Acessibilidade / Reportar erro

Fatores associados à cárie: pesquisa de estudantes do sul do Brasil

Resumo

Objetivo:

Descrever os fatores associados à cárie dentária em escolares de Santa Cruz do Sul, Rio Grande do Sul, Brasil.

Métodos:

Um estudo transversal foi feito em uma amostra aleatória de 623 estudantes de ambos os sexos, entre 10 e 17 anos. A cárie dentária foi avaliada com o índice da Organização Mundial de Saúde (1997) CPO-D (dentição permanente), que constitui a soma de dentes cariados, perdidos e obturados por pessoa. A escolaridade materna foi avaliada com os critérios da Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa. As demais variáveis foram obtidas com um questionário estruturado. A análise de regressão de Poisson foi usada para testar a associação entre as variáveis, com modelos consistentes e um modelo ajustado posteriormente. Os dados foram expressos como razão de prevalência (RP).

Resultados:

A análise multivariada identificou os seguintes fatores relacionados à experiência de cárie dentária: residência em municípios rurais (RP: 1,15; IC95%: 1,0-1,3), frequentar uma escola municipal (RP: 3,30; IC95%: 1,1-9,4) ou estadual (RP: 3,40; IC95%: 1,1-9,6); e ter uma mãe analfabeta ou uma mãe que só estudou até a 4ª série do Ensino Fundamental (RP: 1,67; IC95%: 1,1-2,4) ou o ensino médio (RP: 1,54; IC95%: 1,1-2,2).

Conclusões:

A presença de cárie em alunos no sul do Brasil foi associada com residência em áreas rurais, mãe com baixo nível educacional e frequentar escola pública.

PALAVRAS-CHAVE
Cáries dentárias; Epidemiologia; Estudantes

Abstract

Objective:

To describe the factors associated with dental caries among students from Santa Cruz do Sul, Rio Grande do Sul, Brazil.

Methods:

A cross-sectional study was conducted in a random sample of 623 students of both genders, aged 10-17 years old. Tooth decay was performed using the index of the World Health Organization (1997), DMFT (permanent dentition) that expresses the sum of decayed, missing and filled teeth per person. The maternal educational level was rated using criteria of the Brazilian Association of Market Research Companies. The remaining variables were obtained by a structured questionnaire. Poisson regression analysis was used to test the association between variables using robust models and a subsequently adjusted model. Data were expressed as prevalence ratio (PR).

Results:

Multivariate analysis identified the following factors related to the experience of dental caries: residence in rural municipalities (PR: 1.15; 95%CI: 1.0-1.3), attending a city school (PR: 3.30; 95%CI: 1.1-9.4) or a state school (PR: 3.40; 95%CI: 1.1-9.6); and having an illiterate mother or a mother that only attended up to the 4th year of school (PR: 1.67; 95%CI: 1.1-2.4) or high school (PR: 1.54; 95%CI: 1.1-2.2).

Conclusions:

The presence of caries in students in southern Brazil was associated with residence in rural areas, mother with little education and attendance to a public school.

KEYWORDS
Dental caries; Epidemiology; Students

Introdução

De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), a prevalência de cárie dentária em escolares é de 90% em alguns países.11 Petersen PE, Bourgeois D, Ogawa H, Estupinan-Day S, Ndiaye C. The global burden of oral diseases and risks to oral health. Bull World Health Organ. 2005;83:661-9. No Brasil, a prevalência em crianças é de 53,4% e em adolescentes, de 56,5%.22 Secretaria de Atenção a Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Pesquisa Nacional de Saúde Bucal: resultados principais. Brasília: Ministério da Saúde; 2012. A cárie dentária é uma das doenças orais mais pesquisadas33 Bönecker M, Pucca Junior GA, Costa PB, Pitts N. A social movement to reduce caries prevalence in the world. Braz Oral Res. 2013;27:5-6.,44 Prazai Dixit L, Shakya A, Shrestha M, Shrestha A. Dental caries prevalence, oral health knowledge and practice among indigenous Chepang school children of Nepal. BMC Oral Health. 2013;13:1-5. e resulta de um processo crônico, que ocorre após um certo período de exposição a uma dieta cariogênica e da susceptibilidade dos dentes a microrganismos. A cárie é considerada uma condição multifatorial transmitida localmente e é uma das patologias mais comuns na infância.55 Arora A, Scott JA, Bhole S, Do L, Schwarz E, Blinkhorn AS. Early childhood feeding practices and dental caries in preschool children: a multi-centre birth cohort study. BMC Public Health. 2011;11:2-7.,66 Harris J. Dental neglect in children. Paed Dent. 2012;22:476-82.

