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A situação de trabalho da enfermagem e os riscos ocupacionais na perspectiva da ergologia1 1 Artigo extraído da tese de doutorado “Situação de trabalho da enfermagem em uma instituição de atenção básica à saúde: saberes e práticas”, apresentada à Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil.

Resumos

OBJETIVO:

compreender a situação de trabalho, a partir dos conceitos, saberes e valores expressos e praticados por profissionais de enfermagem, para a gestão dos riscos ocupacionais.

MÉTODO:

pesquisa participante, alicerçada na ergologia. A coleta de dados ocorreu mediante entrevistas com informante-chave e 25 trabalhadores, observação e aferição, em uma Unidade Básica de Saúde, localizada no interior do Rio Grande do Sul. A análise dos dados pautou-se no Dispositivo Dinâmico de Três Polos.

RESULTADOS:

as condições de trabalho são precárias, os trabalhadores estão expostos à violência verbal e outros riscos psicossociais, ergonômicos e biológicos, negligenciam os riscos químicos e físicos e renormatizam constantemente a atividade para a eficácia do serviço.

CONCLUSÃO:

os trabalhadores estudados vivenciam o cotidiano de trabalho sob riscos, expressos pelos diálogos sinérgicos e pela observação participante. A partir do protagonismo desses sujeitos é possível fundir conhecimentos advindos das situações de trabalho com a ciência e equacionar esse desafio.

Saúde do Trabalhador; Condições de Trabalho; Riscos Ocupacionais


OBJECTIVE:

to understand the work environment according to the concepts, knowledge and values expressed and practiced by nursing professionals in occupational risk management.

METHODS:

this was an ergology-based participant study. Data collection was performed through interviews with key informants and 25 workers, as well as observations and measurements at a Basic Health Unit located in Rio Grande do Sul. Data analysis was based on the Three-Pole Dynamic Device.

RESULTS:

work conditions were found to be precarious, and workers are exposed to verbal violence and other psychosocial, biological and ergonomic risks. Chemical and physical risks are neglected, and activity is constantly restandardized toward service effectiveness.

CONCLUSION:

the studied subjects worked in risky conditions on a daily basis, and this information was expressed through synergistic dialogues and participant observations. Based on the contributions of these individuals, it is possible to merge knowledge obtained from work environments with science in order to address this issue.

Occupational Health; Working Conditions; Occupational Risks


OBJETIVO:

comprender la situación de trabajo a partir de los conceptos, saberes y valores manifiestos y aplicados por profesionales de enfermería referentes a la gestión del riesgo ocupacional.

MÉTODO:

estudio participativo basado en la ergología. Los datos fueron recolectados mediante entrevistas con informante clave y 25 trabajadores; la observación y medición en una Unidad Básica de Salud localizada en el interior de Rio Grande do Sul. El análisis de datos está pautado en el Dispositivo Dinámico de Tres Polos.

RESULTADOS:

las condiciones de trabajo son precarias; los trabajadores están expuestos a violencia verbal y otros riesgos psicosociales, ergonómicos y biológicos. Descuidan los riesgos químicos y físicos y reajustan las normas de su actividad a favor de la eficacia del servicio.

CONCLUSIÓN:

los trabajadores estudiados efectúan su trabajo cotidiano bajo condiciones de riesgo, tal como se pudo observar mediante el diálogo sinérgico y la observación participante. Con base en el protagonismo de los sujetos es posible fundir los conocimientos derivados de las situaciones de trabajo con la ciencia y así encuadrar este desafío.

Salud Laboral; Condiciones de Trabajo; Riesgos Laborales


Introdução

As mudanças e novas demandas da sociedade alteraram o mundo social do trabalho e da economia, emergindo questionamentos sobre competências, culturas, obsolescência e adoecimento. Nesse sentido, observam-se trabalhadores transformando o trabalho prescrito, aquele que fixa regras e normas, de modo a articular a produtividade e economia corporal.

Adentra, nesse contexto, a ergologia que propõe uma releitura do trabalho e dos conceitos de ação e atividade. Tem como método a abordagem do trabalho, a partir da vivência daquele que trabalha e, entre outras, analisar a relação estabelecida entre a pessoa e o meio( 11. Schwartz Y, Durrive L. Trabalho e Ergologia: conversas sobre a atividade humana. Niterói: Ed UFF; 2007. ). Trabalhar, de acordo com os pressupostos da ergologia, é atividade de seres humanos situados num tempo e num espaço e ocorre no "acontecendo" da vida( 22. Borges MES. Trabalho e gestão de si: para além dos "recursos humanos". Cad Psicol Soc Trab. [Internet]. 2004 [acesso 27 mar 2010]; 7:41-9. Disponível em: http://www.revistasusp.sibi.usp.br/scielo.
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). A ergologia abarca o trabalho, como o uso de si por outros e o uso de si por si mesmo. Logo, atividade é uma dramática do uso de si, pois as situações são variáveis em função das capacidades, dos recursos e das escolhas feitas( 11. Schwartz Y, Durrive L. Trabalho e Ergologia: conversas sobre a atividade humana. Niterói: Ed UFF; 2007. ) e, frente aos vazios/deficiências de normas antecedentes ou prescrições, o sujeito necessita renormalizar/renormatizar, ou seja, debater, adaptar ou mudar a norma.

