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Preparação de blocos porosos utilizando resíduos de MDF na formulação de massas cerâmicas estruturais

Preparation of porous brick using MDF residues in the formulation of structural ceramic masses

RESUMO

Resíduos de MDF (MediumDensityFiberboard) gerados nas indústrias de móveis de madeiras, geralmente, são depositados em locais inadequados, causando impactos ambientais. Este trabalho teve como objetivo desenvolver materiais porosos com a incorporação de resíduo de MDF (5, 10 e 15% de resíduo) em massas cerâmicas estruturais. As características mineralógicas, químicas e térmicas das massas foram analisadas. Corpos de prova (50mm x15mm x 5mm) foram conformados por prensagem uniaxial (13,3 MPa), os quais foram secos à 110 ºC/24 h e sinterizados à 750, 850 e 950 °C. Posteriormente, estes foram submetidos às seguintes caracterizações: absorção de água, densidade aparente, porosidade aparente e módulo de ruptura à flexão. As características mineralógicas e microestruturais, após queima, também foram analisadas. Os resultados evidenciaram que, até 10% do resíduo de MDF em forma de pó, poderá ser incorporado em massas cerâmicas estruturais para produção de materiais cerâmicos, como blocos porosos isolantes acústicos e térmicos. A porosidade aparente foi de 31,7%, a densidade aparente foi de 1,6 g/cm3 e o módulo de ruptura a flexão foi de 11,5 MPa.

Palavras-chave
resíduos de MDF; materiais porosos; propriedades tecnológicas

ABSTRACT

MDF industrial wastes (Medium Density Fiberboard) generated in the wood furniture industries, have been causing serious environmental impacts, since their improperly disponishment in the nature. In light of this, the purpose of this work is to develop new structural ceramic compositions, containing 5, 10 and 15% by mass of MDF waste. The mineralogical, chemical and thermal characteristics of the masses were analyzed. Test bodies (50mm x15mm x 5mm) were shaped by uniaxial press (13.3 MPa), which were dried at 110º C/24h and sintered at 750, 850 and 950 °C. Subsequently, these were subjected to the following characterizations: Water absorption, apparent density, apparent porosity and flexion rupture module. The mineralogical and microstructural characteristics, after firing, were also analyzed. The results showed that up to 10% of the residue of MDF in the form of powder could be incorporated into structural ceramic masses for the productions of ceramic materials, such as acoustic and thermal insulation porous bricks. The apparent porosity was 31.7 %, bulk density was 1.6 g/cm3, the flexural strength was 11.5 MPa.

Keywords
residues of MDF; porous materials; technological properties

1. INTRODUÇÃO

O desenvolvimento econômico, o crescimento populacional, a urbanização e a revolução tecnológica vêm sendo acompanhados por alterações no estilo de vida e nos modos de produção e consumo da população. Como decorrência direta desses processos, vem ocorrendo um aumento na produção de resíduos sólidos. Além do acréscimo na quantidade, os resíduos produzidos atualmente passaram a abrigar em sua composição, elementos sintéticos e perigosos ao ecossistema e à saúde humana, em virtude das novas tecnologias incorporadas ao cotidiano [11 GOUVEIA, N. “Resíduos sólidos urbanos: impactos socioambientais e perspectiva de manejo sustentável com inclusão social”, Ciência & saúde coletiva, v. 17, pp. 1503-1510, 2012.].

