Acessibilidade / Reportar erro

PEDIATRAS APÓS A RESIDÊNCIA MÉDICA: UM QUESTIONÁRIO SOBRE DADOS E PROBLEMAS PESSOAIS/PROFISSIONAIS

RESUMO

Objetivo:

Avaliar características e problemas pessoais, profissionais, médicos e de educação científica reportados por pediatras.

Métodos:

Estudo transversal com base em uma pesquisa online, incluindo 614 pediatras formados nos últimos 15 anos no Departamento de Pediatria de uma universidade brasileira.

Resultados:

A taxa de resposta foi de 331/614 (54%). A maioria dos participantes era do sexo feminino (82%), a mediana de idade foi de 33 anos (27-40 anos) e a mediana de tempo de prática pediátrica foi de 5 anos (1-13). Jornada de trabalho elevada (>60 horas/semana) foi relatada por 25% dos entrevistados e 47% recebiam ≥15 salários mínimos/mês. Os problemas relacionados ao trabalho mais frequentes foram jornadas longas de trabalho, vida social insatisfatória e sedentarismo (>50%). Os pediatras foram divididos em dois grupos de acordo com os anos de prática clínica pediátrica: grupo 1 (≤5 anos) e grupo 2 (>5 anos). A mediana de satisfação geral com a residência pediátrica [8 (0-10) versus 9 (4-10); p=0,002] foi significativamente menor no grupo 1. As frequências de jornada de trabalho >60 horas, trabalho na enfermaria pediátrica e na terapia intensiva pediátrica foram significativamente maiores no primeiro grupo (p<0,05). Quanto aos principais problemas relacionados à prática clínica no ano anterior, jornadas longas de trabalho (73 versus 53%; p<0,001), vida social insatisfatória (75 versus 62%; p=0,018) e assédio (23 versus 4%; p=0,003) foram significativamente mais elevados no grupo 1.

Conclusões:

Pediatras em início de carreira (≤5 anos) relataram maior jornada de trabalho, menor renda, problemas relacionados ao trabalho e diferentes locais de trabalho em comparação com pediatras mais experientes (>5 anos). A satisfação geral com a residência pediátrica foi boa, porém menor em pediatras do primeiro grupo.

Palavras-chave:
Pediatras; Internato e residência; Comportamento sedentário; Carga de trabalho; Educação médica

ABSTRACT

Objective:

To assess personal, professional, medical, and scientific educational characteristics and issues reported by pediatricians.

Methods:

Cross-sectional study based on an online survey including 614 pediatricians who graduated in the last 15 years at a University Pediatric Department in Brazil.

Results:

The response rate was 331/614(54%). The majority were females (82%), the median age was 33 years (27-40) and median years of pediatric practice was 5 (1-13). High workload (>60 hours/week) occurred in 25% and 47% earned ≥15 minimum wages/month. The most work-related issues reported were long working hours, poor social life and a sedentary lifestyle (>50%). Pediatricians were further divided into two groups, according to years of pediatric clinical practice: group 1 (≤5 years) and group 2 (>5 years). The median of overall satisfaction with pediatric residency [8(0-10) vs. 9 (4-10); p=0.002] was significantly reduced in group 1. The frequencies of workload >60 hours, work on pediatric ward and pediatric intensive care were significantly higher in the first group (p<0.05). Regarding main issues related to clinical practice in the last year, long working hours (73 vs. 53%; p<0.001), poor social life (75 vs. 62%; p=0.018) and harassment (23 vs. 4%; p=0.003) were significantly higher in the first group.

Conclusions:

Very early career pediatricians (≤5 years) reported higher workload, lower income, work-related issues and different location of pediatric practice compared to early career pediatricians (>5 years). The overall satisfaction with pediatric residency was good, however, reduced in very early career pediatricians.

Keywords:
Pediatrician; Internship and residency; Sedentary behavior; Workload; Medical education

INTRODUÇÃO

Os programas de residência geral e pediátrica têm sido modificados em todo o mundo, trazendo novos currículos que incluem uma abordagem moderna de ensino, atendimento ao paciente com atitudes éticas e humanistas e treinamento em pesquisa.11. Udani PM. Special article: history of Indian academy of pediatrics. Indian Pediatr. 1988;25:5-13.,22. Escobar AM, Grisi SJ. 21st century well-child care. Rev Assoc Med Bras. 2016;62:479-81. http://dx.doi.org/10.1590/1806-9282.62.06.479
https://doi.org/http://dx.doi.org/10.159...
,33. Almeida MF, Guinsburg R, Costa JO, Anchieta LM, Freire LM. Teaching neonatal resuscitation at public hospitals in Brazilian state capitals. J Pediatr (Rio J). 2005;81:233-9. http://dx.doi.org/10.1590/S0021-75572005000400010
https://doi.org/http://dx.doi.org/10.159...
,44. Piva JP, Lago PM, Garcia PC. Pediatric emergency in Brazil: the consolidation of an area in the pediatric field. J Pediatr (Rio J). 2017;93 (Supl 1):68-74. http://dx.doi.org/10.1016/j.jped.2017.07.005
https://doi.org/http://dx.doi.org/10.101...
,55. Wuillaume SM, Batista NA. The preceptor in medical residencies in Pediatrics: main attributes. J Pediatr (Rio J). 2000;76:333-8. https://doi.org/10.2223/jped.156
https://doi.org/https://doi.org/10.2223/...
,66. Feigerlova E, Oussalah A, Fournier JP, Antonelli A, Hadjadj S, Marechaud R, et al. Predictors of high motivation score for performing Research Initiation Fellowship, Master 1, Research Master 2, and PhD Curricula during medical studies: a Strobe-compliant Article. Medicine (Baltimore). 2016;95:e2633. https://doi.org/10.1097/MD.0000000000002633
https://doi.org/https://doi.org/10.1097/...
O avanço das inovações tecnológicas envolvendo novos procedimentos médicos, exames de laboratório e radiologia, medicina translacional com o desenvolvimento de medicamentos e alvos terapêuticos específicos para cada doença são uma realidade diária na prática pediátrica.22. Escobar AM, Grisi SJ. 21st century well-child care. Rev Assoc Med Bras. 2016;62:479-81. http://dx.doi.org/10.1590/1806-9282.62.06.479
https://doi.org/http://dx.doi.org/10.159...
,55. Wuillaume SM, Batista NA. The preceptor in medical residencies in Pediatrics: main attributes. J Pediatr (Rio J). 2000;76:333-8. https://doi.org/10.2223/jped.156
https://doi.org/https://doi.org/10.2223/...
,77. Ferreira JC, Trindade VC, Espada G, Morel Z, Bonfá E, Magalhães CS, et al. Epidemiology and management practices for childhood-onset systemic lupus erythematosus patients: a survey in Latin America. Clin Rheumatol. 2018;37:3299-307. https://doi.org/10.1007/s10067-018-4254-4
https://doi.org/https://doi.org/10.1007/...
,88. Alveno RA, Miranda CV, Passone CG, Waetge AR, Hojo ES, Farhat SC, et al. Pediatric chronic patients at outpatient clinics: a study in a Latin American University Hospital. J Pediatr (Rio J). 2018;94:539-45. http://dx.doi.org/10.1016/j.jped.2017.07.014
https://doi.org/http://dx.doi.org/10.101...
,99. Ramos GF, Ribeiro VP, Mercadante MP, Ribeiro MP, Delgado AF, Farhat SC, et al. Mortality in adolescents and young adults with chronic diseases during 16 years: a study in a Latin American tertiary hospital. J Pediatr (Rio J). 2019;95(6):667-73. https://doi.org/10.1016/j.jped.2018.06.006
https://doi.org/https://doi.org/10.1016/...
,1010. Silva CA, Aikawa NE, Bonfa E. Vaccinations in juvenile chronic inflammatory diseases: an update. Nat Rev Rheumatol. 2013;9:532-43. https://doi.org/10.1038/nrrheum.2013.95
https://doi.org/https://doi.org/10.1038/...
,1111. Sneha LM, Ravindran M, Kumar R, Venkatraman P, Scott J, Kannan L. Indian Pediatric Postgraduate’s Perspective on Future Career Intentions. Indian J Pediatr. 2017;84:183-7. https://doi.org/10.1007/s12098-016-2268-y
https://doi.org/https://doi.org/10.1007/...
,1212. Khadilkar SV. Neurology: the scenario in India. J Assoc Physicians India. 2012;60:42-4.,1313. Mahajan A, Cahill C, Scharf E, Gupta S, Ahrens S, Joe E, et al. Neurology residency training in 2017: a survey of preparation, perspectives, and plans. Neurology. 2019;92:76-83. https://doi.org/10.1212/WNL.0000000000006739
https://doi.org/https://doi.org/10.1212/...

