RESUMO
Objetivo:
Avaliar o perfil de desenvolvimento cognitivo e acadêmico de recém-nascidos pré-termo em idade escolar e indicar os fatores relacionados à prematuridade e ao perfil sociodemográfico que influenciam esse resultado.
Métodos:
Recrutaram-se pacientes com idades entre 6 e 14 anos que fizeram seguimento no ambulatório de acompanhamento de prematuros. As capacidades cognitiva, acadêmica e neurológica foram acessadas por avaliação pormenorizada com neuropediatra, neuropsicóloga e psicopedagoga. Buscaram-se os dados neonatais nos prontuários.
Resultados:
Foram incluídos 97 recém-nascidos pré-termo e excluídos 14, resultando em 83 crianças. A idade gestacional foi 30±3 semanas e o peso de nascimento 1138g (605; 4185g). Tiveram mau desempenho em escrita 38,4%, leitura 57,5% e matemática 42,5%. A média de quociente de inteligência total foi de 96,0±14,9 pontos, sendo 10,9% considerados alterados. Crianças com famílias desestruturadas apresentaram 78,3% de falha de leitura (p=0,029). Pela regressão multivariada, houve relação entre idade gestacional ao nascimento e pontuação no miniexame do estado mental (minimental) clássico (p=0,043), quociente de inteligência total (p=0,047), quociente de inteligência organização perceptual (p=0,035) e quociente de inteligência velocidade de processamento (p=0,036); entre peso ao nascer e minimental clássico (p=0,004) e adaptado (p=0,007); entre tempo de ventilação mecânica invasiva e minimental clássico (p=0,049); e entre idade materna mais baixa e quociente de inteligência velocidade de processamento (p=0,033).
Conclusões:
Os recém-nascidos pré-termo apresentaram alta frequência de falha nos testes de avaliação cognitiva e acadêmica. Uma série de intercorrências neonatais apresenta associação com alterações no desenvolvimento cognitivo e escolar.
Palavras-chave:
Recém-nascido prematuro; Deficiências da aprendizagem; Deficiências do desenvolvimento
ABSTRACT
Objective:
To evaluate the cognitive and academic profile of preterm newborns at school age and to determine the factors related to prematurity and sociodemographic profile that influence these results.
Methods:
Patients aged 6-14 years old that were assisted in the preterm follow-up clinic were recruited. The cognitive, academic, and neurological capacities were accessed through a detailed evaluation with a child neurologist, a neuropsychologist and a psychopedagogue. Neonatal data were collected from patient records.
Results:
97 children were included and 14 were excluded from the study, resulting in 83 children. Gestational age (GA) was 30±3 weeks and weight at birth was 1138g (605 to 4185g). Poor performance was shown in 38.4% for writing, 57.5% for reading and 42.5% for mathematics. The mean total intelligence quotient (IQ) was 96±14.9 points, and 10.9% were considered altered. Children with unstructured families presented 78.3% of failure in reading tests (p=0.029). The multivariate analysis showed association between GA at birth and classic mini-mental score (p=0.043), total IQ (p=0.047), perceptual organization IQ (p=0.035), and processing speed IQ (p=0.036). There was also association between weight at birth and the classic (p=0.004) and adapted (p=0.007) mini-mental scores; invasive mechanic ventilation duration and classic mini-mental (p=0.049); and lower maternal age and processing speed IQ (p=0.033).
Conclusions:
Preterm infants at school age had high frequency of failure in cognitive and academic evaluation tests. Learning difficulties are high among them. Multiple neonatal variables are related with altered cognitive and students development.
Keywords:
Infant, premature; Learning disabilities; Developmental disabilities
INTRODUÇÃO
Apesar do avanço terapêutico das últimas décadas no cuidado de recém-nascidos pré-termo (RNPT), as taxas de sequelas em longo prazo têm se mantido bastante elevadas.11. Mangin KS, Horwood LJ, Woodward LJ. Cognitive development trajectories of very preterm and typically developing children. Child Dev. 2017;88:282-98. https://doi.org/10.1111/cdev.12585
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Cerca de 10 a 15% dos RNPT que sobrevivem ao período neonatal apresentam sequelas neurológicas ou sensoriais graves, como deficiência intelectual grave, paralisia cerebral (PC) tetraespástica ou cegueira e necessitam de suporte para o desempenho das atividades diárias por toda a vida.22. Haslam MD, Lisonkova S, Creighton D, Church P, Yang J, Shah PS, et al. Severe neurodevelopmental impairment in neonates born preterm: impact of varying definitions in a Canadian cohort. J Pediatr. 2018;197:75-81. https://doi.org/10.1016/j.jpeds.2017.12.020
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Dos demais, de 30 a 60% apresentará dificuldades menores, como deficiência intelectual leve, atraso no desenvolvimento da linguagem e problemas emocionais e de comportamento.11. Mangin KS, Horwood LJ, Woodward LJ. Cognitive development trajectories of very preterm and typically developing children. Child Dev. 2017;88:282-98. https://doi.org/10.1111/cdev.12585
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Considerando os recém-nascidos prematuros extremos (RNPTE), aqueles nascidos abaixo de 28 semanas de idade gestacional (IG), o índice de sequelas graves pode ser ainda mais alto, chegando a 32%, considerando deficiências como deficiência intelectual (25%), PC (11%) e autismo (7%), apresentadas isoladamente ou em múltiplas associações.33. Hirschberger RG, Kuban KC, O’Shea TM, Joseph RM, Heeren T, Douglass LM, et al. Co-occurrence and severity of neurodevelopmental burden (cognitive impairment, cerebral palsy, autism spectrum disorder, and epilepsy) at age ten years in children born extremely preterm. Pediatr Neurol. 2018;79:45-52 https://doi.org/10.1016/j.pediatrneurol.2017.11.002