O setor moveleiro sempre esteve presente como um gerador de resíduos sólidos; no entanto, como a madeira é uma matéria-prima de fonte renovável, nunca houve uma maior preocupação com as questões ambientais [22 KOZAK, P. A., CORTEZB, A. M., SCHIRMERC, W. N., et al., “Identificação, quantificação e classificação dos resíduos sólidos de uma fábrica de móveis”, Revista Acadêmica: Ciência Animal, v. 6, pp. 203-212, 2008.]. O MDF, do inglês “Medium density fiberboard”, ou painéis de fibra de madeira, é obtido a partir da aglutinação de fibras de madeira com resinas sintéticas, sob temperatura, pressão e a adição de um adesivo sintético, a fim de formar um painel com consistência e resistência próximo ao da madeira maciça [33 GORINI. A. P. F., “Panorama do setor moveleiro no Brasil, com ênfase na competitividade externa a partir do desenvolvimento da cadeia industrial de produtos sólidos de madeira”, Rio de Janeiro: BNDES, v. 199, 1998.]. O mesmo é conhecido internacionalmente como ecologicamente correto por substituir o uso de árvores nativas. O Brasil é um país que se destaca como um dos maiores produtores de painéis de madeira do mundo, é o sexto maior fabricante mundial (10.371.000 m3/ano) e produz 63% de todos os painéis fabricados na América do Sul [44 PIEKARSKI, C. M., FRANCISCO A. C., LUZ, L. M., et al.,“Life cycle assessment of medium-density fiberboard (MDF) manufacturing process in Brazil”, Science of the Total Environment, v. 575, pp. 103–111, 2017.]. Os resíduos sólidos gerados normalmente na forma de pó pela cadeia produtiva moveleira são provenientes, em sua maioria, das operações de usinagem dos painéis, principalmente corte, furação e lixamento. Dessa forma, em diversas etapas do processamento dos painéis, desde a fabricação até a operação de lixamento de qualquer peça de um móvel, são gerados resíduos em diferentes proporções e com diferentes características [55 TREIN, F. A., SANTOS, A., “Material compósito de resíduos de MDF e MDP estruturados em matriz de PVC para produtos alinhados pelo eco-design”, In: SBDS15. 5° Simpósio de Design Sustentável, 377-388, Rio de Janeiro-RJ, 11-13 Nov. 2015.].

Pesquisadores [66 HAN, T. U., YOUNG-MIN, K., WATANABE, C., et al., “Analytical pyrolysis properties of waste medium-density fiberboard and particle board”, Journal of Industrial and Engineering Chemistry, v. 32, pp. 345–352, 2015.], estudaram as várias propriedades do resíduo de MDF, uma delas foi o poder calorífico (3576.1 kcal/kg), sugerindo ter forte potencial como fonte de combustível. O resíduo de MDF quando queimado em caldeiras ou fornos, seus gases gerados na combustão podem conter compostos orgânicos, incluindo hidrocarbonetos, fenóis e derivados, aldeídos, cetonas, ácidos e derivados ésteres, éteres e outros compostos oxigenados [77 ZENG, Q., LU, Q., ZHOU, Y., et al.,“Circular development of recycled natural fibers from medium density fiberboard Wastes”, Journal of Cleaner Production, v. 202, pp. 456-464, 2018.]; mas por outo lado, estudos [88 COTA, T.G., REIS, E.L., LIMA, R.M.F., et al., “Incorporation of waste from ferromanganese alloy manufacture and soapstone powder in red ceramic production”, Applied Clay Science, v. 161, pp. 274–281, 2018.] relatam que as argilas têm o potencial de isolar contaminantes, reduzindo a toxidade de vários tipos de materiais, e, queimando-se em atmosfera oxidante o teor de gases tóxicos fica abaixo do recomendado. Diante disto, é possível ser incorporado em massas cerâmicas com danos ambientais reduzidos.

Nos últimos anos, o uso de resíduos como substitutos da argila nas massas utilizadas para fabricação de produtos da cerâmica vermelha tem sido extensivamente estudado [88 COTA, T.G., REIS, E.L., LIMA, R.M.F., et al., “Incorporation of waste from ferromanganese alloy manufacture and soapstone powder in red ceramic production”, Applied Clay Science, v. 161, pp. 274–281, 2018.

9 MAN, J., GAO, W., YAN, S., LIU, G. HAO, H,“Preparation of porous brick from diatomite and sugar filter mud at lower temperature”,Constructin and building materials, v. 156, pp. 1035-1042, 2017.

10 COUTINHO, N. C., VIEIRA, E C. M. F., “Caracterização e incorporação de cinza de resíduo sólido urbano em cerâmica vermelha”, Cerâmica, v. 62, pp. 249-255, 2016.

11 MENDES, T. M., MORALES, G., REIS, P. J., “Use ofbasalticwaste as redceramicraw material”,Cerâmica, v. 6, pp. 157-162, 2016.

12 VIEIRA, C. M. F., MORAIS, A. S. C., MONTEIRO, S. N.,et al., “Teste industrial de cerâmica vermelha incorporada com resíduo de vidro de lâmpada fluorescente”,Cerâmica, v. 62, pp. 376-385, 2016.