Após a conclusão da residência pediátrica, pediatras e especialistas em pediatria lidam rotineiramente com diferentes perfis de atendimento ao paciente, incluindo aqueles com risco de morte, doenças crônicas, sofrimento e morte.88. Alveno RA, Miranda CV, Passone CG, Waetge AR, Hojo ES, Farhat SC, et al. Pediatric chronic patients at outpatient clinics: a study in a Latin American University Hospital. J Pediatr (Rio J). 2018;94:539-45. http://dx.doi.org/10.1016/j.jped.2017.07.014
https://doi.org/http://dx.doi.org/10.101...
,99. Ramos GF, Ribeiro VP, Mercadante MP, Ribeiro MP, Delgado AF, Farhat SC, et al. Mortality in adolescents and young adults with chronic diseases during 16 years: a study in a Latin American tertiary hospital. J Pediatr (Rio J). 2019;95(6):667-73. https://doi.org/10.1016/j.jped.2018.06.006
https://doi.org/https://doi.org/10.1016/...
Além disso, pacientes gravemente comprometidos, assédio, discriminação, baixa renda e interferência na vida familiar podem levar os pediatras a altos níveis de estresse físico e psicológico e/ou problemas profissionais,88. Alveno RA, Miranda CV, Passone CG, Waetge AR, Hojo ES, Farhat SC, et al. Pediatric chronic patients at outpatient clinics: a study in a Latin American University Hospital. J Pediatr (Rio J). 2018;94:539-45. http://dx.doi.org/10.1016/j.jped.2017.07.014
https://doi.org/http://dx.doi.org/10.101...
,1414. Fnais N, Soobiah C, Chen MH, Lillie E, Perrier L, Tashkhandi M, et al. Harassment and discrimination in medical training: a systematic review and meta-analysis. Acad Med. 2014;89:817-27. https://doi.org/10.1097/ACM.0000000000000200
https://doi.org/https://doi.org/10.1097/...
,1515. Tartas M, Walkiewicz M, Majkowicz M, Budzinski W. Psychological factors determining success in a medical career: a 10-year longitudinal study. Med Teach. 2011;33:e163-72. https://doi.org/10.3109/0142159X.2011.544795
https://doi.org/https://doi.org/10.3109/...
,1616. De Andrade AP, Amaro Junior E, Farhat SC, Schvartsman C. Higher burnout scores in paediatric residents are associated with increased brain activity during attentional functional magnetic resonance imaging task. Acta Paediatr. 2016;105:705-13. https://doi.org/10.1111/apa.13371
https://doi.org/https://doi.org/10.1111/...
,1717. Dyrbye LN, West CP, Satele D, Boone S, Tan L, Sloan J, et al. Burnout among U.S. medical students, residents, and early career physicians relative to the general U.S. population. Acad Med. 2014;89:443-51. https://doi.org/10.1097/ACM.0000000000000134
https://doi.org/https://doi.org/10.1097/...
além de poder reduzir a satisfação geral,1818. Freed GL, McGuinness GA, Moran LM, Spera L, Althouse LA. New pediatricians: first jobs and future workplace goals. Pediatrics. 2015;135:701-6. https://doi.org/10.1542/peds.2014-3372
https://doi.org/https://doi.org/10.1542/...
particularmente em médicos em início de carreira.1919. Kohno T, Kosaka S, Takei Y, Fukuda K, Ozaki Y, Yamashina A. Time trend in interest and satisfaction towards clinical training and academic activities among early-career cardiologists - the Japanese circulation society post-graduate training survey. Circ J. 2018;82;423-9. https://doi.org/10.1253/circj.CJ-17-0398
https://doi.org/https://doi.org/10.1253/...

Até onde sabemos, não há análises simultâneas de características e problemas pessoais, profissionais, médicos e de educação científica reportados por pediatras realizadas na América Latina.

Assim, este estudo teve como objetivo avaliar os relatos de pediatras sobre dados demográficos, local de trabalho, especialidade pediátrica, índices de satisfação geral com a residência/prática clínica, renda, educação médica e científica, perfis de atendimento ao paciente, exames laboratoriais/uso de medicação e principais problemas físicos, psiquiátricos/psicológicos e profissionais relacionados à prática clínica. Além disso, as características e os problemas pessoais, profissionais e educacionais foram comparados de acordo com os anos de prática clínica pediátrica.