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Os fatores que mais causam impacto negativo no desenvolvimento e aumentam o risco de atrasos e deficiências, especialmente a cognitiva, são a baixa IG e o baixo peso. Outros fatores perinatais que aumentam o risco para o desenvolvimento de deficiência intelectual grave são a hemorragia peri-intraventricular (HPIV) grave, a leucomalácia periventricular cística, o uso de corticoide após o nascimento e a submissão a grandes procedimentos cirúrgicos.44. Cheong JL, Lee KJ, Boland RA, Spittle AJ, Opie GF, Burnett AC, et al. Changes in long-term prognosis with increasing postnatal survival and the occurrence of postnatal morbidities in extremely preterm infants offered intensive care: a prospective observational study. Lancet Child Adolesc Heal. 2018;2:872-9. https://doi.org/10.1016/s2352-4642(18)30287-6
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Mas também exercem influência o sexo masculino, a etnia (não branca), a baixa renda e a baixa escolaridade parental.55. Linsell L, Johnson S, Wolke D, O’Reilly H, Morris JK, Kurinczuk JJ, et al. Cognitive trajectories from infancy to early adulthood following birth before 26 weeks of gestation: a prospective, population-based cohort study. Arch Dis Child. 2018;103:363-70. https://doi.org/10.1136/archdischild-2017-313414
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Como fatores protetores, podemos elencar presença do aleitamento materno, maior renda familiar e inserção em programas de estimulação precoce e de suporte educacional preventivo.66. Spittle AJ, Treyvaud K, Lee KJ, Anderson PJ, Doyle LW. The role of social risk in an early preventative care programme for infants born very preterm: a randomized controlled trial. Dev Med Child Neurol. 2018;60:54-62. https://doi.org/10.1111/dmcn.13594
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,77. Vieira ME, Linhares MB. Developmental outcomes and quality of life in children born preterm at preschool- and school-age. J Pediatr (Rio J). 2011;87:281-91. https://doi.org/10.2223/jped.2096
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Tendo em vista o alto risco para atrasos no desenvolvimento, uma série de métodos e testes de triagem foi criada e implementada em ambulatórios de seguimento de RNPT em todo mundo, com altos índices de sucesso e retorno social. Contudo, até o momento, não é possível determinar com precisão, por meio de escalas e testes de desenvolvimento tradicionais, quais RNPT apresentarão dificuldade escolar.88. Bright HR, Babata K, Allred EN, Erdei C, Kuban KC, Joseph RM, et al. Neurocognitive outcomes at 10 years of age in extremely preterm newborns with late-onset bacteremia. J Pediatr. 2017;187:43-9. https://doi.org/10.1016/j.earlhumdev.2018.04.017
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,99. Wong HS, Santhakumaran S, Cowan FM, Modi N. Developmental assessments in preterm children: a meta-analysis. Pediatrics. 2016;138:e20160251. https://doi.org/10.1542/peds.2016-0251
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,1010. O’Shea TM, Joseph RM, Allred EN, Taylor HG, Leviton A, Heeren T, et al. Accuracy of the Bayley-II Mental Development Index at 2 Years as a predictor of cognitive impairment at school age among children born extremely preterm. Journal of Perinatology. 2018;38:908-16. https://doi.org/10.1038/s41372-017-0020-8
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Um dos motivos apontados para essa dificuldade reside no fato de que a aprendizagem (particularmente leitura, escrita e matemática) é uma função cognitiva complexa determinada, modificada e modulada por fatores não apenas biológicos, mas também ambientais e socioculturais.1111. Meister EK, Bruck I, Antoniuk SA, Crippa AC, Muzzolon SR, Spessatto A, et al. Learning disabilities: analysis of 69 children. Arq Neuro-Psiquiatr. 2001;59:338-41. https://doi.org/10.1590/s0004-282x2001000300005
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,1212. Rotta NT, Ohlweiler L, Riesgo RS, editors. Transtornos da aprendizagem, abordagem neurobiológica e multidisciplinar. Porto Alegre: Artmed; 2015. Limitações metodológicas tornam mais difícil a avaliação e a compreensão de habilidades sociais complexas dos RNPT quando atingem a idade escolar.1313. Ritchie K, Bora S, Woodward LJ. Social development of children born very preterm: a systematic review. Dev Med Child Neurol. 2015;57:899-918. https://doi.org/10.1111/dmcn.12783
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Os RNPT possuem um risco aumentado de desenvolver Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), cuja prevalência é de 20 a 25% nessa população, e a gravidade de sintomas é inversamente proporcional ao peso de nascimento e à IG.88. Bright HR, Babata K, Allred EN, Erdei C, Kuban KC, Joseph RM, et al. Neurocognitive outcomes at 10 years of age in extremely preterm newborns with late-onset bacteremia. J Pediatr. 2017;187:43-9. https://doi.org/10.1016/j.earlhumdev.2018.04.017