Observa-se que, empiricamente, os trabalhadores da equipe de enfermagem, em muitos cenários da rede básica de saúde, estão trabalhando sob condições de risco, considerando-se alguns fatores presentes nesse contexto, tais como negligência e impudência dos próprios trabalhadores, ou maus usos de si, aliadas às precariedades para a realização do trabalho, aos vazios de normas e ao descaso dos gestores à atenção à saúde do trabalhador.

Isso posto, uma discussão sobre as condições de trabalho da enfermagem, a partir dos saberes expressos pelos sujeitos que realizam a atividade, com foco na exposição aos riscos ocupacionais, pode ser relevante na medida em que realiza um diagnóstico legítimo do processo saúde/doença/trabalho, pois parte de um diálogo sinérgico com os protagonistas e obtém elementos para intervir, com vistas à melhoria da qualidade de vida dos trabalhadores.

Para a ergologia, não basta a racionalidade técnica, é preciso considerar as racionalidades da atividade real do trabalhador( 11. Schwartz Y, Durrive L. Trabalho e Ergologia: conversas sobre a atividade humana. Niterói: Ed UFF; 2007. ). Acredita-se que restringir a análise técnica dos riscos ocupacionais, desconsiderando outras dimensões envolvidas, não permite a apreensão completa do processo de trabalho, o que justifica o estudo nessa perspectiva.

De acordo com a Organização Pan-Americana de Saúde( 33. Organização Pan-Americana da Saúde no Brasil. Ministério da Saúde do Brasil (BR) . Doenças relacionadas ao trabalho: manual de procedimentos para os serviços de saúde. Brasília (DF): Ministério da Saúde do Brasil; 2001. ), os fatores de riscos à saúde e segurança dos trabalhadores, relacionados ao trabalho, estão agrupados em cinco grandes grupos, assim denominados: físicos, biológicos, químicos, mecânicos e de acidentes, ergonômicos e psicossociais.

O objetivo deste estudo consistiu em compreender a situação de trabalho da enfermagem, a partir dos conceitos, saberes e valores expressos e praticados por profissionais de enfermagem, para a gestão dos riscos ocupacionais sob o enfoque da ergologia.

Método

Trata-se de pesquisa participante, com referencial teórico-metodológico da ergologia. O método da pesquisa participante possibilitou a aplicação do Dispositivo Dinâmico de Três Polos (DDTP), recomendado por Schwartz( 11. Schwartz Y, Durrive L. Trabalho e Ergologia: conversas sobre a atividade humana. Niterói: Ed UFF; 2007. ), para articular os saberes científicos/disciplinares, necessários à produção de saúde e à proteção da saúde do trabalhador e do usuário, com os saberes da experiência, sobrevindos da atividade para, enfim, "fecundá-los'' na concepção de um novo saber.

Participaram do estudo 25 profissionais, sendo 24 técnicos/auxiliares de enfermagem e um enfermeiro que atenderam o critério de ser integrante da equipe de enfermagem e estarem ativos no serviço. Desses, 72% trabalhavam de seis a 10 anos no serviço, 52% possuíam jornada dupla, distribuídas entre duas instituições de saúde e/ou estudo. Os trabalhadores pesquisados desempenhavam atividades no serviço entre 5 e 25 anos.

O campo de estudo foi um serviço de atenção básica em saúde de um município do interior do Estado do Rio Grande do Sul, que representa a maior unidade básica local. Esse serviço pode ser classificado, de acordo com a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) nº50( 44. Ministério da Saúde (BR). Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução RDC n.º 50, de 21 de fevereiro de 2002. Dispõe sobre o regulamento Técnico para planejamento, programação, elaboração e avaliação de projetos físicos de estabelecimento assistenciais de saúde [Internet]. Brasília (DF); 2002 [acesso 23 abr 2011]. Disponível em: http://www.anvisa.gov.br/legis/resol/2002/50_02rdc.pdf.
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), como um serviço de prestação de atendimento eletivo de promoção e assistência à saúde em regime ambulatorial e de hospital-dia e um serviço de prestação de atendimento imediato de assistência à saúde.

Os dados foram coletados de junho a dezembro de 2010, mediante entrevistas com um informante-chave e com os trabalhadores, por meio de observação participante e sistemática e pela aferição da sobrecarga e conforto térmicos, ruído e iluminamento da área física, feita por um engenheiro do trabalho. A observação participante ocorreu durante seis dias, selecionados por sorteio, durante períodos de 1h e 30min, em média, pela manhã e à tarde. Para a observação sistemática, adaptaram-se os critérios da NR nº32( 55. Ministério do Trabalho e Emprego (BR). Normas Regulamentadoras. [Internet] . Brasília (DF): 1978 [acesso 15 ago 2009]. Disponível em: http://portal.mte.gov.br/legislacao/normas-regulamentadoras-1.htm.
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), focando-se nos riscos biológicos, químicos, físicos, ergonômicos, de manipulação de resíduos e de condições sanitárias. Acrescentou-se ao roteiro itens que permitiram observar os riscos psicossociais, de acordo com a classificação proposta pela Organização Pan-Americana de Saúde e Ministério da Saúde. Para o registro das informações, foi utilizado um microgravador e um diário de campo.

