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Alimentos modificados e suas implicações no metabolismo energético

Effects of modified foods on energy metabolism

Resumos

OBJETIVO: Comparar o efeito de duas dietas, modificadas no perfil de seus carboidratos, no metabolismo energético de homens com peso normal e com sobrepeso. MÉTODOS: Três formulações convencionais e suas formulações correspondentes diet, compuseram as dietas isoenergéticas padrão e a dieta modificada, respectivamente. Utilizou-se a calorimetria indireta, para obtenção dos dados referentes ao metabolismo energético. A amostra foi de 13 homens em cada grupo. RESULTADOS: O grupo com sobrepeso apresentou um gasto energético superior e uma termogênese inferior (p<0,01) ao grupo com eutróficos, independentemente da dieta. Verificou-se um quociente respiratório de repouso, gasto energético de repouso, termogênese, e oxidação de carboidratos, superior (p<0,05), após o uso de dieta modificada, independentemente do grupo. CONCLUSÃO: Os resultados sugerem que uma dieta isoenergética, com maior quantidade de carboidratos complexos, tende a elevar o quociente respiratório, promovendo, assim, um aumento da termogênese e do gasto energético.

alimentos modificados; carboidratos complexos; metabolismo energético; obesidade


OBJECTIVE: To compare the effects of two diets, which had their carbohydrates profile modified, on the energy metabolism of two groups of subjects: normal lean men and overweight ones. METHODS: Two isoenergetic meal plans were used, to evaluate their effects in the energy expenditure of thirteen lean, and thirteen overweight men. Three regular meal preparations and their diet analogous preparations were used to compound the regular meal and the modified meal, respectively. Indirect calorimetry was used to estimate the energy expenditure. RESULTS: Overweight subjects had a higher energy expenditure (p<0.01) and lower thermogenesis (p<0.01) comparing to lean subjects, independently of the meal tested. Modified meal was higher in complex carbohydrates and, independently of the group, its consumption caused rest respiratory quotient, rest energy expenditure, thremogenesis, and carbohydrate oxidation to be greater (p<0.05) than those observed when regular meal was consumed. CONCLUSION: Our results suggest that an isocaloric meal, higher in complex carbohydrate, can increase the respiratory coefficient, and, consequently, can increase thermogenesis and energy expenditure.

modified food; complex carbohydrates; energy metabolism; obesity


ORIGINAL ORIGINAL

Alimentos modificados e suas implicações no metabolismo energético

Effects of modified foods on energy metabolism

Denise Machado MourãoI, 1 1 Correspondência para / Correspondence to: D.M. Mourão. E-mail: < dmourao@rocketmail.com>, < denisemm@vicosa.ufv.br> ; Josefina Bressan Resende MonteiroII; Helen Hermana Miranda HermsdorffIII; Marta Cristina Leite TeixeiraIV

IDoutoranda, Curso de Ciência e Tecnologia de Alimentos, Universidade Federal de Viçosa. Av. P.H. Rolfs, s/n, Campus da UFV, 36570-000, Viçosa, MG, Brasil

IIDepartamento de Nutrição e Saúde, Universidade Federal de Viçosa. Viçosa, MG, Brasil

IIIMestranda, Curso de Nutrição, Universidade Federal de Viçosa. Viçosa, MG, Brasil

IVMestranda, Curso de Microbiologia de Alimentos, Universidade Federal de Viçosa. Viçosa, MG, Brasil

RESUMO

OBJETIVO: Comparar o efeito de duas dietas, modificadas no perfil de seus carboidratos, no metabolismo energético de homens com peso normal e com sobrepeso.

MÉTODOS: Três formulações convencionais e suas formulações correspondentes diet, compuseram as dietas isoenergéticas padrão e a dieta modificada, respectivamente. Utilizou-se a calorimetria indireta, para obtenção dos dados referentes ao metabolismo energético. A amostra foi de 13 homens em cada grupo.

RESULTADOS: O grupo com sobrepeso apresentou um gasto energético superior e uma termogênese inferior (p<0,01) ao grupo com eutróficos, independentemente da dieta. Verificou-se um quociente respiratório de repouso, gasto energético de repouso, termogênese, e oxidação de carboidratos, superior (p<0,05), após o uso de dieta modificada, independentemente do grupo.

CONCLUSÃO: Os resultados sugerem que uma dieta isoenergética, com maior quantidade de carboidratos complexos, tende a elevar o quociente respiratório, promovendo, assim, um aumento da termogênese e do gasto energético.

