 37,2±7 anos), de um hospital brasileiro de ensino, responderam o instrumento Power as Knowing Participation in Change Tool, antes e após a implementação de uma classificação de diagnósticos. Esse instrumento tem 4 domínios e provê escores parciais e totais. Os coeficientes de confiabilidade do instrumento foram de 0,88 a 0,98. Os escores totais não foram estatisticamente diferentes entre as avaliações (p=0,21,), mas os escores de "Envolvimento na Criação de Mudanças" foram mais altos após a implementação da classificação (p=0,04). O impacto do uso de sistemas de classificação de enfermagem na percepção das enfermeiras sobre seu poder clínico ainda requer estudos que forneçam evidências úteis para guiar decisões no ensino e na clínica.

atitude; papel do profissional de enfermagem; diagnóstico de enfermagem; desenvolvimento de pessoal


This article reports on a study on nurses' perception of power regarding their clinical role before and after implementation of a nursing diagnosis classification. Sixty clinical nurses (average age = 37.2 ± 7.0 years) from a Brazilian teaching hospital answered the Power as Knowing Participation in Change Tool (PKPCT) before and after the implementation of a diagnosis classification. PKPCT has four domains and provides total and partial scores. Reliability coefficients ranged from 0.88 to 0.98. Total scores were not statistically different between assessments (p=0.21), although scores in the "Involvement in Creating Change" domain were higher in the second assessment (p=0.04). Further studies providing sound evidence regarding the impact of nursing classification systems on nurses' power perception are needed to guide decisions on teaching and clinical practice.

attitude; nurse´s role; nursing diagnosis; staff development


Este artículo relata un estudio sobre la percepción de poder clínico de las enfermeras, antes y después de la implementación de una clasificación de diagnósticos de enfermería. Sesenta enfermeras (edad promedio = 37,2±7 años), de un hospital brasileño de enseñanza, respondieron el instrumento Power as Knowing Participation in Change Tool, antes y después de la implementación de una clasificación de diagnósticos. Ese instrumento tiene 4 dominios y provee puntajes parciales y totales. Los coeficientes de confiabilidad del instrumento fueron de 0,88 la 0,98. Los puntajes totales no fueron estadísticamente diferentes entre las evaluaciones (p=0,21), sin embargo los puntajes de "Participación en la Creación de Cambios" fueron más altos después de la implementación de la clasificación (p=0,04). El impacto del uso de sistemas de clasificación de enfermería en la percepción de las enfermeras sobre su poder clínico todavía requiere estudios que entreguen evidencias útiles para guiar decisiones en la enseñanza y en la clínica.

actitud; rol de la enfermera; diagnóstico de enfermería; desarrollo de personal


ARTIGO ORIGINAL

Percepção de poder de enfermeiras frente ao seu papel clínico

Diná de Almeida Lopes Monteiro da CruzI; Cibele Andrucioli de Mattos PimentaI; Maria Fernanda Vita PedrosaII; Antônio Fernandes da Costa LimaIII; Raquel Rapone GaidzinskiIV

IEnfermeira, Professor Titular da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, Brasil, e-mail: mtmllf@usp.br, parpca@usp.br

IIEnfermeira, Hospital do Câncer A. C. Camargo, Brasil, e-mail: fervita@hotmail.com

IIIEnfermeiro, Hospital Universitário da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Brasil, e-mail: tonifer@usp.br

IVEnfermeira, Professor Associado da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, Brasil, e-mail: raqui@usp.br

RESUMO

Este artigo relata estudo sobre a percepção de poder clínico de enfermeiras, antes e após a implementação de uma classificação de diagnósticos de enfermagem. Sessenta enfermeiras (idade média = 37,2±7 anos), de um hospital brasileiro de ensino, responderam o instrumento Power as Knowing Participation in Change Tool, antes e após a implementação de uma classificação de diagnósticos. Esse instrumento tem 4 domínios e provê escores parciais e totais. Os coeficientes de confiabilidade do instrumento foram de 0,88 a 0,98. Os escores totais não foram estatisticamente diferentes entre as avaliações (p=0,21,), mas os escores de "Envolvimento na Criação de Mudanças" foram mais altos após a implementação da classificação (p=0,04). O impacto do uso de sistemas de classificação de enfermagem na percepção das enfermeiras sobre seu poder clínico ainda requer estudos que forneçam evidências úteis para guiar decisões no ensino e na clínica.