As informações coletadas por meio das observações, entrevistas e laudo pericial foram submetidas à Análise de Conteúdo na modalidade temática. A análise alicerçou-se no Dispositivo Dinâmico de Três Polos (DDTP)(1). Esse método de análise do trabalho permite fundir conhecimentos advindos da experiência e da ciência. É válido salientar que os polos não são excludentes entre si, mas complementares, e circulam num movimento de convocações mútuas e de retrabalho eventual na disciplina de origem.

Sendo assim, adaptou-se o modelo proposto por Schwartz( 11. Schwartz Y, Durrive L. Trabalho e Ergologia: conversas sobre a atividade humana. Niterói: Ed UFF; 2007. ), constituindo-se como o Polo I os saberes disciplinares das Ciências da Saúde, Educação, Jurídicas, Sociais, da Comunicação, da Ergonomia e da Ergologia, sendo essa última o fio condutor da pesquisa. O Polo II abrangeu os conhecimentos imbricados na atividade, na experiência, na história e nos valores dos sujeitos que vivenciam o trabalho da equipe de enfermagem. Considera-se que "o saber que se esconde na atividade é um tipo de saber que deve ser elaborado para que se possa avaliar seu grau de generalidade [...]". Sendo assim, esse não deve ser confundido com "subsaberes" e é fundamental que se conheça e reconheça os saberes disciplinares que circulam e podem ser recriados no decorrer da atividade( 11. Schwartz Y, Durrive L. Trabalho e Ergologia: conversas sobre a atividade humana. Niterói: Ed UFF; 2007. ).

No Polo III, fundiram-se os conhecimentos advindos das situações de trabalho com os da ciência para a formação de propostas de ambiência saudável aos trabalhadores, circunscrito por aprendizagens e in-prendizagens - uma forma de humildade diante da atividade de trabalho e que implica o desnude da racionalidade intelectual, o desconforto intelectual, para, a partir do ético e do epistêmico, constituir o polo do mundo comum a construir( 11. Schwartz Y, Durrive L. Trabalho e Ergologia: conversas sobre a atividade humana. Niterói: Ed UFF; 2007. ). O DDTP, portanto, é o lugar do encontro, de rompimento das divisões.

Isso posto, apresentou-se a análise preliminar dos dados (entrevistas, observações e laudo pericial) para discussão e validação. Para tanto, foram convidados todos os participantes do estudo para um encontro em grupo, no qual participaram quinze sujeitos. O intuito do grupo consistiu em validar os dados e construir, por meio da discussão coletiva dos mesmos, um novo saber, representado pelas propostas de adequação da conjuntura/situação de trabalho.

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Regional do Alto Uruguai e das Missões (URI), campus Santo Ângelo, sob Protocolo nº0033-4/PPH/10 e pelo gestor da instituição. Aos que aceitaram participar, foi solicitada a assinatura de um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Resultados

As condições e os riscos ocupacionais da situação de trabalho

O Polo I do DDTP foi representado pelo conhecimento disciplinar obtido por meio da observação sistemática e participante da pesquisadora e aferição de agentes físicos (ruído, umidade e temperatura/conforto térmico) e ergonômicos (iluminação) por um engenheiro do trabalho com acompanhamento da pesquisadora. Nessa etapa, foram necessárias competências disciplinares que abarcassem a complexidade do cenário em estudo.

O Polo II foi representado pelos saberes investidos na experiência dos trabalhadores, sem desconsiderar os disciplinares implicados no contexto histórico/político/social, e o Polo III representou os novos conhecimentos de prevenção de agravos e promoção da saúde do trabalhador, elaborados durante a socialização dos dados e discussão com os participantes envolvidos na pesquisa.

A observação permitiu compreender que, sob vazios ou déficit de normas, os trabalhadores estão, cotidianamente, expondo-se a riscos ocupacionais. Utilizam-se, para isso, de alguns mecanismos para gerir essas lacunas, de modo a obter produtividade e economia corporal, ou seja, renormatizam a atividade. Entre outras observações, a área física, muito aquém do que a legislação preconiza para a segurança do usuário e do trabalhador, é um exemplo disso. A equipe de enfermagem ultrapassa cinco portas para ter acesso à sala de emergência, o quantitativo de pessoal é insuficiente para o trabalho em períodos de demanda maior, e, entre os diferentes riscos, destaca-se a iluminação inadequada, configurando exposição a risco ergonômico.