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,1414. Franz AP, Bolat GU, Bolat H, Matijasevich A, Santos IS, Silveira RC, et al. Attention-deficit/hyperactivity disorder and very preterm/very low birth weight: a meta-analysis. Pediatrics. 2018;141:e20171645. https://doi.org/10.1542/peds.2017-1645
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Da mesma maneira, a frequência de deficiência intelectual (DI) entre os RNPT chega a índices como 25 a 41%, sendo maiores entre os RNPTE.33. Hirschberger RG, Kuban KC, O’Shea TM, Joseph RM, Heeren T, Douglass LM, et al. Co-occurrence and severity of neurodevelopmental burden (cognitive impairment, cerebral palsy, autism spectrum disorder, and epilepsy) at age ten years in children born extremely preterm. Pediatr Neurol. 2018;79:45-52 https://doi.org/10.1016/j.pediatrneurol.2017.11.002
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,1515. Linsell L, Malouf R, Johnson S, Morris J, Kurinczuk JJ, Marlow N. Prognostic factors for behavioral problems and psychiatric disorders in children born very preterm or very low birth weight: a systematic review. J Dev Behav Pediatr. 2016;37:88-102. https://doi.org/10.1097/dbp.0000000000000238
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,1616. Serenius F, Ewald U, Farooqi A, Fellman V, Hafström M, Hellgren K, et al. Neurodevelopmental outcomes among extremely preterm infants 6.5 years after active perinatal care in Sweden. JAMA Pediatr. 2016;170:954-63. https://doi.org/10.1001/jamapediatrics.2016.1210
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Quando comparados a crianças nascidas a termo, os RNPT de qualquer IG apresentam de 11 a 15 pontos a menos de quociente de inteligência (QI) que crianças nascidas a termo.1717. Riechi TI, Moura-Ribeiro MV, Ciasca SM. Impact of preterm birth and low birth weight on the cognition, behavior and learning of school-age children. Rev Paul Pediatr. 2011;29:495-501. https://doi.org/10.1590/S0103-05822011000400005
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,1818. Brydges CR, Landes JK, Reid CL, Campbell C, French N, Anderson M. Cognitive outcomes in children and adolescents born very preterm: a meta-analysis. Dev Med Child Neurol. 2018;60:452-68. https://doi.org/10.1111/dmcn.13685
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Entre os RNPT, aqueles que crescem em ambiente social desfavorável apresentam maior risco para o desenvolvimento de deficiência intelectual.1919. Pittet-Metrailler MP, Mürner-Lavanchy I, Adams M, Graz MB, Pfister RE, Natalucci G, et al. Neurodevelopmental outcome at early school age in a Swiss national cohort of very preterm children. Swiss Med Wkly. 2019;149:1-9. https://doi.org/10.4414/smw.2019.20084
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De forma similar, os RNPT apresentam maiores prevalências2020. Taylor R, Pascoe L, Scratch S, Doyle LW, Anderson P, Roberts G. A simple screen performed at school entry can predict academic under-achievement at age seven in children born very preterm. J Paediatr Child Health. 2016;52:759-64. https://doi.org/10.1111/jpc.13186
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de dificuldades em leitura (22%), escrita (20%) e matemática (40%) e cerca de 2,8 vezes mais chances de necessitar de assistência educacional especial que seus pares nascidos a termo.2121. Twilhaar ES, Kieviet JF, Aarnoudse-Moens CS, Elburg RM, Oosterlaan J. Academic performance of children born preterm: a meta-analysis and meta-regression. Arch Dis Child Fetal Neonatal Ed. 2018;103:322-30. https://doi.org/10.1136/archdischild-2017-312916
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O objetivo deste estudo foi realizar um levantamento do perfil nacional de deficiência intelectual e dificuldades escolares em RNPT acompanhados em um ambulatório de seguimento para crianças com risco para o desenvolvimento, bem como identificar quais fatores relacionados à prematuridade e ao perfil sociodemográfico possam estar relacionados a esses desfechos, em virtude da escassez de dados a respeito do desenvolvimento cognitivo em longo prazo dos RNPT que sobreviveram sem sequelas graves.
MÉTODO
Trata-se de estudo observacional analítico transversal ambispectivo. O estudo foi conduzido entre novembro de 2015 e setembro de 2019. A avaliação dos pacientes e a coleta de dados deram-se entre novembro de 2015 e abril de 2019.
Consideraram-se critérios de inclusão: os pais ou responsáveis assinarem o termo de consentimento livre e esclarecido; os pacientes assinarem o termo de assentimento, quando aplicável; IG igual ou inferior a 36 semanas ao nascimento, de acordo com dados registrados no prontuário (levando em conta o cálculo de IG ecográfico por ecografia realizada até a 12ª semana de IG e dado cronológico-menstrual); ter nascido entre 2003 e 2012; ter comparecido ao menos a três consultas no ambulatório de neuropuericultura. Consideraram-se critérios de exclusão: pacientes que após avaliação médica inicial apresentaram evidente DI, autismo ou outro transtorno do neurodesenvolvimento de acordo com os critérios clínicos estabelecidos no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais2222. American Psychiatric Association. Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders. Porto Alegre: Artmed ; 2014.; pacientes matriculados em escolas especiais.
Utilizou-se a base de dados do ambulatório para entrar em contato telefônico com os pais dos pacientes que se encaixaram nos critérios de inclusão e exclusão, por meio dos números telefônicos de cadastro no hospital, a fim de convidá-los a participar da pesquisa.