Descritores: atitude; papel do profissional de enfermagem; diagnóstico de enfermagem; desenvolvimento de pessoal

INTRODUÇÃO

A importância dos sistemas de classificação é internacionalmente reconhecida. Sistemas de classificação de enfermagem são bases de representação do conhecimento que tornam possível a recuperação de dados úteis de enfermagem. Embora haja considerável literatura sobre o desenvolvimento de vocabulários, terminologias e classificações de enfermagem e de seus impactos na documentação de enfermagem, pouco se encontra sobre os efeitos das classificações em outros aspectos da prática clínica.

Implementar um sistema de classificação num serviço de saúde é processo de mudança. Este artigo relata estudo sobre a percepção de poder de enfermeiras frente ao seu papel clínico, antes e após a implementação da North American Nursing Diagnosis - International Classification (NANDA-I)(1).

A percepção de poder das enfermeiras é componente importante no desenvolvimento de seu papel clínico(2). A literatura sugere que as enfermeiras frequentemente se percebem impotentes visto que são submetidas ao poder de outros(2-3).

O principal pressuposto deste artigo é que a implementação de uma classificação de diagnósticos de enfermagem influencia positivamente a percepção de poder das enfermeiras.

Poder

No senso comum, prevalece a ideia de que poder é a capacidade de exercer influência sobre uma pessoa ou grupo para que aceitem ideias diferentes, mesmo contra sua vontade, ou a capacidade de uma, ou mais pessoas, alcançar o que deseja por uma ação coletiva.

A literatura sobre poder é volumosa e apresenta várias definições e teorias de poder. Poder tem natureza abstrata e as definições mais antigas foram associadas a ações de controle militar e governamental, representando ideias de autoridade, força, coerção, manipulação, influência e controle(4). Ao lado de visões de poder como um relacionamento social, em visões mais recentes, poder tem sido descrito como fenômeno transformacional que promove o crescimento individual e grupal pelo encorajamento da reciprocidade, estímulo ao pensamento criativo, expansão do conhecimento e favorecimento da conscientização(5-6).

O poder tem dois significados principais: um é o 'poder para' e outro é 'poder sobre'(7). 'Poder sobre' é a capacidade de influenciar pessoas, está relacionado ao controle, competitividade e autoridade. 'Poder para' refere-se à eficácia e inclui a capacidade para alcançar objetivos, os meios para assegurá-los e habilidades para agir de acordo com eles(7).

O foco deste estudo foi a percepção de poder das enfermeiras para realizar mudanças nos resultados de saúde dos pacientes, e não para influenciar outras pessoas por meio de controle, competitividade e autoridade. Poder foi visto como um desejo intencional de tomar parte em transformações; a perspectiva foi do 'poder para'(7).

Poder como participação consciente

A visão do 'poder para' representa extensão da noção de poder que focaliza a pessoa e o ambiente como um todo integralmente relacionado. Congruente com essa visão, foi desenvolvida uma teoria de poder baseada na Ciência dos Seres Humanos Unitários(8). Essa teoria define poder como a capacidade de participar conscientemente da natureza das mudanças, caracterizando padronização contínua dos campos humano e ambiental(9). Poder como participação consciente é estar cônscio do que se está escolhendo fazer, sentir-se livre para fazer o que se escolheu, e intencionalmente fazer o que se escolheu(6,9).

Essa estrutura teórica oferece explanação para a participação intencional em mudanças que pode ser aplicada a vários contextos da experiência humana. O foco deste estudo foi a percepção de poder de enfermeiras, relacionada ao seu papel clínico. Para esse propósito, poder clínico foi definido como a percepção da enfermeira de ser intelectual, física e emocionalmente capaz e preparada para interpretar respostas humanas, planejar, implementar e avaliar intervenções de enfermagem de forma eficaz. Com base na teoria de poder escolhida(6), a conscientização da enfermeira sobre quais ações de cuidado escolhe fazer, sentir-se livre para fazê-las e fazê-las intencionalmente representa o poder clínico das enfermeiras.