[...] A equipe é pequena, [...] às vezes a gente fica em menos gente, um está ocupado lá, a gente tem que ajudar um paciente e se expõe, subir na cama, descer da cama, pôr em cadeira de roda. Quando tem que colocar um na maca é um sacrifício, dor na coluna é o que a gente sente mais. Faz uns quatro ou cinco anos que tenho de fazer esforço, virar paciente, erguer paciente (Trabalhador 11).

É rotina, no serviço, os técnicos em enfermagem confeccionarem pacotes de curativos para os usuários de todo município que fazem os curativos no domicilio. Essa atividade é considerada muito cansativa pelos participantes da pesquisa e é causa de dores nos braços e coluna.

Dói a coluna, porque dobrar as gazes, isso aqui [mostra a região cervical] ninguém aguenta. O dia que a gente faz bastante material a gente sai dura, é dor cervical (Trabalhador 6).

A sala de espera para atendimento aos pacientes com diabetes melito e/ou hipertensão arterial sistêmica é a mesma que dá acesso aos usuários com HIV/Aids, o que representa um risco a infecções oportunistas aos, já vulneráveis, pacientes portadores de HIV. O mesmo ocorre no corredor que dá acesso à área para imunizações pediátricas, comum à sala de espera de pacientes das consultas médicas, com sintomatologias diversas, tais como tosse produtiva, expondo crianças sadias ao risco. Assim como expõe os usuários, expõe trabalhadores aos agentes biológicos.

O espaço físico é apertado, não é arejado, tu tem contato direto com o paciente que tem tuberculose; não tem sala de espera específica, tem contato com secreções dos pacientes (Trabalhador 20).

A limpeza, realizada por empresa terceirizada, também é deficiente, facilitando a dispersão de poeiras e microrganismos, e a higienização das mãos é precária, considerando que não há, em todos os ambientes, dispositivos para a técnica apropriada.

É precário, o pessoal é desqualificado, [...] não são pessoas que estão interessadas em trabalhar, elas não se veem como um trabalho importante [...]; a gente depende delas para limpar parede, limpar chão, limpar instrumental/equipamento. É feito o básico, tirar o lixo e passar o pano no meio, e isso é muito estressante, a gente sabe que é um serviço que precisa de limpeza (Trabalhador 2).

A técnica de enfermagem que realiza a coleta de sangue, no setor de tratamento e acolhimento da Aids, também está exposta a riscos, visto que desempenha suas funções em área precária e sem equipamento de segurança adequado para atender pacientes com tuberculose, infecção frequente desses usuários, ratificando a vulnerabilidade ocupacional da enfermagem a essa doença( 66. Souza JN, Bertolozzi MR. The vulnerability of nursing workers to tuberculosis in a teaching hospital. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2007;15(2):259-66. ). Em todos os setores há falta de Equipamento de Proteção Individual (EPI) disponível em quantidade, qualidade e especificidade, expondo o trabalhador aos riscos biológicos, mecânicos e de acidentes.

É por briga, até a gente conseguir convencer para que venha EPI apropriado, tu tem luva à disposição [...]. Agora tem máscara comum. A N95, não tem. Só tem a comum, normal(Trabalhador 2).

No local destinado ao processamento químico de artigos e materiais há, concomitantemente, administração de medicamentos, entre outros procedimentos de enfermagem. O manuseio do produto químico é feito sob condições insalubres, visto que o local não possui ventilação e equipamentos de proteção adequados, expondo o trabalhador ao risco químico, embora muitos o desconsiderem ou não o reconheçam.

Químico, acho que não, só o glutaraldeído, só tem esse aqui e só se usa luva para preparar; não tem máscara. É arrumado ali mesmo [na sala de procedimentos de enfermagem] e é só usado para nebulizador, é pequena a quantidade (Trabalhador 11).

Observou-se presteza da equipe para atendimento das necessidades de saúde dos usuários. Nenhuma situação de negligência ou falta de polidez no trato com usuários, por parte da enfermagem foi notada, porém, em muitos momentos, esses trabalhadores foram alvos de constrangimentos e agressões verbais, configurando violência psicológica. Representam a maior queixa citada pelos sujeitos, configurando risco psicossocial, visto que pode provocar estresse ou outros agravos mentais. Vale ressaltar que a maioria não notificou as agressões.

[...] Violência verbal de pessoas, usuários, por ignorância, tipo de pessoa que, às vezes, já chega estressada [...], chamam a gente de vaca, dizem: "vou chamar fulano para te ensinar". Estou com cansaço mental. Tenho vontade de ficar quieta, sem falar (Trabalhador 1).

Insegurança e medo são sentimentos vivenciados pelos sujeitos, diante das agressões, advindas, em especial, de usuários em sofrimento psíquico e presidiários. A falta de um vigilante no serviço também foi referida como causa de insegurança.

[...] Eles queriam colocar três presidiários para dentro da sala, e eu disse: "não, é um por vez", eles estão algemados, mas eles são muito ágeis e se tu tem uma seringa, tem que cuidar (Trabalhador 4).