Fatores de risco para cárie dentária incluem o fluxo e a composição salivares, bactérias cariogênicas presentes, exposição inadequada ao flúor, componentes imunológicos e fatores genéticos.77 Featherstone JD, Adair SM, Anderson MH, Berkowitz RJ, Bird WF, Crall JJ, et al. Caries management by risk assessment: consensus statement, April 2002. J Calif Dent Assoc. 2003;31:257-69.

8 Thomson WM. Dental caries experience in older people over time: what can the large cohort studies tell us? Br Dent J. 2004;196:89-92.
-99 Anderson M. Risk assessment and epidemiology of dental caries: review of the literature. Pediatr Dent. 2002;24:377-85. No entanto, outros fatores, como estilo de vida, comportamento, higiene, hábitos alimentares, nível social e fatores sociodemográficos, também contribuem para a evolução da cárie.66 Harris J. Dental neglect in children. Paed Dent. 2012;22:476-82.,1010 Fejerskov O, Kidd EA. Dental caries: the disease and its clinical management. Copenhagen: Blackwell Monksgaard; 2003.

11 Selwitz RH, Ismail AI, Pitts NB. Dental caries. Lancet. 2007;369:51-9.
-1212 Castilho AR, Mialhe FL, Barbosa Tde S, Puppin-Rontani RM. Influence of family environment on children's oral health: a systematic review. J Pediatr (Rio J). 2013;89:116-23. Doenças orais afetam as atividades diárias; entre essas atividades, aumento do absenteísmo1313 World Health Organization. The World Oral Health Report 2003: continuous improvement of oral health in the 21st century - the approach of the WHO Global Oral Health Programme. Geneva: WHO; 2003. e diminuição do desempenho escolar e no trabalho têm impactos econômicos e psicológicos generalizados e podem levar a reduções significativas na qualidade de vida do indivíduo.1414 Seirawan H, Faust S, Mulligan R. The impact of oral health on the academic performance of disadvantaged children. Am J Public Health. 2012;102:1729-34.,1515 Çolak K, Çoruh T, Dülgergil MD, Hamidi MM. Early childhood caries update: a review of causes, diagnoses, and treatments. J Nat Sci Biol Med. 2013;4:29-38. Nesse contexto, o presente estudo teve como objetivo descrever fatores associados à cárie dentária entre os escolares da cidade de Santa Cruz do Sul, Rio Grande do Sul, Brasil.

Método

Um estudo transversal de 623 estudantes de ambos os sexos, entre 10-17 anos, foi conduzido de abril a dezembro de 2012. A amostra foi composta por alunos de escolas públicas e privadas na cidade de Santa Cruz do Sul, Rio Grande do Sul, Brasil.

Santa Cruz do Sul tem uma população de 118.374 habitantes, segundo o censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).1616 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE [homepage on the Internet]. Diretoria de Pesquisas - DPE-Coordenação de População e Indicadores sociais - COPIS. Available from: http://www.cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?lang=&codmun=431680&search=rio-grandedo-sul|santa-cruz-do-sul [cited 29.01.16].
http://www.cidades.ibge.gov.br/xtras/per...
Na área urbana do município existem 105.190 habitantes e na área rural, 13.184 habitantes. O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é de 0,773. A cidade tem 99% dos domicílios atendidos por água potável com fluoretação adequada. O município tem 64 estabelecimentos do Sistema Único de Saúde (SUS), 12 Unidades Básicas de Saúde (UBS) (quatro na área rural e oito na área urbana) e, entre eles, seis têm cirurgiões dentistas. Dez equipes são dedicadas à Estratégia de Saúde da Família (uma na área rural e nove na urbana) e quatro delas têm equipe de saúde bucal. Em 2012, 14.899 matrículas foram feitas no ensino fundamental (1.751 em escolas privadas, 6.958 em escolas públicas municipais e 6.190 em escolas públicas estaduais). No ensino médio, houve 4.010 matrículas (765 em escolas privadas e 3.245 em escolas públicas).1717 Município de Santa Cruz do Sul [homepage on the Internet]. Secretaria de Educação e Cultura [cited 29.01.16]. Available from: http://www.santacruz.rs.gov.br/secretarias/educacao-e-cultura
http://www.santacruz.rs.gov.br/secretari...