MÉTODO

Este estudo transversal envolvendo 614 pediatras foi realizado com base em uma pesquisa online que avaliou características e problemas pessoais, profissionais, médicos e de educação científica. Todos os médicos haviam concluído com êxito o Programa de Residência em Pediatria Geral e/ou o Programa de Residência em Especialidades Pediátricas em um Departamento de Pediatria no Brasil, que são programas de formação orientados para o ensino. O Programa de Residência em Pediatria Geral conta com atividades de atenção primária e secundária durante o primeiro ano de formação, com foco no cuidado e atendimento de crianças e adolescentes saudáveis. No segundo e terceiro anos, há um predomínio de atividades de atenção secundária e terciária em clínicas de internação e ambulatoriais, incluindo várias subespecialidades pediátricas.

A pesquisa foi realizada utilizando a ferramenta REDCap, um aplicativo de Internet seguro para construir, controlar e acessar questionários eletrônicos e bancos de dados. Este inquérito foi enviado entre novembro de 2018 e janeiro de 2019 a todos os pediatras que concluíram o Programa de Residência em Pediatria Geral ou o Programa de Residência em Especialidades Pediátricas entre 2006 e 2018. Pelo menos 15 e-mails foram enviados para melhorar a taxa de resposta. O Comitê de Ética do nosso hospital universitário aprovou este estudo (CAAE: 93564518.5.0000.0068) e um termo de consentimento livre e esclarecido foi obtido de todos os participantes.

Os convites para o questionário de autorrelato anônimo foram distribuídos por e-mail. A pesquisa online foi composta de 21 questões focadas no relato do médico sobre problemas pessoais, educacionais e profissionais. As respostas podiam ser de múltipla escolha, dicotômicas (sim e não) ou de escala visual analógica horizontal, recordando eventos ocorridos durante a prática. O tempo estimado para o preenchimento era de aproximadamente 15 minutos.

O inquérito online incluiu 21 itens relacionados a:

  1. Dados demográficos dos pediatras (idade, sexo, estado civil, número de filhos, cidade, estado, país e anos de prática clínica pediátrica após a conclusão da residência em pediatria geral).

  2. Local de trabalho do pediatra no ano anterior (serviço público, serviço privado, atenção pediátrica primária, enfermaria pediátrica, sala de emergência pediátrica, terapia intensiva pediátrica, atendimento neonatal, consultório pediátrico particular, professor de universidade pública/privada, indústria farmacêutica, procedimentos médicos, serviço de radiologia, exames laboratoriais, organização não-governamental e serviço administrativo).

  3. Especialidades pediátricas após o Programa de Residência em Pediatria Geral (Medicina do Adolescente, Cardiologia, Desenvolvimento e Comportamento, Emergência, Endocrinologia, Gastroenterologia, Genética, Hematologia, Terapia Intensiva Pediátrica, Alergia e Imunologia, Doenças Infecciosas, Neonatologia, Nefrologia e Transplante Renal, Neurologia, Nutrologia, Oncologia, Dor e Cuidados Paliativos, Pneumologia, Reumatologia e sem especialidade).

  4. Índice de satisfação geral durante o Programa de Residência em Pediatria Geral do Departamento de Pediatria da Universidade de São Paulo, medido por meio de uma escala visual analógica horizontal (0=nenhuma satisfação e 10=excelente satisfação geral).

  5. Índice de satisfação geral com a prática clínica pediátrica no ano anterior, medido por meio de uma escala visual analógica horizontal (0=nenhuma satisfação e 10=excelente satisfação geral).

  6. Jornada de trabalho em horas/semana no ano anterior (≤20 horas, 20-40 horas, 40-60 horas e >60 horas).

  7. Número de pacientes pediátricos/semana no ano anterior (≤50 pacientes, 50-100 pacientes, 100-200 pacientes e >200 pacientes).

  8. Disponibilidade de serviços de saúde para pacientes pediátricos no ano anterior (público, privado e/ou outros).

  9. Renda do pediatra no ano anterior (<15 salários mínimos/mês e ≥15 salários mínimos/mês).

  10. Trabalho exclusivo com pediatria no ano anterior (sim/não).

  11. Bolsa de iniciação científica durante a faculdade de medicina (sim/não).

  12. Número de participações em seminários/congressos/cursos no ano anterior.

  13. Artigos publicados na literatura médica (sim/não).

  14. Aluno em um programa de mestrado e/ou doutorado (sim/não).

  15. Principais perfis de atendimento ao paciente no ano anterior (sala de emergência, enfermaria, terapia intensiva pediátrica, atenção primária, recém-nascido, acompanhamento do crescimento e desenvolvimento, controle de doenças crônicas, controle psiquiátrico/psicológico, contracepção e aconselhamento ginecológico, uso de drogas lícitas e ilícitas, infecções sexualmente transmissíveis e aconselhamento na gestação e avaliação de violência física/psicológica).

  16. Uso de testes laboratoriais durante a prática clínica no ano anterior (laboratório clínico, radiografia, eletrocardiograma, eletroencefalograma, exames endoscópicos, ecocardiograma, ultrassonografia, tomografia computadorizada, ressonância magnética, densitometria óssea, exame oftalmológico, biópsia, sequenciamento genômico total e audiometria).

  17. Uso de medicamentos durante a prática clínica no ano anterior (antibióticos, anti-inflamatórios não hormonais, glicocorticoide oral ou intravenoso, glicocorticoide inalatório, droga vasoativa, surfactante, antidepressivo, anticonvulsivante, analgésico, anti-histamínico, imunossupressor/quimioterapia, imunobiológicos, contraceptivos, vacinas e homeopatia).

  18. Prescrição de contraceptivos para pacientes adolescentes no ano anterior (preservativo, anticoncepcional oral, acetato de medroxiprogesterona, implante contraceptivo, pílula do dia seguinte, dispositivo intrauterino e nenhum).

  19. Serviços de apoio terapêutico utilizados durante a prática clínica no ano anterior (prontuário eletrônico, hospital-dia, avaliação de dados antropométricos, questionários sobre a qualidade de vida relacionada à saúde, avaliação da dor, atendimento odontológico, fisioterapia, orientação nutricional, fonoaudiologia, apoio psicológico, tratamento de reabilitação, educação sexual, orientação para atividade física, educação do paciente/família sobre a doença e o tratamento, abordagem multidisciplinar, chamadas telefônicas para melhorar a adesão e agendar consultas, participação em ensaios clínicos, monitoramento de eventos adversos, proteção solar, cuidados paliativos e programa de transição para o atendimento na fase adulta).