O ruído, a umidade e a temperatura do ambiente não foram relatados como risco físico, embora considerados, por muitos, como desconfortáveis. Oportuno é salientar que a área física destinada à alimentação dos trabalhadores também é precária. O ambiente é úmido, com odor característico de mofo e ventilação insuficiente. A umidade, no momento da aferição, foi maior do que 40%, e, em alguns locais, chegou a 72%, configurando ambiente muito úmido. O ruído e a temperatura, em muitas áreas, estavam fora dos padrões preconizados pela legislação, conforme laudo do engenheiro do trabalho (perito). Os ruídos variaram de 56,1 a 75,4 dB(A). Quanto à temperatura, essa variou entre 15 e 17ºC, abaixo dos parâmetros estabelecidos para conforto( 44. Ministério da Saúde (BR). Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução RDC n.º 50, de 21 de fevereiro de 2002. Dispõe sobre o regulamento Técnico para planejamento, programação, elaboração e avaliação de projetos físicos de estabelecimento assistenciais de saúde [Internet]. Brasília (DF); 2002 [acesso 23 abr 2011]. Disponível em: http://www.anvisa.gov.br/legis/resol/2002/50_02rdc.pdf.
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), configurando risco físico.

O serviço em pauta é deficiente em condutas que atentem para a prevenção dos riscos ocupacionais e não dispõe de Programa de Prevenção de Riscos Ocupacionais. Por dificuldades de recursos humanos, não atende a demanda do Programa de Saúde do Trabalhador. Há uma técnica de segurança do trabalho, lotada na secretaria de obras, que pouco intervém na secretaria de saúde; não há reuniões, programas de educação permanente em saúde ou alternativas que tenham como pauta a prevenção e o controle dos riscos ocupacionais, muito menos a cogestão com os trabalhadores.

Existe um serviço de saúde e do trabalhador não sei para quê. A gente não tem nada, não tem palestras, nada. [...] tu fazer ginástica laboral preventiva, massagem preventiva, nada. Ouvir, ver vídeos, nada, nem educação (Trabalhador 2).

Outra dificuldade apontada na organização do trabalho do serviço foi a "falta de um supervisor/coordenador/gestor local", relato recorrente por parte dos trabalhadores que atuam nas imunizações.

[...] Não tem uma chefia que a gente possa esclarecer as dúvidas, a gente fica mal assessorada, tem que resolver tudo, tem que arcar com toda a responsabilidade sozinha (Trabalhador 4).

Diante dos dados, pode-se inferir que, na situação de trabalho do serviço, coexistem bons e maus usos de si, os últimos, em geral, por dificuldades para lidar com as lacunas do sistema de saúde, do vazio/deficiência de normas.

Na reunião para discussão e validação dos dados desta pesquisa, os trabalhadores apontaram algumas alternativas para criação de uma ambiência saudável. Essas são decorrentes da fusão entre os saberes investidos na atividade e os conceitos disciplinares, constituindo as aprendizagens e in-prendizagens ( 11. Schwartz Y, Durrive L. Trabalho e Ergologia: conversas sobre a atividade humana. Niterói: Ed UFF; 2007. ).

Os trabalhadores sugerem programas de ginástica laboral, serviço de psicologia e atividades de educação em saúde, que podem ser otimizados, mediante parcerias com a Universidade Regional, a qual pode auxiliar, também, no desenvolvimento de projetos para melhorias da unidade.

A Educação Permanente em Saúde e as oficinas para atualização técnica foram referidas como uma necessidade dos trabalhadores. A construção de indicadores epidemiológicos e o controle dos acidentes e adoecimentos, mediante a capacitação de um grupo de profissionais de cada setor, podem agregar valor à saúde do servidor público. Também, disponibilizar uniformes, máscaras N95, óculos, entre outros EPIs, e um vestiário protegeria o trabalhador de agravos. Alguns trabalhadores manifestaram preocupação com o não cumprimento da NR 32( 55. Ministério do Trabalho e Emprego (BR). Normas Regulamentadoras. [Internet] . Brasília (DF): 1978 [acesso 15 ago 2009]. Disponível em: http://portal.mte.gov.br/legislacao/normas-regulamentadoras-1.htm.
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).

Recomendações de melhorias de mobiliários, área física e logística foram citadas para o bom desenvolvimento da atividade, bem como mudanças na logística de produção de materiais para a população. Também apontaram a necessidade de telefonista e ramal telefônico em todos os setores da unidade. A conservação, adequação e ampliação da área física transpareceram como necessidades prementes aos trabalhadores. De acordo com os sujeitos, os enfermeiros solicitaram várias vezes conservação e pintura do prédio, central de esterilização para todos os postos e outros, e não obtiveram sucesso. Em virtude da alternância de altas e baixas temperaturas sugeriram a climatização em todos os setores. Também solicitaram capacitação do pessoal do Serviço de Higienização, bem como um serviço de vigilância.

O desenvolvimento de um sistema informatizado para a rede de atenção à saúde do município foi referido como estratégia para melhorar a organização e os fluxos, reduzir o trabalho e o custo e agilizar o processo de atendimento.

