Acessibilidade / Reportar erro

Espíritas de todo o Brasil, uni-vos! Meandros da unificação espírita na primeira metade do século XX

Spiritists from all over Brazil, unite! Meanders of Spiritist Unification in the First Half of the 20th Century

Resumo

Neste artigo analiso o processo de adensamento institucional do espiritismo na primeira metade do século XX. As disputas pela unificação institucional e teórica foram impulsionadas, por um lado, pelos próprios espíritas, que abraçavam visões distintas sobre o que entendiam ser espiritismo e, consequentemente, suas formas possíveis de organização e legitimidade institucional; por outro lado, respondiam a desdobramentos do processo de redefinição das relações entre o Estado e as religiões no Brasil. As agitações, principalmente no Rio de Janeiro e em São Paulo, que desembocaram na assinatura do Pacto Áureo, nos permitem compreender que, longe de um processo aparentemente incompleto, contribuíram, por fim, para a preservação da pluralidade de concepções como forma de resistência a certo enrijecimento burocrático e doutrinário.

Palavras-chave:
Espiritismo; Federação Espírita Brasileira; Federação Espírita do Estado de São Paulo; Pacto Áureo

Abstract

In this article I analyze the process of institutional densification of Spiritism in the first half of the 20th century. The disputes over institutional and theoretical unification were driven, on the one hand, by the spiritists themselves, who embraced different visions of what they understood to be Spiritism and, consequently, their possible forms of organization and institutional legitimacy; on the other hand, responded to developments in the process of redefining relations between the State and religions in Brazil. The agitations, especially in Rio de Janeiro and São Paulo, which resulted in the signing of the Aureus Pact, allow us to understand that, far from an apparently incomplete process, they have contributed, finally, to the preservation of the plurality of conceptions as a form of resistance to certain bureaucratic and doctrinal rigidity.

Keywords:
Spiritism; Brazilian Spiritist Federation; Spiritist Federation of the State of São Paulo; Aureus Pact

Observar cada formiga e nunca esquecer o formigueiro 1 1 “(…) watch the individual ants, and yet never forget the ant-heap” (Namier 1968: 47, minha tradução).

A primeira metade do século XX nos permite ver um momento bastante específico do desenvolvimento e da dinâmica das religiões no Brasil, principalmente a ascensão de novos segmentos em busca de legitimidade, incluindo nesse rol o espiritismo kardecista. Esse momento também foi marcado por mudanças na sociedade brasileira, observadas, sobretudo, a partir da década de 1930, data símbolo para a vida nacional. Os nossos hábitos políticos, sociais, culturais e religiosos estavam sendo significativamente transformados. Nesse clima, o espiritismo dava passos importantes rumo ao seu adensamento institucional, em parte impulsionado por seus agentes, que abraçavam visões distintas e por vezes conflitantes sobre o que entendiam ser espiritismo e, consequentemente, suas formas possíveis de organização e legitimidade institucional; e em parte porque respondiam a desdobramentos do processo de redefinição das relações entre o Estado e as religiões no Brasil.

Como é sabido na literatura sobre espiritismo, o Brasil foi um dos destinos, em meados do século XIX, da doutrina elaborada por Allan Kardec (Arribas 2010ARRIBAS, Célia. (2010), Afinal, espiritismo é religião? São Paulo: Ed. Alameda/Fapesp.; Aubrée & Laplantine 1990AUBRÉE, Marion & LAPLANTINE, François. (1990), La Table, le livre et les esprits. Paris: S.l. Jean Claude Lattes.; Damazio 1994DAMAZIO, Sylvia. (1994), Da elite ao povo. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil.; Giumbelli 1997a____________. (1997a), O cuidado dos mortos: Uma história da condenação e legitimação do Espiritismo. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional. ; Machado 1983MACHADO, Ubiratan. (1983), Os intelectuais e o espiritismo. Rio de Janeiro: Edições Antares.; Prandi 2012PRANDI, Reginaldo. (2012), Os mortos e os vivos: uma introdução ao espiritismo. São Paulo: Três Estrelas.; Warren 1984WARREN, Donald. (1984), “A terapia espírita no Rio de Janeiro por volta de 1900”. Religião e Sociedade , Rio de Janeiro, n.º11(3). e 1986__________. (1986), “A medicina espiritualizada”. Religião e Sociedade, Rio de Janeiro, n.º 13(1).). Como se tratava de uma doutrina tríplice face - entendida ao mesmo tempo por seus correligionários como uma religião, uma ciência e uma filosofia -, era de se esperar que fosse absorvida e desenvolvida em várias frentes, levando à formação de diversas associações2 2 No final do século XIX, havia somente no Rio de Janeiro aproximadamente 35 associações espíritas (Giumbelli 1997a: 59-60). . O quadro de significativa dispersão, já desde o seu início, deu lugar a várias disputas internas ao espiritismo, sobretudo na corrida pela legitimidade institucional, tema privilegiado neste artigo.

