Acessibilidade / Reportar erro

Ingestão de cálcio, níveis séricos de vitamina D e obesidade infantil: existe associação?

Resumos

OBJETIVO:

Avaliar a associação da ingestão de cálcio e níveis séricos de vitamina D e a obesidade infantil, por meio de uma revisão integrativa.

FONTES DE DADOS:

A pesquisa foi feita nas bases Pubmed/MedLine, Science Direct e SciELO com publicações de 2001 a 2014. Usaram-se os termos em inglês combinados: "children" e "calcium" ou "children" e "vitamina D" associados, cada um, aos descritores: "obesity", "adiposity" ou "body fat", para todas as bases. Foram incluídos estudos que relacionassem as palavraschave da pesquisa, com delineamento transversal, estudos de coorte e ensaios clínicos. Foram excluídos artigos de revisão ou artigos que não estudaram a associação de interesse.

SÍNTESE DOS DADOS:

Oito artigos fizeram parte dessa revisão, dos quais cinco eram referentes ao cálcio e três abordaram a vitamina D. A maioria dos estudos foi de delineamento longitudinal. Os estudos analisados encontraram associação entre ingestão cálcio e obesidade, especialmente quando consideradas características como idade e sexo. Tem-se observado relação inversa entre concentrações séricas de vitamina D e medidas de adiposidade em crianças. Essas são influenciadas pelo sexo e pelas estações do ano.

CONCLUSÕES:

Os estudos avaliados mostraram associação entre cálcio e vitamina D com a obesidade na infância. Assim, considerando o possível efeito protetor desses micronutrientes em relação à obesidade infantil, as ações preventivas de saúde pública podem ser pautadas com ênfase na educação nutricional.

Crianças; Cálcio; Vitamina D; Obesidade; Adiposidade


OBJECTIVE:

To evaluate the association between calcium intake and serum vitamin D levels and childhood obesity by an integrative review.

DATA SOURCE:

The research was conducted in the databases PubMed/medLine, Science Direct and SciELO with 2001 to 2014 publications. We used the combined terms in English: ''children'' and ''calcium'' or ''children'' and ''vitamin D'' associated with the descriptors: ''obesity'', ''adiposity'' or ''body fat'' for all bases. Cross-sectional and cohort studies, as well as clinical trials, were included. Review articles or those that that have not addressed the association of interest were excluded.

DATA SYNTHESIS:

Eight articles were part of this review, five of which were related to calcium and three to vitamin D. Most studies had a longitudinal design. The analyzed studies found an association between calcium intake and obesity, especially when age and sex were considered. Inverse relationship between serum vitamin D and measures of adiposity in children has been observed and this association was influenced by the sex of the patient and by the seasons of the year.

CONCLUSIONS:

The studies reviewed showed an association between calcium and vitamin D with childhood obesity. Considering the possible protective effect of these micronutrients in relation to childhood obesity, preventive public health actions should be designed, with emphasis on nutritional education.

Children; Calcium; Vitamin D; Obesity; Adiposity


Introdução

A obesidade é considerada um problema de saúde pública que alcança proporções alarmantes a cada ano em todas as regiões do mundo.1Tremblay A, Arguin H. Healthy eating at school to compensate for the activity-related obesigenic lifestyle in children and adolescents: the Quebec experience. Adv Nutr. 2011;2:167S-70S. , 2Buyukinan M, Ozen S, Kokkun S, Saz EU. The relation of vitamin D deficiency with puberty and insulin resistance in obese children and adolescents. J Pediatr Endocrinol Metab. 2012;25:83-7. and 3World Health Organization. Population-based approaches to childhood obesity prevention. Geneva: WHO Document Production Services; 2012. Disponivel em: http://www.who.int/entity/dietphysicalactivity/childhood/WHOnewchildhoodobesityPREVENTION27novHRPRINTOK.pdf De acordo com a Organização Mundial da Saúde, mundialmente, a prevalência de obesidade quase dobrou desde 1980.3World Health Organization. Population-based approaches to childhood obesity prevention. Geneva: WHO Document Production Services; 2012. Disponivel em: http://www.who.int/entity/dietphysicalactivity/childhood/WHOnewchildhoodobesityPREVENTION27novHRPRINTOK.pdf

A prevenção da obesidade na infância é de alta prioridade3World Health Organization. Population-based approaches to childhood obesity prevention. Geneva: WHO Document Production Services; 2012. Disponivel em: http://www.who.int/entity/dietphysicalactivity/childhood/WHOnewchildhoodobesityPREVENTION27novHRPRINTOK.pdf e está associada aos hábitos dietéticos e à prática de atividade física. Contudo, já se sabe que, independentemente da ingestão calórica, outros fatores podem determinar a obesidade infantil, como a nutrigenômica, a nutrição pré-natal e a amamentação, a saúde da microbiota intestinal, o consumo de alimentos com propriedades funcionais e a ingestão de ácidos graxos ômega-3, zinco, vitaminas A, C, D, E, folato e cálcio.4 Esses fatores podem contribuir para a prevenção e auxiliar o tratamento dessa doença.