Os trabalhadores acreditam que 90% dos colegas são comprometidos, mas necessitam de um gestor/gerente que organize o serviço. Referem que dificuldades de gestão causam problemas de todas as naturezas. Solicitaram uma chefia responsável pelo serviço, um coordenador geral da unidade e a proposição de um Plano de Cargos e Salários, elementos que contribuiriam para a organização e normatização das relações de trabalho.

Discussão

Em toda atividade, há uma dinâmica na qual se apresentam rupturas e descontinuidades, exigindo do trabalhador renormatizações constantes em torno da criação de novas normas para responder por sua tarefa( 77. Silva NM, Muniz HP. Vivências de trabalhadores em contexto de precarização: um estudo de caso em serviço de emergência de hospital universitário. Estud Pesqui Psicol. 2011;11(3):821-40. ). Sendo assim, cotidianamente, o trabalhador tece sua atividade, num cruzamento, entre a "trama", ou, os saberes técnicos, organizacionais, os instrumentos, os usuários e a "urdidura", a própria história dos sujeitos, com seus corpos que aprendem e envelhecem, seus valores, seus saberes, seus desejos( 11. Schwartz Y, Durrive L. Trabalho e Ergologia: conversas sobre a atividade humana. Niterói: Ed UFF; 2007. ). Pode ser complicado instituir competências para o trabalho em saúde, pois o objeto é complexo, as situações de trabalho são difíceis de padronizar e o processo de cuidar envolve um encontro sempre singular entre as pessoas( 88. Scherer MDA, Pires D, Schwartz Y. Trabalho coletivo: um desafio para a gestão em saúde. Rev Saúde Pública. 2009;43(4):721-25. ).

As normas antecedentes, as quais o sujeito pode renormatizar, quase sempre existem antes da atividade e, frequentemente, são elaboradas por técnicos com características diferentes da singularidade das pessoas destinadas a utilizá-las. Sabe-se que, para trabalhar, o sujeito precisa de normas antecedentes que, neste estudo, são caracterizadas pelos manuais, notas técnicas, prescrições e procedimentos padronizados. Por outro lado, é possível recriá-las, reinterpretá-las, desenvolvê-las como uma atividade singular por sucessivas renormatizações, configurando o meio como seu( 99. Schwartz Y, Durrive L. Glossário da ergologia. Laboreal [Internet]. 2008 [acesso 20 jan 2009];4(1):23-8. Disponível em: http://laboreal.up.pt/revista/artigo.php.
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), o que possibilita apropriação da atividade pelo trabalhador e economia corporal.

A escolha pela transgressão à norma, portanto, pode impor responsabilidades aos que trabalham devido aos riscos que as microdecisões possam causar ao processo de trabalho. E o "segredo" dos usos de si pode colocar o trabalhador na solidão. É preciso, então, publicizar o ato técnico do uso de si, pois essa atitude confere reconhecimento da habilidade do sujeito, da sua inventividade( 1010. Fonseca TMG, Barros ME. Entre prescrições e singularizações: o trabalho em vias da criação. Fractal Rev Psicol. 2010; 22(1):101-14. ). Entretanto, é preciso atenção à contravenção de uma norma que implique mau uso de si, porque, quando a mudança individual no modo de trabalhar é significativo para o coletivo, a contravenção pode induzir os colegas e se tornar catastrófica.

O trabalho, nesse contexto, se configura como uma atividade industriosa, no sentido de maestria, de habilidade( 99. Schwartz Y, Durrive L. Glossário da ergologia. Laboreal [Internet]. 2008 [acesso 20 jan 2009];4(1):23-8. Disponível em: http://laboreal.up.pt/revista/artigo.php.
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) na gestão do próprio fazer. Para a ergologia, isso supõe um constante debate entre normas que "ultrapassa o meio de trabalho, mas que se situa dentro do meio de trabalho"( 1111. Schwartz Y. Entrevista com Yves Schwartz. Trab Educ Saúde 2006;4(2):457-66. ).