As manifestações observáveis de poder são o 'estar cônscio', as escolhas, a liberdade para agir intencionalmente e o envolvimento na criação de mudanças(6). 'Estar cônscio' refere-se a ter consciência daquilo que a pessoa percebe existir(6). No caso deste estudo, refere-se à enfermeira ter consciência de seu papel clínico. Escolhas são seleções entre as possibilidades de participar das experiências(6). Neste estudo, são seleções de possibilidades de participar de experiências clínicas. Liberdade para agir intencionalmente é a experiência da capacidade que a pessoa tem para fazer algo ou realizar aquilo que tem em mente(6). Neste estudo, é a experiência da capacidade da enfermeira de exercer o papel clínico guiado por seus próprios princípios e conhecimento. O envolvimento na criação de mudanças é o engajamento inovativo no imprevisível processo mútuo entre pessoa e ambiente para tornar real algumas possibilidades e não outras(6). Dessa forma, aqui, é o engajamento da enfermeira no processo mútuo entre ambiente e pessoas para realizar os potenciais de saúde dos pacientes.

Diagnóstico de enfermagem

A importância dos diagnósticos de enfermagem tem sido crescente e há esforços para desenvolver classificações de diagnósticos para representar o universo de possibilidades relativas aos focos da enfermagem clínica. Esse universo de possibilidades permite às enfermeiras identificar os focos clínicos pertinentes ao cuidado que prestam. Identificar o foco clínico, por sua vez, dá às enfermeiras maior conscientização de seu papel clínico, mais intencionalidade e envolvimento para decidir o que fazer para influenciar de modo benéfico o estado de saúde do paciente. Em síntese, a identificação dos focos clínicos pode aumentar o sentimento de "poder" das enfermeiras, de se sentirem "capazes" de interferir e realizar os potenciais de saúde dos pacientes.

Classificações científicas são instrumentos para aprimorar as experiências humanas e os significados das palavras ou frases nelas contidas são fundamentadas na experiência dos usuários das próprias classificações(10). Conforme as enfermeiras começam a usar um sistema de classificação elas precisam pensar nos significados de palavras ou frases e isso as ajuda a organizar suas experiências no mundo da enfermagem.

O uso de uma classificação de diagnósticos pode aumentar a percepção de poder das enfermeiras por oferecer certa organização do conhecimento sobre os focos clínicos da enfermagem. O conhecimento mais organizado dos focos clínicos facilita maior conscientização das enfermeiras sobre os mesmos. Além disso, uma classificação de diagnósticos apresenta alto número de alternativas para as conclusões diagnósticas, isto é, oferece referência para a escolha dos melhores diagnósticos em cada situação. O acesso à informação, representada por uma classificação de diagnósticos, pode aumentar o senso de liberdade para agir intencionalmente e maior envolvimento para criar mudanças na saúde dos pacientes(11).

OBJETIVO

O objetivo do estudo foi comparar a percepção de poder das enfermeiras antes e depois da implementação da classificação de diagnósticos da NANDA-I(1), em uma unidade hospitalar. A hipótese testada foi a de que o poder das enfermeiras aumentaria com a implementação da classificação.

MÉTODO

Foi um estudo longitudinal realizado num hospital público e de ensino de São Paulo, Brasil. Esse hospital é uma instituição de médio porte e, na época do estudo, dispunha de 246 leitos (unidades de clínica médica, cirúrgica, pediatria, cuidados intensivos e maternidade), ambulatório e emergência. Desde 1980, quando o hospital foi criado, o processo de enfermagem é aplicado e documentado. O Departamento de Enfermagem iniciou o processo de implementação da classificação da NANDA-I em maio de 2004. Um ano depois, maio de 2005, a documentação dos diagnósticos da NANDA-I passou a ser requerida nos prontuários de todos os pacientes da Instituição. Na época de sua introdução, a edição da classificação da NANDA-I usada foi a de 2003-2004(1).

