Acessibilidade / Reportar erro

Flora das cangas da Serra dos Carajás, Pará, Brasil: Marantaceae

Flora of the cangas of Serra dos Carajás, Pará, Brazil: Marantaceae

Resumo

Este estudo taxonômico envolve as espécies de Marantaceae registradas para as cangas da Serra dos Carajás, Pará, Brasil. Duas espécies ocorrem nas áreas de canga: Maranta ruiziana e Monotagma plurispicatum. Descrições morfológicas dos gêneros e espécies, ilustrações e comentários são apresentados.

Palavras-chave:
FLONA Carajás; cangas; Marantaceae; flora

Abstract

This taxonomic survey comprises the species of Marantaceae registered for the cangas of Serra dos Carajás, Pará, Brazil. Two species inhabit the cangas: Maranta ruiziana and Monotagma plurispicatum. Morphological descriptions of genera and species, illustrations, and additional remarks are also presented.

Key words:
FLONA Carajás; cangas; Marantaceae; flora

Marantaceae

Marantaceae R. Brown é uma família de monocotiledôneas com aproximadamente 550 espécies de distribuição pantropical (Kress 1990Kress J (1990) The phylogeny and classification of the Zingiberales. Annals of the Missouri Botanical Garden 77: 698-721.). Sua maior diversidade está concentrada no neotrópico, estimada em cerca de 450 espécies (Andersson 1998Andersson L (1998) Marantaceae. In: Kubitzki K (ed.) The families and genera of vascular plants. Vol. 4. Springer-Verlag, Berlin. Pp. 278-293.). A família é considerada monofilética dentre as Zingiberales e é caracterizada pelas seguintes sinapomorfias: região de células especializadas entre o pecíolo ou bainha e a lâmina foliar, formando um pulvino; e pelas nervuras transversais paralelas que conectam nervuras secundárias sigmoides na lâmina foliar (Kress 1990Kress J (1990) The phylogeny and classification of the Zingiberales. Annals of the Missouri Botanical Garden 77: 698-721.). Treze espécies de Marantaceae ocorrem na Serra do Carajás, das quais duas em áreas de canga: Maranta ruiziana Körn. e Monotagma plurispicatum (Körn.) K. Schum. As espécies não registradas para as cangas são encontradas em matas de transição fechada: Maranta cyclophylla K.Schum.; Maranta longiscapa S. Moore; matas à margem de rios: Ischnosiphon obliquus (Regel) Körn; Monotagma exile Hagberg & R.Erikss.; capoeira: Goeppertia allouia (Aubl.) Borchs. & S. Suárez; Goeppertia polytricha (Baker) Saka; e em florestas de terra firme e adjacências: Goeppertia sp. 1; Hylaeanthe hexantha (Poepp. & Endl.) Jonker & Jonker; Ischnnosiphon gracilis (Rudge) Körn.; Monotagma densiflorum (Körn.) K. Schum.; Monotagma vaginatum Hagberg.

    Chave de identificação dos gêneros de Marantaceae das cangas da Serra dos Carajás
  • 1. Ervas caulescentes; ausência de anel de tricomas entre o pecíolo ou bainha foliar e pulvino; címulas dolicoblásticas ...................................................................................................................... 1. Maranta

  • 1'. Ervas acaulescentes; presença de anel de tricomas entre o pecíolo ou bainha foliar e pulvino; címulas braquiblásticas ou sub-braquiblásticas ............................................................................. 2. Monotagma

1. Maranta L.

Ervas rizomatosas, caulescentes ou acaulescentes. Folhas alternas dísticas; se caulinares com entrenós distintos; homótropas ou antítropas, uniformemente verdes. Sinflorescências terminais ou laterais, simples ou pouco ramificadas. Brácteas persistentes, normalmente verdes ou marrons. Címulas dolicoblásticas, compostas de 2 flores, com pedúnculo distinto; interfilo ausente, bractéolas ausentes ou rudimentares. Cálice fibroso, tubo da corola 2 vezes mais comprido que largo; 2 estaminódios externos petaloides; estaminódio caloso firme ou distalmente petaloide, com calo; apêndice do estaminódio cuculado curto e basal; estilete com depressão estilar oblíqua, ovário com um lóculo fértil. Fruto cápsula obcônica angulosa, sépalas normalmente persistentes, pericarpo esclerótico quando maduro; sementes ariladas.

