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Infusão venosa aquecida no controle da hipotermia no período intraoperatório1 1 Apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG), processo nº APQ 00384-10.

Resumos

OBJETIVO:

verificar a eficácia da intervenção de infusão venosa aquecida, na prevenção da hipotermia em pacientes no período intraoperatório.

MÉTODO:

estudo experimental, comparativo, de campo, prospectivo e quantitativo, realizado em um hospital público federal. A amostra foi constituída por 60 adultos, que tiveram, como um dos critérios de inclusão, a temperatura axilar entre 36 e 37,1ºC e acesso cirúrgico abdominal, divididos em grupos controle e experimental, compostos utilizando-se a técnica de amostragem probabilística sistemática.

RESULTADOS:

nos 2 grupos, 22 pacientes (73,4%) saíram da sala de operação com hipotermia, ou seja, temperatura inferior a 36ºC (p=1,0000). A temperatura da sala de operação na entrada do paciente e a temperatura do paciente na entrada da sala de operação foram estatisticamente significativas para influenciar a ocorrência de hipotermia.

CONCLUSÃO:

o planejamento e implementação das intervenções de enfermagem, realizadas pelo enfermeiro, são essenciais para prevenção da hipotermia e manutenção da normotermia perioperatória.

Hipotermia; Enfermagem Perioperatória; Salas Cirúrgicas


OBJECTIVE:

to verify the effectiveness of warmed intravenous infusion for hypothermia prevention in patients during the intraoperative period.

METHOD:

experimental, comparative, field, prospective and quantitative study undertaken at a federal public hospital. The sample was composed of 60 adults, included based on the criteria of axillary temperature between 36ºC and 37.1ºC and surgical abdominal access, divided into control and experimental groups, using the systematic probability sampling technique.

RESULTS:

22 patients (73.4%) from both groups left the operating room with hypothermia, that is, with temperatures below 36ºC (p=1.0000). The operating room temperature when patients arrived and patients' temperature when they arrived at the operating room were statistically significant to affect the occurrence of hypothermia.

CONCLUSION:

the planning and implementation of nursing interventions carried out by baccalaureate nurses are essential for preventing hypothermia and maintaining perioperative normothermia.

Hypothermia; Perioperative Nursing; Operating Rooms


OBJETIVO:

verificar la eficacia de la intervención de infusión venosa calentada en la prevención de la hipotermia en pacientes en el período intraoperatorio.

MÉTODO:

estudio experimental, comparativo, de campo, prospectivo y cuantitativo, en un hospital público federal. La muestra abarcó a 60 adultos, que tuvieron como uno de los criterios de inclusión la temperatura axilar entre 36ºC y 37,1ºC y acceso quirúrgico abdominal, divididos en grupos control y experimental, compuestos utilizándose la técnica de muestreo probabilístico sistemático.

RESULTADOS:

en los 2 grupos, 22 pacientes (73,4%) salieron del quirófano con hipotermia, o sea, temperatura inferior a 36ºC (p=1,0000). La temperatura del quirófano cuando de la entrada del paciente y la temperatura del paciente cuando de la entrada en el quirófano fueron estadísticamente significativas para influir en la ocurrencia de hipotermia.

CONCLUSÍON:

la planificación e implementación de las intervenciones de enfermería practicadas por el enfermero son esenciales para prevenir la hipotermia y mantener la normotermia perioperatoria.

Hipotermia; Enfermería Perioperatoria; Quirófanos


Introdução

No período intraoperatório, a hipotermia acomete acima de 70% dos pacientes e pode estar associada a vários fatores, como agentes anestésicos, temperatura ambiental, tempo de exposição a ambiente com baixas temperaturas, administração de infusões venosas frias, distúrbios sistêmicos e a presença de alguns fatores de risco, a exemplo de idades extremas e manifestação de doenças metabólicas ou de distúrbios neurológicos( 11. Poveda VB, Galvão CM, Santos CB. Factors associated to the development of hypothermia in the intraoperative period. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2009;17(2):228-33. - 22. Mattia AL, Barbosa MH, Rocha AM, Farias HL, Santos CA, Santos DM. Hypothermia in patients during the perioperative period. Rev Esc Enferm. USP. 2012; 46(1):60-6. ).