13 SOUZA, H.N., REIS, E.L., LIMA, R.M.F., et al., “Using soapstone waste with diesel oil adsorbed as raw material for red ceramic products”, Ceram. Int. v. 42, pp. 16205–16211, 2016.

14 AREIAS, I. O. R., VIEIRA, C. M. F., MANHÃES, R. S. T., et al., “Incorporação de lodo da estação de tratamento de esgoto (ETE) em cerâmica vermelha”, Cerâmica, v. 63, pp. 343-349, 2017.
-1515 BOLTAKOVA, N.V., FASEEVA, G.R., KABIROV, R.R., et al., “Utilization of inorganic industrial wastes in producing construction. Ceramics”,Review of Russian experience for the years 2000–2015. Waste Management, v. 60, pp. 230 – 246, 2017.]. Vários pesquisadores [77 ZENG, Q., LU, Q., ZHOU, Y., et al.,“Circular development of recycled natural fibers from medium density fiberboard Wastes”, Journal of Cleaner Production, v. 202, pp. 456-464, 2018., 1616 MYMRIN, V., ALEKSEEV, K., FORTINI, O. M., et al., “Water cleaning sludge as principal component of composites to enhance mechanical properties of ecologically clean red ceramics”,Journal of Cleaner Production, v. 145, pp. 367-373, 2017.

17 KIZINIEVIC, O., KIZINIEVIC, V., MALAIŠKIENE, J., “Analysis of the effect of paper sludge on the properties, microstructure and frost resistance of clay bricks”Construction and Building Materials, v.169, pp. 689–696, 2018.

18 JUNIOR, R. A., SILVA, J. B., CAMPOS, L. F. A., et al., “Desenvolvimento de materiais cerâmicos de dupla camada com adição de diferentes materiais orgânicos”,Revista Eletrônica de Materiais e Processos, v. 9, n. 1, pp. 10-15, 2014.

19 QI, H., COOPER, P.A., WAN, H., “Effect of carbon dioxide injection on production of wood cement composites from waste medium density fiberboard (MDF)”,Waste Management, v. 26,pp. 509–515, 2006.
-2020 JIN, X-J., ZHANG, M-Y., WU, Y., et al.,“Nitrogen-enriched waste medium density fiberboard-based activated carbons as materials for supercapacitors”,Industrial Crops and Products, v. 43, pp. 617– 622, 2013.] têm estudado o resíduo de MDF, tanto para produção de blocos porosos para isolamento acústico e térmico em edificações, como para produção de compósitos de fibrocimento, agente ativante para produção de capacitores eletroquímicos e melhoramento das fibras para produção de novos materiais. A incorporação do pó de MDF em peças cerâmicas, como agente orgânico formador de porosidade, pode ser uma alternativa de baixo custo para a produção de peças porosas, bom como de reaproveitamento de resíduos. É realmente importante transformar resíduos em riqueza e obter uma dupla vitória na economia e no meio ambiente. [99 MAN, J., GAO, W., YAN, S., LIU, G. HAO, H,“Preparation of porous brick from diatomite and sugar filter mud at lower temperature”,Constructin and building materials, v. 156, pp. 1035-1042, 2017.]

A obtenção de cerâmicas porosas segue algumas rotas clássicas, das quais podem ser citadas: queima de partículas orgânicas, réplica, gelcasting de espumas cerâmicas, entre outros. O primeiro método citado consiste na incorporação de produtos orgânicos nos corpos cerâmicos, os quais são removidos durante a queima, deixando poros cujo tamanho está associado com as partículas dos agentes orgânicos [2121 ROMANO, R. C. O., PANDOLFELLI, V. C.,“Obtenção e propriedades de cerâmicas porosas pela técnica de incorporação de espuma”, Cerâmica,v. 52, pp. 213-219, 2006.], rota esta, utilizada em nossa pesquisa.

Diante deste contexto, buscando contribuir para minimizar impactos ambientais provenientes da má disposição de resíduos e desenvolver novos produtos, o objetivo deste trabalho foi investigar a preparação de blocos porosos utilizando resíduos de MDF na formulação de massas cerâmicas estruturais, empregada na produção de blocos acústicos e térmicos, enfatizando as propriedades tecnológicas e microestruturais.