Maranta é um gênero exclusivamente neotropical com cerca de 50 espécies, e tem como centro de diversidade o Brasil central (Andersson 1986Andersson L (1986) Revision of Maranta subgen. Maranta (Marantaceae). Nordic Journal of Botany 6: 729-756.).

1.1. Maranta ruiziana Körn., Bull. Soc. Imp. Naturalistes Moscou 35(1): 45. 1862. Fig. 1a-b

Figura 1
a-b. Maranta ruiziana - a. detalhe da címula; b. hábito. c-d. Monotagma plurispicatum - c. hábito; d. detalhe da sinflorescência. Ilustração: Alex Pinheiro Araujo.
Figure 1
a-b. Maranta ruiziana - a. cymule in detail; b. habit. c-d. Monotagma plurispicatum - c. habit; d. synflorescence in detail. Illustration: Alex Pinheiro Araujo.

Ervas caulescentes, 0,5 m alt. Folhas alternas dísticas, antítropas; bainha pubescente a hirsuta, pecíolo ausente; ausência de anel entre a bainha e o pulvino; pulvino 0,5−1 mm compr., hirsuto; lâmina foliar 3−5 × 1−1,4 cm, elíptica a ovada, base truncada, ápice atenuado, face adaxial glabra, nervura principal tomentosa; face abaxial glabra, exceto pela margem ciliada, nervura principal hirsuta na junção com o pulvino. Sinflorescência laxa, 1−2 nodada, componente da florescência 1 címula de 2 flores; brácteas verdes, 2,2−3 cm compr, pubescentes. Sépalas 11−13 × 2−3 mm, tubo da corola 13−15 mm compr., ovário seríceo, com tricomas esbranquiçados recobrindo a superfície, 1 mm compr. Fruto cápsula indeiscente, pericarpo esclerotificado, 5−7 mm compr., sépalas persistentes, semente 1 por cápsula, com arilo.

Material examinado selecionado: Paraupebas, N4 W sul, 6°06'48"S, 50°11'02"W, 26.II.2010, fr., R.D. Ribeiro et al. 1452 (MG); N4, 10.I.2010, fl., L.C.B. Lobato et al. 3781 (MG); 20−25 km NW of Serra Norte mining camp, 5°55'S, 50°26'W, 6.XII.1981, fl., D.C. Daly et al. 1778 (MG).

Maranta ruiziana é caracterizada pelas folhas pequenas e antítropas. Esta última característica é incomum no gênero e compartilhada apenas com M. tuberculata L. Anderss., da qual difere pelos frutos não tuberculados. É morfologicamente similar à M. parvifolia Petersen, pelo hábito caulescente e folhas pequenas. No entanto, difere pelas folhas antítropas (vs. homótropas) e lâmina foliar glabra (vs. pilosa). Apresenta raízes sobolíferas ou tuberosas que armazenam amido, sendo consumidas como alimento por algumas tribos indígenas (Andersson 1986Andersson L (1986) Revision of Maranta subgen. Maranta (Marantaceae). Nordic Journal of Botany 6: 729-756.).

Amplamente distribuída no neotrópico, da Amazônia Central (Andersson 1986Andersson L (1986) Revision of Maranta subgen. Maranta (Marantaceae). Nordic Journal of Botany 6: 729-756.) ao sudeste do Brasil. No Brasil, ocorre nas regiões Centro-Oeste (Distrito Federal, Goiás e Mato Grosso), Nordeste (Maranhão e Piauí), Norte (Amazonas, Pará e Tocantins) e Sudeste (Minas Gerais e São Paulo) (BFG 2015BFG - The Brazil Flora Group (2015) Growing knowledge: an overview of seed plant Diversity in Brazil. Rodriguésia 66: 1-29.). Serra dos Carajás: Serra Norte: N4.

2. Monotagma K. Schum.

Ervas rizomatosas, acaulescentes. Folhas espiraladas, homótropas, normalmente verdes, às vezes com cera. Sinflorescências terminais, densamente ramificadas, laxas ou congestas. Brácteas persistentes, verdes, marrons ou avermelhadas. Címulas braquiblásticas ou sub-braquiblásticas, compostas por 1 flor, interfilo e bractéolas ausentes. 1 estaminódio externo petaloide, estaminódio caloso com calo pequeno ou pouco conspícuo, apêndice do estaminódio cuculado simples e distal, estilete com depressão estilar afunilado, ovário com um lóculo fértil. Fruto cápsula elíptica arredondada, sépalas normalmente decíduas, pericarpo esclerótico quando maduro; sementes ariladas.