A deficiência de micronutrientes, como o cálcio e a vitamina D, é frequente em diversos países, independentemente do estado nutricional, porém sua magnitude é maior em crianças com excesso de peso.2Buyukinan M, Ozen S, Kokkun S, Saz EU. The relation of vitamin D deficiency with puberty and insulin resistance in obese children and adolescents. J Pediatr Endocrinol Metab. 2012;25:83-7. , 5Al-Musharaf S, Al-Othman A, Al-Daghri NM, Krishnaswamy S, Yusuf DS, Alkharfy KM, et al. Vitamin D deficiency and calcium intake in reference to increased body mass index in children and adolescents. Eur J Pediatr. 2012;171:1081-6. , 6Astrup A. The role of calcium in energy balance and obesity: the search for mechanisms. Am J Clin Nutr. 2008;88:873-4. and 7Ali HI, Ng SW, Zaghloul S, Harrison GG, Qazaq HS, El Sadig M, et al. High proportion of 6 to 18-year-old children and adolescents in the United Arab Emirates are not meeting dietary recommendations. Nutr Res. 2013;33:447-56. Nesse contexto, o interesse sobre a associação entre o consumo de cálcio e os níveis séricos de vitamina D e as doenças metabólicas em crianças tem ganhado destaque no mundo científico há pelo menos 30 anos.8 Vários são os estudos que tentam esclarecer as mais diversas questões sobre o assunto,6Astrup A. The role of calcium in energy balance and obesity: the search for mechanisms. Am J Clin Nutr. 2008;88:873-4. , 9Zemel MB, Shi H, Greer B, Dirienzo D, Zemel PC. Regulation of adiposity by dietary calcium. FASEB J. 2000;14:1132-8. and 1010 Bendsen N, Hother A, Jensen S, Lorenzen J, Astrup A. Effect of dairy calcium on fecal fat excretion: a randomized crossover trial. Int J Obes (Lond). 2008;32:1816-24. já que a combinação de baixos níveis séricos de 25-hidroxivitamina D (25(OH)D) e inadequada ingestão de cálcio tem sido associada a fatores de risco cardiovasculares, tais como hipertensão, obesidade, síndrome metabólica (SM) e diabetes mellitus tipo 2. 2Buyukinan M, Ozen S, Kokkun S, Saz EU. The relation of vitamin D deficiency with puberty and insulin resistance in obese children and adolescents. J Pediatr Endocrinol Metab. 2012;25:83-7. , 4Bruney TS. Childhood obesity: effects of micronutrients, supplements, genetics, and oxidative stress. J Nurse Pract. 2011:647-53. , 5Al-Musharaf S, Al-Othman A, Al-Daghri NM, Krishnaswamy S, Yusuf DS, Alkharfy KM, et al. Vitamin D deficiency and calcium intake in reference to increased body mass index in children and adolescents. Eur J Pediatr. 2012;171:1081-6. and 8McCarron D, Morris CD, Henry HJ, Stanton JL. Blood pressure and nutrient intake in the United States. Science. 1984;29:1392-8. Ou seja, a combinação da deficiência de ambos os nutrientes merece consideração especial em crianças. 4Bruney TS. Childhood obesity: effects of micronutrients, supplements, genetics, and oxidative stress. J Nurse Pract. 2011:647-53.

Entretanto, as recomendações da ingestão de cálcio e vitamina D não foram propostas para prevenção de doenças crônicas não transmissíveis, visto que os estudos ainda são escassos, inconsistentes e às vezes de baixa qualidade.1111 Holick MF, Binkley NC, Bischoff-Ferrari HA, Gordon CM, Hanley DA, Heaney RP, et al. Evaluation, treatment, and prevention of vitamin D deficiency: an Endocrine Society clinical practice guideline. J Clin Endocrinol Metab. 2011;96:1911-30. Apesar da insuficiência de vitamina D e a baixa ingestão de cálcio serem comumente relatadas, pouco se sabe sobre a ação desses micronutrientes na prevenção e no tratamento de doenças, como a obesidade. Diante do exposto, esta revisão integrativa teve como objetivo avaliar a associação entre o consumo de cálcio e os níveis séricos de vitamina D com o acúmulo de gordura corporal (GC) em crianças.

Método

A pesquisa foi feita por meio de busca nas bases de dados Pubmed/MedLine, Science Direct e SciELO para artigos publicados entre 2001 e junho de 2014. Usaram-se os termos em inglês combinados: "children" e "calcium" ou "children" e "vitamina D" associados, cada um, aos descritores "obesity", "adiposity" ou "body fat", para ambas as bases (fig. 1). Foram usados os parâmetros etários da Organização Mundial de Saúde1212 Organización Mundial de la Salud. La salud de los jóvenes: un reto y una esperanza. Geneva: OMS; 1995. para a definição de "criança" e considerados apenas os artigos que incluíram indivíduos com até nove anos. Foram incluídos estudos que relacionaram as palavras-chave da pesquisa, com delineamento transversal, longitudinal e ensaio clínico; foram excluídos artigos de revisão e artigos que não estudaram a associação entre esses micronutrientes e a obesidade. Três revisores independentes fizeram a pesquisa simultaneamente. As pesquisas foram confrontadas e foram incluídos apenas os estudos selecionados por no mínimo dois pesquisadores.

Figura 1.
Fluxograma detalhado da estratégia de pesquisa e seleção dos estudos.

Resultados

A pesquisa resultou em 216 estudos sobre o tema (91 da busca com o descritor "calcium" e 125 com o descritor "vitamin D"). Inicialmente, foram selecionados 65 artigos para leitura dos resumos com base na relevância dos títulos. Após a leitura dos resumos foram selecionados 10 artigos que se referiam ao estudo da associação entre adiposidade corporal e os micronutrientes de interesse. Entretanto, dois estudos foram excluídos, após a leitura dos textos completos, por não atender aos objetivos dessa revisão. Assim, oito artigos fizeram parte dessa revisão, os quais foram publicados de 2001 a 2014. Dentre os estudos incluídos, cinco1313 Carruth BR, Skinner JD. The role of dietary calcium and other nutrients in moderating body fat in preschool children. Int J Obes Relat Metab Disord. 2001;25:559-66. , 1414 Skinner JD, Bounds W, Carruth BR, Ziegler P. Longitudinal calcium intake is negatively related to children's body fat indexes. J Am Diet Assoc. 2003;103:1626-31. , 1515 Dixon LB, Pellizzon MA, Jawad AF, Tershakovec AM. Calcium and dairy intake and measures of obesity in hyperand normocholesterolemic children. Obes Res. 2005;13:1727-38. , 1616 DeJongh ED, Binkley TL, Specker BL. Fat mass gain is lower in calcium-supplemented than in unsupplemented preschool children with low dietary calcium intakes. Am J Clin Nutr. 2006;84:1123-7. and 1717 Moreira P, Padez C, Mourao I, Rosado V. Dietary calcium and body mass index in Portuguese children. Eur J Clin Nutr. 2005;59:861-7. eram referentes ao cálcio e três1818 Lee HA, Kim YJ, Lee H, Gwak HS, Park EA, Cho SJ, et al. Association of vitamin D concentrations with adiposity indices among preadolescent children in Korea. J Pediatr Endocrinol Metab. 2013;26:849-54. , 2020 Lee SH, Kim SM, Park HS, Choi KM, Cho GJ, Ko BJ, et al. Serum 25-hydroxyvitamin D levels, obesity and the metabolic syndrome among Korean children. Nutr Metab Cardiovasc Dis. 2013;23:785-91. and 2121 Lourenço BH, Willett L, Cardoso WC. Action Study Team FTO genotype, vitamin D status, and weight gain during childhood. Diabetes. 2014;63:808-14. abordaram a vitamina D. A figura 1 apresenta o fluxograma do processo feito até a seleção dos estudos incluídos nesta revisão.