A população de referência para o estudo consistiu de 20.540 alunos de escolas de ensino fundamental e secundário da rede de ensino público e privado da cidade de Santa Cruz do Sul, estratificada por área rural versus urbana e, ainda, por centro e periferia: norte, sul, leste ou oeste. A cidade tem 69 escolas: oito são privadas, todas na área urbana, 30 são da cidade e 31 municipais. Na área rural, há seis escolas estaduais e 16 municipais.1717 Município de Santa Cruz do Sul [homepage on the Internet]. Secretaria de Educação e Cultura [cited 29.01.16]. Available from: http://www.santacruz.rs.gov.br/secretarias/educacao-e-cultura
http://www.santacruz.rs.gov.br/secretari...
Para calcular o tamanho da amostra, foi usado o programa Epi-Info (Centers for Disease Control and Prevention, Atlanta, GA, EUA, versão 7). A prevalência de cárie dentária usada para o cálculo foi de 56%,22 Secretaria de Atenção a Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Pesquisa Nacional de Saúde Bucal: resultados principais. Brasília: Ministério da Saúde; 2012. com poder de 80% e um erro padrão de 5%. Com base nesses parâmetros, o tamanho mínimo da amostra foi estimado em 362 alunos. Quando as variáveis de confusão foram adicionadas para controlar o efeito em 20% e 20% para perdas e recusas, a amostra necessária foi estimada em 522 alunos.

Os critérios de inclusão foram: formulário de consentimento livre e informado assinado por um dos pais/responsáveis pelo estudante; o adolescente estava disposto e capaz de fazer o exame da cavidade oral; estava devidamente matriculado na escola dentro da faixa etária de 10-17 anos. Ambos os sexos foram incluídos no estudo. Os adolescentes eram excluídos do estudo se estivessem ausente da escola no momento da avaliação da saúde bucal ou se não permitissem a avaliação ou se não preenchessem os questionários corretamente. Foram feitas duas tentativas de avaliação da saúde bucal por aluno.

Para avaliar a cárie dentária, um examinador fez a calibração, inicialmente, e o teste kappa mostrou uma correlação de K=0,90. A calibração feita entre o examinador do estudo e um pesquisador com vasta experiência. A avaliação da saúde bucal foi feita no laboratório de pesquisa da universidade por um pesquisador previamente treinado. A avaliação seguiu o protocolo do Projeto SB Brasil.22 Secretaria de Atenção a Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Pesquisa Nacional de Saúde Bucal: resultados principais. Brasília: Ministério da Saúde; 2012. Durante o exame oral, o aluno e o pesquisador permaneceram sentados em cadeiras em frente a uma janela, a fim de obter o máximo de iluminação natural. A duração média do exame odontológico foi de 10min. O exame foi feito com uma sonda WHO (OMS) e um espelho dental número 5, todos embalados em papel cirúrgico e autoclavados. Radiografias não foram feitas, enfatizou-se pré-secagem e escovação ou profilaxia dos dentes foi feita antes do exame. Todos os códigos e critérios foram registrados em fichas individuais para cada aluno. O índice usado foi o CPO-D (dentes cariados, perdidos e obturados/restaurados). O índice CPO-D mede, em uma população específica, o número médio por pessoa de: dentes cariados permanentes que necessitam de obturação ou extração (C), dentes permanentes perdidos que foram removidos como resultado de cárie (P) e dentes permanentes obturados/restaurados (O). Às vezes, os componentes separados do índice CPO-D são usados como uma medida de serviços (por exemplo, o componente O é uma indicação de tratamento dentário de dentes cariados) e o componente P pode sugerir que tipos de cuidados dentários foram ou não recebidos (por exemplo, um alto índice de componente P sugere que os dentes foram extraídos como resultado de cárie não tratada).