  20. Avaliação do cartão de vacinação em todas as consultas no ano anterior (sim/não).

  21. Principais problemas físicos, psiquiátricos, psicológicos e profissionais relacionados à prática clínica no ano anterior (jornadas longas de trabalho, vida social insatisfatória, inatividade física, redução global da qualidade de vida relacionada à saúde, ansiedade, depressão, síndrome de burnout, interferências na vida familiar, assédio, sintomas obsessivo-compulsivos, baixa renda, problemas jurídicos, violência no local de trabalho, estresse provocado por chefe/professor e estresse provocado por plano de saúde).

Os pediatras foram divididos em dois grupos de acordo com a mediana de anos de prática clínica pediátrica: grupo 1 (≤5 anos) e grupo 2 (>5 anos).

O software Statistical Package for the Social Sciences, versão 13.0, foi utilizado. Os resultados das variáveis contínuas foram expressos em mediana (valores mínimo e máximo) ou média±desvio padrão (DP) e comparados pelo teste de Mann-Whitney e t de Student, respectivamente. Os resultados das variáveis categóricas foram apresentados como frequência (porcentagem) e comparados pelo teste exato de Fisher ou qui-quadrado de Pearson, conforme apropriado. Coeficientes de correlação de Pearson ou de Spearman foram usados para correlacionar a satisfação geral relacionada à residência pediátrica/prática clínica em pediatria com a idade atual e os anos de prática médica após a conclusão da residência. Valores p inferiores a 0,05 foram considerados significativos.

RESULTADOS

A taxa de resposta para este questionário online foi de 377/614 (61%) pediatras. Os dados de 44/614 (7%) entrevistados estavam incompletos e apenas 2/614 (0,3%) se recusaram a participar do estudo. Dessa forma, foram avaliados 331/614 (54%) entrevistados que completaram o questionário.

A Tabela 1 apresenta os dados demográficos, o local de trabalho e as especialidades pediátricas relatadas por pediatras após a conclusão da residência. A maioria dos participantes era do sexo feminino (82%), a mediana de idade foi de 33 anos (27-40) e a mediana de tempo de prática pediátrica após a conclusão da residência foi de 5 anos (1-13). Os principais locais de trabalho declarados por pediatras no ano anterior foram serviço público (79%) e serviço privado (81%), enquanto procedimentos médicos, serviço administrativo, professor de universidade pública, serviço de radiologia, laboratório, indústria farmacêutica e organização não-governamental tiveram baixa frequência (<4%). As três especialidades pediátricas prevalentes foram Neonatologia (25%), Terapia Intensiva Pediátrica (14%) e Cardiologia Pediátrica (7%) (Tabela 1).

Tabela 1
Dados demográficos, local de trabalho e especialidades pediátricas relatadas por pediatras após a conclusão da residência.

A maioria dos pediatras (86%) acompanhava pacientes com idade entre 28 dias e 10 anos. Um quarto dos pediatras reportou ter jornadas longas de trabalho (>60 horas/semana) e 15% atendiam mais de 100 pacientes pediátricos/semana. Quase 50% dos pediatras recebiam ≥15 salários mínimos/mês. Aproximadamente 90% dos médicos relataram ter participado de pelo menos um simpósio/congresso/curso e cerca de 30% afirmaram ter artigos publicados na literatura médica. Entre os entrevistados, 64% declaram que tiveram bolsa de iniciação científica durante a faculdade de medicina e 16% reportaram ser alunos em programas de mestrado e/ou doutorado (Tabela 2).

Tabela 2
Descrição das seguintes variáveis de acordo com o relato de pediatras após a conclusão da residência referentes ao ano anterior: faixa etária dos pacientes, jornada de trabalho semanal, número de pacientes/semana, renda do pediatra, trabalho exclusivo com pediatria, bolsa de iniciação científica durante a faculdade de medicina, número de participações em seminários/congressos/cursos, artigos publicados e aluno em um programa de mestrado ou doutorado.

Os principais perfis de atendimento ao paciente foram sala de emergência, terapia intensiva pediátrica, enfermaria e acompanhamento do crescimento e desenvolvimento (>40%). Os problemas físicos, psiquiátricos/psicológicos e profissionais mais importantes (>50%) foram jornadas longas de trabalho, vida social insatisfatória, inatividade física e interferência na vida familiar (Tabela 3).

Tabela 3
Descrição das seguintes variáveis de acordo com o relato de pediatras após a conclusão da residência referentes ao ano anterior: perfil principal de atendimento ao paciente, exames laboratoriais, uso de medicação, prescrição de contraceptivos, serviços de apoio terapêutico, avaliação do cartão de vacinação em todas as consultas e principais problemas físicos, psiquiátricos/psicológicos e profissionais.

Os grupos foram divididos em dois: grupo 1 [≤5 anos de prática clínica após a conclusão da residência em pediatria geral, n=172/302 (67%)] e grupo 2 [>5 anos, n=159/312 (56%)]. A mediana de idade [30 (27-37) versus 35 (31-40) anos; p<0,001] e o número de filhos [0 (0-3) versus 1 (0-4); p<0,001] foram significativamente menores no grupo 1 em relação ao grupo 2 (Tabela 4). A mediana de satisfação geral com a residência pediátrica [8 (0-10) versus 9 (4-10); p=0,002] foi significativamente maior no grupo 2 e semelhante à mediana de satisfação geral com a prática clínica pediátrica [8 (1-10) versus 8 (4-10); p=0,845] (Tabela 5).

Tabela 4
Dados demográficos e tipo de especialidade pediátrica de acordo com os anos de prática clínica pediátrica em dois grupos: grupo 1 (≤5 anos) e grupo 2 (>5 anos).
Tabela 5
Descrição das seguintes variáveis de acordo com o relato de pediatras após a conclusão da residência referentes ao ano anterior: local de trabalho, jornada de trabalho, número de pacientes/semana, satisfação geral com a residência pediátrica/prática clínica, participação em seminários/congressos/cursos, artigos publicados e principais problemas relacionados à profissão de acordo com os anos de prática clínica pediátrica em dois grupos: grupo 1 (≤5 anos) e grupo 2 (>5 anos).

As frequências de pediatras gerais (19 versus 3%; p<0,001), jornada de trabalho >60 horas (31 versus 19%; p=0,011), trabalho na enfermaria pediátrica (37 versus 20%; p=0,001) e na terapia intensiva pediátrica (58 versus 27%; p<0,001) foram significativamente mais elevadas no grupo 1 quando comparadas ao grupo 2, enquanto ser casado/ter companheiro (52 versus 80%; p<0,001) e trabalhar em consultório particular foram significativamente menores no primeiro grupo (44 versus 57%; p=0,021). Quanto aos principais problemas relacionados à prática clínica no ano anterior, jornadas longas de trabalho (73 versus 53%; p<0,001), vida social insatisfatória (75 versus 62%; p=0,018) e assédio (23 versus 4%; p=0,003) foram significativamente maiores no primeiro grupo (Tabelas 4 e 5).