A hipotermia é determinada pela temperatura corporal menor que 36ºC, podendo ser considerada leve, média ou moderada e grave ou severa. Consiste em um estado clínico de temperatura corporal abaixo do normal, no qual o corpo é incapaz de gerar calor suficiente para a realização das funções( 33. Craven RF, Hirlen CJ. Fundamentos de enfermagem: saúde e função humanas. 4th ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2006.

4. Association of periOperative Registered Nurses (AORN). Recommended practices for the prevention of unplanned perioperative hypothermia. AORN J. 2007;85(5):972-88.
- 55. Potter PA, Perry AG. Fundamentos de enfermagem. 6th ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2005. ). Normotermia é a temperatura corpórea entre 36 e 38ºC( 44. Association of periOperative Registered Nurses (AORN). Recommended practices for the prevention of unplanned perioperative hypothermia. AORN J. 2007;85(5):972-88.

5. Potter PA, Perry AG. Fundamentos de enfermagem. 6th ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2005.

6. Hooper VD, Chard R, Clifford T, Fetzer S, Fossum S, Godden B, et al. ASPAN's Evidence-Based Clinical Practice Guideline for the Promotion of Perioperative Normothermia. ASPAN J. 2009;24(5):271-89.
- 77. Costa ALS, Mendoza IYQ, Peniche ACG. Hipotermia no paciente em UTI. In: Padilha KG, Vattino MFF, Silva SC, Kimura M. Enfermagem em UTI: cuidando do paciente crítico. Barueri(SP): Manole; 2010. p. 595-612 ).

Em 2009, a American Society of periAnesthesia Nurses (ASPAN) publicou a segunda edição do guia para promoção da normotermia perioperatória, segundo a prática clínica baseada em evidência. Nas recomendações, refere existir evidências que a alternativa de medidas ativas de aquecimento pode manter a normotermia, quando essas medidas são utilizadas isoladamente ou em combinação com o aquecimento de ar forçado. Essas medidas de aquecimento incluem a infusão venosa aquecida, irrigação de fluidos aquecidos, colchões de água circulante aquecida e calor radiante( 66. Hooper VD, Chard R, Clifford T, Fetzer S, Fossum S, Godden B, et al. ASPAN's Evidence-Based Clinical Practice Guideline for the Promotion of Perioperative Normothermia. ASPAN J. 2009;24(5):271-89. ).

Em sua maioria, o aquecimento ativo tem resultados melhores, principalmente através da manta de ar aquecido, mantendo a temperatura corporal próxima ou igual à normotermia. Em relação ao aquecimento passivo, alguns estudos afirmam que é possível a manutenção da normotermia, pois esse método atua isolando o paciente das baixas temperaturas frequentes em ambiente cirúrgico, mantendo-se a camada de ar disposta junto à pele e reduzindo a perda de calor corporal, através da radiação e convecção( 88. Tramontini CC, Graziano KU. Hypothermia control in elderly surgical patients in the intraoperative period: evaluation of two nursing interventions. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2007;15(4):626-31. ).

Em estudo de revisão sistemática, os autores concluíram que existe evidência moderada para concluir que a utilização de mantas de fibra de carbono são tão eficazes como o sistema de aquecimento de ar forçado, para evitar a hipotermia, e que a utilização de roupas com circulação de água, constituiriam o método mais eficaz para manter a normotermia( 99. Galvão CM, Marck PB, Sawada NO, Clark AM. A systematic review of the effectiveness of cutaneous warming systems to prevent hypothermia. J Clin Nurs. 2009; 18(5):627-36. ).

Embora o aquecimento ativo por ar forçado e o uso de mantas de fibra de carbono tenham apresentado os melhores resultados, esse tipo de prevenção de hipotermia intraoperatória é limitada pelo investimento financeiro necessário.

A ASPAN refere existirem evidências sobre a eficácia da alternativa correspondente ao uso de medidas ativas de aquecimento, como a da administração de infusão venosa aquecida para a manutenção da normotermia intraoperatória, seja isolada ou em combinação com outro método de aquecimento. Diante do exposto, levanta-se a seguinte questão: a infusão venosa aquecida previne a hipotermia intraoperatória?

Portanto, reconhecendo a necessidade de investigação das formas eficientes de prevenção para a hipotermia intraoperatória, esta pesquisa teve como objetivo verificar a eficácia da intervenção de infusão venosa aquecida, na prevenção da hipotermia em pacientes, durante o período intraoperatório.

Metodologia

A abordagem metodológica foi quantitativa, com delineamento experimental, comparativo, de campo e prospectivo.