Termos de indexação: alimentos modificados, carboidratos complexos, metabolismo energético, obesidade.

ABSTRACT

OBJECTIVE: To compare the effects of two diets, which had their carbohydrates profile modified, on the energy metabolism of two groups of subjects: normal lean men and overweight ones.

METHODS: Two isoenergetic meal plans were used, to evaluate their effects in the energy expenditure of thirteen lean, and thirteen overweight men. Three regular meal preparations and their diet analogous preparations were used to compound the regular meal and the modified meal, respectively. Indirect calorimetry was used to estimate the energy expenditure.

RESULTS: Overweight subjects had a higher energy expenditure (p<0.01) and lower thermogenesis (p<0.01) comparing to lean subjects, independently of the meal tested. Modified meal was higher in complex carbohydrates and, independently of the group, its consumption caused rest respiratory quotient, rest energy expenditure, thremogenesis, and carbohydrate oxidation to be greater (p<0.05) than those observed when regular meal was consumed.

CONCLUSION: Our results suggest that an isocaloric meal, higher in complex carbohydrate, can increase the respiratory coefficient, and, consequently, can increase thermogenesis and energy expenditure.

Indexing terms: modified food, complex carbohydrates, energy metabolism, obesity.

INTRODUÇÃO

A obesidade é uma desordem complexa e multifatorial, caracterizada por ingestão energética acima do gasto, por um período prolongado. Tem sido descrita como desordem fisiológica que pode gerar complicações clínicas, psicológicas e sociais, com características de uma epidemia global1.

A oferta de novos produtos, com finalidades específicas para o combate à obesidade, tem sido cada vez mais comum no mercado; todavia, isso vem ocorrendo sem o conhecimento dos efeitos destes produtos no metabolismo energético. Assim, as mudanças na composição de macronutrientes em alimentos têm ocorrido de forma significativa, podendo afetar o balanço energético e a obesidade2. Em particular, tem-se verificado maior aumento no consumo de alimentos com alto teor de carboidratos refinados3.

Vários estudos têm investigado o efeito e a eficiência do uso de dietas hipocalóricas, alimentos modificados e outros, na obesidade4-6. Contudo, poucos trabalhos foram desenvolvidos para verificar o efeito desses alimentos e a sua eficiência no balanço energético de indivíduos obesos.

Metabolismo basal é a atividade metabólica necessária à manutenção da vida e das funções fisiológicas do indivíduo, ocorrendo, fundamentalmente, nos processos de transporte ativo, funções cardiorespiratórias, excreção, manutenção do tônus muscular, assim como nos processos de biossíntese das biomoléculas. O metabolismo basal é quantificado, medindo-se o consumo de oxigênio, a produção de CO2 e a excreção de nitrogênio da pessoa, tanto estando esta acordada, como quando em completo repouso, em atmosfera e temperatura neutras, após jejum noturno de 8 a 12 horas. A taxa metabólica basal, expressa por kcal/min/kg peso corporal, diferencia-se da taxa metabólica em repouso; enquanto aquela se refere ao metabolismo do organismo em jejum, a taxa metabólica de repouso, refere-se ao período pós-absortivo, incluindo gastos com a digestão, absorção e distribuição corporal do alimento ingerido. Na maioria dos adultos sedentários, o metabolismo basal constitui, aproximadamente, 60% a 70% dos gastos energéticos diários7.

A íntima relação entre o metabolismo basal e tamanho corporal é conhecida há muitos anos. Contudo, estudos recentes7 têm demonstrado que, para qualquer tamanho e composição corporal, o metabolismo basal pode variar consideravelmente entre os indivíduos. A massa livre de gordura, massa de gordura, idade e sexo, são os principais determinantes do metabolismo basal, explicando cerca de 80% de sua variação. Desta forma, a oxidação de substrato ocorre de maneiras diferentes nos vários tecidos corporais7.

Grande tem sido o uso de substitutos do açúcar na prevenção do ganho de peso. Tem-se verificado o aumento da oxidação de carboidratos e do gasto energético total, em resposta a uma sobrecarga de lipídios, ou seja, em resposta a mudanças agudas na composição da dieta8. Assim, verifica-se que alterações dietéticas podem, claramente, influenciar a regulação do peso corporal.