A verificação do desenvolvimento neuropsicomotor das crianças em idade escolar foi realizada por exame clínico e aplicação de testes por neuropediatra. Os testes aplicados foram a lista de verificação de sintomas pediátrica (instrumento de simples e rápida aplicação em que os pais ou cuidadores assinalam a presença de sintomas referentes à saúde mental da criança e os graduam entre muito presentes ou medianamente presentes),2323. Muzzolon SR. Avaliação do uso da lista de sintomas pediátricos como instrumento para a triagem de problemas emocionais e psicossociais em uma escola pública de Curitiba. Curitiba (PR): Universidade Federal do Paraná; 2008. o questionário de Vanderbilt para desatenção e hiperatividade para preenchimento pelos pais (composto de perguntas objetivas sobre o comportamento da criança e que gradua os sintomas em quatro categorias para cada item: nunca, ocasionalmente, frequentemente e muito frequentemente, sendo considerados alterados quando assinaladas as duas últimas categorias. São nove itens para desatenção e nove para hiperatividade, o questionário é considerado alterado quando assinalados acima de seis itens para cada),2424. Vargas NC. Seguimento até a idade escolar de recém-nascidos prematuros e a termo com intercorrências neonatais. Curitiba (PR): Universidade Federal do Paraná ; 2010. o miniexame do estado mental (minimental) clássico (teste de triagem cognitiva de rápida aplicação que avalia orientação, memória imediata, atenção e cálculo, recordação, linguagem e cópia-praxia visuo-construtiva), o minimental adaptado para a faixa etária pediátrica (avalia orientação, atenção, concentração, percepção sensorial, memória imediata, linguagem e praxia visuo-construtiva)2525. Lorenzon SF. Utilização do instrumento “mini-mental state examination” em crianças escolares de 6 a 11 anos da rede de ensino particular de Porto Alegre, RS, Brasil. Porto Alegre (RS): Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2001.,2626. Santos LH, Pimentel RF, Rosa LG, Muzzolon SR, Antoniuk SA, Bruck I. Cognitive and behavioral screening of children with learning disabilities: a preliminary study. Rev Paul Pediatr. 2012;30:93-9. https://doi.org/10.1590/S0103-05822012000100014
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e o exame neurológico evolutivo (uma avaliação neuropediátrica de habilidades e marcos do desenvolvimento infantil utilizada para classificar o desenvolvimento da criança de 3 a 7 anos em diferentes domínios e inclui a análise de equilíbrio estático, equilíbrio dinâmico, coordenação apendicular, coordenação de tronco e membros, persistência motora e gnosia. Cada um desses itens engloba atividades esperadas para determinada idade, sendo considerado um resultado alterado quando a criança não o atinge).2727. Rotta NT. Neurologic evolutive examination and apprenticeship difficulties. Arq Neuro-Piquiatr. 1975;33:132-9. https://doi.org/10.1590/s0004-282x1975000200004
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Na análise, para definir como alterado o resultado dos testes, consideraram-se as notas de corte de 28 pontos para a lista de verificação de sintomas2828. Muzzolon SR, Cat MN, Santos LH. Evaluation of the Pediatric Symptom Checklist as a screening tool for the identification of emotional and psychosocial problems. Rev Paul Pediatr. 2013;31:359-65. https://doi.org/10.1590/s0103-05822013000300013
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, 20 pontos em crianças com 7 anos e 28 em crianças com mais de 8 anos para o minimental clássico2626. Santos LH, Pimentel RF, Rosa LG, Muzzolon SR, Antoniuk SA, Bruck I. Cognitive and behavioral screening of children with learning disabilities: a preliminary study. Rev Paul Pediatr. 2012;30:93-9. https://doi.org/10.1590/S0103-05822012000100014
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,2929. Jain M, Passi GR. Assessment of a modified Mini-Mental Scale for cognitive functions in children. Indian Pediatr. 2005;42:907-12. e para o minimental adaptado,2626. Santos LH, Pimentel RF, Rosa LG, Muzzolon SR, Antoniuk SA, Bruck I. Cognitive and behavioral screening of children with learning disabilities: a preliminary study. Rev Paul Pediatr. 2012;30:93-9. https://doi.org/10.1590/S0103-05822012000100014
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,2929. Jain M, Passi GR. Assessment of a modified Mini-Mental Scale for cognitive functions in children. Indian Pediatr. 2005;42:907-12. respectivamente.
A análise pedagógica foi realizada por psicopedagoga por meio de testes de leitura, escrita e raciocínio matemático próprios e padronizados, tendo sido criados pela equipe de psicopedagogia, adequados para cada faixa etária e seriação acadêmica, levando em consideração as características culturais loco-regionais, a fim de avaliar os desempenhos nas áreas de leitura, escrita e matemática. Após a correção, de acordo com a quantidade de erros, classificaram-se os pacientes como suficientes ou insuficientes naquela habilidade, considerados a faixa etária e o ano escolar,3030. Silva ML. Desempenho em leitura e escrita de alunos com diagnóstico de TDAH. Curitiba (PR): Universidade Federal do Paraná ; 2006. bem como por meio do diagnóstico operatório de Piaget (avalia os processos de raciocínio e dá o potencial cognitivo da criança de acordo com cada faixa etária. É considerado alterado quando a criança se encontra aquém do esperado para sua faixa etária).3030. Silva ML. Desempenho em leitura e escrita de alunos com diagnóstico de TDAH. Curitiba (PR): Universidade Federal do Paraná ; 2006.,3131. Visca J. O diagnóstico operatório na prática psicopedagógica. São José dos Campos: Pulso Editorial; 2008. Os testes acadêmicos avaliaram o desempenho das crianças nas habilidades escolares de acordo com seriação e idade. O teste de QI foi executado por psicóloga pela Escala Wechsler de Inteligência para Crianças - 4ª edição (WISC-4), dividido em compreensão verbal, organização perceptual, capacidade de atenção e velocidade de processamento3232. Rueda F, Noronha A, Sisto F, Santos A, Castro N. Escala de Inteligência Wechsler para crianças: WISC-IV. Manual de instruções para aplicação e avaliação. Adaptação e padronização brasileira. 4. ed. São Paulo: Casa do Piscólogo; 2013. e considerado alterado quando menor que 80.