O local do estudo foi o centro cirúrgico de um hospital público, geral, de grande porte, situado na capital de Minas Gerais. O centro cirúrgico conta com 16 Salas de Operação (SO), destinadas ao atendimento de todas as especialidades. Foram selecionadas duas SOs para o estudo, por apresentarem características semelhantes, no que se refere à bioengenharia e à temperatura ambiental, ou seja, temperaturas entre 19 e 24ºC, e umidade relativa do ar entre 45 e 60%, conforme as recomendações do Ministério da Saúde( 1010. Ministério da Saúde (BR). Portaria n. 1.884 de 11 de novembro de 1994. Normas para Projetos Físicos de Estabelecimentos Assistenciais de Saúde. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 1994. ).

O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais, atendendo a Resolução 196/96, do Conselho Nacional de Saúde, sob Parecer nºETIC 310/09.

O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) foi assinado por todos os participantes após receberem do pesquisador as informações sobre o estudo e seus objetivos. Os esclarecimentos e a assinatura do termo foram realizados no quarto do paciente, no dia da cirurgia, antes da administração da medicação pré-anestésica, quando indicada.

Foram critérios de inclusão na amostra: ter assinado o TCLE, ser adulto com idade superior a 18 anos, procedimento cirúrgico eletivo, com acesso cirúrgico abdominal convencional ou mínimo, anestesia geral, tempo anestésico de, no mínimo, uma hora, classificação física da American Society Anesthesiologists (ASA) de I a III e temperatura corpórea axilar ao entrar na SO entre 36 e 37,1ºC( 33. Craven RF, Hirlen CJ. Fundamentos de enfermagem: saúde e função humanas. 4th ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2006. ).

Excluiram-se pacientes com predisposição às alterações de temperatura como distúrbios da tireoide e neurológicos, extremos de peso, classificação de ASA IV a VI e temperatura corpórea axilar inferior a 36ºC ou superior a 37,1ºC, ao entrar na SO.

A amostra foi constituída por 60 sujeitos, e definida segundo o número de variáveis preditivas inicialmente proposto, utilizando cinco sujeitos em relação a cada uma das variáveis integrantes do modelo de regressão múltipla( 1111. Chattefuee S, Hadi AS. Regression analysis by example. New Jersey: John Wiley & Sons; 2006. ).

Os grupos do estudo foram compostos utilizando-se a técnica de amostragem probabilística sistemática, ou seja, no início da coleta de dados, foi realizado um sorteio para determinar o grupo do primeiro sujeito componente da amostra, se Grupo Experimental (GE) ou Grupo Controle (GC), o qual foi sorteado para o GE, e, a partir desse, o segundo paciente foi para o GC, e, assim, sucessivamente intercalados até completar 30 pacientes em cada grupo.

Os sujeitos do GE receberam infusão venosa aquecida durante todo procedimento anestésico-cirúrgico e os sujeitos do GC não receberam cuidados específicos para prevenção da hipotermia, conforme os procedimentos da instituição. Todos os sujeitos receberam aquecimento passivo de cobertura com lençol.

O aquecimento da infusão venosa foi feito por estufa, da marca Fanem, linha 502, versão A, com termostato eletrônico, e mantido a 40ºC, propiciando, dessa forma, que as infusões se mantivessem em temperaturas entre 37 e 38ºC. Foram feitos testes para a adequação da temperatura da estufa com a temperatura da infusão venosa, com a finalidade de controlar a temperatura de infusão venosa, conforme o limite superior da temperatura corpórea considerada normal.

Para a coleta de dados, foi elaborado um instrumento, submetido à validação de conteúdo por 4 juízes, sendo dois enfermeiros assistenciais de centro cirúrgico e dois professores universitários responsáveis por disciplinas que abordam conteúdos de assistência perioperatória.

Do paciente, foram coletados dados referentes ao grupo a que pertence (GC ou GE), sexo, idade, comorbidades, classificação de ASA, temperatura corpórea no momento de entrada e saída da SO. No que se refere ao procedimento anestésico-cirúrgico, dados referentes ao tipo de cirurgia realizada, potencial de contaminação( 1212. Ministério da Saúde (BR). Portaria 2. 616. Dispõe sobre normas de controle de infecções hospitalares. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 1998. ) e duração da cirurgia e da anestesia. Os dados ambientais foram a temperatura e a umidade relativa do ar na SO, tanto na entrada como na saída do paciente, utilizando-se o termômetro de marca Thermometer, posicionado a um metro da cabeceira da mesa de operação.