A calorimetria indireta tem sido um dos métodos mais utilizados para este tipo de estimativa, medindo o consumo de O2 e a produção de CO2 É utilizada na avaliação da termogênese e determinação da taxa de utilização de nutrientes9.

O presente trabalho teve o objetivo de investigar o efeito de uma dieta modificada (na constituição dos carboidratos) no metabolismo energético.

CASUÍSTICA E MÉTODOS

A realização deste estudo ocorreu no Laboratório de Composição Corporal e Metabolismo Energético do Departamento de Nutrição e Saúde, na Divisão de Saúde e no Laboratório de Técnica Dietética do Departamento de Nutrição e Saúde, da Universidade Federal de Viçosa.

Vinte e seis homens saudáveis e não fumantes participaram do estudo. Exames laboratoriais de colesterol total e frações, glicose, triglicerídios, creatinina, uréia, ácido úrico e hemograma completo confirmaram o estado hígido dos voluntários. Estes foram divididos em dois grupos, o grupo de indivíduos eutróficos, com índice de massa corporal (IMC) entre 18,5 a 24,9kg/m2 e percentual de gordura corporal até 25% (n=13); e o grupo com sobrepeso, IMC e % de gordura acima de 251 (n=13). Para a avaliação do percentual de gordura, utilizou-se o método de bioimpedância elétrica.

Como o envelhecimento está associado às mudanças na composição corporal10, procurou-se trabalhar com voluntários cujas idades apresentassem uma variação mínima.

Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre Esclarecido para a realização do estudo, previamente aprovado pelo Comitê de Ética na Pesquisa em Seres Humanos, da Universidade Federal de Viçosa.

Foi oferecido, como suprimento energético, um terço do gasto energético basal de cada indivíduo, sendo este também estimado pelo equipamento de bioimpedância elétrica.

Duas dietas isoenergéticas foram usadas, com aproximadamente 60% de carboidratos, 15% de proteína e 25% de lipídios: uma, como dieta padrão, utilizando-se alimentos preparados com sacarose; a outra, como dieta modificada, utilizando-se o adoçante sucralose, em substituição à sacarose. Três preparações constituíram as dietas testadas: broa de milho, brigadeiro e doce de abacaxi.

Os percentuais de macronutrientes foram analisados pelo software DietPro® (versão 3.0), sendo que a dieta com sucralose apresentou maior quantidade de carboidratos complexos.

Para o método da calorimetria indireta utilizou-se o aparelho Deltatrac II®, que oferece medidas do consumo de oxigênio e produção de dióxido de carbono por minuto, através de um espirômetro. Obtivemos, então, os dados necessários para os cálculos posteriores de quociente respiratório (RQ). Este relaciona os moles de CO2 expirados por moles de O2 consumido; gasto energético (GE); termogênese induzida pela dieta (TID) e oxidação de nutrientes, lipídios e carboidratos. O RQ é calculado pela seguinte equação: RQ = VCO2/VO2.

Este foi, então, determinado para os respectivos períodos: jejum (RQJ), pós-prandial (RQPP) e de repouso (RQR). (1).

As medidas de volume de gás carbônico expirado (VCO2) e o volume de oxigênio inspirado (VO2) L/minuto foram tomadas no tempo de 30 minutos, para o período de jejum (leituras de 5 em 5 minutos); 2 horas, para o período pós-prandial (com leituras de 15 em 15 minutos) e 30 minutos para o período de repouso (leituras de 5 em 5 minutos). Esta determinação é convertida em quilocalorias de calor produzido por metro quadrado de superfície corporal por hora, e é extrapolada para o gasto energético. O nitrogênio urinário foi determinado pelo método de Kjeldahl, descrito pela Association of Official Analytical Chemists11, mediante a coleta da urina de cada voluntário, para os três períodos de medição do metabolismo energético: em jejum de 12h, após a refeição - pós prandial e no período de repouso.

O gasto energético (kcal/min) é determinado pela seguinte equação:

(kcal/min) = (16,4 VO2) + (4,5 VCO2) — (3,4 x N) / 4,18 (2).

O efeito das dietas na TID, para os períodos pós-prandial e de repouso, foi obtido por intermédio das seguintes equações:

1) TIDPP (%) = (GEPP — GEJ) x tempo (min) x 100/ kcal ingeridas (3).

2) TIDR (%) = (GER — GEJ) x tempo (min) x 100/ kcal ingeridas (4).