Entre os trabalhos que avaliaram a relação entre a ingestão de cálcio e obesidade, a maioria foi de delineamento longitudinal.1313 Carruth BR, Skinner JD. The role of dietary calcium and other nutrients in moderating body fat in preschool children. Int J Obes Relat Metab Disord. 2001;25:559-66. , 1414 Skinner JD, Bounds W, Carruth BR, Ziegler P. Longitudinal calcium intake is negatively related to children's body fat indexes. J Am Diet Assoc. 2003;103:1626-31. , 1515 Dixon LB, Pellizzon MA, Jawad AF, Tershakovec AM. Calcium and dairy intake and measures of obesity in hyperand normocholesterolemic children. Obes Res. 2005;13:1727-38. and 1616 DeJongh ED, Binkley TL, Specker BL. Fat mass gain is lower in calcium-supplemented than in unsupplemented preschool children with low dietary calcium intakes. Am J Clin Nutr. 2006;84:1123-7. Foi encontrado apenas um estudo transversal.1717 Moreira P, Padez C, Mourao I, Rosado V. Dietary calcium and body mass index in Portuguese children. Eur J Clin Nutr. 2005;59:861-7. A faixa etária variou desde crianças mais jovens1313 Carruth BR, Skinner JD. The role of dietary calcium and other nutrients in moderating body fat in preschool children. Int J Obes Relat Metab Disord. 2001;25:559-66. , 1414 Skinner JD, Bounds W, Carruth BR, Ziegler P. Longitudinal calcium intake is negatively related to children's body fat indexes. J Am Diet Assoc. 2003;103:1626-31. and 1616 DeJongh ED, Binkley TL, Specker BL. Fat mass gain is lower in calcium-supplemented than in unsupplemented preschool children with low dietary calcium intakes. Am J Clin Nutr. 2006;84:1123-7. até indivíduos no fim da infância.1515 Dixon LB, Pellizzon MA, Jawad AF, Tershakovec AM. Calcium and dairy intake and measures of obesity in hyperand normocholesterolemic children. Obes Res. 2005;13:1727-38. and 1717 Moreira P, Padez C, Mourao I, Rosado V. Dietary calcium and body mass index in Portuguese children. Eur J Clin Nutr. 2005;59:861-7.

Na análise dos resultados dos estudos (tabela 1), quatro mostraram uma associação inversa entre a ingestão de cálcio e indicadores de obesidade.1313 Carruth BR, Skinner JD. The role of dietary calcium and other nutrients in moderating body fat in preschool children. Int J Obes Relat Metab Disord. 2001;25:559-66. , 1414 Skinner JD, Bounds W, Carruth BR, Ziegler P. Longitudinal calcium intake is negatively related to children's body fat indexes. J Am Diet Assoc. 2003;103:1626-31. , 1515 Dixon LB, Pellizzon MA, Jawad AF, Tershakovec AM. Calcium and dairy intake and measures of obesity in hyperand normocholesterolemic children. Obes Res. 2005;13:1727-38. and 1717 Moreira P, Padez C, Mourao I, Rosado V. Dietary calcium and body mass index in Portuguese children. Eur J Clin Nutr. 2005;59:861-7. Destaca-se que, desses, apenas o artigo de Skinner et al. 1414 Skinner JD, Bounds W, Carruth BR, Ziegler P. Longitudinal calcium intake is negatively related to children's body fat indexes. J Am Diet Assoc. 2003;103:1626-31. não fez ajustes estatísticos para controle dos fatores de confusão. Algumas particularidades foram verificadas no estudo de Moreira et al. 1717 Moreira P, Padez C, Mourao I, Rosado V. Dietary calcium and body mass index in Portuguese children. Eur J Clin Nutr. 2005;59:861-7. onde essa relação foi observada apenas em meninas. No estudo de Dixon et al., 1515 Dixon LB, Pellizzon MA, Jawad AF, Tershakovec AM. Calcium and dairy intake and measures of obesity in hyperand normocholesterolemic children. Obes Res. 2005;13:1727-38. verificou-se associação somente nas crianças não hipercolesterolêmicas mais velhas (sete a 10 anos). Diferenças nos parâmetros de obesidade dos indivíduos com diferentes ingestões de cálcio foram verificadas no ensaio clínico randomizado feito por DeJongh, Binkley e Specker: 1616 DeJongh ED, Binkley TL, Specker BL. Fat mass gain is lower in calcium-supplemented than in unsupplemented preschool children with low dietary calcium intakes. Am J Clin Nutr. 2006;84:1123-7. nas crianças no menor tercil de ingestão de cálcio dietético (<821mg/dia), o ganho de massa de gordura foi mais baixo (0,3±0,5kg) no grupo suplementado com cálcio (dois tabletes de 500 mg de cálcio elementar como carbonato de cálcio) do que no grupo placebo (0,8±1,1kg).

Tabela 1.
Estudos que avaliaram a associação entre cálcio ou vitamina D e obesidade em crianças, 2001-2014