Os dados foram coletados em maio de 2004 e maio de 2005. Em maio de 2004, todas as enfermeiras já tinham participado de cursos, oficinas e discussões clínicas para discutir o raciocínio diagnóstico, a classificação da NANDA-I e o processo de enfermagem, preparando-se para implementar a inovação. Expressões de resistência, frequentemente manifestas no início, foram lentamente transformadas em posições mais ou menos entusiásticas em relação à classificação na prática clínica. Nesse clima é que ocorreu a primeira coleta dos dados.

De maio de 2004, quando a primeira coleta dos dados ocorreu, até maio de 2005, as enfermeiras planejaram, negociaram e realizaram as mudanças necessárias nos sistemas de documentação (todo manual) para que pudessem ter os diagnósticos de enfermagem da NANDA-I documentados, diariamente, para todos os pacientes. Em maio de 2005 todas as enfermeiras tinham que documentar os diagnósticos de pacientes dos quais cuidavam. A segunda coleta dos dados foi realizada em maio de 2005.

Todas as enfermeiras, trabalhando na Instituição, foram convidadas a participar do estudo. Em maio de 2004, havia 186 enfermeiras e 115 (61,8%) fizeram parte da primeira avaliação. Em maio de 2005, 60 enfermeiras que participaram da primeira avaliação participaram da segunda. Sessenta enfermeiras participaram das duas avaliações o que representou cerca de 33% do total das enfermeiras da Instituição.

Os dados foram coletados por um questionário distribuído a todas as enfermeiras trabalhando na Instituição. Os participantes responderam o questionário individualmente. O questionário era composto de duas partes: a primeira incluía dados sociais e um conjunto de 5 itens sobre o tipo e grau de experiência com os diagnósticos de enfermagem; a segunda parte foi o instrumento Power as Knowing Participation in Change Tool (PKPCT)(6). Esse instrumento foi desenvolvido para avaliar o poder como a capacidade para participar conscientemente na natureza da mudança; usa a técnica do diferencial semântico; tem 4 domínios (Consciência, Escolhas, Liberdade para Agir Intencionalmente e Envolvimento na Criação de Mudanças) e 48 itens. Os escores dos itens podem ser somados para cada domínio (variação possível de 12 a 48 pontos), e para a escala total (variação possível de 48 a 336). A frase "Em relação à minha prática clínica..." foi fornecida como contexto para as respostas aos itens. Neste estudo, as consistências internas da escala, pelo alfa de Cronbach, variaram de 0,88 (primeira aplicação) a 0,98 (segunda aplicação), mostrando boa confiabilidade. O PKPCT(6) foi adaptado para a língua portuguesa, com permissão da autora, em estudo ainda não publicado, realizado com 313 participantes. No estudo de adaptação da escala, a análise de componentes principais, com rotação Varimax, confirmou as 4 dimensões do instrumento original, todas com autovalores maiores que um. Essa solução explicou 53,7% da variância e as consistências internas, pelo alfa de Cronbach, das dimensões variaram de 0,87 a 0,96. As estimativas de confiabilidade do instrumento na língua original variaram de 0,63 a 0,99(6). Para parear as duas avaliações deste estudo os participantes informaram os últimos 3 dígitos do CPF nos instrumentos.

A experiência com diagnósticos de enfermagem foi avaliada por autorrelato. As enfermeiras responderam o quanto haviam: 1) participado em eventos sobre diagnósticos de enfermagem, 2) lido sobre o assunto, 3) participado de cursos sobre diagnósticos, 4) trabalhado com diagnóstico na prática clínica e 5) pesquisado sobre diagnóstico de enfermagem. O grau de experiência foi pontuado de 1 a 4 (1=nada; 2=muito pouco; 3=pouco; 4=muito). Um escore total (variando de 5 a 20) foi obtido pela soma dos itens. A consistência interna dessa medida foi boa nas duas avaliações (alfa de Cronbach = 0,73).

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética da Instituição e todos os participantes assinaram termo de consentimento livre e esclarecido.

As diferenças entre os escores do PKPCT foram analisadas pelo Teste t Pareado, após a confirmação de que os escores tinham distribuição normal. A tendência central foi analisada por média e desvio-padrão. Para verificar se as experiências com os diagnósticos de enfermagem variaram entre as duas coletas de dados, o teste de Wilcoxon foi aplicado aos escores de grau de experiência com diagnósticos de enfermagem. Por se tratar de teste não-paramétrico, foi usada a mediana (P50), segundo (P25) e terceiro (P75) quartis para descrever tendência central, pois, para esses dados, não foi confirmada a distribuição normal, o que impediu o uso de teste paramétrico. Foi aplicado o nível de significância de 5% para todos os testes. Os dados foram analisados com o programa SPSS Version 13.0.