A mensuração da temperatura axilar do paciente ocorreu tanto na entrada como na saída da SO, utilizando-se o termômetro clínico digital Pro Check TH186. A coleta de dados ocorreu entre maio de 2011 e abril de 2012 e foi realizada por um dos pesquisadores.

O software utilizado na análise dos dados foi R, na versão 2.13.1. Para verificar a homogeneidade entre o GC e o GE foi utilizado o teste de Mann-Whitney, empregado para a comparação das variáveis quantitativas, e apresentando os resultados em média aritmética, mediana, valores máximo e mínimo, erro-padrão, com nível de significância de 5%.

O teste qui-quadrado foi utilizado para as variáveis qualitativas, e o teste exato de Fisher foi utilizado para as variáveis qualitativas, quando os valores esperados da tabela de contingência foram menores do que cinco.

Para selecionar as variáveis que influenciam, de forma significativa, a ocorrência de hipotermia, foi utilizado o método de seleção stepwise, através de regressões logísticas, Como critério de entrada (forward) na regressão logística multivariada foi utilizado o nível de significância de 20%, e como critério de saída (backward) foi utilizado o nível de 5% de significância.

Quanto às variáveis que influenciam, de forma significativa, a ocorrência de hipotermia, foi verificado, através da regressão logística multivariada, se existiam diferenças significativas entre os grupos controle e experimental, controlando os possíveis fatores de confusão.

Resultados

Os resultados estão apresentados com dados relativos à caracterização do paciente, do procedimento anestésico-cirúrgico, da temperatura corpórea e do ambiente.

Caracterização do paciente

Em relação ao sexo, houve semelhança entre os grupos, com prevalência do sexo feminino, sendo 23 (76,6%) e 22 (73,3%) eram do sexo feminino e 7 (23,4%) e 8 (26,7%) do masculino, no GC e GE, respectivamente (p=0,7660).

A média de idade dos pacientes no GC foi de 45,4 anos, a mediana foi de 45,5 anos, e o erro-padrão foi de 2,48, acusando mínimo de 18 e máximo de 69 anos. No GE, a média foi de 49,6 anos, a mediana de 54,0 anos, o erro-padrão de 2,74, acusando o mínimo de 20 e o máximo de 81 anos (p=0,2608).

As comorbidades assinaladas, como de maior frequência, foram: a hipertensão arterial sistêmica, seguida do diabetes mellitus. No GC, 14 (46,6%) e no GE 9 (30,0%) pacientes apresentaram hipertensão arterial sistêmica (p=0,1840). No que se refere ao diabetes mellitus, os dois grupos apresentaram 4 (13,3%) pacientes (p=1,0000).

A avaliação da condição física de ASA foi semelhante, com prevalência de ASA II em ambos os grupos, sendo 20 (66,6%) no GC e 18 (60,0%) no GE. Apenas um paciente do GE apresentou ASA III (p=0,793).

Caracterização do procedimento anestésico-cirúrgico

Foi critério de inclusão na amostra ter acesso abdominal no procedimento cirúrgico. Os procedimentos realizados apresentaram semelhança entre os grupos, quanto ao tipo e classificação do potencial de contaminação.

O procedimento de maior frequência para os dois grupos foi a colecistectomia laparoscópica, devido à colelitíase, com 8 (26,6%) no GC e 6 (20,0%) no GE, seguido da videolaparoscopia, por distúrbios como endometriose, miomas uterinos, cistos ovarianos, entre outros, com 5 (16,6%) no GC e 8 (26,6%) no GE.

Quanto ao potencial de contaminação, os procedimentos classificados como limpos foram 22 e 21, potencialmente contaminados 4 e 6, contaminados 3 e 3, infectados 1 e zero, no GC e GE, respectivamente, (p=0,911).

Conforme a Tabela 1, a média da duração tanto da anestesia quanto da cirurgia foi semelhante entre os grupos.

Tabela 1
Caracterização da duração da anestesia e da cirurgia. Belo Horizonte, MG, Brasil, 2011

Caracterização da temperatura corpórea

A temperatura mediana dos pacientes na entrada da SO foi de 36,4ºC no GC e de 36,1ºC no GE, sendo essa diferença marginalmente significativa (p=0,0562). Na saída da SO, a temperatura mediana foi de 34,7ºC no GC e de 34,3ºC no GE, com máximo de 35,6ºC para o GC e 36,2ºC para o GE, não apresentando significância estatística (p=0,7113).