Referente às correlações de Spearman, a idade e os anos de prática clínica pediátrica após a conclusão da residência não estavam correlacionados com a satisfação geral com a residência em pediatria e com prática clínica pediátrica (p>0,05).

Análises posteriores também foram realizadas comparando os dois grupos de acordo com a duração do programa de residência pediátrica: A (3 anos, n=82) e B (2 anos, n=249). As frequências de trabalho na enfermaria (45 versus 24%; p<0,001) e na sala de emergência (77 versus 32%; p<0,001) foram significativamente mais elevadas no grupo A do que no B. A mediana de satisfação geral com a residência pediátrica [8 (0-10) versus 8 (4-10); p=0,015] e a frequência de pediatras que recebiam ≥15 salários mínimos/mês (13 versus 59%; p<0,001), bem como a de participantes com especialidade pediátrica (68 versus 96%; p<0,001), foram significativamente maiores no grupo B em relação ao A.

DISCUSSÃO

Esta foi a primeira pesquisa online a realizar uma análise simultânea do equilíbrio entre vida pessoal e profissional e da educação científica de pediatras após a conclusão de um Programa de Residência na América Latina. Os pediatras eram jovens e relataram baixa renda e jornadas longas de trabalho, particularmente na sala de emergência e na enfermaria pediátrica. A satisfação geral com a residência pediátrica foi boa, porém menor em pediatras em início de carreira (≤5 anos).

A vantagem do presente estudo foi a taxa de resposta moderada (54%) do questionário de autorrelato online, considerando que não houve incentivo financeiro. Esta taxa de resposta contrasta com a baixa participação relatada em estudos anteriores envolvendo neonatologistas, membros da Academia Americana de Pediatria (15%),2020. Horowitz E, Feldman HA, Savich R. Neonatologist salary: factors, equity and gender. J Perinatol. 2019;39:359-65. https://doi.org/10.1038/s41372-018-0304-7
https://doi.org/https://doi.org/10.1038/...
graduandos em um programa de residência neurológica (23%)1313. Mahajan A, Cahill C, Scharf E, Gupta S, Ahrens S, Joe E, et al. Neurology residency training in 2017: a survey of preparation, perspectives, and plans. Neurology. 2019;92:76-83. https://doi.org/10.1212/WNL.0000000000006739
https://doi.org/https://doi.org/10.1212/...
e estudantes de medicina, residentes e médicos em início de carreira cadastrados (35%).1717. Dyrbye LN, West CP, Satele D, Boone S, Tan L, Sloan J, et al. Burnout among U.S. medical students, residents, and early career physicians relative to the general U.S. population. Acad Med. 2014;89:443-51. https://doi.org/10.1097/ACM.0000000000000134
https://doi.org/https://doi.org/10.1097/...
A confidencialidade da pesquisa foi relevante, já que não houve divulgação da identidade dos entrevistados. Outro ponto forte deste estudo foi a avaliação de autorrelato e o questionário padronizado, incluindo instrumentos de medição para analisar a satisfação geral.

Os pediatras deste estudo eram jovens, casados e com um baixo número de filhos. Observou-se também uma predominância do sexo feminino, semelhante a outros estudos.1818. Freed GL, McGuinness GA, Moran LM, Spera L, Althouse LA. New pediatricians: first jobs and future workplace goals. Pediatrics. 2015;135:701-6. https://doi.org/10.1542/peds.2014-3372
https://doi.org/https://doi.org/10.1542/...
,2121. Association of American Medical Colleges [homepage on the Internet]. 2016 physician specialty data report. Washington, DC: Association of American Medical Colleges [cited 2019 Mar 28]. Available from: Available from: https://www.aamc.org/data/workforce/reports/458712/1-3-chart.html
https://www.aamc.org/data/workforce/repo...
Na verdade, esse achado está relacionado com o aumento de mulheres nas faculdades de medicina e nos programas de residência em todo o mundo.2222. Wang LC, Mittal AG, Puttmann K, Janzen N, Palmer LS, Yerkes EB, et al. The changing gender landscape of pediatric urology fellowship: results from a survey of fellows and recent graduates. J Pediatr Urol. 2019;15:51-7. https://doi.org/10.1016/j.jpurol.2018.09.001
https://doi.org/https://doi.org/10.1016/...
,2323. Scheffer MC, Guilloux AG, Poz MR, Schraiber LB. Reasons for choosing the profession and profile of newly qualified physicians in Brazil. Rev Assoc Med Bras. 2016;62:853-61. http://dx.doi.org/10.1590/1806-9282.62.09.853
https://doi.org/http://dx.doi.org/10.159...

Cerca de 80% dos pediatras trabalhavam tanto em serviços públicos quanto privados, o que é conhecido como dupla prática. Esta é uma particularidade do Brasil, onde mais da metade dos profissionais de medicina estão envolvidos em dupla prática.2424. Miotto BA, Guilloux AG, Cassenote AJ, Mainardi GM, Russo G, Scheffer MC. Physician’s sociodemographic profile and distribution across public and private health care: an insight into physicians’ dual practice in Brazil. BMC Health Serv Res. 2018;18:299. https://doi.org/10.1186/s12913-018-3076-z
https://doi.org/https://doi.org/10.1186/...

Nossos residentes foram expostos a todas as especialidades pediátricas durante o programa de residência. No entanto, as especialidades escolhidas com mais frequência por nossos pediatras foram Neonatologia, Terapia Intensiva Pediátrica e Cardiologia Pediátrica, como relatado anteriormente.1111. Sneha LM, Ravindran M, Kumar R, Venkatraman P, Scott J, Kannan L. Indian Pediatric Postgraduate’s Perspective on Future Career Intentions. Indian J Pediatr. 2017;84:183-7. https://doi.org/10.1007/s12098-016-2268-y
https://doi.org/https://doi.org/10.1007/...
Em realidade, estas especialidades são baseadas em atendimento hospitalar e em procedimentos médicos, tendo potencialmente mais oportunidades de trabalho com possibilidade de melhora na renda.1111. Sneha LM, Ravindran M, Kumar R, Venkatraman P, Scott J, Kannan L. Indian Pediatric Postgraduate’s Perspective on Future Career Intentions. Indian J Pediatr. 2017;84:183-7. https://doi.org/10.1007/s12098-016-2268-y
https://doi.org/https://doi.org/10.1007/...
,2525. Heyman MB, Weiss P, Boyer D, Fussell J, Imundo L, Aye T, et al. Challenges of funding pediatric fellowship programs-invited commentary from the council of pediatric subspecialties. J Pediatr. 2019;204:4-6.e1. https://doi.org/10.1016/j.jpeds.2018.10.006
https://doi.org/https://doi.org/10.1016/...