Dentre os trabalhos que abordaram a relação entre vitamina D e obesidade em crianças, dois foram transversais1818 Lee HA, Kim YJ, Lee H, Gwak HS, Park EA, Cho SJ, et al. Association of vitamin D concentrations with adiposity indices among preadolescent children in Korea. J Pediatr Endocrinol Metab. 2013;26:849-54. and 2020 Lee SH, Kim SM, Park HS, Choi KM, Cho GJ, Ko BJ, et al. Serum 25-hydroxyvitamin D levels, obesity and the metabolic syndrome among Korean children. Nutr Metab Cardiovasc Dis. 2013;23:785-91. e um longitudinal2121 Lourenço BH, Willett L, Cardoso WC. Action Study Team FTO genotype, vitamin D status, and weight gain during childhood. Diabetes. 2014;63:808-14. (tabela 1). Em um estudo com crianças de sete a nove anos na Coreia, Lee et al. 1818 Lee HA, Kim YJ, Lee H, Gwak HS, Park EA, Cho SJ, et al. Association of vitamin D concentrations with adiposity indices among preadolescent children in Korea. J Pediatr Endocrinol Metab. 2013;26:849-54. encontraram associação inversa entre concentrações de vitamina D e IMC, percentual de gordura corporal (%GC), perímetro da cintura, perímetro do braço e dobra cutânea triciptal. Neste trabalho a concentração de 25(OH)D (25 hidroxivitamina D) foi dosada e os níveis foram categorizados em três grupos, de acordo com o Instituto de Medicina (IOM): 1919 Institute of Medicine (US) Committee to review dietary reference intakes for vitamin, D and calcium. Ross AC, Taylor CL, Yaktine AL, Del Valle HB, editors. Dietary reference intakes for calcium and vitamin D. Washington: National Academies Press; 2010. suficiente (≥ 30 ng/mL), insuficiente (20,0-29,9 ng/mL) e deficiente (< 20 ng/mL). Entre as crianças, 84,4% não alcançaram os níveis suficientes de vitamina D e 17,6% estavam deficientes. As meninas tiveram níveis mais elevados de vitamina D do que os meninos. Outro estudo encontrou menores concentrações de vitamina D em crianças obesas em relação às eutróficas. Os valores séricos de Vitamina D estiveram significativamente associados com maiores valores de IMC, perímetro da cintura e triacilgliceróis séricos, além de menores valores de HDL. 2020 Lee SH, Kim SM, Park HS, Choi KM, Cho GJ, Ko BJ, et al. Serum 25-hydroxyvitamin D levels, obesity and the metabolic syndrome among Korean children. Nutr Metab Cardiovasc Dis. 2013;23:785-91. Os autores deste estudo usaram a mesma categorização dos níveis de vitamina D do IOM, porém citaram outra referência. 2222 Holick MF. Vitamin D deficiency. N Engl J Med. 2007;357:266-81. Finalmente, um estudo longitudinal, na região amazônica brasileira, acompanhou crianças de 2007 a 2012 com o objetivo de avaliar o efeito do gene FTO nas modificações do IMC durante a infância, além de verificar se o status de vitamina D poderia modificar esse efeito. Com modelos de regressão múltipla, os autores encontraram efeito do FTO que aumentou o IMC ao longo dos anos e a deficiência de vitamina D (<75nmol/L em 32% da amostra em 2007) e exacerbou esse efeito, ou seja, aumentou ainda mais o IMC. 2121 Lourenço BH, Willett L, Cardoso WC. Action Study Team FTO genotype, vitamin D status, and weight gain during childhood. Diabetes. 2014;63:808-14. Em todos esses estudos que abordam a vitamina D os autores fizeram ajustes para possíveis variáveis de confundimento.

Discussão

Embora o papel do cálcio na obesidade seja amplamente estudado em adultos, observa-se uma escassez de trabalhos com crianças. Dentre os artigos analisados, peculiaridades foram encontradas nos resultados e isso pode estar relacionado a diferenças metodológicas nos estudos, como, por exemplo, métodos de avaliação dietética (recordatório de 20 horas, registros alimentares, questionário de frequência alimentar), bem como o período de tempo avaliado e o ajuste do cálcio dietético por energia ou outros possíveis confundidores nos modelos estatísticos. Além disso, a fonte dietética de cálcio também pode ter influenciado nos efeitos sobre a obesidade. Segundo Zemel & Miller,2323 Zemel MB, Miller SL. Dietary calcium and dairy modulation of adiposity and obesity risk Nutrition reviews. Nutrition Reviews. 2004;62:125-31. o cálcio oriundo de fontes lácteas parece exercer maiores efeitos comparado àquele de fontes suplementares ou fortificadas. Esses efeitos, provavelmente, podem ser atribuídos à presença de outros compostos bioativos dos laticínios que atuam sinergicamente com o cálcio para reduzir a adiposidade.

Os mecanismos envolvidos na relação entre cálcio e obesidade estão apresentados na figura 2. Esses mecanismos ainda não estão completamente elucidados, entretanto alguns estudos fornecem algumas explicações plausíveis.2424 Zemel MB. The role of dairy foods in weight management. J Am Coll Nutr. 2005;24 Suppl 6: 537S-46. and 2525 Major GC, Chaput JP, Ledoux M, St-Pierre S, Anderson GH, Zemel MB, et al. Recent developments in calcium-related obesity research. Obes Rev. 2008;9:428-45. Uma delas é que a baixa ingestão de cálcio aumenta os níveis séricos de calcitriol, o que pode estimular o fluxo de cálcio dos adipócitos por receptores de membrana da vitamina D, identificados como associados à membrana de resposta rápida a esteroides. O aumento dos níveis intracelulares de cálcio, por sua vez, aumenta a atividade da ácido graxo sintase, inibe a expressão da lipase hormônio-sensível, promove a lipogênese, inibe a lipólise e resulta no acúmulo de gordura corporal. Além disso, o calcitriol inibe a expressão da proteína desacopladora-2 (envolvida na regulação do metabolismo, na termogênese induzida pela dieta e controle do peso corporal), por meio dos receptores clássicos de vitamina D nuclear em adipócitos, e aumenta, assim, a eficiência de energia.2424 Zemel MB. The role of dairy foods in weight management. J Am Coll Nutr. 2005;24 Suppl 6: 537S-46. and 2525 Major GC, Chaput JP, Ledoux M, St-Pierre S, Anderson GH, Zemel MB, et al. Recent developments in calcium-related obesity research. Obes Rev. 2008;9:428-45. Adicionalmente, a regulação pelo calcitriol da proteína desacopladora-2 e dos níveis de cálcio intracelular parece desempenhar um efeito sobre o metabolismo da energia ao afetar a apoptose de adipócitos.2424 Zemel MB. The role of dairy foods in weight management. J Am Coll Nutr. 2005;24 Suppl 6: 537S-46.

Figura 2.
Mecanismos sugeridos para explicar a relação entre ingestão de cálcio e obesidade. AGS, Ácido Graxo Sintase; LHS, Lipase Hormônio Sensível; 11 ß-OHE D-1, 11 ß-hidroxiesteroide desidrogenase.

O mecanismo exato pelo qual a ingestão de cálcio induz a redução da obesidade abdominal ainda não está claro, mas a produção de cortisol autócrino do tecido adiposo poderia explicar esse efeito.2424 Zemel MB. The role of dairy foods in weight management. J Am Coll Nutr. 2005;24 Suppl 6: 537S-46. Foi demonstrado que o calcitriol estimula a expressão da 11ß-hidroxiesteroide desidrogenase-1, a qual catalisa a conversão de cortisona a cortisol (envolvido na deposição de gordura principalmente na região abdominal) nos adipócitos. Assim, sugere-se que as dietas ricas em cálcio, ao suprimir os níveis de calcitriol, levam a um menor acúmulo de gordura corporal pela redução da produção de cortisol no tecido adiposo.2626 Morris KL, Zemel MB. 1,25-dihydroxyvitamin D3 modulation of adipocyte glucocorticoid function. Obes Res. 2005;13:670-7.