O movimento espírita precisava se unir - diagnosticavam seus adeptos. Mas necessitava, antes de tudo, se definir. Os investimentos nesse sentido, despendidos pelas lideranças do movimento, almejavam sem dúvida equacionar as diferenças internas, mas também pretendiam mostrar “para fora” dele a imagem de um espiritismo coeso e sistematizado, questão que remete aos desafios enfrentados pelo espiritismo na construção de seu lugar no campo religioso, assim como na sociedade brasileira. As agitações que têm lugar na primeira metade do século XX, longe de ser um processo aparentemente incompleto - já que as lutas pela definição e unificação institucional não eliminaram, como pretendiam os espíritas, as várias vertentes que compõem o espiritismo -, contribuíram para a preservação da pluralidade de concepções doutrinárias e políticas, bem como para a introdução de inovações em suas práticas como uma forma de resistência a certo enrijecimento burocrático e doutrinário.

Dessa forma, acompanho neste artigo as ações de personagens concretos - ainda pouco conhecidos pela literatura acadêmica - e suas relações com as instituições espíritas nascentes, um movimento repleto de idas e vindas que se desenrolou com mais vigor principalmente no Rio de Janeiro e em São Paulo. A inconstância na linearidade da narrativa aqui apresentada não deixa de ser, em certa medida, um reflexo do próprio campo e dos processos de institucionalização do espiritismo no país.

Por mais que tenha me atido a um recorte limitado de personagens e instituições que, certamente, fazem parte de um movimento mais amplo e complexo, busco frisar um momento fecundo para a atuação de personagens e instituições que até hoje (e por causa disso) são conhecidos e tidos como referência no meio espírita. É nesse período, impulsionado igualmente por injunções externas e internas, que podemos registrar um expressivo adensamento institucional, com a criação, cisões e fusões de uma série de entidades espíritas, bem como um adensamento teórico-doutrinário, com o surgimento de uma malha editorial própria e a realização de congressos, veículos privilegiados de exposição e de debate de ideias e concepções. Embora a dimensão doutrinária faça parte do cenário coberto neste artigo, a luz será lançada, mais propriamente falando, sobre a faceta institucional.

Para tanto, me inspiro nos ferramentais analíticos da sociologia da religião de Max Weber (2000WEBER, Max. (2000), “Sociologia da religião”. Economia e sociedade. Brasília: Ed. Universidade de Brasília.) e em uma sociologia dos intelectuais bourdiesiana (Bourdieu 1983BOURDIEU, Pierre. (1983), “Mas quem criou os criadores?” Questões de sociologia. Rio de Janeiro: Editora Marco Zero., 1986___________. (1986), “L’Illusion Biographique”. In: Actes de la Recherche em Sciences Sociales, v. 62, n. 62/62. e 2001___________. (2001), “Gênese e estrutura do campo religioso”; “Uma interpretação da teoria da religião de Max Weber”. A economia das trocas simbólicas. São Paulo: Perspectiva.), que privilegiam uma visão sociológica pautada em disputas e cisões, ideais e materiais, que conformaram o que podemos denominar de campo religioso brasileiro, no qual o espiritismo, neste estudo, é colocado em pauta. Como hipótese geral, sustento que a existência de tais tensões relaciona-se com o fato de o espiritismo, em sua própria doutrina, trazer uma propensão a disputas de todas as ordens, haja vista seus fundamentos teóricos defenderem que se trata de religião, filosofia e ciência. Essa tríplice face ensejaria a que certos grupos sociais e intelectuais, uns mais afeitos do que outros a uma das faces em razão de suas trajetórias sociais, capitais amealhados, habitus e decorrentes capacidades de compreensão e vivência religiosa, se esbatessem constantemente pelo tipo de autoridade específico a que o espiritismo faria jus, de acordo com suas visões ideais, corporificando-as em instituições às suas imagens e semelhanças.