A quantidade de calor liberado no processo oxidativo não é constante, sendo dependente do tipo de nutriente que está sendo oxidado. O VO2 e VCO2 consumido e produzido, respectivamente, permitem determinar com precisão a proporção dos diferentes substratos que estão sendo utilizados, assim como a energia produzida nesses processos. Para não haver variações no metabolismo, devido à dieta, utilizou-se uma mesma distribuição energética, em ambas as dietas testadas para os dois grupos.

Para os cálculos de oxidação de nutrientes, utilizou-se o quociente respiratório, o consumo de oxigênio e o dióxido de carbono, não protéicos, RQNP, NPVO2 e NPVCO2, respectivamente, RQNP = NPVCO2/NPVO2 (5).

em que,

ªPVO2 = N x 6,25 x 0,966

bNPVO2 = VO2c — PVO2

NPVCO2 = VCO2 — PVO2

a = vol. O2 consumido na oxidação protéica

b = vol. O2 não-protéico

c = vol. O2 total determinado por calorimetria indireta

Oxidação de lipídio (g/min) = NPVO2 x (1 — RQNP)/0,293 x 0,746 (6).

Oxidação de carboidrato (g/min) = NPVO2 x (RQNP — 0,707)/0,293 x 0,746 (7).

Todos os cálculos e as equações utilizadas foram baseados no trabalho de Labayen et al.9.

Protocolo do teste

Os indivíduos foram orientados a permanecer em jejum nas 12 horas que antecederam o início do teste, não realizando atividade física extenuante, e com o mínimo de esforço para chegar ao laboratório, sendo transportados de carro até o local. O protocolo utilizado para a avaliação do metabolismo energético está apresentado no Quadro 1.


A temperatura ambiente foi registrada durante todo o teste, e apresentou média e erro-padrão de 21,6 + 0,4ºC.

O experimento foi montado segundo esquema fatorial 2x2, tendo as duas dietas (com sacarose e com sucralose) e os dois grupos (o de indivíduos eutróficos e o dos com sobrepeso) como fatores, no delineamento em blocos casualisados com 13 repetições.

Os dados foram analisados por meio de análise de variância. As médias foram comparadas, utilizando-se o teste de "F", adotando-se o nível de 1% e 5% de probabilidade. Os dados foram analisados, utilizando-se o programa Sistema de Análises Estatística e Genéticas (SAEG).

RESULTADOS

Considerando a recomendação de consumo de um terço do gasto energético basal de cada indivíduo, o grupo de eutróficos consumiu cerca de 582+14,4kcal e o grupo com sobrepeso 673+14,8kcal (média + erro-padrão) para cada dieta. Não houve diferença (p>0,05) entre o peso médio das dietas testadas dentro do mesmo grupo (dados não apresentados).

Na avaliação do efeito das duas dietas na resposta metabólica dos voluntários, verificou-se que a dieta com sucralose teve efeito superior (p<0,05) para as variáveis RQR, GER, TIDPP, TIDR e OXID CHO. Para as variáveis RQPP, GEPP, e OXID LIP não se verificou diferença na resposta metabólica entre as dietas testadas (p>0,05) (Tabela 1).

O perfil dos voluntários que participaram deste estudo constituiu-se da avaliação da idade, peso, altura, IMC, % de gordura, gasto energético basal, com os valores médios e erro-padrão (Tabela 2).

A ANOVA não mostrou interação significativa entre os fatores grupo e dieta. Desta forma, procedeu-se ao estudo desses efeitos principais de forma independente.

Na comparação da resposta metabólica entre grupos, os gastos energéticos, tanto o de jejum e o pós-prandial, como o de repouso, foram superiores, enquanto que a termogênese pós-prandial e a de repouso, foram inferiores para os indivíduos com sobrepeso (p<0,01). Contudo, não foi encontrada diferença significativa entre as médias do quociente respiratório entre os grupos (p>0,01) (Tabela 2).

DISCUSSÃO

Efeito da manipulação dietética

Dietas com diferentes fontes de carboidratos agem de forma diversa na oxidação de macronutrientes e, também, no gasto energético total2. A frutose tem uma velocidade de oxidação maior, dentre os monossacarídeos, por não depender da insulina; e, ainda, promove aumento na oxidação de carboidratos e redução na oxidação de lipídios12.