O nível de escolaridade materna foi avaliado com um questionário adaptado com os critérios da Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (Abep).1818 Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa. Critério de Classificação Econômica no Brasil. Brasil: ABEP; 2009. Três categorias foram usadas: analfabetos ou alfabetizados que cursaram até o 4º ano do Ensino Fundamental, Ensino Médio e Ensino Superior. A idade dos alunos foi definida pelos critérios da OMS1919 World Health Organization. Young people's health - a challenge for society. Report of a WHO study group on young people and health for all. Geneva: WHO; 1986. da seguinte forma: fase inicial da adolescência (10-13 anos), intermediária (14-16 anos) e final (17-19 anos).

A higiene oral foi avaliada com um questionário adaptado de Barros e Nahas,2020 Barros MV, Nahas MV. Medidas da atividade física: teoria e aplicação em diversos grupos populacionais. Londrina: Midiograf; 2003. com questões relacionadas à frequência de uso do fio dental e escovação dos dentes. Também usamos um questionário autoadministrado sobre os hábitos alimentares proposto por Barros e Nahas,2020 Barros MV, Nahas MV. Medidas da atividade física: teoria e aplicação em diversos grupos populacionais. Londrina: Midiograf; 2003. com questões relacionadas à frequência de consumo de alimentos doces, lanches e refrigerantes.

A análise dos dados foi feita com o software Statistical Package for Social Sciences (SPSS) versão 20.0 para Windows (IBM Corp. Lançado 2011, Armonk, NY: IBM Corp, EUA). O nível de significância usado foi de 5%. Os dados foram descritos como percentuais absolutos e relativos. O teste qui-quadrado analisou a associação da cárie dentária com outras variáveis. A análise de regressão de Poisson foi usada para verificar a associação entre as variáveis dependentes (CPO-D ≥1) e as independentes, com modelos substanciais; para esses modelos, níveis de significância de p-valor<0,05 ou p-valor<0,20 foram adotados. O modelo ajustado incluiu as variáveis que foram consideradas significantes (p-valor<0,05).

O projeto de pesquisa foi submetido ao e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de Santa Cruz do Sul, sob o protocolo 3.044/11, em conformidade com a Declaração de Helsinque. Todos os estudantes que participaram do estudo tiveram os formulários de consentimento informado assinado pelos pais ou responsáveis registrados.

Resultados

Foram avaliados 623 estudantes, com média de 13,5 anos; desses, 57,9% eram do sexo feminino, 50,1% residiam na área urbana, 65,3% estudavam em escolas públicas e 59,2% tinham mães que eram analfabetas ou que tinham quatro anos ou menos de escolaridade. Os estudantes relataram consumir doces e refrigerantes 2-6 vezes por semana e na maior parte das vezes consumiam batatas chips uma vez por semana. Em relação aos hábitos de higiene oral dos estudantes, 83,1% escovavam os dentes 1-3 vezes por dia e a frequência de uso do fio dental foi relatada como “às vezes” por 52% dos estudantes. A presença de cárie dentária mostrou associações positivas com área de residência, tipo de escola, nível de escolaridade da mãe e frequência de uso do fio dental. A média do índice CPO-D foi de 2,5 (tabela 1), o que significa que cada criança tinha uma média de 2,5 dentes cariados, perdidos ou obturados/restaurados na boca no momento da avaliação.

Tabela 1
Caracterização dos estudantes (n=623)

Como mostrado na tabela 2, os estudantes que viviam na área rural do município eram 25% mais propensos a desenvolver cárie dentária (CPO-D≥1) em comparação com aqueles que viviam na área urbana. Os alunos que frequentavam escolas municipais ou estaduais tinham uma probabilidade cinco vezes maior de desenvolver cárie dentária em comparação com os de escolas privadas. Estudantes com mães cuja escolaridade ia apenas até o 4º ano do Ensino Fundamental tinham duas vezes mais probabilidade de desenvolver cárie dentária em comparação com filhos de mães que tinham mais escolaridade. No entanto, os alunos com mães que tinham concluído o Ensino Médio tinham aproximadamente 81% mais chance de desenvolver cáries em comparação com os estudantes cujas mães tinham ensino superior completo. Em relação aos hábitos de higiene bucal, o uso do fio dental “às vezes” teve um efeito protetor de 20% em comparação com a probabilidade de cárie e em comparação com o hábito de não usar o fio dental.