A norma antecedente, Portaria 500( 1212. Secretaria de Saúde do Estado do Rio Grande do Sul (BR). Portaria 500 de 31 de agosto de 2010. Regulamento técnico para Processamento de artigos por método físico em estabelecimentos sujeitos à Vigilância Sanitária no RS [Internet]. Porto Alegre (RS); 2010 [acesso 16 mai 2011]. Disponível em: http://www.osap.org/resource/resmgr/Docs/PORTARIA_500_31_AGOSTO__2010.pdf
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), do Estado do Rio Grande do Sul, prescreve que o local de processamento de artigos deve dispor de equipamentos para limpeza, desinfecção ou esterilização de materiais. A Resolução nº42( 1313. Ministério da Saúde (BR). Agencia Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução da Diretoria Colegiada n. 42, de 25 de outubro de 2010. Dispõe sobre a obrigatoriedade de disponibilização de preparação alcoólica para fricção antisséptica das mãos, pelos serviços de saúde do País [Internet]. Brasília; 2010 [acesso 24 nov 2010]. Disponível em:ftp://ftp.saude.sp.gov.br/ftpsessp/bibliote/informe_eletronico/2010/iels.out.10/Iels203/URS-MS-ANVISA-RDC-42_251010.pdf
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) dispõe sobre a obrigatoriedade de disponibilização de álcool para antissepsia das mãos pelos serviços de saúde. De acordo com a RDC 50( 55. Ministério do Trabalho e Emprego (BR). Normas Regulamentadoras. [Internet] . Brasília (DF): 1978 [acesso 15 ago 2009]. Disponível em: http://portal.mte.gov.br/legislacao/normas-regulamentadoras-1.htm.
Disponível em: http://portal.mte....
), a área física para atendimento ambulatorial de indivíduos com Aids deve ter sala de inalação individual para tratamento e as normas regulamentadoras( 44. Ministério da Saúde (BR). Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução RDC n.º 50, de 21 de fevereiro de 2002. Dispõe sobre o regulamento Técnico para planejamento, programação, elaboração e avaliação de projetos físicos de estabelecimento assistenciais de saúde [Internet]. Brasília (DF); 2002 [acesso 23 abr 2011]. Disponível em: http://www.anvisa.gov.br/legis/resol/2002/50_02rdc.pdf.
Disponível em: http://www.anvisa....
) legislam sobre a obrigatoriedade do empregador dispor EPIs, elementos inexistentes no campo em estudo.

Descompromisso e desrespeito dos serviços com a proteção do trabalhador no ambiente de trabalho é fator de desmotivação e insegurança, possibilitando, em consequência, maior possibilidade de erros e acidentes, o que se depreende é que as práticas gerenciais e organizacionais exercem significativa contribuição para a salubridade do ambiente de trabalho( 1414. Neves HCC, Souza ACS, Medeiros Marcelo, Munari DB, Ribeiro LCM, Tipple AFV. Safety of Nursing Staff and Determinants of Adherence to Personal Protective Equipment. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2011;19(2):354-61. ).

Frente ao vazio/deficiência de normas é válido ressaltar que, ao mesmo tempo em que se valorizam as normas antecedentes, "peca-se com a falta de outros elementos importantes para a viabilização de um trabalho que permita a conquista de saúde - os modos de fazer e as condições para isso"( 1515. Masson LP, Brito JC, Sousa RNP. O trabalho e a saúde de cuidadores de adolescentes com deficiência: uma aproximação a partir do ponto de vista da atividade. Saúde Soc 2008;17(4):68-80. ). Assim, pode haver uma espécie de fragilização na possibilidade de (re)criar o meio, configurada pela organização do trabalho e condições oferecidas.

Entre outras, essas normas não cumpridas integralmente no lócus pesquisado por dificuldades na microgestão - a gestão de si e do meio feita pelos trabalhadores - ocorrem por dificuldades de aderência da macrogestão. É oportuno salientar que em todo trabalho há a microgestão, pois ali, "no espaço entre o prescrito e o efetivamente realizado, há uma exigência de microgestões da situação e trocas coletivas em constante vaivém"( 77. Silva NM, Muniz HP. Vivências de trabalhadores em contexto de precarização: um estudo de caso em serviço de emergência de hospital universitário. Estud Pesqui Psicol. 2011;11(3):821-40. ).

Sendo assim, o trabalhador é convocado a renormatizar a seu modo, fazendo alguns maus usos de si, para tornar o trabalho possível. "Cada um procura no trabalho o equilíbrio entre o uso de si requisitado e consentido. O fracasso é um sofrimento [...], a dramática pode se tornar trágica, levando a um grande sofrimento [...]"( 11. Schwartz Y, Durrive L. Trabalho e Ergologia: conversas sobre a atividade humana. Niterói: Ed UFF; 2007. ), tais como no fenômeno da violência psicológica. Constantemente o trabalhador é convocado a gerir as situações de agressão psicológica. A pressão vivida pelos trabalhadores e a consequente exposição à violência, advinda dos usuários, também os colocam numa dramática do uso de si, por si mesmos e pelos outros na medida em que exige mobilização do corpo si, para enfrentar situações inusitadas.

O mesmo ocorre pela falta de enfermeiros para supervisionar todas as unidades. Na Resolução nº302, do Conselho Federal de Enfermagem( 1616. Conselho Federal de Enfermagem (BR). Resolução Nº 302 de 16 de março de 2005. Aborda a responsabilidade técnica do enfermeiro. Rio de Janeiro; 2005. ), consta que todo estabelecimento, onde existam atividades de enfermagem, deve apresentar Certidão de Responsabilidade Técnica de Enfermagem, exercida por um enfermeiro. Nesse caso, um vazio de normas difícil de renormatizar. Embora a ergologia defenda a Gestão com Pessoas, plural e coletiva, é requisitada pela equipe a supervisão de modo a compartilhar as responsabilidades e construir um canal de comunicação entre as diferentes esferas do serviço público, bem como auxiliar na requisição de medidas que assegurem a saúde e reduzam os riscos.