Outros estudos têm relacionado o papel do cálcio na obesidade pelo efeito desse micronutriente sobre a excreção fecal de gordura e regulação do apetite. O cálcio da dieta e de suplementos pode aumentar a excreção fecal de gordura, por meio da formação de complexos insolúveis no intestino.2424 Zemel MB. The role of dairy foods in weight management. J Am Coll Nutr. 2005;24 Suppl 6: 537S-46. Entretanto, os estudos têm demonstrado que esse efeito é relativamente pequeno (especialmente com o cálcio suplementar).2727 Jacobsen R, Lorenzen JK, Toubro S, Krog-Mikkelsen I, Astrup A. Effect of short-term high dietary calcium intake on 24-h energy expenditure, fat oxidation, and fecal fat excretion. Int J Obes. 2005;29:292-301. and 2828 Christensen R, Lorenzen JK, Svith CR, Bartels EM, Melanson EL, Saris WH, et al. Effect of calcium from dairy and dietary supplements on faecal fat excretion: a meta-analysis of randomized controlled trials. Obes Rev. 2009;10:475-86. Dessa forma, esse mecanismo contribui para o efeito antiobesidade de cálcio, mas não pode explicá-lo completamente.2424 Zemel MB. The role of dairy foods in weight management. J Am Coll Nutr. 2005;24 Suppl 6: 537S-46. , 2525 Major GC, Chaput JP, Ledoux M, St-Pierre S, Anderson GH, Zemel MB, et al. Recent developments in calcium-related obesity research. Obes Rev. 2008;9:428-45. and 2727 Jacobsen R, Lorenzen JK, Toubro S, Krog-Mikkelsen I, Astrup A. Effect of short-term high dietary calcium intake on 24-h energy expenditure, fat oxidation, and fecal fat excretion. Int J Obes. 2005;29:292-301. Sugere-se que a ingestão de cálcio possa interferir na regulação do apetite. Entretanto, esse efeito foi avaliado em poucos estudos e a hipótese não é confirmada.6Astrup A. The role of calcium in energy balance and obesity: the search for mechanisms. Am J Clin Nutr. 2008;88:873-4. and 2929 Dougkas A, Reynolds CK, Givens ID, Elwood PC, Minihane AM. Associations between dairy consumption and body weight: a review of the evidence and underlying mechanisms. NRR. 2011;24:72.

O fato de um dos estudos ter encontrado relação inversa da ingestão de cálcio com parâmetros de obesidade apenas em meninas1717 Moreira P, Padez C, Mourao I, Rosado V. Dietary calcium and body mass index in Portuguese children. Eur J Clin Nutr. 2005;59:861-7. necessita de investigação. Isso pode se relacionar a características intrínsecas ao gênero, já que o aumento no percentual de gordura corporal ocorre mais cedo e com maior intensidade no sexo feminino durante a puberdade. Além disso, os meninos apresentam maior conteúdo de massa corporal magra por centímetro de altura do que as meninas.3030 Menezes AM. Noções basicas de epidemiologia [pagina da Internet]. Epidemiologia das doenças respiratórias Ministério Público de Tocantins [acessado em 11 de junho de 2014]. Disponivel em: http://www.mpto.mp.br/static/caops/patrimonio-publico/files/files/nocoes-de-epidemiologia.pdf
http://www.mpto.mp.br/static/caops/patri...
Moreira et al. 1717 Moreira P, Padez C, Mourao I, Rosado V. Dietary calcium and body mass index in Portuguese children. Eur J Clin Nutr. 2005;59:861-7. levantaram a hipótese de uma possível interação entre o conteúdo de gordura corporal e o cálcio dietético e sugeriram que os efeitos desse micronutriente dependem de um maior percentual de gordura corporal, o que não foi observado nos indivíduos do sexo masculino.

A associação inversa entre a ingestão de cálcio e medidas de adiposidade verificada apenas em crianças mais velhas1515 Dixon LB, Pellizzon MA, Jawad AF, Tershakovec AM. Calcium and dairy intake and measures of obesity in hyperand normocholesterolemic children. Obes Res. 2005;13:1727-38. pode ser explicada pelo padrão de crescimento nessa faixa etária. A GC diminui gradualmente durante os primeiros anos de vida e alcança um conteúdo mínimo entre quatro e seis anos. A partir desse período, as crianças passam pelo "rebote da adiposidade", com um aumento no peso corporal em preparação para o estirão de crescimento puberal.3131 Whitaker RC, Pepe MS, Wright JA, Seidel KD, Dietz WH. Early adiposity rebound and the risk of adult obesity. Pediatrics. 1998;101:E5. DeJongh, Binkley e Specker,1616 DeJongh ED, Binkley TL, Specker BL. Fat mass gain is lower in calcium-supplemented than in unsupplemented preschool children with low dietary calcium intakes. Am J Clin Nutr. 2006;84:1123-7. que estudaram crianças entre três e cinco anos, também sugerem que o efeito da ingestão de cálcio deve ser maior na faixa etária em que a GC está aumentada.

As diferenças encontradas nos parâmetros de obesidade dos indivíduos com menores ingestões de cálcio, comparados com aqueles com maiores ingestões, indicam que o efeito do aumento da ingestão desse micronutriente na GC é mais observado nos indivíduos com baixas ingestões usuais de cálcio.1616 DeJongh ED, Binkley TL, Specker BL. Fat mass gain is lower in calcium-supplemented than in unsupplemented preschool children with low dietary calcium intakes. Am J Clin Nutr. 2006;84:1123-7. Isso pode ser explicado pelo papel do calcitriol na absorção do cálcio. O calcitriol influencia o transporte ativo por aumentar a permeabilidade da membrana, regular a migração de cálcio por meio das células intestinais e aumentar o nível de calbindina.3232 Bronner F, Pansu D. Nutritional aspects of calcium absorption. J Nutr. 1999;129:9-12. and 3333 Guéguen L, Pointillart A. The bioavailability of dietary calcium. J Am Coll Nutr. 2000;19:119S-36S. A fração de cálcio absorvida aumenta conforme sua ingestão diminui, devido a uma adaptação parcial à restrição desse micronutriente, o que resulta no aumento do transporte ativo mediado pelo calcitriol. Assim, o transporte ativo torna-se o principal mecanismo de absorção de cálcio quando a sua ingestão é baixa.3434 Dawson-Hughes B, Harris SS, Finneran S. Calcium absorption on high and low calcium intakes in relation to vitamin D receptor genotype. JCEM. 1995;12:3657-61.