Tabela 2
Associações entre o índice CPOD≥1 e as seguintes variáveis específicas: área de residência, tipo de escola, nível educacional materno, hábitos alimentares e hábitos de higiene oral (frequências de escovação e uso de fio dental)

A tabela 3 apresenta a análise ajustada para fatores de confusão. Viver em uma área rural, ter uma mãe com um nível de escolaridade inferior e frequentar uma escola pública municipal ou estadual foram independentemente associados com a presença de cárie dentária.

Tabela 3
Associações entre CPOD ≥ 1 e outras variáveis: área de residência, tipo de escola, nível de escolaridade materna e hábitos de higiene oral, ajustadas por sexo e idade

Discussão

Este estudo demonstrou uma associação independente entre índices CPO-D≥dos estudantes e variáveis sociodemográficas, tais como: viver em áreas rurais, estar matriculado em escolas públicas municipais ou estaduais e ser filho de mãe com menor escolaridade.

Análises descritivas da média do índice CPO-D (2,5) indicaram uma boa saúde bucal nessa população quando comparada com o contexto brasileiro. Dados da Pesquisa Nacional de Saúde Bucal feita em 2010 mostraram que o índice CPO-D aos 12 anos era de 2,06; aos 15-19 anos, de 4,01.22 Secretaria de Atenção a Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Pesquisa Nacional de Saúde Bucal: resultados principais. Brasília: Ministério da Saúde; 2012. Para a Organização Mundial de Saúde, esse resultado é considerado de baixa severidade, está dentro da variação de 1,2-2,6.2121 World Health Organization. Levantamento epidemiológico básico de saúde bucal: manual de instruções. 3rd ed. São Paulo: Editora Santos; 1991. Isso significa que, em média, cada criança tem 1,2-2,6 dentes cariados, perdidos ou obturados/restaurados na boca.

Os alunos que viviam em áreas rurais tinham uma maior probabilidade de desenvolver cáries dentárias em comparação com alunos de áreas urbanas. Estudos feitos na Grécia,2222 Oulis CJ, Tsinidou K, Vadiakas G, Mamai-Homata E, Polychronopoulou A, Athanasouli T. Caries prevalence of 5, 12 and 15-year-old Greek children: a national pathfinder survey. Community Dent Health. 2012;29:29-32.,2323 Panagidis D, Schulte AG. Caries prevalence in 12-year-old Cypriot children. Community Dent Health. 2012;29:297-301. Austrália,2424 Christian B, Blinkhorn AS. A review of dental caries in Australian Aboriginal children: the health inequalities perspective. Rural Remote Health. 2012;12:1-11. no Paquistão2525 Sufia S, Chaudhry S, Izhar F, Syed A, Mirza BA, Khan AA. Dental caries experience in preschool children: is it related to a child's place of residence and family income? Oral Health Prev Dent. 2011;9:375-9. e Brasil2626 Bastos RS, Silva RP, Maia-Junior AF, Carvalho FS, Merlini S, Caldana ML, et al. Dental caries profile in Monte Negro, Amazonian state of Rondônia Brazil, in 2008. J Appl Oral Sci. 2010;18:437-41.,2727 Antunes JL, Peres MA, de Campos Mello TR, Waldman EA. Multilevel assessment of determinants of dental caries experience in Brazil. Community Dent Oral Epidemiol. 2006;34:146-52. mostraram uma maior prevalência de cáries dentárias e necessidades de tratamento em estudantes de áreas rurais. Esse resultado pode estar fortemente associado com a má condição de saúde e o acesso limitado aos serviços de saúde da população do interior, o que enfatiza a urgência de concentrar a atenção sobre essas áreas para fornecer aos seus moradores informações sobre saúde, com equipes de profissionais treinados para satisfazer as suas necessidades.2626 Bastos RS, Silva RP, Maia-Junior AF, Carvalho FS, Merlini S, Caldana ML, et al. Dental caries profile in Monte Negro, Amazonian state of Rondônia Brazil, in 2008. J Appl Oral Sci. 2010;18:437-41.