RESULTADOS

A idade dos participantes (N=60) variou de 24 a 58 anos (média=37,2±7 anos) e a média do tempo de experiência após o bacharelado foi 13,1±6,9 anos; 95% eram mulheres.

A Tabela 1 apresenta os resultados sobre os tipos e graus de experiência com diagnósticos de enfermagem nas duas avaliações e os resultados dos testes estatísticos.

Os participantes avaliaram a si mesmos como tendo pouca ou muito pouca experiência com os diagnósticos de enfermagem, tanto antes como depois da implementação da classificação da NANDA-I, e os escores de experiência com a prática clínica foram significativamente mais altos após a implementação (p=0,001) (Tabela 1).

A Tabela 2 apresenta os escores nos domínios do PKPCT e os resultados dos testes estatísticos para comparar as medidas antes e depois da implementação.

DISCUSSÃO

A hipótese deste estudo não foi confirmada, apesar de os escores do domínio de Envolvimento na Criação de Mudanças, após a implementação da classificação da NANDA-I, terem sido estatisticamente maiores que antes da implementação (p=0,04) (Tabela 2). O Envolvimento na Criação de Mudanças refere-se ao senso de compromisso da pessoa com a natureza das mudanças que ocorrem nos ambientes. No processo de implementação da classificação da NANDA-I, a Instituição modificou métodos e instrumentos da prática clínica das enfermeiras, modificando o contexto de trabalho. Essa mudança foi realizada de forma participativa. Quase todas as enfermeiras se envolveram nos programas educativos e oficinas sobre a classificação da NANDA-I e raciocínio diagnóstico e nas definições de estratégias e métodos para implementá-los na prática clínica(12). As pessoas aumentam sua percepção de poder quando se envolvem na implementação de mudanças dentro de seus ambientes(13).

Estudos sobre os efeitos das classificações no empoderamento das enfermeiras são escassos. Em um estudo foi analisado o efeito do uso de classificações de enfermagem, por meio de sistemas computadorizados, na percepção que enfermeiras escolares tinham de seu poder para ajudar as crianças e nos resultados de saúde das próprias crianças(11). Os escores totais no PKPCT das enfermeiras que usaram as classificações (n=6) foram 262±40,6 (antes) e 279±27,6 (após). Não houve diferença estatística no nível de 5% entre os escores antes e após a implementação do sistema; os escores em cada domínio do PKPCT não foram relatados. No presente estudo, os escores totais do PKPCT também não foram diferentes antes e após a implementação da classificação da NANDA-I (269,6±31,7 e 273,6±33,0; p=0,21) (Tabela 2).

Os participantes deste estudo avaliaram-se como tendo muito pouca ou pouca experiência com os diagnósticos de enfermagem, tanto antes como depois da implementação (Tabela 1). Após a implementação houve aumento do escore mediano relativo à prática clínica (p=0,001) e no total (p=0,009). Esses resultados apóiam a interpretação de que a implementação da classificação da NANDA-I aumentou a experiência das enfermeiras com os diagnósticos de enfermagem e que esse ganho de experiência poderia estar relacionado ao aumento da percepção de poder no domínio de Envolvimento na Criação de Mudanças (Tabela 2).

As comparações entre antes e depois da implementação mostraram não ter havido mudanças estatisticamente significantes nos domínios Consciência, Escolhas e Liberdade para Agir Intencionalmente (Tabela 2). Análise cuidadosa dos conceitos envolvidos nesses domínios pode auxiliar na interpretação desses resultados.