Pode-se perceber que muitos dos mecanismos que explicam a adiposidade e sua associação com os micronutrientes estudados demostram a estreita relação entre o cálcio e a vitamina D presente nos eventos metabólicos da adipogênese. A presença ou ausência de um deles pode trazer prejuízos não apenas ósseos, mas à saúde como um todo. Os mecanismos envolvidos na associação entre obesidade e níveis séricos de vitamina D não são descritos especificamente para crianças. A figura 3 apresenta os possíveis mecanismos envolvidos na relação entre a vitamina D e a obesidade.

Figura 3.
Mecanismos sugeridos para explicar a relação cíclica entre deficiência de vitamina D e o aumento do depósito de gordura corporal. PTH, Paratormônio.

Cabe aqui ressaltar que, apesar de a 25 (OH) D3 (calcidiol) não ser o metabólito mais ativo, é o mais comumente avaliado, já que os níveis plasmáticos da vitamina D ativa, a 1,25 di-hidroxivitamina D (1,25(OH)2D3), são regularmente mantidos em concentração normais; além disso, os níveis plasmáticos de 25(OH)D3 são aproximadamente 100 vezes maiores do que os de 1,25(OH)2D3 e a meia-vida da 1,25(OH)2D3 é de aproximadamente seis horas, enquanto a da 25(OH)D3, de duas a três semanas.1111 Holick MF, Binkley NC, Bischoff-Ferrari HA, Gordon CM, Hanley DA, Heaney RP, et al. Evaluation, treatment, and prevention of vitamin D deficiency: an Endocrine Society clinical practice guideline. J Clin Endocrinol Metab. 2011;96:1911-30.

Quando se comparam os níveis séricos de vitamina D das crianças do estudo de Lourenço2121 Lourenço BH, Willett L, Cardoso WC. Action Study Team FTO genotype, vitamin D status, and weight gain during childhood. Diabetes. 2014;63:808-14. no Brasil com um estudo feito nos Estados Unidos,3535 Gilbert-Diamond D, Baylin A, Mora-Plazas M, Marin C, Arsenault JE, Hughes MD, et al. Vitamin D deficiency and anthropometric indicators of adiposity in school-age children: a prospective study. Am J Clin Nutr. 2010;92:1446-51. observam-se maiores níveis no Brasil. Esse fato está relacionado à maior incidência de luz solar em áreas tropicais e aumenta a conversão da vitamina D em sua forma ativa, que é dosada. Webb, Kline & Holick3636 Webb AR, Kline L, Holick MF. Influence of season and latitude on the cutaneous synthesis of vitamin D3 : exposure to winter sunlight in Boston and Edmonton will not promote vitamin D3 synthesis in human skin. JCEM. 1988;67:373-8. já explicavam esse fenômeno e mostravam que a latitude e as estações afetam a quantidade e qualidade da radiação solar que atinge a terra, especialmente no espectro UVB, e influenciam de forma drástica a síntese de vitamina D cutânea. Acredita-se também que a deficiência de vitamina D pode estar relacionada à falta de exposição solar dos indivíduos obesos, uma vez que são mais sedentários e ficam mais abrigados do sol. Por esses fatores estarem interligados com a piora no quadro da obesidade, não é clara ainda a relação de causa e efeito entre as duas patologias.3737 Schuch NJ, Garcia VC, Martini LA. Vitamin D and endocrine diseases. Arq Bras Endocrinol Metab. 2009;35:625-33.

Lee et al. 1818 Lee HA, Kim YJ, Lee H, Gwak HS, Park EA, Cho SJ, et al. Association of vitamin D concentrations with adiposity indices among preadolescent children in Korea. J Pediatr Endocrinol Metab. 2013;26:849-54. destacaram que as diferenças nos níveis séricos de vitamina D em relação ao gênero podem ser explicadas pelo fato de as meninas alegarem ter uma alimentação mais saudável em todos os quesitos questionados. Por outro lado, essa diferença entre gêneros não foi encontrada em outro estudo. 2020 Lee SH, Kim SM, Park HS, Choi KM, Cho GJ, Ko BJ, et al. Serum 25-hydroxyvitamin D levels, obesity and the metabolic syndrome among Korean children. Nutr Metab Cardiovasc Dis. 2013;23:785-91.

O mecanismo pelo qual a vitamina D influencia a adiposidade corporal não está completamente elucidado, porém existem vertentes que tentam explicar esse fenômeno. A vitamina D é lipossolúvel, por isso é sequestrada e fica armazenada nos adipócitos. Isso reduz a biodisponibilidade dela e aciona o hipotálamo para gerar uma cascata de reações que leva ao aumento da sensação de fome e redução do gasto energético, de modo a compensar a falta da vitamina.3737 Schuch NJ, Garcia VC, Martini LA. Vitamin D and endocrine diseases. Arq Bras Endocrinol Metab. 2009;35:625-33. Entre essas reações está o aumento do hormônio da paratireoide (PTH), que promove lipogênese3838 Sun X, Zemel MB. 1Alfa, 25-dihydroxyvitamin D and corticosteroid regulate adipocyte nuclear vitamin D receptor. Int J Obes (Lond). 2008;32:1305-11. and 3939 McCarty MF, Thomas CA. PTH. excess may promote weight gain by impeding catecholamine-induced lipolysis-implications for the impact of calcium, vitamin D, and alcohol on body weight. Med Hypotheses. 2003;61:535-42. e pode modular a adipogênese por meio da supressão do receptor de vitamina D, que inibe compostos envolvidos na diferenciação e maturação dos adipócitos.3939 McCarty MF, Thomas CA. PTH. excess may promote weight gain by impeding catecholamine-induced lipolysis-implications for the impact of calcium, vitamin D, and alcohol on body weight. Med Hypotheses. 2003;61:535-42. and 4040 Wood RJ. Vitamin D and adipogenesis: new molecular insights. Nutr Rev. 2008;66:40-6. De maneira geral, percebe-se que o aumento da GC pode agravar a deficiência de vitamina D que, por sua vez, pode aumentar ainda mais o acúmulo de gordura e gerar um ciclo (fig. 3).