2. MATERIAIS E MÉTODOS

Os materiais utilizados no desenvolvimento deste trabalho foram: massa utilizada na confecção de peças da cerâmica vermelha (MP) e resíduo de MDF (R) em forma de pó, oriundo da indústria moveleira da região de Campina Grande/PB.

A massa padrão e o resíduo em forma de pó de MDF, (peneira ABNT malha 200) foram submetidos às seguintes caracterizações: química, mineralógica, e térmica. As caracterizações foram realizadas por meio das seguintes técnicas: análise química por fluorescência de raios X, usando um espectrômetro por fluorescência de raios X modelo EDX 720 da Shimadzu; difração de raios X (DRX), utilizando equipamento XRD 6000 da Shimadzu, com radiação Kα do Cu (40 kV/30mA); análise termogravimétrica (ATG) e análise térmica diferencial (ATD) utilizando um equipamento Shimadzu TA 60H, com razão de aquecimento 12,5°C/min até 1000°C e atmosfera de ar comprimido.

Após as caracterizações, a massa padrão (MP) e as massas com 5 (5R), 10 (10R) e 15% (15R) do resíduo, com 7% de umidade foram submetidas a etapa de compactação. Corpos de prova retangulares (50 mm x 15mm x 4mm) foram prensados (13,3 MPa) em uma prensa semiautomática, da marca Servitech, modelo CT-335. Após conformação, os corpos de prova foram secos por 24h em estufa à 110ºC, em seguida sinterizados nas temperaturas de 750, 850, e 950 ºC e submetidos aos testes de retração linear de queima (RLq), absorção de água (AA), densidade aparente (DA), porosidade aparente (PA) e resistência à flexão em três pontos (MRF), utilizando uma máquina de ensaios mecânicos da Shimadzu Autograph modelo AG-X, capacidade máxima de 50kN. A microestrutura das peças calcinadas foi analisada por MEV, utilizando um microscópio eletrônico de varredura, marca Shimadzu, modelo SSX 550 SUPER SCAN. Após queima, as fases mineralógicas e a microestrutura das amostras também foram analisadas.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os resultados da análise química da massa padrão (MP), resíduo de MDF(R) e das massas com resíduo (5R, 10R e 15R) estão apresentados na Tabela 1.

Tabela 1
Composição química das matérias-primas (em % de óxidos).

Observa-se na Tabela 1 que o percentual de óxido de silício (SiO2) nas massas variou de 55,5 – 63,3%. A sílica indica provavelmente a presença de argilominerais, como a caulinita, muscovita, bem como o quartzo. O teor de óxido de alumínio (Al2O3) ficou entre 20,5 – 30,5% para as composições analisadas. Observou-se um alto teor de óxido de ferro (Fe2O3), acima de 5%, característico das massas para cerâmica vermelha. Os percentuais de óxidos presentes nas massas são característicos de massas utilizadas na fabricação de produtos cerâmicos, como blocos de vedação e estruturais, blocos de isolamento, dentre outros. [2222 JUNIOR, M.C., MOTTA, J. F. M., ALMEIDA, A. S., et al.,“Argilas para Cerâmica Vermelha”,Rochas e Minerais Industriais – CETEM/2005.]. As massas contendo resíduos apresentaram teores dos principais óxidos bem semelhantes à massa padrão. Pode-se observar elevada quantidade de óxidos fundentes (Fe2O3, MgO, K2O e CaO) nas massas; estes atuam na formação da fase líquida, contribuindo para aumentar a densificação e reduzir a porosidade [2323 BARRETO, I. A. R., COSTA, M. L., “Sintering of red ceramics from yellow Amazonian latosols incorporated with illitic and gibsitic clay”, Applied Clay Science, v.152, pp. 124-130, 2018.].

A Figura 1 ilustra os padrões de DRX do resíduo puro, do resíduo de MDF queimado (cinza) e das massas cerâmicas.

Figura 1
Padrões de DRX do R (a) cinzas de R (b) e composições (c) antes do tratamento térmico.