As variáveis analisadas foram: sexo, idade materna ao nascimento, idade gestacional ao nascimento, escolaridade materna, renda familiar, estrutura familiar (família considerada desestruturada quando havia a ausência de pelo menos um dos pais), sorologias maternas, peso ao nascer, índice de Apgar no primeiro e quinto minuto, presença de sepse neonatal precoce e tardia, dias de ventilação mecânica, dias de internamento em UTI neonatal, presença de retinopatia da prematuridade, icterícia neonatal, necessidade de transfusão sanguínea de troca da volemia, necessidade de transfusão sanguínea, presença de HPIV, desempenho nos testes do minimental clássico e adaptado, exame neurológico evolutivo, lista de verificação de sintomas, resultado do questionário de Vanderbilt, diagnóstico clínico presuntivo, avaliação do desenvolvimento cognitivo operatório de Piaget, desempenho em leitura, escrita e matemática e resultados de QI.
Obtiveram-se os dados do período perinatal por meio dos registros nos prontuários referentes àquela época e os dados socioeconômicos durante a consulta neuropediátrica. As avaliações da equipe multiprofissional (médica, pedagógica e psicológica) não foram realizadas no mesmo dia para evitar a fadiga dos pacientes, e sim com um intervalo de até 14 dias entre elas.
Os dados foram agrupados em planilhas do Excel® e analisados por meio do programa Statistica®, utilizando a análise descritiva simples, o teste exato de Fisher e o teste do qui-quadrado de Pearson para variáveis categóricas. Realizou-se regressão múltipla tendo como variáveis independentes as seguintes: IG ao nascimento, peso de nascimento, índice de Apgar no 1º e 5º minutos de vida, dias de internação, dias de ventilação mecânica invasiva, dias de ventilação não invasiva, idade materna e renda familiar. As variáveis dependentes analisadas foram: pontuação na lista de verificação de sintomas, pontuação no minimental clássico e adaptado, pontuação no QI total, QI compreensão verbal, QI organização perceptual, QI velocidade de processamento e QI memória operacional.
A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa e registrada sob o número 57932616.2.0000.0096.
RESULTADOS
Buscaram-se os registros de 422 pacientes no livro de consultas mantido no ambulatório, com nascimento entre 2003 e 2013. Deles, 342 pacientes eram prematuros, com IG de nascimento igual ou inferior a 36 semanas. Destes, obteve-se o contato telefônico de 335 nos registros do hospital. Foi possível contato com 97 pacientes (cujo telefone estava atualizado na base de dados do hospital), dos quais 5 não aceitaram o convite para participar do estudo, 2 haviam ido a óbito por outras intercorrências e 4 foram excluídos por incompatibilidade com os critérios. Avaliaram-se então 86 crianças, das quais 2 foram identificadas com DI grave na primeira avaliação médica e não puderam completar as avaliações e 1 tinha autismo grave, entre outras intercorrências, e foi a óbito durante o estudo. Ao fim, avaliaram-se 83 crianças no presente estudo (Figura 1). Pelas avaliações de cada profissional não terem sido realizadas na mesma visita para evitar o cansaço dos participantes, elevou-se o número de faltas e perda de seguimento. Assim sendo, 83 crianças foram submetidas à avaliação médica, apenas 71 pais responderam ao questionário de Vanderbilt, 73 crianças realizaram a avaliação psicopedagógica e 54 crianças realizaram a avaliação com testes de QI.
Dos pacientes estudados, 60,2% eram meninos e 39,8% eram meninas. De acordo com a renda familiar, a mediana foi de R$ 1.850,00 (300-5.000), sendo 47,7% com renda familiar inferior a 2 salários mínimos. Avaliando estruturação familiar, 24,1% viviam apenas com a mãe ou com os avós. Quanto à escolaridade materna, 16,6% possuíam o ensino fundamental (até oito anos de escolaridade formal). Outros dados de perfil demográfico, histórico perinatal e resultados da avalição na idade escolar podem ser encontrados na Tabela 1.
Após a avaliação médica, 59,1% dos RNPT apresentaram dificuldade escolar clínica de acordo com a avaliação médica, com 31% pontuando para desatenção no questionário de Vanderbilt e 35% para hiperatividade. Na avaliação psicopedagógica, 38,4% tiveram falha no teste de escrita, 57,5% no teste de leitura e 42,5% no teste de matemática. Na avaliação neuropsicológica, 10,9% apresentavam QI baixo ou limítrofe. Os demais resultados das avaliações podem ser encontrados na Tabela 2.
Quando comparados quanto à estruturação familiar, o grupo de pacientes cuja família não era estruturada no modelo tradicional apresentou uma frequência (85,0 vs. 50,8%; p=0,006) maior de dificuldade escolar clínica. Pacientes com família não estruturada obtiveram maior frequência de falha no teste de leitura (78,9 vs 50,9%; p=0,029), conforme Tabela 3. Na análise de QI, não houve diferença nos grupos de acordo com renda familiar e estruturação familiar.
Na análise quanto à escolaridade materna, não houve diferença nos resultados dos testes aplicados na idade escolar.