Para essa revisão, é necessário considerar a possibilidade de vieses de publicação, pois nota-se uma tendência de que resultados positivos sejam mais publicados. Alguns estudos1717 Moreira P, Padez C, Mourao I, Rosado V. Dietary calcium and body mass index in Portuguese children. Eur J Clin Nutr. 2005;59:861-7. , 1818 Lee HA, Kim YJ, Lee H, Gwak HS, Park EA, Cho SJ, et al. Association of vitamin D concentrations with adiposity indices among preadolescent children in Korea. J Pediatr Endocrinol Metab. 2013;26:849-54. and 2020 Lee SH, Kim SM, Park HS, Choi KM, Cho GJ, Ko BJ, et al. Serum 25-hydroxyvitamin D levels, obesity and the metabolic syndrome among Korean children. Nutr Metab Cardiovasc Dis. 2013;23:785-91. que avaliaram a associação do cálcio e vitamina D com a obesidade apresentaram delineamento transversal. É importante considerar a existência de algumas limitações, com destaque para a causalidade reversa, já que a exposição e o desfecho são coletados simultaneamente.3030 Menezes AM. Noções basicas de epidemiologia [pagina da Internet]. Epidemiologia das doenças respiratórias Ministério Público de Tocantins [acessado em 11 de junho de 2014]. Disponivel em: http://www.mpto.mp.br/static/caops/patrimonio-publico/files/files/nocoes-de-epidemiologia.pdf
http://www.mpto.mp.br/static/caops/patri...
Além disso, é importante levar em conta que um dos estudos1414 Skinner JD, Bounds W, Carruth BR, Ziegler P. Longitudinal calcium intake is negatively related to children's body fat indexes. J Am Diet Assoc. 2003;103:1626-31. não fez ajustes para fatores de confusão nas análises estatísticas, além do pequeno tamanho amostral usado por outros,1313 Carruth BR, Skinner JD. The role of dietary calcium and other nutrients in moderating body fat in preschool children. Int J Obes Relat Metab Disord. 2001;25:559-66. and 1414 Skinner JD, Bounds W, Carruth BR, Ziegler P. Longitudinal calcium intake is negatively related to children's body fat indexes. J Am Diet Assoc. 2003;103:1626-31. o que pode contribuir para conclusões equivocadas. Finalmente, vale ainda enfatizar que se reconhece a importância da avaliação da qualidade dos estudos nas revisões sistemáticas. Entretanto, destacamos que as listas e escalas de qualidade existentes usadas para esse processo de avaliação contêm questões voltadas para ensaios clínicos. Nessa revisão, foi incluído apenas um ensaio clínico e, assim, tal avaliação não foi aplicada.

Considerações finais

A associação entre o cálcio e a vitamina D com a obesidade é complexa e muito ainda há de ser elucidado. No tocante ao cálcio, os estudos que avaliam a associação da ingestão e medidas de obesidade na infância têm encontrado resultados importantes quando são consideradas características como a idade e o sexo dos indivíduos. Em relação à vitamina D, os estudos são recentes e promissores. Todos mostram associação inversa entre concentrações séricas de vitamina D e obesidade ou medidas de adiposidade em crianças. Essa associação é influenciada por estações do ano e pelo sexo dos indivíduos.

Já é consenso que os hábitos alimentares e comportamentais nas idades mais tenras podem afetar a vida adulta. Com isso, a necessidade de mais estudos cuja amostra seja composta exclusivamente por crianças é extremamente relevante, principalmente os de delineamento longitudinal, uma vez que podem esclarecer a relação de causalidade entre essas associações. O cálcio e a vitamina D, avaliados tanto pela ingestão dietética quanto por marcadores bioquímicos, mostraram-se associados à obesidade.

Assim, considerando o efeito protetor da ingestão desses nutrientes em relação à obesidade infantil, as ações de saúde pública para prevenção podem ser pautadas principalmente na educação nutricional, por ser de fácil acesso e baixo custo, e auxiliar consequentemente as condutas de prevenção das doenças crônicas associadas ao sobrepeso e à obesidade ao longo da vida.