É importante salientar que o perfil médico descrito em nossa instituição pode não representar os dados demográficos do pediatra brasileiro. Inclusive, dados de 2018 do estado de São Paulo mostraram que a média de idade dos pediatras foi de 47,4±11,6 anos e as especialidades pediátricas mais comuns foram Alergia e Imunologia, Oncologia e Endocrinologia.2626. Portal da demografia médica [homepage on the Internet]. São Paulo, Brazil [cited 2019 Aug 23] Available from: Available from: http://demografiamedica.org.br/atlas-de-especialidades/pediatria/
http://demografiamedica.org.br/atlas-de-...

Quanto à educação médica continuada, a maioria dos pediatras participa de congressos médicos regularmente. Este é um resultado importante para os médicos devido aos grandes avanços no conhecimento científico acerca da prática clínica para recém-nascidos, crianças e adolescentes, particularmente para aqueles com doenças crônicas e complexas.22. Escobar AM, Grisi SJ. 21st century well-child care. Rev Assoc Med Bras. 2016;62:479-81. http://dx.doi.org/10.1590/1806-9282.62.06.479
https://doi.org/http://dx.doi.org/10.159...
,33. Almeida MF, Guinsburg R, Costa JO, Anchieta LM, Freire LM. Teaching neonatal resuscitation at public hospitals in Brazilian state capitals. J Pediatr (Rio J). 2005;81:233-9. http://dx.doi.org/10.1590/S0021-75572005000400010
https://doi.org/http://dx.doi.org/10.159...
,44. Piva JP, Lago PM, Garcia PC. Pediatric emergency in Brazil: the consolidation of an area in the pediatric field. J Pediatr (Rio J). 2017;93 (Supl 1):68-74. http://dx.doi.org/10.1016/j.jped.2017.07.005
https://doi.org/http://dx.doi.org/10.101...
,1212. Khadilkar SV. Neurology: the scenario in India. J Assoc Physicians India. 2012;60:42-4.,2727. Bogetz JF, Bogetz AL, Gabhart JM, Bergman DA, Blankenburg RL, Rassbach CE. Continuing education needs of pediatricians across diverse specialties caring for children with medical complexity. Clin Pediatr (Phila). 2015;54:222-7. https://doi.org/10.1177/0009922814564049
https://doi.org/https://doi.org/10.1177/...
Um quarto dos pediatras declarou ter artigos publicados na literatura médica. Tem havido um aumento dessa prática em nossa Faculdade de Medicina e Departamento de Pediatria nos últimos anos, reforçando a relevância de ganhos adicionais na produção de um manuscrito,2828. McLaughlin C, Barin E, Ford H, Upperman J, Cassidy L, Burke RV. Formative research experiences in pediatric surgeons: a mixed methods study of Pediatric Trauma Society members. Pediatr Surg Int. 2019;35:495-9. https://doi.org/10.1007/s00383-019-04438-9
https://doi.org/https://doi.org/10.1007/...
como a educação profissional, ganhos financeiros, benefícios sociais e prazer intelectual. Isto também é importante para os residentes que pretendem se dedicar à medicina acadêmica.

É relevante que os principais locais de trabalho descritos por pediatras em início de carreira foram a sala de emergência e a enfermaria pediátrica, que levam a jornadas longas de trabalho, vida social insatisfatória e sedentarismo. A possibilidade de atender pacientes com quadros agudos, seriamente comprometidos, com risco de morte e crônicos pode provocar problemas e contribuir para a redução na satisfação geral com a residência pediátrica relatada por pediatras com menos de 5 anos de prática clínica.

Além disso, estes são problemas encontrados em programas de formação médica em todo o mundo. A transição da residência para a prática clínica pode ser um desafio para o pediatra em início de carreira, causando estresse relacionado ao trabalho, fadiga, desconforto e desgaste emocional, como a síndrome de burnout, ansiedade, depressão e suscetibilidade ao assédio.1414. Fnais N, Soobiah C, Chen MH, Lillie E, Perrier L, Tashkhandi M, et al. Harassment and discrimination in medical training: a systematic review and meta-analysis. Acad Med. 2014;89:817-27. https://doi.org/10.1097/ACM.0000000000000200
https://doi.org/https://doi.org/10.1097/...
,1616. De Andrade AP, Amaro Junior E, Farhat SC, Schvartsman C. Higher burnout scores in paediatric residents are associated with increased brain activity during attentional functional magnetic resonance imaging task. Acta Paediatr. 2016;105:705-13. https://doi.org/10.1111/apa.13371
https://doi.org/https://doi.org/10.1111/...
,1717. Dyrbye LN, West CP, Satele D, Boone S, Tan L, Sloan J, et al. Burnout among U.S. medical students, residents, and early career physicians relative to the general U.S. population. Acad Med. 2014;89:443-51. https://doi.org/10.1097/ACM.0000000000000134
https://doi.org/https://doi.org/10.1097/...

Os pediatras com >5 anos de prática clínica eram mais especializados, trabalhavam em consultórios particulares e afirmaram ter alta renda. Na verdade, pediatras autônomos podem escolher a própria jornada de trabalho de acordo com as suas preferências e interesses financeiros.2929. Russo G, Sousa B, Sidat M, Ferrinho P, Dussault G. Why do some physicians in Portuguese-speaking African countries work exclusively for the private sector Findings from a mixed-methods study?. Hum Resour Health. 2014;12:51. https://doi.org/10.1186/1478-4491-12-51
https://doi.org/https://doi.org/10.1186/...
,3030. Koch VR, Doria Filho U, Bollela VR. Assessment of the Medical Residency programs of the Paediatrics Department of the University of São Paulo Medical School in light of the professional profiles of the graduates. Rev Bras Educ Med. 2011:35:454-9. http://dx.doi.org/10.1590/S0100-55022011000400003
https://doi.org/http://dx.doi.org/10.159...

As diferenças entre os locais de trabalho dos pediatras mostraram que a maioria deles começou a carreira nas salas de emergência e enfermarias, passando mais tarde para as especialidades pediátricas, principalmente em consultórios pediátricos particulares. Isso reforça a necessidade de os programas de residência médica cobrirem todas as áreas de prática na formação do pediatra.