Os meninos pontuaram mais no questionário de Vanderbilt para desatenção do que as meninas (45,0 vs 12,9%; p=0,003) e tiveram maior frequência de falhas no teste de leitura (66,0 vs 42,3%; p=0,041), de acordo com Tabela 3, e no teste de QI memória operacional (34,3 vs 10,0%; p=0,041), segundo Tabela 4.
Quando avaliadas as idades gestacionais, RNPT com IG<30 semanas pelo método ecográfico apresentaram maiores frequências de falha no minimental adaptado (32,5 vs 10,3%; p=0,035). Na comparação quanto à IG, não houve diferença quanto aos resultados das avaliações psicopedagógicas ou neuropsicológicas.
Quando verificados quanto ao índice de Apgar nos 1º e 5º minutos de vida e ao tipo de parto, não houve diferença quanto aos testes neurológicos, acadêmicos ou de QI, considerando alterados os índices de Apgar<7. Os RNPT com peso de nascimento <1500g apresentaram maiores frequências de alteração nos testes de matemática (52,1 vs 25,0%; p=0,029) e na velocidade de processamento (21,6 vs 5,9%; p = 0,012), conforme Tabela 4.
Os RNPT com sepse precoce obtiveram maiores frequências de alteração nos questionários de Vanderbilt para desatenção (36,5 vs 11,8%; p=0,041) e hiperatividade (42,3 vs 12,0%; p=0,042). Já os RNPT com sepse tardia apresentaram mais alterações no diagnóstico de dificuldade escolar pelo neuropediatra (71,4 vs 50,0%; p=0,041). Não houve diferenças quando avaliados quanto aos testes neuropsicológicos e psicopedagógicos.
Não ocorreram diferenças nas frequências de alterações nos testes de avaliação na idade escolar quando comparadas à presença das variáveis retinopatia da prematuridade (ROP), de alterações oftalmológicas e dos dias em ventilação mecânica invasiva.
Quando avaliada apenas a presença de HPIV, não houve diferença entre aqueles com ou sem HPIV nos resultados das avaliações realizadas. No entanto, entre os que tiveram HPIV, aqueles com hemorragias graus III e IV apresentaram maiores índices de alteração no teste do diagnóstico operatório de Piaget (83,3 vs 35,3%; p=0,013).
Na análise de regressão múltipla, encontrou-se relação entre IG ao nascimento e pontuação no minimental clássico (p=0,04), QI total (p=0,047), QI organização perceptual (p=0,035) e QI velocidade de processamento (p=0,036). Houve também relação entre peso de nascimento e minimental clássico (p=0,004) e adaptado (p=0,007); entre o tempo de ventilação mecânica invasiva e o minimental clássico (p=0,049); e entre idade materna mais baixa e QI velocidade de processamento (p=0,033). Não foi encontrada relação entre as demais variáveis avaliadas.
DISCUSSÃO
O presente estudo avaliou a trajetória neurológica, cognitiva e acadêmica de escolares nascidos prematuros que ficaram livres de sequelas mais graves. Nesse contexto, era esperada a baixa incidência de deficiências e sequelas maiores, tais quais a surdez, a cegueira, a paralisia cerebral e a deficiência intelectual. Contudo os escolares nascidos prematuros apresentaram altos índices de desempenho acadêmico insuficiente em leitura, escrita e matemática.
Nossos resultados estão de acordo com os achados da literatura. No Brasil, Riechi et al., em 2011, encontraram pior desempenho acadêmico de RNPT, quando comparados a escolares nascidos a termo.1717. Riechi TI, Moura-Ribeiro MV, Ciasca SM. Impact of preterm birth and low birth weight on the cognition, behavior and learning of school-age children. Rev Paul Pediatr. 2011;29:495-501. https://doi.org/10.1590/S0103-05822011000400005
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Na Austrália, Taylor et al., em um estudo com 194 RNPT com IG <30 semanas demonstraram pior desempenho em testes padronizados de leitura (22%), escrita (20%) e matemática (40%) aos 7 anos quando comparados com controles RNT (7, 6 e 11%, respectivamente).2020. Taylor R, Pascoe L, Scratch S, Doyle LW, Anderson P, Roberts G. A simple screen performed at school entry can predict academic under-achievement at age seven in children born very preterm. J Paediatr Child Health. 2016;52:759-64. https://doi.org/10.1111/jpc.13186
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Os índices de falha nas avaliações cognitivas e principalmente escolares foram importantes. Um dos influenciadores para esse desempenho pior que o esperado pode ser a baixa renda familiar da amostra estudada, uma vez que a pobreza e o risco social oferecem forte influência nas trajetórias cognitivas das crianças.3333. Lee D, Jackson M. The simultaneous effects of socioeconomic disadvantage and child health on children’s cognitive development. Demography. 2017;54:1845-71. https://doi.org/10.1007/s13524-017-0605-z
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Não foi encontrada associação entre menor renda familiar, baixa escolaridade materna e mau desempenho no WISC ou nas avaliações psicopedagógicas, da mesma maneira, tal fato pode ser explicado pela homogeneidade da amostra, na qual a renda familiar e a escolaridade materna eram baixas e fatores como classe social e escolaridade materna têm tanto peso na trajetória cognitiva quanto fatores biológicos.3434. Doyle LW, Cheong JL, Burnett A, Roberts G, Lee KJ, Anderson PJ. Biological and social influences on outcomes of extreme-preterm/low-birth weight adolescents. Pediatrics. 2015;136:e1513-20. https://doi.org/10.1542/peds.2015-2006
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Sendo assim, com mais acesso aos serviços de saúde e com melhores índices socioeconômicos, em países desenvolvidos, nos últimos anos, o desempenho cognitivo de prematuros tem tido uma tendência à melhora,3535. Courchia B, Berkovits MD, Bauer CR. Cognitive impairment among extremely low birthweight preterm infants from 1980 to present day. J Perinatol. 2019;39:1098-104. https://doi.org/10.1038/s41372-019-0414-x
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o que não pudemos observar nesta amostra transversal.