References

  • 1
    Tremblay A, Arguin H. Healthy eating at school to compensate for the activity-related obesigenic lifestyle in children and adolescents: the Quebec experience. Adv Nutr. 2011;2:167S-70S.
  • 2
    Buyukinan M, Ozen S, Kokkun S, Saz EU. The relation of vitamin D deficiency with puberty and insulin resistance in obese children and adolescents. J Pediatr Endocrinol Metab. 2012;25:83-7.
  • 3
    World Health Organization. Population-based approaches to childhood obesity prevention. Geneva: WHO Document Production Services; 2012. Disponivel em: http://www.who.int/entity/dietphysicalactivity/childhood/WHOnewchildhoodobesityPREVENTION27novHRPRINTOK.pdf
  • 4
    Bruney TS. Childhood obesity: effects of micronutrients, supplements, genetics, and oxidative stress. J Nurse Pract. 2011:647-53.
  • 5
    Al-Musharaf S, Al-Othman A, Al-Daghri NM, Krishnaswamy S, Yusuf DS, Alkharfy KM, et al. Vitamin D deficiency and calcium intake in reference to increased body mass index in children and adolescents. Eur J Pediatr. 2012;171:1081-6.
  • 6
    Astrup A. The role of calcium in energy balance and obesity: the search for mechanisms. Am J Clin Nutr. 2008;88:873-4.
  • 7
    Ali HI, Ng SW, Zaghloul S, Harrison GG, Qazaq HS, El Sadig M, et al. High proportion of 6 to 18-year-old children and adolescents in the United Arab Emirates are not meeting dietary recommendations. Nutr Res. 2013;33:447-56.
  • 8
    McCarron D, Morris CD, Henry HJ, Stanton JL. Blood pressure and nutrient intake in the United States. Science. 1984;29:1392-8.
  • 9
    Zemel MB, Shi H, Greer B, Dirienzo D, Zemel PC. Regulation of adiposity by dietary calcium. FASEB J. 2000;14:1132-8.
  • 10
    Bendsen N, Hother A, Jensen S, Lorenzen J, Astrup A. Effect of dairy calcium on fecal fat excretion: a randomized crossover trial. Int J Obes (Lond). 2008;32:1816-24.
  • 11
    Holick MF, Binkley NC, Bischoff-Ferrari HA, Gordon CM, Hanley DA, Heaney RP, et al. Evaluation, treatment, and prevention of vitamin D deficiency: an Endocrine Society clinical practice guideline. J Clin Endocrinol Metab. 2011;96:1911-30.
  • 12
    Organización Mundial de la Salud. La salud de los jóvenes: un reto y una esperanza. Geneva: OMS; 1995.
  • 13
    Carruth BR, Skinner JD. The role of dietary calcium and other nutrients in moderating body fat in preschool children. Int J Obes Relat Metab Disord. 2001;25:559-66.
  • 14
    Skinner JD, Bounds W, Carruth BR, Ziegler P. Longitudinal calcium intake is negatively related to children's body fat indexes. J Am Diet Assoc. 2003;103:1626-31.
  • 15
    Dixon LB, Pellizzon MA, Jawad AF, Tershakovec AM. Calcium and dairy intake and measures of obesity in hyperand normocholesterolemic children. Obes Res. 2005;13:1727-38.
  • 16
    DeJongh ED, Binkley TL, Specker BL. Fat mass gain is lower in calcium-supplemented than in unsupplemented preschool children with low dietary calcium intakes. Am J Clin Nutr. 2006;84:1123-7.
  • 17
    Moreira P, Padez C, Mourao I, Rosado V. Dietary calcium and body mass index in Portuguese children. Eur J Clin Nutr. 2005;59:861-7.
  • 18
    Lee HA, Kim YJ, Lee H, Gwak HS, Park EA, Cho SJ, et al. Association of vitamin D concentrations with adiposity indices among preadolescent children in Korea. J Pediatr Endocrinol Metab. 2013;26:849-54.
  • 19
    Institute of Medicine (US) Committee to review dietary reference intakes for vitamin, D and calcium. Ross AC, Taylor CL, Yaktine AL, Del Valle HB, editors. Dietary reference intakes for calcium and vitamin D. Washington: National Academies Press; 2010.
  • 20
    Lee SH, Kim SM, Park HS, Choi KM, Cho GJ, Ko BJ, et al. Serum 25-hydroxyvitamin D levels, obesity and the metabolic syndrome among Korean children. Nutr Metab Cardiovasc Dis. 2013;23:785-91.
  • 21
    Lourenço BH, Willett L, Cardoso WC. Action Study Team FTO genotype, vitamin D status, and weight gain during childhood. Diabetes. 2014;63:808-14.
  • 22
    Holick MF. Vitamin D deficiency. N Engl J Med. 2007;357:266-81.
  • 23
    Zemel MB, Miller SL. Dietary calcium and dairy modulation of adiposity and obesity risk Nutrition reviews. Nutrition Reviews. 2004;62:125-31.
  • 24
    Zemel MB. The role of dairy foods in weight management. J Am Coll Nutr. 2005;24 Suppl 6: 537S-46.
  • 25
    Major GC, Chaput JP, Ledoux M, St-Pierre S, Anderson GH, Zemel MB, et al. Recent developments in calcium-related obesity research. Obes Rev. 2008;9:428-45.
  • 26
    Morris KL, Zemel MB. 1,25-dihydroxyvitamin D3 modulation of adipocyte glucocorticoid function. Obes Res. 2005;13:670-7.
  • 27
    Jacobsen R, Lorenzen JK, Toubro S, Krog-Mikkelsen I, Astrup A. Effect of short-term high dietary calcium intake on 24-h energy expenditure, fat oxidation, and fecal fat excretion. Int J Obes. 2005;29:292-301.
  • 28
    Christensen R, Lorenzen JK, Svith CR, Bartels EM, Melanson EL, Saris WH, et al. Effect of calcium from dairy and dietary supplements on faecal fat excretion: a meta-analysis of randomized controlled trials. Obes Rev. 2009;10:475-86.
  • 29
    Dougkas A, Reynolds CK, Givens ID, Elwood PC, Minihane AM. Associations between dairy consumption and body weight: a review of the evidence and underlying mechanisms. NRR. 2011;24:72.
  • 30
    Menezes AM. Noções basicas de epidemiologia [pagina da Internet]. Epidemiologia das doenças respiratórias Ministério Público de Tocantins [acessado em 11 de junho de 2014]. Disponivel em: http://www.mpto.mp.br/static/caops/patrimonio-publico/files/files/nocoes-de-epidemiologia.pdf
    » http://www.mpto.mp.br/static/caops/patrimonio-publico/files/files/nocoes-de-epidemiologia.pdf
  • 31
    Whitaker RC, Pepe MS, Wright JA, Seidel KD, Dietz WH. Early adiposity rebound and the risk of adult obesity. Pediatrics. 1998;101:E5.
  • 32
    Bronner F, Pansu D. Nutritional aspects of calcium absorption. J Nutr. 1999;129:9-12.
  • 33
    Guéguen L, Pointillart A. The bioavailability of dietary calcium. J Am Coll Nutr. 2000;19:119S-36S.
  • 34
    Dawson-Hughes B, Harris SS, Finneran S. Calcium absorption on high and low calcium intakes in relation to vitamin D receptor genotype. JCEM. 1995;12:3657-61.
  • 35
    Gilbert-Diamond D, Baylin A, Mora-Plazas M, Marin C, Arsenault JE, Hughes MD, et al. Vitamin D deficiency and anthropometric indicators of adiposity in school-age children: a prospective study. Am J Clin Nutr. 2010;92:1446-51.
  • 36
    Webb AR, Kline L, Holick MF. Influence of season and latitude on the cutaneous synthesis of vitamin D3 : exposure to winter sunlight in Boston and Edmonton will not promote vitamin D3 synthesis in human skin. JCEM. 1988;67:373-8.
  • 37
    Schuch NJ, Garcia VC, Martini LA. Vitamin D and endocrine diseases. Arq Bras Endocrinol Metab. 2009;35:625-33.
  • 38
    Sun X, Zemel MB. 1Alfa, 25-dihydroxyvitamin D and corticosteroid regulate adipocyte nuclear vitamin D receptor. Int J Obes (Lond). 2008;32:1305-11.
  • 39
    McCarty MF, Thomas CA. PTH. excess may promote weight gain by impeding catecholamine-induced lipolysis-implications for the impact of calcium, vitamin D, and alcohol on body weight. Med Hypotheses. 2003;61:535-42.
  • 40
    Wood RJ. Vitamin D and adipogenesis: new molecular insights. Nutr Rev. 2008;66:40-6.
  • Financiamento O estudo não recebeu financiamento.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Apr-Jun 2015

Histórico

  • Recebido
    10 Abr 2014
  • Aceito
    14 Ago 2014
Sociedade de Pediatria de São Paulo R. Maria Figueiredo, 595 - 10o andar, 04002-003 São Paulo - SP - Brasil, Tel./Fax: (11 55) 3284-0308; 3289-9809; 3284-0051 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: rpp@spsp.org.br