De acordo com a Figura 1a, nota-se a presença de picos característicos da celulose em 2Ɵ =15° e 22° da hemicelulose/lignina, resultados que estão de acordo com outros pesquisadores [2424 GOMES, J. W., GODOI, G. S., SOUZA, L. G. M., “Absorção de água e propriedades mecânicas de compósitos poliméricos utilizando resíduos de MDF”, Polímeros, v. 27, pp. 48-55, 2017.]. Na Figura 1b, foi observado que a amostra Cinza de R, apresentou picos característicos das fases: óxido de ferro e cálcio (PDF 00-30-0256), silicato de alumínio e bário (PDF 00-28-0125), silicato de cálcio (PDF 00-01-1276) e óxido de ferro e alumínio (PDF 00-30-0024), que corroboram com resultados da análise química na Tabela 1. Na Figura 1c, as massas antes da sinterização, apresentaram as seguintes fases mineralógicas: quartzo (PDF 00-46-1045), caulinita (PDF 01-79-1570) e esmectita (PDF 00-13-0135), fases características das formulações empregadas para produção de produtos de cerâmica estrutural, corroborando com os resultados da análise química (Tabela 1). As composições 5R e 10R de resíduo de MDF apresentaram padrões de DRX muito semelhantes à massa padrão (MP). Já a composição 15R, apresentou menos fase cristalina e mais fase amorfa que as demais composições, devido a maior quantidade de resíduo.

Figura 2 encontram-se as curvas de análise térmica diferencial (DTA) e análise termogravimétrica (TG) das massas cerâmicas e resíduo de MDF (R).

Figura 2
(a) Curvas de TG e DTA de R (b) TG das composições e (c) curvas de DTA das composições.

A Figura 2 (a), apresenta a análise termogravimétrica e análise térmica diferencial do R, onde observa-se que a amostra é degradada rapidamente entre 200-400°C na curva de TG [77 ZENG, Q., LU, Q., ZHOU, Y., et al.,“Circular development of recycled natural fibers from medium density fiberboard Wastes”, Journal of Cleaner Production, v. 202, pp. 456-464, 2018.] e mais lentamente acima de 400°C continuando até 500°C. A curva DTA, apresenta dois picos exotérmicos, em 343°C e 489°C, referentes a decomposição da hemicelulose, celulose e lignina, matéria orgânica proveniente do resíduo. A TG das massas foram de aproximadamente 8, 13, 16 e 22%, para MP, 5R, 10R e 15R respectivamente, as perdas ocorreram de acordo com o percentual de resíduo incorporado na massa. A perda de massa, está relacionada à perda de voláteis, ou seja, queima de material orgânico, que vai se intensificando à medida que aumenta o resíduo na massa, como também a decomposição de carbonatos, perda de água [2525 VIEIRA, C. M. F., PINHEIRO, R. M., “Avaliação de argilas cauliníticas de Campos dos Goytacazes utilizadas para fabricação de cerâmica vermelha”, Cerâmica, v. 57,pp. 319-323, 2011.-2626 SILVA, J. B., HOTZA, D., SEGADÃES, A. M., et al., “Incorporação de lama de mármore e granito em massas argilosas”, Cerâmica,v. 51, pp. 320-325, 2005.]. A perda de massa das composições ocasiona porosidade e retração durante a queima [1010 COUTINHO, N. C., VIEIRA, E C. M. F., “Caracterização e incorporação de cinza de resíduo sólido urbano em cerâmica vermelha”, Cerâmica, v. 62, pp. 249-255, 2016.]. Observa-se na Figura 2 (b), a análise de DTA, entre 90 - 200°C, que apresentaram picos endotérmicos referentes à perda de água livre e adsorvida, a composição 15R apresentou pico endotérmico menos intenso, possivelmente por apresentar menor umidade. Entre 200 – 400°C os picos exotérmicos nas composições 5R, 10R e 15R em torno de 300°C, referentes à presença do resíduo de MDF e consequentemente a combustão da matéria orgânica [2727 XAVIER, G. C., SABOYA, F., MAIA, P. C. A., et al., “Análise de processos de degradação acelerada em laboratório para estudo da durabilidade de peças cerâmicas vermelhas incorporadas com resíduo de granito”, Cerâmica, v. 55, pp. 1-10, 2009.]. Notou-se que, na faixa de temperatura entre 350°C e 450°C, também apresentaram picos exotérmicos nas composições, provavelmente atribuído à decomposição da matéria orgânica, bem como pela queima do carbono e materiais voláteis [1111 MENDES, T. M., MORALES, G., REIS, P. J., “Use ofbasalticwaste as redceramicraw material”,Cerâmica, v. 6, pp. 157-162, 2016.]. À medida que foi aumentando o teor de resíduo, o pico exotérmico foi aumentando. Em 500°C aparece um pico endotérmico nas massas, provavelmente atribuído à presença de hidroxilas da folha octaédrica da esmectita e caulinita. Por fim entre 800 e 900°C as formulações apresentaram picos exotérmicos, característicos da formação de novas fases cristalinas (silicatos) a partir da decomposição da metacaulinita [2727 XAVIER, G. C., SABOYA, F., MAIA, P. C. A., et al., “Análise de processos de degradação acelerada em laboratório para estudo da durabilidade de peças cerâmicas vermelhas incorporadas com resíduo de granito”, Cerâmica, v. 55, pp. 1-10, 2009.].