Vale ressaltar que a satisfação geral com a prática clínica foi alta e semelhante nos grupos 1 (≤5 anos de carreira) e 2 (>5 anos). Nosso estudo sugere que os pediatras estão satisfeitos com a profissão, provavelmente dada a estreita relação com pacientes e familiares e a consciência holística da saúde mental, física e emocional. No entanto, a pediatria geral não é baseada em procedimentos médicos e, assim, os resultados desta pesquisa contrastam com os de cardiologistas japoneses em formação, que tiveram a satisfação associada a procedimentos invasivos, como a angiografia coronária e a angioplastia coronária.1919. Kohno T, Kosaka S, Takei Y, Fukuda K, Ozaki Y, Yamashina A. Time trend in interest and satisfaction towards clinical training and academic activities among early-career cardiologists - the Japanese circulation society post-graduate training survey. Circ J. 2018;82;423-9. https://doi.org/10.1253/circj.CJ-17-0398
https://doi.org/https://doi.org/10.1253/...

Em 2014, um novo programa de residência pediátrica de 3 anos foi instituído em nosso Departamento de Pediatria, destinado à formação de pediatras no século 21. Os tópicos de Medicina do Adolescente, Atenção ao Desenvolvimento e Comportamento, saúde mental e cuidados de doenças pediátricas crônicas foram expandidos. Aproximadamente um terço dos nossos residentes de pediatria do programa de 3 anos não fez uma especialização pediátrica após a conclusão da residência geral. Estudos multicêntricos futuros envolvendo uma população mais expressiva de residentes de pediatria do programa de 3 anos serão necessários para esclarecer essa questão.

As limitações deste estudo incluem a possibilidade de viés de memória, uma vez que os participantes foram solicitados a relatar problemas ocorridos preferencialmente em um período recordatório de 1 ano. Ademais, os resultados desta pesquisa não devem ser extrapolados para além da população de pediatras brasileiros. Outras limitações foram o delineamento transversal do estudo e o fato de que a pesquisa não incluiu instrumentos para avaliar problemas fisiológicos/psiquiátricos. Portanto, estudos longitudinais e qualitativos são necessários para clarificar a trajetória dos pediatras e melhorar o entendimento sobre o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional e os objetivos futuros desta população.

Em conclusão, pediatras em início de carreira (≤5 anos) relataram jornada longas de trabalho, menor renda e problemas relacionados ao trabalho em comparação com pediatras mais experientes (>5 anos). Contudo, com o tempo, estes profissionais passam a trabalhar em consultórios particulares e com atendimento especializado, consequentemente, melhorando seus salários e condições de vida. A satisfação geral com a residência pediátrica foi boa, porém menor em pediatras em início de carreira, possivelmente por não poderem utilizar todo o conhecimento adquirido durante a residência médica.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos a todos os pediatras que responderam a pesquisa online. Também gostaríamos de agradecer ao Dr. Ulysses Doria Filho pelo apoio com a análise estatística.