Há sempre um engajamento do corpo-si no trabalho, portanto, correr algum risco é inevitável e a responsabilidade disso não é exclusiva dos protagonistas da atividade, considerando que numa situação de trabalho isso não é possível, devido à relação de autonomia e heteronomia e pelas relações de subordinação dos trabalhadores aos empregadores( 1717. Nouroudine A. Risco e atividades humanas acerca da possível positividade aí presente. In: Athayde M, Brito J, Alvarez D, Organizadores. Labirintos do Trabalho: interrogações e olhares sobre o trabalho vivo. Rio de Janeiro: DP&A; 2004. p. 37-62. ).

Citadas pelos trabalhadores, as Lesões por Esforços Repetitivos (LER) e Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (DORT) são multicausais( 1818. Ministério da Saúde (BR). Instrução normativa INSS/DC nº 98, de 05 de dezembro de 2003. Aprova Norma Técnica sobre Lesões por Esforços Repetitivos - LER ou Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho-DORT. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2003. ). Essas transformam o trabalho em sofrimento, que se estende ao período de descanso, visto que o aparecimento dos sintomas ocorre durante os picos de produção e nos finais da jornada de trabalho, exigindo que o trabalhador realize repouso do segmento afetado, no período noturno, em casa.

Um estudo que avaliou a associação da intensidade da dor musculoesquelética com a capacidade para o trabalho em profissionais de enfermagem identificou que as classificações dor forte e dor insuportável associaram-se, positivamente, à reduzida capacidade para o trabalho( 1919. Magnago TSBS, Lima ACS, Prochnow A, Ceron MDS, Tavares JP, Urbanetto JS. Intensity of musculoskeletal pain and (in) ability to work in nursing. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2012;20(6):1125-33. ), o que ratifica a influência desse tipo de agravo não só para o adoecimento do trabalhador, mas, também, para a qualidade do processo de trabalho( 1919. Magnago TSBS, Lima ACS, Prochnow A, Ceron MDS, Tavares JP, Urbanetto JS. Intensity of musculoskeletal pain and (in) ability to work in nursing. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2012;20(6):1125-33. ).

Outro problema discutido pelos trabalhadores foram os riscos físicos. A norma antecedente, ou seja, a NR 17( 44. Ministério da Saúde (BR). Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução RDC n.º 50, de 21 de fevereiro de 2002. Dispõe sobre o regulamento Técnico para planejamento, programação, elaboração e avaliação de projetos físicos de estabelecimento assistenciais de saúde [Internet]. Brasília (DF); 2002 [acesso 23 abr 2011]. Disponível em: http://www.anvisa.gov.br/legis/resol/2002/50_02rdc.pdf.
Disponível em: http://www.anvisa....
), prevê temperaturas de 20 a 23ºC para conforto térmico e ruído entre 30-55 dB(A) para conforto acústico( 2020. Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 10152. Níveis de ruído para conforto acústico. Rio de Janeiro: ABNT; 1987. ), parâmetros não observados nesse serviço.

É possível pensar com o trabalhador, que usa de si, que renormatiza e, mediante microgestões, torna possível sua atividade, sobre a efetiva aderência da "macro e mesogestão" no ambiente de trabalho e a cogestão de todos, contribui para tornar esse lócus saudável.

As estratégias coletivas de prevenção de agravos e "insalubridades" devem direcionar-se à melhoria da organização do trabalho, envolvendo a oferta de ambiente e materiais seguros ao desenvolvimento das atividades, a implantação de programas educativos e a sensibilização para a mudança de comportamento, tanto dos trabalhadores como dos gestores( 2121. Vieira M, Padilha MI, Pinheiro RDC. Analysis of Accidents with Organic Material in Health Workers. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2011;19(2):332-9. ), essa última de essencial importância para que a ambiência se transforme de tal forma que agregue valor e atenção ao cuidador e ao usuário do serviço.

Conclusão

Os trabalhadores da equipe de enfermagem do serviço estudado vivenciam o cotidiano de trabalho sob alguns riscos laborais, expressos pelos diálogos sinérgicos e pela observação participante. Os riscos ocupacionais que mais expõem os sujeitos ao sofrimento e ao adoecimento físico e mental foram os psicossociais, caracterizados pela agressão verbal e falta de segurança. Também expressaram sofrimento relacionado à precaridade do serviço no que tange à falta de materiais e instalações adequadas, contingência que leva ao constrangimento do trabalhador, ao realizar um trabalho de má qualidade.

Reflexões profundas sobre as condições de trabalho e exposição aos riscos, com pesquisas nas unidades básicas de saúde são imperiosas a todos os gestores do sistema, do micro ao macroespaço, a fim de propor alternativas para minimizar o sofrimento no trabalho.

Eficácia e eficiência, associadas ao acesso e resolutividade do sistema da saúde e transaberes, são fundamentais para o equacionamento desse nó crítico na prestação do serviço público de saúde. À população, campanhas educativas acerca do sistema de saúde são imperativas para o conhecimento da dinâmica dessa rede, bem como para valorização do servidor.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Out 2013
  • Data do Fascículo
    Nov-Dec 2013

Histórico

  • Recebido
    18 Jan 2013
  • Aceito
    31 Jul 2013
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