Caracterizando a hipotermia como a temperatura do paciente na saída da SO menor que 36ºC, observaram-se 44 casos de hipotermia, considerando os dois grupos, sendo que 50,0% ocorreu no GC e 50,0% no GE.

Tanto no GC quanto no GE, 8 (26,6%) pacientes não apresentaram hipotermia e 22 (73,4%) pacientes saíram da SO com temperatura abaixo de 36ºC (p=1,0000), odds ratio 1,00 e (IC 95%: 0,318 - 3,14).

Caracterização do ambiente

A umidade da SO, tanto na entrada quando na saída do paciente, apresentou mediana superior no GC, quando comparado ao GE, sendo essa diferença significativa, na entrada (p=0,0000) e na saída (p=0,0001).

A Tabela 4 mostra as variáveis analisadas com o objetivo de verificar os fatores que influenciam na hipotermia de uma forma univariada, e selecionar os potenciais preditores para participar do modelo multivariado. O critério de entrada na regressão multivariada foi apresentar um p-valor menor que 0,20.

Tabela 2
Caracterização da temperatura corpórea do paciente na entrada e saída da sala de operação. Belo Horizonte, MG, Brasil, 2011

Tabela 3
Caracterização da sala de operação quanto à temperatura e umidade. Belo Horizonte, MG, Brasil, 2011

Tabela 4
Proporção dos sujeitos do GC e GE, segundo as variáveis influenciáveis para a ocorrência de hipotermia. Belo Horizonte, MG, Brasil, 2011

Pode-se verificar que as variáveis selecionadas para compor o modelo multivariado com p-valor menor que 0,20 foram: idade, sexo, temperatura do paciente na entrada da SO, temperatura da SO na entrada do paciente, temperatura da SO na saída do paciente e umidade relativa do ar na SO, na saída do paciente.

Observa-se que a temperatura do paciente na entrada da SO influencia de forma significativa (p=0,025) a ocorrência de hipotermia, sendo que a cada 1ºC de acréscimo nessa temperatura, a chance de hipotermia diminui em 0,12 vezes. É interessante observar que a amplitude máxima de temperatura do paciente, correspondeu a 1,1ºC.

A temperatura da SO na entrada do paciente influencia de forma significativa (p=0,023) a ocorrência de hipotermia, sendo que a cada 1ºC em que a mesma é acrescida, a chance de hipotermia diminui pela metade.

Tabela 5
Distribuição das variáveis selecionadas para regressões logísticas multivariadas, para a ocorrência de hipotermia. Belo Horizonte, MG, Brasil, 2011

Foi realizada a regressão multivariada, com todos os fatores selecionados. Aplicando-se o procedimento backward, no nível de 5% de significância, obteva-se que tanto a temperatura do paciente na entrada da SO como a temperatura da SO na entrada do paciente são significativas, no que se refere a poder influenciar a ocorrência de hipotermia.

A cada 1ºC que se aumenta a temperatura do paciente na entrada da SO a chance de hipotermia diminui em 0,11 vezes ou, ainda, a cada 1ºC que se aumenta a temperatura do paciente na entrada da SO, a chance de não ocorrer hipotermia aumenta em 8,33 vezes.

A cada 1ºC que se aumenta a temperatura da SO na entrada do paciente a chance de hipotermia diminui em 0,48 ou, ainda, a cada 1ºC que se aumenta a temperatura da SO na entrada do paciente, a chance de não ocorrer hipotermia aumenta em 2,08 vezes.

Discussão

Os resultados evidenciaram que tanto no GC quanto no GE 22 (73,4%) pacientes saíram da SO hipotérmicos, com temperatura corpórea abaixo de 36ºC, e que as variáveis estatisticamente significantes para influenciar a hipotermia foram a temperatura do paciente na entrada da SO e a temperatura da SO na entrada do paciente.

A temperatura do paciente na entrada SO foi uma variável controlada nesta pesquisa, com amplitude entre valores máximo e mínimo de 1,1ºC. Os testes estatísticos demonstraram que a cada 1ºC que se aumenta na temperatura do paciente na entrada da SO, diminui a chance da ocorrência de hipotermia e aumenta a chance de não ocorrência de hipotermia.