REFERENCES

  • 1
    Udani PM. Special article: history of Indian academy of pediatrics. Indian Pediatr. 1988;25:5-13.
  • 2
    Escobar AM, Grisi SJ. 21st century well-child care. Rev Assoc Med Bras. 2016;62:479-81. http://dx.doi.org/10.1590/1806-9282.62.06.479
    » https://doi.org/http://dx.doi.org/10.1590/1806-9282.62.06.479
  • 3
    Almeida MF, Guinsburg R, Costa JO, Anchieta LM, Freire LM. Teaching neonatal resuscitation at public hospitals in Brazilian state capitals. J Pediatr (Rio J). 2005;81:233-9. http://dx.doi.org/10.1590/S0021-75572005000400010
    » https://doi.org/http://dx.doi.org/10.1590/S0021-75572005000400010
  • 4
    Piva JP, Lago PM, Garcia PC. Pediatric emergency in Brazil: the consolidation of an area in the pediatric field. J Pediatr (Rio J). 2017;93 (Supl 1):68-74. http://dx.doi.org/10.1016/j.jped.2017.07.005
    » https://doi.org/http://dx.doi.org/10.1016/j.jped.2017.07.005
  • 5
    Wuillaume SM, Batista NA. The preceptor in medical residencies in Pediatrics: main attributes. J Pediatr (Rio J). 2000;76:333-8. https://doi.org/10.2223/jped.156
    » https://doi.org/https://doi.org/10.2223/jped.156
  • 6
    Feigerlova E, Oussalah A, Fournier JP, Antonelli A, Hadjadj S, Marechaud R, et al. Predictors of high motivation score for performing Research Initiation Fellowship, Master 1, Research Master 2, and PhD Curricula during medical studies: a Strobe-compliant Article. Medicine (Baltimore). 2016;95:e2633. https://doi.org/10.1097/MD.0000000000002633
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1097/MD.0000000000002633
  • 7
    Ferreira JC, Trindade VC, Espada G, Morel Z, Bonfá E, Magalhães CS, et al. Epidemiology and management practices for childhood-onset systemic lupus erythematosus patients: a survey in Latin America. Clin Rheumatol. 2018;37:3299-307. https://doi.org/10.1007/s10067-018-4254-4
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1007/s10067-018-4254-4
  • 8
    Alveno RA, Miranda CV, Passone CG, Waetge AR, Hojo ES, Farhat SC, et al. Pediatric chronic patients at outpatient clinics: a study in a Latin American University Hospital. J Pediatr (Rio J). 2018;94:539-45. http://dx.doi.org/10.1016/j.jped.2017.07.014
    » https://doi.org/http://dx.doi.org/10.1016/j.jped.2017.07.014
  • 9
    Ramos GF, Ribeiro VP, Mercadante MP, Ribeiro MP, Delgado AF, Farhat SC, et al. Mortality in adolescents and young adults with chronic diseases during 16 years: a study in a Latin American tertiary hospital. J Pediatr (Rio J). 2019;95(6):667-73. https://doi.org/10.1016/j.jped.2018.06.006
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1016/j.jped.2018.06.006
  • 10
    Silva CA, Aikawa NE, Bonfa E. Vaccinations in juvenile chronic inflammatory diseases: an update. Nat Rev Rheumatol. 2013;9:532-43. https://doi.org/10.1038/nrrheum.2013.95
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1038/nrrheum.2013.95
  • 11
    Sneha LM, Ravindran M, Kumar R, Venkatraman P, Scott J, Kannan L. Indian Pediatric Postgraduate’s Perspective on Future Career Intentions. Indian J Pediatr. 2017;84:183-7. https://doi.org/10.1007/s12098-016-2268-y
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1007/s12098-016-2268-y
  • 12
    Khadilkar SV. Neurology: the scenario in India. J Assoc Physicians India. 2012;60:42-4.
  • 13
    Mahajan A, Cahill C, Scharf E, Gupta S, Ahrens S, Joe E, et al. Neurology residency training in 2017: a survey of preparation, perspectives, and plans. Neurology. 2019;92:76-83. https://doi.org/10.1212/WNL.0000000000006739
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1212/WNL.0000000000006739
  • 14
    Fnais N, Soobiah C, Chen MH, Lillie E, Perrier L, Tashkhandi M, et al. Harassment and discrimination in medical training: a systematic review and meta-analysis. Acad Med. 2014;89:817-27. https://doi.org/10.1097/ACM.0000000000000200
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1097/ACM.0000000000000200
  • 15
    Tartas M, Walkiewicz M, Majkowicz M, Budzinski W. Psychological factors determining success in a medical career: a 10-year longitudinal study. Med Teach. 2011;33:e163-72. https://doi.org/10.3109/0142159X.2011.544795
    » https://doi.org/https://doi.org/10.3109/0142159X.2011.544795
  • 16
    De Andrade AP, Amaro Junior E, Farhat SC, Schvartsman C. Higher burnout scores in paediatric residents are associated with increased brain activity during attentional functional magnetic resonance imaging task. Acta Paediatr. 2016;105:705-13. https://doi.org/10.1111/apa.13371
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1111/apa.13371
  • 17
    Dyrbye LN, West CP, Satele D, Boone S, Tan L, Sloan J, et al. Burnout among U.S. medical students, residents, and early career physicians relative to the general U.S. population. Acad Med. 2014;89:443-51. https://doi.org/10.1097/ACM.0000000000000134
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1097/ACM.0000000000000134
  • 18
    Freed GL, McGuinness GA, Moran LM, Spera L, Althouse LA. New pediatricians: first jobs and future workplace goals. Pediatrics. 2015;135:701-6. https://doi.org/10.1542/peds.2014-3372
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1542/peds.2014-3372
  • 19
    Kohno T, Kosaka S, Takei Y, Fukuda K, Ozaki Y, Yamashina A. Time trend in interest and satisfaction towards clinical training and academic activities among early-career cardiologists - the Japanese circulation society post-graduate training survey. Circ J. 2018;82;423-9. https://doi.org/10.1253/circj.CJ-17-0398
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1253/circj.CJ-17-0398
  • 20
    Horowitz E, Feldman HA, Savich R. Neonatologist salary: factors, equity and gender. J Perinatol. 2019;39:359-65. https://doi.org/10.1038/s41372-018-0304-7
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1038/s41372-018-0304-7
  • 21
    Association of American Medical Colleges [homepage on the Internet]. 2016 physician specialty data report. Washington, DC: Association of American Medical Colleges [cited 2019 Mar 28]. Available from: Available from: https://www.aamc.org/data/workforce/reports/458712/1-3-chart.html
    » https://www.aamc.org/data/workforce/reports/458712/1-3-chart.html
  • 22
    Wang LC, Mittal AG, Puttmann K, Janzen N, Palmer LS, Yerkes EB, et al. The changing gender landscape of pediatric urology fellowship: results from a survey of fellows and recent graduates. J Pediatr Urol. 2019;15:51-7. https://doi.org/10.1016/j.jpurol.2018.09.001
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1016/j.jpurol.2018.09.001
  • 23
    Scheffer MC, Guilloux AG, Poz MR, Schraiber LB. Reasons for choosing the profession and profile of newly qualified physicians in Brazil. Rev Assoc Med Bras. 2016;62:853-61. http://dx.doi.org/10.1590/1806-9282.62.09.853
    » https://doi.org/http://dx.doi.org/10.1590/1806-9282.62.09.853
  • 24
    Miotto BA, Guilloux AG, Cassenote AJ, Mainardi GM, Russo G, Scheffer MC. Physician’s sociodemographic profile and distribution across public and private health care: an insight into physicians’ dual practice in Brazil. BMC Health Serv Res. 2018;18:299. https://doi.org/10.1186/s12913-018-3076-z
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1186/s12913-018-3076-z
  • 25
    Heyman MB, Weiss P, Boyer D, Fussell J, Imundo L, Aye T, et al. Challenges of funding pediatric fellowship programs-invited commentary from the council of pediatric subspecialties. J Pediatr. 2019;204:4-6.e1. https://doi.org/10.1016/j.jpeds.2018.10.006
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1016/j.jpeds.2018.10.006
  • 26
    Portal da demografia médica [homepage on the Internet]. São Paulo, Brazil [cited 2019 Aug 23] Available from: Available from: http://demografiamedica.org.br/atlas-de-especialidades/pediatria/
    » http://demografiamedica.org.br/atlas-de-especialidades/pediatria/
  • 27
    Bogetz JF, Bogetz AL, Gabhart JM, Bergman DA, Blankenburg RL, Rassbach CE. Continuing education needs of pediatricians across diverse specialties caring for children with medical complexity. Clin Pediatr (Phila). 2015;54:222-7. https://doi.org/10.1177/0009922814564049
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1177/0009922814564049
  • 28
    McLaughlin C, Barin E, Ford H, Upperman J, Cassidy L, Burke RV. Formative research experiences in pediatric surgeons: a mixed methods study of Pediatric Trauma Society members. Pediatr Surg Int. 2019;35:495-9. https://doi.org/10.1007/s00383-019-04438-9
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1007/s00383-019-04438-9
  • 29
    Russo G, Sousa B, Sidat M, Ferrinho P, Dussault G. Why do some physicians in Portuguese-speaking African countries work exclusively for the private sector Findings from a mixed-methods study?. Hum Resour Health. 2014;12:51. https://doi.org/10.1186/1478-4491-12-51
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1186/1478-4491-12-51
  • 30
    Koch VR, Doria Filho U, Bollela VR. Assessment of the Medical Residency programs of the Paediatrics Department of the University of São Paulo Medical School in light of the professional profiles of the graduates. Rev Bras Educ Med. 2011:35:454-9. http://dx.doi.org/10.1590/S0100-55022011000400003
    » https://doi.org/http://dx.doi.org/10.1590/S0100-55022011000400003

Financiamento

  • Este estudo foi financiado por bolsas do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico [CNPq 303422/2015-7] para CAS, da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo [FAPESP 2015/03756-4] para CAS e do Núcleo de Apoio à Pesquisa “Saúde da Criança e do Adolescente” da Universidade de São Paulo (NAP-CriAd) para MCS e CAS.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Ago 2020
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    27 Jun 2019
  • Aceito
    02 Out 2019
  • Publicado
    28 Jul 2020
Sociedade de Pediatria de São Paulo R. Maria Figueiredo, 595 - 10o andar, 04002-003 São Paulo - SP - Brasil, Tel./Fax: (11 55) 3284-0308; 3289-9809; 3284-0051 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: rpp@spsp.org.br