Meninos apresentaram maiores frequências de falha nos testes de leitura, QI memória operacional e desatenção, o que é compatível com a prevalência geral dessas afecções, muito mais comuns no sexo masculino.3636. Katusic SK, Colligan RC, Barbaresi WJ, Schaid DJ, Jacobsen SJ. Incidence of reading disability in a population-based birth cohort, 1976-1982, Rochester, Minn. Mayo Clin Proc. 2001;76:1081-92. https://doi.org/10.4065/76.11.1081
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,3737. Katusic SK, Colligan RC, Weaver AL, Barbesi WJ. The forgotten learning disability - epidemiology of written language disorder in a population-based birth cohort (1976-1982), Rochester, Minnesota. Pediatrics. 2009;135:1306-13. https://doi.org/10.1542/peds.2008-2098
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,3838. Barbaresi WJ, Katusic SK, Colligan RC, Weaver AL, Jacobsen SJ. Math learning disorder: Incidence in a population- based birth cohort 1976-82, rochester, Minn. Ambul Pediatr. 2005;5:281-9. https://doi.org/10.1367/a04-209r.1
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A IG mais baixa (<30 semanas) teve associação com alterações cognitivas sugeridas pelo minimental adaptado, mas não sugeridas pelos testes de QI. Esse achado pode ser explicado pelo fato de o minimental ser um teste de triagem, menos específico que o WISC. O diagnóstico de uma deficiência intelectual, apesar de se basear frequente e objetivamente no resultado do teste de QI, por definição ocorre ante uma dificuldade adaptativa dos pacientes aos desafios impostos pelo meio,3939. Greenspan S. Borderline intellectual functioning: an update. Curr Opin Psychiatry. 2017;30:113-22. https://doi.org/10.1097/YCO.0000000000000317
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sendo possível que um teste de triagem mais sensível e menos específico como o minimental seja mais sensível para detectar essa alteração. Da mesma forma, a IG mais baixa associou-se à maior alteração no exame neurológico. Crianças nascidas RNPT, mesmo na ausência de paralisia cerebral, apresentam maiores índices de alterações no exame neurológico.4040. Broström L, Vollmer B, Bolk J, Eklöf E, Ådén U. Minor neurological dysfunction and associations with motor function, general cognitive abilities, and behaviour in children born extremely preterm. Dev Med Child Neurol. 2018;60:826-32. https://doi.org/10.1111/dmcn.13738
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Não foi encontrada associação entre asfixia neonatal sugerida pelo score de Apgar e alterações cognitivas e escolares. Outro estudo de desenho similar mostrou que a asfixia perinatal teve associação a valores mais baixos de QI na idade escolar.4141. Koç Ö, Kavuncuoʇlu S, Ramoʇlu MG, Aldemir ES, Aktalay A, Eras Z. School performance and neurodevelopment of very low birth weight preterm infants. J Child Neurol. 2016;31:170-6. https://doi.org/10.1177/0883073815587028
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Este estudo considerou alterado o boletim de Apgar abaixo de 7 pontos, levando assim também em consideração os casos de hipóxia leve, uma vez que o objetivo era avaliar os sobreviventes que não tiveram sequelas graves, enquanto outros estudos levaram em consideração o índice menor que 3 (hipóxia grave).4242. Casey BM, McIntire DD, Leveno KJ. The continuing value of the Apgar score for the assessment of newborn infants. N Engl J Med. 2001;344:467-71. https://doi.org/10.1056/nejm200102153440701
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Apesar de uma série de fatores limitarem o uso do boletim de Apgar como fator de prognóstico, especialmente pela pouca homogeneidade de sua aplicação pelos diversos profissionais, ele continua a ser indicado para a avaliação de longo prazo no desenvolvimento como fator de risco importante, especialmente quando considerado no 5º minuto de vida.4343. Siddiqui A, Cuttini M, Wood R, Velebil P, Delnord M, Zile I, et al. Can the Apgar Score be used for international comparisons of newborn health? Paediatr Perinat Epidemiol. 2017;31:338-45. https://doi.org/10.1111/ppe.12368
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A idade materna mais baixa associou-se a menores índices no QI-velocidade de processamento, que está ligada tanto aos sintomas desatentos do TDAH quanto aos referentes à impulsividade e ao comportamento. A idade materna mais baixa em crianças nascidas prematuras é associada a um risco aumentado de problemas comportamentais na criança.4444. Gray RF, Indurkhya A, McCormick MC. prevalence, stability, and predictors of clinically significant behavior problems in low birth weight children at 3, 5, and 8 years of age. Pediatrics. 2004;114:736-43. https://doi.org/10.1542/peds.2003-1150-l
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A sepse neonatal precoce apresentou associação à sugestão diagnóstica de TDAH tanto do tipo desatento quanto do tipo hiperativo, sem, contudo, associar-se a outros aspectos do desenvolvimento cognitivo e acadêmico. Em uma coorte francesa de RNPT, não foi encontrada associação entre sepse neonatal (precoce ou tardia) e DI aos 5 anos de idade.4444. Gray RF, Indurkhya A, McCormick MC. prevalence, stability, and predictors of clinically significant behavior problems in low birth weight children at 3, 5, and 8 years of age. Pediatrics. 2004;114:736-43. https://doi.org/10.1542/peds.2003-1150-l
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Contudo um estudo multicêntrico mostrou um risco maior de comprometimento cognitivo em RNPTE que tiveram bacteremia tardia.88. Bright HR, Babata K, Allred EN, Erdei C, Kuban KC, Joseph RM, et al. Neurocognitive outcomes at 10 years of age in extremely preterm newborns with late-onset bacteremia. J Pediatr. 2017;187:43-9. https://doi.org/10.1016/j.earlhumdev.2018.04.017
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Os mediadores inflamatórios produzidos na sepse podem estar relacionados a alterações nas conexões neuronais que atuam como base neurobiológica do TDAH.