Monotagma ocorre exclusivamente na região neotropical, e apresenta 37 espécies (Hagberg & Eriksson 2011Hagberg M & Eriksson R (2011) New names in Monotagma (Marantaceae). Phytotaxa 20: 1-25.).

2.1. Monotagma plurispicatum (Körn.) K.Schum. Pflanzen. IV. Fam. 48: 169. 1902.

Ischnosiphon plurispicatus Körn., Bull. Soc. Imp. Naturalistes Moscou 35(1): 83. 1862. Fig. 1c-d

Ervas, 0,4−1(−1,5) m alt. Bainha hirsuta; pecíolo 5,3−11,9 cm compr., hirsuto, ausente nas folhas caulinares; presença de anel entre o pecíolo e o pulvino; pulvino 1−3,2(−6,1) cm compr., pubescente na face adaxial e glabro na abaxial; lâmina foliar 21,1−32(−49,2) × 5,6−9,3(−12,5) cm, elíptica a ovada, base truncada a cuneada, ápice atenuado, glabra. Sinflorescência subtendida por folha caulinar, laxa, 2−3(−4) nodada, cada nó com um profilo basal; 5−22 florescências, cada uma com 7−15 brácteas dísticas a subdísticas; componente da florescência 1 címula de 1 flor; brácteas verdes ou marrons, 1,5−2,3 cm compr, pubescentes. Sépalas 5−7 × 1−2 mm, tubo da corola 11−13 mm compr., ovário com ápice seríceo, 2−3 mm compr. Fruto cápsula deiscente, pericarpo esclerotificado, 10−14 mm compr., sépalas decíduas, semente 1 por cápsula, com arilo.

Material examinado selecionado: Canaã dos Carajás, Serra Sul, Corpo A, 6°21'19,2"S, 50°26'79,9"W, 600−800 m, 17.II.2010, fl., L.V. Costa et al. 791 (BHCB); 6°24'23"S, 50°18'10"W, 650−50 m, 2.X.2009, fl., P.L. Viana et al. 4364 (BHCB); Corpo B, 6°22'40,38"W, 50°22'55,17"W, 709 m, 16.II.2010, fl., F.D. Gontijo 85 (BHCB); S11-D, 22.VI.2013, fl. e fr., R.S. Santos 107 (MG). Paraupebas, Serra Norte, 6°00'55"S, 50°17'51"W, 750 m, 11.XII.2007, fl., P.L. Viana et al. 3442 (MG); 6°06'85"S, 50°98'19"W, 1.VI.2008, fl., C.V. Vidal 720 (BHCB); N7, 6°09'07"S, 50°10'34"W, 694 m, 24.VI.2012, fl., L.V.C. Silva et al. 1321 (BHCB); N4, 16.IV.2010, fr., L.C.B. Lobato et al. 3906 (MG); N5, limites da Mina de N5, perto da torre, 6°01'62"S, 50°07'49"W, 715 m, 27.IV.2015, fl., N.F.O. Mota et al. 2938 (MG).

Monotagma plurispicatum é morfologicamente similar a M. laxum K.Schum. e M. vaginatum Hagberg, das quais difere pela presença de anel de pelos entre o pecíolo e o pulvino, característica ausente em M. laxum e pecíolo ausente em M. vaginatum, cujo ápice da bainha apresenta um tufo de pelos (Costa et al. 2010Costa FRC, Espinelli FP & Figueiredo FOG (2011) Guia de Zingiberales dos Sítios PPBio na Amazônia Ocidental Brasileira. Áttema Design Editorial, Manaus. 284p.). Além disso, pode ser diferenciada dessas duas espécies pela presença de uma folha caulinar subtendendo a inflorescência (vs. inflorescência subtendida por uma bainha sem lâmina) (Hagberg 2001Hagberg M (2001) Monotagma . In: Steyermark JA, Berry PE, Yatskievych K & Holst BK (eds.) Flora of the Venezuelan Guayana, Vol. 6. Missouri Botanical Garden Press. Pp. 240-244.).