Diante do exposto, observa-se a necessidade de intervenções para a prevenção da hipotermia e manutenção da normotermia, tanto no período intraoperatório, quanto no período pré-operatório.

A ASPAN faz recomendações de manutenção da normotermia perioperatória, nos períodos pré e intra e pós-operatório. As recomendações no período pré-operatório de avaliação do paciente incluem avaliar os fatores de risco do paciente para hipotermia perioperatória, medir a temperatura do paciente no momento da admissão, determinar o nível de conforto térmico, avaliar sinais e sintomas de hipotermia como tremores, piloereção e extremidades frias e documentar e comunicar toda avaliação de fatores de risco para todos os membros da anestesia e equipe cirúrgica(6).

As intervenções pré-operatórias incluem implementar medidas passivas de cuidados termais, manter a temperatura ambiente em 24ºC, ou acima, instituir aquecimento ativo para os pacientes hipotérmicos, considerar o aquecimento pré-operatório para reduzir o risco de hipotermia intraoperatória e pós-operatória e, ainda, refere evidências que sugerem que o pré-aquecimento por, no mínimo, 30 minutos pode reduzir o risco subsequente de hipotermia intraoperatória(6).

A implementação de métodos para a manutenção da normotermia do paciente no perioperatório é crucial. Nesse cenário, compete ao enfermeiro a implantação de intervenções eficazes que proporcionem a prevenção ou o tratamento da hipotermia e, consequentemente, a diminuição das complicações associadas a esse evento( 1313. Poveda VB, Galvão CM. Hypothermia in the intraoperative period: can it be avoided? Rev Esc Enferm USP. 2011;45(2):411-17. ).

No aquecimento passivo, uma única camada pode reduzir a perda de calor em até 30%, porém, o uso de um sistema ativo de aquecimento cutâneo é comprovadamente mais eficaz para a manutenção da normotermia do paciente no perioperatório( 1414. Kurz A. Thermal care in the perioperative period. Best Pract Res Clin Anaesthesiol. 2008; 22(1):39-62. - 1515. Biazzotto CB, Brudniewski M, Schimidt AP, Auler-Jr JOC. Hipotermia no período peri-operatório. Rev Bras Anestesiol. 2006; 56(1): 89-106. ).

Estudo realizado em adultos, com cirurgias abdominais eletivas, demonstrou que o aquecimento da superfície da pele por uma hora, no período pré-operatório, combinada com o aquecimento da superfície da pele, durante as duas primeiras horas da cirurgia, impedem a redistribuição da hipotermia( 1616. Vanni SM, Braz JR, Módolo NS, Amorim RB, Rodrigues Jr GR. Preoperative combined with intraoperative skin-surface warming avoids hypothermiacaused by general anesthesia and surgery. J Clin Anesth. 2003; 15(2):119-25. ).

A prevenção da hipotermia melhora os resultados do paciente no período pós-operatório(17-18). Os enfermeiros devem assumir e implementar proativamente intervenções de enfermagem para manter os pacientes aquecidos durante todas as fases do período perioperatório. No pré-operatório, o enfermeiro pode sugerir ao paciente usar um par de meias e uma cobertura na cabeça, orientar os benefícios de se manter aquecido(17).

Nesta pesquisa, as cirurgias foram com acesso abdominal. A hipotermia pode estar também associada a pacientes submetidos às cirurgias da cavidade abdominal por causa da exposição, em geral prolongada, da grande superfície visceral à temperatura ambiente da sala cirúrgica, quando a via convencional é utilizada( 1919. Pagnocca ML, Tai EJ, Dwan JL. Temperature Control in Conventional Abdominal Surgery: Comparison between Conductive and the Association of Conductive and Convective Warming. Rev Bras Anestesiol. 2009; 59(1):56-66. ).

Medidas de prevenção de hipotermia e manutenção da normotermia devem ser preocupação do enfermeiro da unidade de origem do paciente, promovendo intervenções para que o paciente chegue à SO com temperatura corpórea próxima ao limite superior da normotermia.

A temperatura da SO na entrada do paciente foi outra variável significante no desenvolvimento da hipotermia intraoperatória. Essa variável foi controlada, conforme recomendação do Ministério da Saúde, entre 19 e 24ºC( 1010. Ministério da Saúde (BR). Portaria n. 1.884 de 11 de novembro de 1994. Normas para Projetos Físicos de Estabelecimentos Assistenciais de Saúde. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 1994. ). Os testes estatísticos demonstraram, dentro desse intervalo de temperatura da SO, a chance de diminuição da ocorrência de hipotermia e aumento da chance de não ocorrer hipotermia, a cada 1ºC que se aumenta na temperatura da SO na entrada do paciente.