Estudos demonstraram um decréscimo no RQ de voluntários obesos, após o uso de dieta rica em lipídios e após 28 dias de intervenção13, com dieta hipocalórica, em obesos mórbidos hospitalizados14.

Ademais, tem-se verificado que, para dietas mistas, o valor de RQ está em torno de 0,8. A falta de significância no RQPP (p>0,05) era, de certa forma, esperada (Tabela 1), pois este período pós-prandial, corresponde à digestão e à absorção das dietas, não sendo possível notar, muitas vezes, diferenças no RQ pelo efeito de uma dieta. Em dietas líquidas, alterações no RQ e, conseqüentemente, no gasto energético, são mais facilmente notadas15, pois os alimentos líquidos e com menor teor de lipídios são metabolizados mais rapidamente. Desta forma, decorridas três horas e meia após a ingestão das dietas testadas, com alimentos sólidos, foi possível observar maior RQR nos indivíduos do grupo com a dieta com sucralose, sugerindo que uma dieta isoenergética, com maior quantidade de carboidratos complexos, tende a produzir elevação no RQ e, conseqüentemente, na oxidação de carboidratos.

Embora diferenças no gasto energético tenham sido encontradas em vários estudos com macronutrientes16,17, Westerterp-Plantenga et al.18 consideram que a composição de uma refeição parece não influenciar no gasto energético.

Assim, como não houve diferença significativa entre as dietas testadas no RQPP, possivelmente devido ao pouco tempo de metabolização decorrido, o mesmo parece ter acontecido para o gasto energético pós-prandial. Já o gasto energético de repouso foi superior no grupo submetido à dieta com sucralose, resultado correlacionado a um maior valor da TIDPP e TIDR da mesma, visto que a termogênese é um dos componentes do gasto energético (Tabela 1). Entretanto, Raben et al.19 observaram maior gasto energético na dieta rica em carboidratos.

Não foi verificada nenhuma mudança significativa na oxidação de lipídios, após a ingestão das dietas testadas (Tabela 1), possivelmente porque ajustes, na oxidação de lipídios, relacionados à ingestão de alimentos, geralmente só ocorrem após um período de tempo considerável, acarretando mudanças da gordura corporal e subseqüentes mudanças na concentração de ácidos graxos circulante, uma vez que, para curtos períodos, a oxidação de lipídios depende, em maior escala, de fatores relacionados ao metabolismo de carboidratos, como o depósito de glicogênio12.

Com relação à oxidação de carboidratos, é necessário considerar que existem variações na absorção de diferentes tipos de carboidratos. Também os outros nutrientes presentes no alimento estão relacionados a estas variações, podendo, assim, refletir respostas termogênicas diferentes12.

Vários trabalhos têm relatado a superioridade da frutose para aumentar a TID e o gasto energético, quando comparada à glicose12,20.

No trabalho de Blaak & Saris12, diferentes tipos de carboidratos (frutose, sacarose, glicose e amido de milho) foram testados, em solução aquosa, para investigar possíveis mudanças no balanço de macronutrientes. Constatou-se incremento no gasto energético, sendo este similar entre frutose e sacarose, porém maior para sacarose, quando comparada à glicose. A TID foi similar, após a ingestão de frutose e sacarose, sendo maior com sacarose do que com glicose e amido, e maior para frutose do que para glicose. Aumentos na oxidação total de carboidratos foram significativamente maiores com sacarose do que com glicose e amido, concluindo-se que a termogênese e a utilização de substratos variam consideravelmente após a ingestão de diferentes tipos de carboidratos. Contudo, é importante mencionar que o amido utilizado nesse estudo era pré-gelatinizado, com boa digestibilidade (73% de amilopectina e 27% de amilose), não se podendo assegurar que estes achados são válidos para outros tipos de amido de milho. De qualquer forma, esses resultados indicaram que a termogênese, após a ingestão de carboidratos, não é dependente do aumento da concentração de insulina plasmática, somente, mas resultante do metabolismo celular.

A dieta com sucralose provocou maior elevação (p<0,05) na oxidação de carboidratos (Tabela 1). Outros estudos também mostraram diferenças neste tipo de oxidação, após a ingestão de carboidratos simples e complexos19,21,22. O trabalho de Ritz et al.22 mostrou maior oxidação de carboidratos para a dieta com carboidratos complexos, corroborando os resultados do presente trabalho. Contudo, Raben et al.19 observaram maior oxidação de carboidratos e menor oxidação de lipídios para a dieta com sacarose. Entretanto, esta dieta era superior em peso, implicando em maior ingestão energética. Vasilaras et al.23 não encontraram diferença significativa na oxidação de macronutrientes entre as dietas com carboidratos simples e complexos.