Não foi encontrada associação entre tempo prolongado de ventilação mecânica invasiva e alterações no desenvolvimento cognitivo e acadêmico. Contudo não se pesquisou o uso prolongado de oxigênio inalatório ou a presença do diagnóstico clínico de broncodisplasia, que é tida como um importante fator de risco para a dificuldade escolar.4545. Mitha A, Foix-L’Hélias L, Arnaud C, Marret S, Vieux R, Aujard Y, et al. Neonatal infection and 5-year neurodevelopmental outcome of very preterm infants. Pediatrics. 2013;132:e372-80. https://doi.org/10.1542/peds.2012-3979
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A presença de HPIV isoladamente não se mostrou fator de risco independente para atraso cognitivo. Já a presença de HPIV grave se mostrou associada à alteração no teste do diagnóstico operatório de Piaget, o que demonstra alteração no processo cognitivo de aprendizagem dos RNPT. As lesões cerebrais extensas têm um fator de impacto robusto sobre o desenvolvimento cognitivo e as dificuldades em leitura, escrita e matemática.4646. Twilhaar ES, Wade RM, Kieviet JF, Goudoever JB, Elburg RM, Oosterlaan J. Cognitive outcomes of children born extremely or very preterm since the 1990s and associated risk factors: a meta-analysis and meta-regression. JAMA Pediatr. 2018;172:361-7. https://doi.org/10.1001/jamapediatrics.2017.5323
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Da mesma maneira, pode-se apontar que HPIV leves (graus I e II) não apresentam influência no desenvolvimento escolar e cognitivo.4747. Luu TM, Ment LR, Schneider KC, Katz KH, Allan WC, Vohr BR. Lasting effects of preterm birth and neonatal brain hemorrhage at 12 years of age. Pediatrics. 2009;123:1037-44. https://doi.org/10.1542/peds.2008-1162
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Anormalidades encontradas em ressonância magnética de RNPT, especialmente na substância cinzenta profunda, podem possuir associação a prejuízos na memória, memória operacional e aprendizagem na idade escolar.4848. Haebich KM, Willmott C, Scratch SE, Pascoe L, Lee KJ, Spencer-Smith MM, et al. Neonatal brain abnormalities and brain volumes associated with goal setting outcomes in very preterm 13-year-olds. Brain Imaging Behav. 2020;14:1062-73. https://doi.org/10.1007/s11682-019-00039-1
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Estudos de ressonância magnética associaram diminuição volumétrica e alterações presentes na substância branca, substância cinzenta profunda (tálamo) e cerebelo com mau desempenho em avaliações cognitivas na adolescência.4848. Haebich KM, Willmott C, Scratch SE, Pascoe L, Lee KJ, Spencer-Smith MM, et al. Neonatal brain abnormalities and brain volumes associated with goal setting outcomes in very preterm 13-year-olds. Brain Imaging Behav. 2020;14:1062-73. https://doi.org/10.1007/s11682-019-00039-1
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Encontrou-se grande prevalência de dificuldade escolar na população estudada. A trajetória das dificuldades escolares, especialmente dos transtornos de leitura e escrita, está geralmente associada a atrasos na aquisição da linguagem e os RNPT comumente apresentam um desenvolvimento da linguagem atípico, com maior incidência de atrasos na aquisição da linguagem expressiva.4949. Stefano P, Marchignoli M, Pisani F, Cossu G. Uneven linguistic outcome in extremely preterm children. J Psycholinguist Res. 2019;48:1363-75. https://doi.org/10.1007/s10936-019-09662-x
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Como limitações do presente estudo, aponta-se o tamanho amostral reduzido quando comparado a outros estudos semelhantes, a ausência de um grupo controle com RNT, a dificuldade em conseguir a avaliação completa das crianças e a dificuldade em buscar alguns dados do período neonatal nos registros de prontuários.
Apesar dessas limitações, foi possível traçar um perfil acadêmico e cognitivo de RNPT mais adaptado à realidade cultural brasileira, demonstrando grande impacto da prematuridade no desenvolvimento cognitivo e escolar dos indivíduos sobreviventes, mesmo que muitas vezes estes já estejam livres de sequelas mais graves que possam ser mais precocemente identificadas (como paralisia cerebral e limitações graves do desenvolvimento).
Recomenda-se, com esses resultados, que o acompanhamento dos RNPT nos ambulatórios de risco, especialmente dos RNPTE, seja continuado até depois que as crianças ingressem na vida escolar e que profissionais de pedagogia e psicologia sejam incluídos imprescindivelmente nas equipes multiprofissionais que realizam esse acompanhamento.
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Financiamento
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O estudo não recebeu financiamento.
Declaração
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8
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
30 Jul 2021 -
Data do Fascículo
2022
Histórico
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Recebido
12 Jul 2020 -
Aceito
22 Nov 2020