A Figura 3 apresenta os padrões de DRX das composições dos corpos de provas da amostra padrão e composições, submetidos a 750, 850 e 950°C.

Figura 3
Padrões de DRX dos corpos de provas após queima de 750, 850 e 950°C, da massa padrão e das composições de 5R, 10R e 15R. F - Feldspato, I - Ilita, C - Cristobalita, H - Hematita, Q- Quartzo. T – Tridimita.

Na Figura 3, pode-se observar que as massas apresentaram composições mineralógicas similares, mesmo com a adição do resíduo. A massa padrão MP, trata-se de uma argila plástica de queima vermelha, onde os picos são característicos de esmectita (PDF 00-29-1497), mica (PDF 00-83-1808), quartzo (PDF 00-46-1045), ilita (PDF 00-29-1496), cristobalita (PDF 00-82-0512) e feldspato (PDF 00-89-8574). Em 5R, 10R e 15R à 750°C e 850°C, foram observados picos de difração correspondentes do quartzo, ilita, feldspato, cristobalita, hematita (PDF 00-87-1164) e tridimita (PDF 00-42-1401). A 950°C os minerais se repetiram, e a fase ilita desapareceu, aumentando a formação da fase hematita e cristobalita, devido a presença de mineralizadores (nucleadores), como o CaO, MgO e Fe2O3, presentes na composição química das matérias-primas. A fase cristobalita em temperaturas baixas foi encontrada nesta pesquisa, devido a argila possuir excesso de óxidos fundentes que aceleraram o processo de formação da cristobalita, como também foram identificadas por alguns pesquisadores [99 MAN, J., GAO, W., YAN, S., LIU, G. HAO, H,“Preparation of porous brick from diatomite and sugar filter mud at lower temperature”,Constructin and building materials, v. 156, pp. 1035-1042, 2017.], quando prepararam tijolos porosos de diatomita e lama de filtro de açúcar, em baixas temperaturas.

A Tabela 2 apresenta os resultados das propriedades físicas e mecânicas dos corpos de prova submetidos as temperaturas de queima de 750, 850 e 950°C.

Tabela 2
Propriedades físicas e mecânicas dos corpos de prova sinterizados a diferentes temperaturas, 750, 850 e 950°C.