Em relação ao tipo de escola, alunos de escolas públicas tinham aproximadamente cinco vezes mais probabilidade de desenvolver cárie dentária em comparação com alunos de escolas particulares. Da mesma forma, um estudo feito em Porto Alegre, Brasil,2828 Maltz M, Barbachan e Silva B. Relação entre cárie, gengivite e fluorose e nível socioeconômico em escolares. Rev Saude Publica. 2001;35:170-6. mostrou que os estudantes da rede pública de ensino vinham de famílias com níveis de escolaridade mais baixos e que os alunos da rede particular de ensino vinham de famílias com renda mais elevada. Em nosso estudo, 59,2% das mães dos estudantes eram analfabetas ou tinham, no máximo, completado apenas o 4º ano do Ensino Fundamental, em contraste com 9,1% dos estudantes cujas mães tinham ensino superior completo.

Vários estudos na literatura têm abordado a relação entre o estado da saúde oral e menor renda e, consequentemente, com pais menos escolarizados. Na maioria dos casos, o acesso limitado à informação e comportamentos negativos relacionados à saúde estão associados a esses resultados e atenção especial deve ser dada a esse grupo.1212 Castilho AR, Mialhe FL, Barbosa Tde S, Puppin-Rontani RM. Influence of family environment on children's oral health: a systematic review. J Pediatr (Rio J). 2013;89:116-23.,2929 Chi DL, Rossitch KC, Beeles EM. Developmental delays and dental caries in low-income preschoolers in the USA: a pilot cross-sectional study and preliminary explanatory model. BMC Oral Health. 2013;13:53.

30 Ravera E, Sanchez GA, Squassi AF, Bordoni N. Relationship between dental status and family, school and socioeconomic level. Acta Odontol Latinoam. 2012;25:140-9.

31 Ayele FA, Taye TA, Ayele TA, Gelaye KA. Predictors of dental caries among children 7-14 years old in Northwest Ethiopia: a community based cross-sectional study. BMC Oral Health. 2013;13:2-6.
-3232 Ferreira SH, Béria JU, Kramer PF, Feldens EG, Feldens CA. Dental caries in 0- to 5-year-old Brazilian children: prevalence, severity, and associated factors. Int J Paediatri Dent. 2007;17:289-96. No nosso estudo, em relação à higiene oral, a maioria das crianças em idade escolar escovava os dentes diariamente (1-3 vezes/dia), mas 2,9% relataram escovar os dentes 1-3 vezes por semana ou não escovar os dentes em absoluto. Em relação ao uso do fio dental, a maioria dos escolares relatou o uso de fio dental somente às vezes. As práticas de higiene oral ruins estão diretamente associadas com as condições da saúde bucal, especialmente em relação ao desenvolvimento de cáries dentárias.3333 Dawani N, Nisar N, Khan N, Syed S, Tanweer N. Prevalence and factors related to dental caries among pre-school children of Saddar town, Karachi, Pakistan: a cross-sectional study. BMC Oral Health. 2012;12:2-9.

Um estudo feito na Tailândia, com 1.156 alunos com seis anos e 1.116 alunos com 12 anos demonstrou uma associação positiva entre o desenvolvimento da cárie dentária e práticas inadequadas de higiene oral.3434 Petersen PE, Hoerup N, Poomviset N, Prommajan J, Watanapa A. Oral health status and oral health behaviour of urban and rural schoolchildren in Southern Thailand. Int Dent J. 2001;51:95-102. Uma pesquisa feita em Clementina e Gabriel Monteiro, no Brasil, mostrou que quanto mais cedo as crianças iniciavam boas práticas de higiene oral, menor era a prevalência inicial de cárie dentária.3535 Tiano A, Moimaz S, Saliba O, Saliba NA. Dental caries prevalence in children up to 36 months of age attending daycare centers in municipalities with different water fluoride content. J Appl Oral Sci. 2009;17:39-44.

As limitações deste estudo são inerentes a estudos transversais, que não permitem estabelecer uma relação de causa e efeito. No entanto, deve notar-se que a amostra foi representativa do município estudado, com seleção aleatória de todos os estudantes de escolas públicas e privadas, de áreas urbanas e áreas rurais. Os resultados deste estudo só podem ser generalizados para populações com características semelhantes às dos adolescentes estudados.