O domínio Consciência diz respeito à conscientização da enfermeira quanto ao seu papel clínico. O domínio Escolhas refere-se ao poder para selecionar intervenções de enfermagem para o paciente. O domínio Liberdade para Agir Intencionalmente concerne ao desempenho de ações de cuidado para implementar as intervenções selecionadas. A seleção (domínio Escolhas) e a implementação (domínio Liberdade) de intervenções de enfermagem são diretamente relacionadas ao cuidado do paciente. Considerando que o uso clínico da classificação da NANDA-I estava apenas se iniciando, pois havia um mês que tinha sido requerido o registro dos diagnósticos em todos os prontuários, a experiência dos participantes de cuidar dos pacientes usando a classificação era recente. Esse pequeno tempo em que as enfermeiras estavam usando a NANDA-I no cuidado foi suficiente para aumentar o seu nível de experiência com os diagnósticos na prática clínica (Tabela 1), mas não aumentou significativamente os escores nos domínios de Consciência, Escolhas e Liberdade. Considerando que um efeito é dependente da quantidade de tempo de exposição, provavelmente um tempo maior usando a classificação da NANDA-I poderia produzir diferentes resultados. Medidas repetidas da percepção de poder após longo tempo de exposição ao uso de um sistema de classificação na prática clínica poderiam produzir dados para melhor estudar a influência de sistemas padronizados de linguagem na percepção de poder das enfermeiras.

A ausência de normas para os escores do PKPCT para auxiliar na interpretação de resultados de pesquisa e de outros estudos com o PKPCT, em amostras brasileiras, torna difícil determinar se os escores dos participantes deste estudo foram altos, moderados ou baixos. Apesar disso, os escores observados podem ser considerados moderados desde a primeira avaliação (269,6±31,7) (Tabela 2). Nessa avaliação, o escore total médio do PKPCT correspondeu a 80% do máximo (269/336), e após a implementação correspondeu a 81,3%. O escore médio do PKPCT de enfermeiras executivas norte-americanas correspondeu a 86,3% do máximo (289/336)(14). Os escores médios totais do PKPCT das enfermeiras deste estudo parecem ser mais baixos que aqueles encontrados em outros estudos. Os escores médios observados em amostra de 349 estudantes do bacharelado em enfermagem antes e após um curso clínico foram 274 e 280, respectivamente(15). Em outro estudo, com 88 estudantes de enfermagem, o escore médio total do PKPCT foi 287,6(16). Em amostras de enfermeiras executivas os escores observados foram 290±23,4 (n=182)(14) e 289±25,9 (n=89)(17), e foram os maiores entre os estudos analisados. Considerando que a percepção de poder entre as enfermeiras deste estudo não pode ser generalizado para as enfermeiras brasileiras e que nos Estados Unidos da América há poucos estudos sobre essa variável, além de que a maioria foi realizado com estudantes e com enfermeiras executivas, as comparações devem ser feitas com cautela.

Para a interpretação dos resultados é importante considerar que os escores do PKPCT se inclinam para valores elevados relacionados à "desejabilidade social", que mascara a identificação de amostras com percepção de baixo poder(18). São, portanto, necessários outros estudos sobre as normas para o PKPCT.

CONCLUSÃO

Este estudo não confirmou a hipótese de que a implementação da classificação da NANDA-I influenciaria positivamente a percepção de poder das enfermeiras. Houve aumento na percepção de poder relacionada ao domínio de Envolvimento na Criação de Mudanças, mas não houve diferenças nos escores dos outros domínios e nem no escore total médio. Estratégias para aumentar a capacidade das enfermeiras de participar conscientemente na natureza das mudanças podem contribuir para o seu empoderamento. Na prática clínica, o poder das enfermeiras é relacionado à participação consciente nas mudanças no estado de saúde dos pacientes. As classificações de enfermagem podem ser instrumentos capazes de ajudar as enfermeiras a aumentar a conscientização do seu papel clínico e do poder desse papel.

Outros estudos para aumentar o conhecimento sobre as relações entre a percepção de poder das enfermeiras e modelos, estratégias e instrumentos, aplicados na prática clínica, são necessários.

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    Diná de Almeida Lopes Monteiro da CruzI; Cibele Andrucioli de Mattos PimentaI; Maria Fernanda Vita PedrosaII; Antônio Fernandes da Costa LimaIII; Raquel Rapone GaidzinskiIV
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      15 Jun 2009
    • Data do Fascículo
      Abr 2009

    Histórico

    • Recebido
      09 Fev 2008
    • Aceito
      23 Dez 2008
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