Observa-se pela Tabela 2 que, com o aumento de teor de resíduo e aumento da temperatura, houve um aumento da retração linear dos corpos de provas nas três temperaturas e composições, o maior valor da retração foi de 8,4% na composição 10R à 950°C, que ainda encontra-se próximo ao limite recomendável para produtos cerâmicos [2020 JIN, X-J., ZHANG, M-Y., WU, Y., et al.,“Nitrogen-enriched waste medium density fiberboard-based activated carbons as materials for supercapacitors”,Industrial Crops and Products, v. 43, pp. 617– 622, 2013.]. Observa-se também que os valores de %AA reduziram com o aumento de temperatura em cada composição. A porosidade aparente cresceu quando se aumentou a quantidade de resíduo, porém à medida que se elevou a temperatura, esta foi diminuindo em pequena proporção devido à coalescência dos poros. Verifica-se nos valores de densidade aparente, que a amostra padrão (MP) apresentou densidade de 2,0g/cm² à 950°C. Com o aumento da quantidade de resíduo, houve redução nas densidades, que foram de 1,6g/cm² para 5R e 10R e 1,5g/cm² para 15RM à 950°C respectivamente, a redução foi de 24,5% para os corpos de prova de 15R. Provavelmente pode ter ocorrido devido ao teor de resíduo ser maior nessa composição, como também apresentar menor percentual de óxidos fundentes que as outras duas composições, como apresentado na Tabela 2. Resultados semelhantes também foram confirmados por outros pesquisadores [1414 AREIAS, I. O. R., VIEIRA, C. M. F., MANHÃES, R. S. T., et al., “Incorporação de lodo da estação de tratamento de esgoto (ETE) em cerâmica vermelha”, Cerâmica, v. 63, pp. 343-349, 2017.], os quais observaram que, com o aumento de biomassa na massa cerâmica, a densidade decresceu em virtude do aumento da porosidade. Dentre os percentuais de resíduos incorporados nas composições, os corpos de provas de 5R e 10R, apresentaram maior densidade (1,6g/cm³) à 950°C, próxima ao limite recomendável para produtos de cerâmica vermelha. Por fim, o módulo de ruptura à flexão, verifica-se redução no comportamento mecânico com o acréscimo do teor de resíduo incorporado a massa cerâmica. Para a temperatura de 850°C, observa-se valores bem próximos para a massa padrão e as massas com 5 e 10% de resíduo; no entanto, para 950°C a massa padrão apresentou maior resistência, o que pode estar relacionado a menor quantidade de poros e as fases cristalinas formadas (Figura 4). Os valores do módulo de ruptura à flexão dos corpos de prova com incorporação até 10% de resíduo de MDF, estão de acordos com a faixa de valores determinadas pela literatura [2828 SANTOS, P. S. “Ciência e Tecnologia das Argilas”, 2ª ed., v. 1 Editora Edgard Blucher Ltda. São Paulo, Brasil, 1989.-2929 MACEDO, R. S., MENEZES, R. R., NEVES, G. A., et al.,“Estudo de argilas usadas em cerâmica vermelha”, Cerâmica, v. 54, pp. 411-417, 2008.] para uso em blocos cerâmicos, como também em materiais cerâmicos acústicos e térmicos, devido sua alta porosidade, que variou de 31,4 – 43,7%.

A Figura 4 apresenta as micrografias da composição 10R, sinterizada nas temperaturas de a 750, 850 e 950°C.

Figura 4
Micrografias obtidas por MEV da composição 10R (750, 850 e 950°C).

Pode-se observar uma distribuição heterogênea e irregular dos agregados. A microestrutura apresenta defeitos atribuídos ao resíduo de MDF, que, durante a sinterização se decompõe e libera gases, resultando em um material poroso. À 950°C, observa-se a formação de um aglomerado esponjoso, provavelmente os cristais de cristobalita, corroborando com os resultados de DRX (Fig. 3) e também a que apresentou maior resistência em comparação com as massas de 5R e 15R.

4. CONCLUSÕES

Após estudos das massas cerâmicas incorporadas com resíduos de MDF, pode-se concluir que, o pó de MDF teve uma interação homogênea em todas as composições, a incorporação de até 10% de resíduo na massa é recomendável. Os valores de absorção de água, porosidade aparente e módulo de ruptura à flexão, ficaram na faixa de valores estabelecida para blocos cerâmicos porosos, como também materiais cerâmicos acústicos e térmicos, devido sua alta porosidade. Pode-se assegurar que, a incorporação do resíduo na massa, propicia a formação de poros após a queima, bem como, o teor do resíduo vai influenciar no desempenho do material. A adição do resíduo em massas cerâmicas, provavelmente poderá contribuir com a redução de custos na indústria cerâmica, pois consequentemente haverá redução do consumo da matéria-prima (argila). O aproveitamento desse resíduo é significativo, quer seja como matéria-prima secundária, quer seja pelo seu potencial energético, produzindo blocos porosos como também contribuindo na redução de impacto ambiental.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Abr 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    07 Maio 2019
  • Aceito
    26 Set 2019
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