Em resumo, este estudo demonstrou que os estudantes que residem em áreas rurais, estudantes de escolas estaduais e municipais e estudantes filhos de mães com menor escolaridade apresentaram um CPO-D≥1. Além disso, ações diretas com vistas à implantação de programas educacionais e preventivos sobre os temas de higiene e autocuidado são necessárias, especialmente para pais e comunidades escolares em áreas rurais.

  • Financiamento
    O presente artigo recebeu financiamento através de bolsas de pesquisa das seguintes instituições: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), pelo financiamento pelo Programa de Suporte à Pós-Graduação de Instituições de Ensino Particulares (Prosup), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pelos subsídios do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (Pibic), Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (Fapergs)/Bolsa de Iniciação Científica (BIC), Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc)/Programa Unisc de Iniciação Científica (Puic).

Agradecimentos

Agradecemos aos alunos de graduação e pós-graduação que ajudaram a coleta de dados.

References

  • 1
    Petersen PE, Bourgeois D, Ogawa H, Estupinan-Day S, Ndiaye C. The global burden of oral diseases and risks to oral health. Bull World Health Organ. 2005;83:661-9.
  • 2
    Secretaria de Atenção a Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Pesquisa Nacional de Saúde Bucal: resultados principais. Brasília: Ministério da Saúde; 2012.
  • 3
    Bönecker M, Pucca Junior GA, Costa PB, Pitts N. A social movement to reduce caries prevalence in the world. Braz Oral Res. 2013;27:5-6.
  • 4
    Prazai Dixit L, Shakya A, Shrestha M, Shrestha A. Dental caries prevalence, oral health knowledge and practice among indigenous Chepang school children of Nepal. BMC Oral Health. 2013;13:1-5.
  • 5
    Arora A, Scott JA, Bhole S, Do L, Schwarz E, Blinkhorn AS. Early childhood feeding practices and dental caries in preschool children: a multi-centre birth cohort study. BMC Public Health. 2011;11:2-7.
  • 6
    Harris J. Dental neglect in children. Paed Dent. 2012;22:476-82.
  • 7
    Featherstone JD, Adair SM, Anderson MH, Berkowitz RJ, Bird WF, Crall JJ, et al. Caries management by risk assessment: consensus statement, April 2002. J Calif Dent Assoc. 2003;31:257-69.
  • 8
    Thomson WM. Dental caries experience in older people over time: what can the large cohort studies tell us? Br Dent J. 2004;196:89-92.
  • 9
    Anderson M. Risk assessment and epidemiology of dental caries: review of the literature. Pediatr Dent. 2002;24:377-85.
  • 10
    Fejerskov O, Kidd EA. Dental caries: the disease and its clinical management. Copenhagen: Blackwell Monksgaard; 2003.
  • 11
    Selwitz RH, Ismail AI, Pitts NB. Dental caries. Lancet. 2007;369:51-9.
  • 12
    Castilho AR, Mialhe FL, Barbosa Tde S, Puppin-Rontani RM. Influence of family environment on children's oral health: a systematic review. J Pediatr (Rio J). 2013;89:116-23.
  • 13
    World Health Organization. The World Oral Health Report 2003: continuous improvement of oral health in the 21st century - the approach of the WHO Global Oral Health Programme. Geneva: WHO; 2003.
  • 14
    Seirawan H, Faust S, Mulligan R. The impact of oral health on the academic performance of disadvantaged children. Am J Public Health. 2012;102:1729-34.
  • 15
    Çolak K, Çoruh T, Dülgergil MD, Hamidi MM. Early childhood caries update: a review of causes, diagnoses, and treatments. J Nat Sci Biol Med. 2013;4:29-38.
  • 16
    Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE [homepage on the Internet]. Diretoria de Pesquisas - DPE-Coordenação de População e Indicadores sociais - COPIS. Available from: http://www.cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?lang=&codmun=431680&search=rio-grandedo-sul|santa-cruz-do-sul [cited 29.01.16].
    » http://www.cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?lang=&codmun=431680&search=rio-grandedo-sul|santa-cruz-do-sul