Amplamente distribuída na região neotropical, ocorrendo na Bolívia, Colômbia, Costa Rica, Guiana Francesa, Honduras, Nicarágua, Suriname e Peru (Hagberg 2001Hagberg M (2001) Monotagma . In: Steyermark JA, Berry PE, Yatskievych K & Holst BK (eds.) Flora of the Venezuelan Guayana, Vol. 6. Missouri Botanical Garden Press. Pp. 240-244.). No Brasil, ocorre em toda a região norte (Costa et al. 2010Costa FRC, Espinelli FP & Figueiredo FOG (2011) Guia de Zingiberales dos Sítios PPBio na Amazônia Ocidental Brasileira. Áttema Design Editorial, Manaus. 284p.) e em parte da região nordeste, nos estados de Bahia e Sergipe (Saka 2013Saka MN (2013) Marantaceae. In: Prata APN, Amaral MCE, Farias MCV & Alves MC (orgs.) Flora de Sergipe. Vol. 1. Gráfica e Editora Triunfo, Aracaju. Pp. 338-350.). Serra dos Carajás: Serra Norte: N4, N5, N7; Serra Sul: S11A, S11B, S11D.

  • Lista de exsicatas
    Arruda AJ 1168 (2.1). Costa LV 791 (2.1). Daly DC 1778 (1.1). Gontijo FD 85 (2.1), 171 (2.1). Lobato LCB 3781 (1.1), 3906 (2.1), 4250 (2.1). Mota NFO 2938 (2.1). Nascimento OC 1082 (2.1). Ribeiro RD 1452 (1.1). Rosa NA 5122 (2.1). Santos RS 107 (2.1). Silva AS AS30 (2.1). Silva LVC 1321 (2.1). Viana PL 3442 (2.1), 4364 (2.1). Vidal CV 720 (2.1).
  • Editor de área: Dr. Marcelo Trovó

Agradecimentos

Agradeço aos organizadores do Projeto "Flora das cangas da Serra de Carajás", o convite; aos curadores dos herbários BHCB/MG, o envio do material analisado. Ao projeto objeto do convênio MPEG/ITV/FADESP (01205.000250/2014-10) e ao projeto aprovado pelo CNPq (processo 455505/2014-4). Também ao CNPq, a minha bolsa de Doutorado sob processo 148985/2012−2.

Referências

  • Andersson L (1986) Revision of Maranta subgen. Maranta (Marantaceae). Nordic Journal of Botany 6: 729-756.
  • Andersson L (1998) Marantaceae. In: Kubitzki K (ed.) The families and genera of vascular plants. Vol. 4. Springer-Verlag, Berlin. Pp. 278-293.
  • BFG - The Brazil Flora Group (2015) Growing knowledge: an overview of seed plant Diversity in Brazil. Rodriguésia 66: 1-29.
  • Costa FRC, Espinelli FP & Figueiredo FOG (2011) Guia de Zingiberales dos Sítios PPBio na Amazônia Ocidental Brasileira. Áttema Design Editorial, Manaus. 284p.
  • Hagberg M (2001) Monotagma . In: Steyermark JA, Berry PE, Yatskievych K & Holst BK (eds.) Flora of the Venezuelan Guayana, Vol. 6. Missouri Botanical Garden Press. Pp. 240-244.
  • Hagberg M & Eriksson R (2011) New names in Monotagma (Marantaceae). Phytotaxa 20: 1-25.
  • Kress J (1990) The phylogeny and classification of the Zingiberales. Annals of the Missouri Botanical Garden 77: 698-721.
  • Saka MN (2013) Marantaceae. In: Prata APN, Amaral MCE, Farias MCV & Alves MC (orgs.) Flora de Sergipe. Vol. 1. Gráfica e Editora Triunfo, Aracaju. Pp. 338-350.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2017

Histórico

  • Recebido
    26 Abr 2017
  • Aceito
    03 Jul 2017
Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro Rua Pacheco Leão, 915 - Jardim Botânico, 22460-030 Rio de Janeiro, RJ, Brasil, Tel.: (55 21)3204-2148, Fax: (55 21) 3204-2071 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: rodriguesia@jbrj.gov.br