Efeito da composição corporal

Tem sido relatado que o gasto energético total tende a aumentar com o peso corporal24 e que a relação entre o gasto e a massa livre de gordura é linear25. Contudo, sabe-se que a relação de tecido gorduroso/tecido magro está aumentada em obesos e que o tecido adiposo é metabolicamente menos ativo25. Um alto valor de RQ de 24h tem sido considerado um fator de risco para o ganho de peso corporal26. Assim, altos valores de RQ, encontrados em indivíduos obesos, demonstram uma tendência para poupar gordura, favorecendo um aumento da oxidação de carboidratos, possivelmente por um defeito no metabolismo de oxidação de nutrientes, nos obesos25. O VO2 consumido, está diretamente relacionado ao tamanho corporal, enquanto que o VCO2 produzido, relaciona-se ao tipo de nutriente oxidado e à eficiência metabólica27.

Neste experimento não foi encontrada diferença significativa entre as médias de RQ na comparação entre os grupos (Tabela 2), possivelmente porque, neste estudo, comparou-se o metabolismo de indivíduos com peso normal e sobrepeso, e não obesos, não havendo assim uma magnitude significativa na gordura corporal total, a ponto de produzir um RQ diferente entre os grupos.

Já o gasto energético, nos períodos de jejum, pós-prandial e repouso, foi superior para o grupo com sobrepeso, caracterizado por uma maior superfície de área corporal total deste grupo, referente a um maior IMC (Tabela 2). Salienta-se aqui que, em geral, o gasto energético em indivíduos obesos é maior do que em magros25, mas a taxa metabólica, expressa pelo gasto energético por quilograma de peso corporal num determinado tempo, é menor.

Estudos complementares à calorimetria indireta também confirmaram maior gasto energético em obesos, quando comparados a magros do mesmo sexo e idade, utilizando-se o método de água duplamente marcada24.

Os valores inferiores da TIDPP e TIDR, em indivíduos com sobrepeso (Tabela 2), concordam com os resultados de outros trabalhos que também verificaram menor TID em obesos28,29, possivelmente, pela resistência insulínica, presente na grande maioria de obesos, podendo levar a uma menor eficiência metabólica dos mesmos.

Christin et al.30 demonstraram que a insulina, por si só, não estimula um aumento na termogênese, mas que esta estimulação é feita via sistema nervoso simpático, explicando o comportamento facultativo da TID.

Existem hipóteses recentes quanto aos possíveis "defeitos" na utilização de macronutrientes em indivíduos obesos25. Assim, esperava-se que a oxidação de lipídios fosse menor e a de carboidratos maior, no grupo com sobrepeso, denotando menor eficiência metabólica do obeso em oxidar gordura. Entretanto, não se encontrou esta diferença neste estudo (p>0,05), possivelmente, devido ao valor de gordura corporal total do grupo com sobrepeso, cujos depósitos de gordura não teriam sido suficientemente grandes para determinar este efeito, como ocorre com obesos mais pesados.

Entretanto, McDevitt et al.2 não encontraram diferença significativa na oxidação de macronutrientes, mesmo entre mulheres magras e obesas, com diferenças grandes na composição corporal (IMC de 25 e 31kg/m2 e gordura corporal total de 35% e 45%).

Em conclusão, no presente estudo, a dieta isoenergética, com maior quantidade de carboidratos complexos, elevou o quociente respiratório promovendo, assim, um aumento na termogênese e no gasto energético total. São necessários estudos de longo prazo do metabolismo energético, com uso contínuo desses alimentos, para nos esclarecer quanto às suas indicações na prática clínica.

AGRADECIMENTOS

Gostaríamos de agradecer a todos os voluntários, a sua colaboração, bem como à Fundação do Amparo a Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG), e ao Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq), o apoio financeiro concedido a este trabalho.

Recebido para publicação em 29 de agosto de 2003 e aceito em 7 de abril de 2004.

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    Correspondência para / Correspondence to: D.M. Mourão.
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      28 Mar 2005
    • Data do Fascículo
      Fev 2005

    Histórico

    • Aceito
      07 Abr 2004
    • Recebido
      29 Ago 2003
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