  • 17
    Município de Santa Cruz do Sul [homepage on the Internet]. Secretaria de Educação e Cultura [cited 29.01.16]. Available from: http://www.santacruz.rs.gov.br/secretarias/educacao-e-cultura
    » http://www.santacruz.rs.gov.br/secretarias/educacao-e-cultura
  • 18
    Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa. Critério de Classificação Econômica no Brasil. Brasil: ABEP; 2009.
  • 19
    World Health Organization. Young people's health - a challenge for society. Report of a WHO study group on young people and health for all. Geneva: WHO; 1986.
  • 20
    Barros MV, Nahas MV. Medidas da atividade física: teoria e aplicação em diversos grupos populacionais. Londrina: Midiograf; 2003.
  • 21
    World Health Organization. Levantamento epidemiológico básico de saúde bucal: manual de instruções. 3rd ed. São Paulo: Editora Santos; 1991.
  • 22
    Oulis CJ, Tsinidou K, Vadiakas G, Mamai-Homata E, Polychronopoulou A, Athanasouli T. Caries prevalence of 5, 12 and 15-year-old Greek children: a national pathfinder survey. Community Dent Health. 2012;29:29-32.
  • 23
    Panagidis D, Schulte AG. Caries prevalence in 12-year-old Cypriot children. Community Dent Health. 2012;29:297-301.
  • 24
    Christian B, Blinkhorn AS. A review of dental caries in Australian Aboriginal children: the health inequalities perspective. Rural Remote Health. 2012;12:1-11.
  • 25
    Sufia S, Chaudhry S, Izhar F, Syed A, Mirza BA, Khan AA. Dental caries experience in preschool children: is it related to a child's place of residence and family income? Oral Health Prev Dent. 2011;9:375-9.
  • 26
    Bastos RS, Silva RP, Maia-Junior AF, Carvalho FS, Merlini S, Caldana ML, et al. Dental caries profile in Monte Negro, Amazonian state of Rondônia Brazil, in 2008. J Appl Oral Sci. 2010;18:437-41.
  • 27
    Antunes JL, Peres MA, de Campos Mello TR, Waldman EA. Multilevel assessment of determinants of dental caries experience in Brazil. Community Dent Oral Epidemiol. 2006;34:146-52.
  • 28
    Maltz M, Barbachan e Silva B. Relação entre cárie, gengivite e fluorose e nível socioeconômico em escolares. Rev Saude Publica. 2001;35:170-6.
  • 29
    Chi DL, Rossitch KC, Beeles EM. Developmental delays and dental caries in low-income preschoolers in the USA: a pilot cross-sectional study and preliminary explanatory model. BMC Oral Health. 2013;13:53.
  • 30
    Ravera E, Sanchez GA, Squassi AF, Bordoni N. Relationship between dental status and family, school and socioeconomic level. Acta Odontol Latinoam. 2012;25:140-9.
  • 31
    Ayele FA, Taye TA, Ayele TA, Gelaye KA. Predictors of dental caries among children 7-14 years old in Northwest Ethiopia: a community based cross-sectional study. BMC Oral Health. 2013;13:2-6.
  • 32
    Ferreira SH, Béria JU, Kramer PF, Feldens EG, Feldens CA. Dental caries in 0- to 5-year-old Brazilian children: prevalence, severity, and associated factors. Int J Paediatri Dent. 2007;17:289-96.
  • 33
    Dawani N, Nisar N, Khan N, Syed S, Tanweer N. Prevalence and factors related to dental caries among pre-school children of Saddar town, Karachi, Pakistan: a cross-sectional study. BMC Oral Health. 2012;12:2-9.
  • 34
    Petersen PE, Hoerup N, Poomviset N, Prommajan J, Watanapa A. Oral health status and oral health behaviour of urban and rural schoolchildren in Southern Thailand. Int Dent J. 2001;51:95-102.
  • 35
    Tiano A, Moimaz S, Saliba O, Saliba NA. Dental caries prevalence in children up to 36 months of age attending daycare centers in municipalities with different water fluoride content. J Appl Oral Sci. 2009;17:39-44.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2016

Histórico

  • Recebido
    24 Set 2015
  • Aceito
    21 Fev 2016
Sociedade de Pediatria de São Paulo R. Maria Figueiredo, 595 - 10o andar, 04002-003 São Paulo - SP - Brasil, Tel./Fax: (11 55) 3284-0308; 3289-9809; 3284-0051 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: rpp@spsp.org.br