Dentre os resultados demonstrados em um estudo com 70 pacientes com o objetivo de analisar os fatores relacionados às alterações da temperatura corporal do paciente submetido à cirurgia eletiva, no período intraoperatório, a temperatura da SO foi uma das variáveis significantes diretamente relacionada à temperatura corporal média dos sujeitos investigados( 1313. Poveda VB, Galvão CM. Hypothermia in the intraoperative period: can it be avoided? Rev Esc Enferm USP. 2011;45(2):411-17. ).

Um estudo de revisão de literatura indicou que a temperatura da SO é fator que influencia a perda de calor do paciente, pois a diminuição da temperatura ambiental acarreta aumento da perda de calor, por radiação do paciente para o ambiente( 2020. Durel YP, Durel JB. A comprehensive review of thermoregulation and intraoperative hypothermia. Curr Rev PAN. 2000; 22(5):53-64. ).

As intervenções intraoperatórias recomendadas pala ASPAN a todos os pacientes, entre outras, é manter a temperatura ambiente entre 20 e 25ºC, conforme recomendação da Association periOperative Room Nurse (AORN)( 66. Hooper VD, Chard R, Clifford T, Fetzer S, Fossum S, Godden B, et al. ASPAN's Evidence-Based Clinical Practice Guideline for the Promotion of Perioperative Normothermia. ASPAN J. 2009;24(5):271-89. ).

A temperatura ambiente suficientemente elevada, maior que 23ºC, irá manter ou restabelecer a normotermia durante anestesia, porém, gera desconforto térmico para a equipe anestésico-cirúrgica e piora seu desempenho cognitivo. Consequentemente, estratégias de aquecimento ativo ou passivo devem ser empregadas( 1515. Biazzotto CB, Brudniewski M, Schimidt AP, Auler-Jr JOC. Hipotermia no período peri-operatório. Rev Bras Anestesiol. 2006; 56(1): 89-106. ).

As variáveis evidenciadas que influenciam a termorregulação, em estudo realizado, foram o posicionamento do paciente na mesa cirúrgica, o controle da temperatura da sala, o aquecimento dos fluídos e o uso de cobertores. Ressaltou-se, ainda, a necessidade de estudos que explorem variáveis como drogas e anestesia em relação à temperatura corpórea( 2121. Mendoza IYQ, Peniche ACG. Complicações do paciente cirúrgico idoso no período de recuperação anestésica: revisão da literatura. Rev SOBECC. 2008; 13(1):25-31. ).

Conclusão

Os resultados desta pesquisa permitiram concluir que o uso da infusão venosa aquecida, isoladamente, em pacientes no período intraoperatório não previne a hipotermia, demonstrando que o mesmo número de sujeitos, tanto do grupo controle quanto do experimental, saiu da SO com temperatura corpórea inferior a 36ºC.

As variáveis selecionadas para compor o modelo multivariado que tiveram relação com a temperatura corpórea foram sexo, idade, temperatura do paciente na entrada da SO, temperatura da SO na entrada e saída do paciente e umidade da SO na saída do paciente.

As variáveis que demonstraram significância estatística, no desenvolvimento da hipotermia intraoperatória, foram a temperatura do paciente na entrada da SO e a temperatura da SO na entrada do paciente.

Medidas devem ser planejadas e implementadas pelo enfermeiro, iniciando no período pré-operatório, como o aquecimento passivo com lençol e cobertores, e exposição o mínimo possível da superfície corpórea, para que o paciente chegue aquecido na SO.

A temperatura ambiental também deve ser controlada. Os resultados possibilitaram concluir que temperatura da SO, mesmo dentro dos parâmetros de normalidade, a cada 1ºC de aumento na temperatura ambiental menor a chance de o paciente desenvolver hipotermia.

Conclui-se, com esta pesquisa, que a utilização da infusão venosa aquecida isolada não previne a hipotermia perioperatória, essa deve estar associada a medidas de aquecimento do paciente no período pré-operatório e controle da temperatura ambiente na sala de operação.

References

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jun 2013

Histórico

  • Recebido
    27 Set 2012
  • Aceito
    19 Fev 2013
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