O artigo se inicia com as discussões em torno das diretrizes básicas do espiritismo, encabeçadas pela Federação Espírita Brasileira no início do século XX no Rio de Janeiro, atentando para alguns arranjos institucionais que pretendiam fazer frente à Federação. Na segunda parte, o foco recai sobre os desdobramentos em São Paulo, com novas instituições e personagens adensando o meio espírita, e finaliza com um dos momentos-chave do processo de unificação: a assinatura do Pacto Áureo, em 1949.

Formação das diretrizes básicas

O tema da unificação parece um espectro a rondar o movimento espírita. Desde seus primeiros passos, os espíritas clamam e pelejam por sua unificação ou, em outros termos, por uma centralização ao mesmo tempo institucional, teórica e prática. E tanto mais curiosa é essa particularidade quanto mais percebemos que o que dá unidade aos espíritas são justamente as lutas incessantes por sua unificação, lutas que buscavam solucionar, internamente, as posições divergentes e conflitantes e, externamente, fazer frente a outras vertentes religiosas, sobretudo as de matriz africana e ao catolicismo, além de responder às pressões exercidas pelas redefinições em curso das relações entre Estado e religiões, mais especificamente a política repressora do Estado, consignada por meio de artigos incluídos no Código Penal de 1890, que instituiu a perseguição policial a práticas correntes no campo mediúnico, em especial aquelas definidas como curandeirismo e charlatanismo (Arribas 2011__________. (2011), “Espiritismo: entre crime e religião”. MNEME - Revista de Humanidades, 11(29), janeiro/julho.; Giumbelli 1997a____________. (1997a), O cuidado dos mortos: Uma história da condenação e legitimação do Espiritismo. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional. ; Maggie 1992MAGGIE, Yvonne. (1992), Medo do feitiço: Relações entre magia e poder no Brasil. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional .; Schritzmeyer 2004SCHRITZMEYER, Ana Lúcia. (2004), Sortilégio de saberes: curandeiros e juízes nos tribunais brasileiros (1900-1990) . São Paulo: IBCCRIM. ). Essa política perdurou até 1940, colocando sob sua mira tanto o espiritismo como as religiões afro-brasileiras. Não por acaso surgiam nesse contexto as instituições federativas espíritas e umbandistas (Negrão 1996NEGRÃO, Lísias. (1996), Entre a cruz e a encruzilhada. São Paulo: Edusp.), iniciativas que tinham por intuito a construção de uma instância política de mediação com o Estado, certamente, mas que não deixavam de ser soluções pertinentes para a unificação desses segmentos religiosos. Daí figurar tanto a legalização institucional quanto a sistematização de crenças e práticas como objetivos centrais. As várias tentativas de criação de federações, ligas e uniões, como se verá aqui, ou ainda, os infindáveis artigos de jornais e revistas sobre o tema da unificação, que há mais de um século circulam entre os adeptos (Arribas 2010), são alguns dos elementos relevantes acerca dos enfrentamentos travados pelos espíritas.

Em meio às disputas acirradas por que passaram os agrupamentos espíritas nas últimas décadas do século XIX, consolidava-se a Federação Espírita Brasileira (FEB), em 1884, uma associação federativa e centralizadora que pretendia regular as ideias espíritas, representar todos os agrupamentos e ser a instituição oficial de divulgação do espiritismo. Nesse sentido, em 1904, aproveitando as comemorações do centenário de nascimento de Allan Kardec (1804-1869), a FEB, na figura de seu presidente Leopoldo Cirne (1870-1941)3 3 As biográficas deste artigo foram consultadas em Zêus Wantuil (2002) e Godoy & Lucena (1990). , promoveu uma reunião entre várias associações com o fim de discutir a tão almejada unificação.

Comerciante paraibano, Cirne tornou-se espírita por volta de 1894, já residindo no Rio de Janeiro, época em que se filiou à FEB. Foi nessa instituição que conheceu, entre outros, o médico e deputado cearense Bezerra de Menezes, personalidade importante para a história da FEB e para o espiritismo de modo geral (Abreu 1996ABREU, Canuto. (1996), Bezerra de Menezes. São Paulo: FEESP., Aquarone 1980AQUARONE, Francisco. (1980), Bezerra de Menezes, o médico dos pobres. São Paulo: Editora Aliança., Arribas 2010ARRIBAS, Célia. (2010), Afinal, espiritismo é religião? São Paulo: Ed. Alameda/Fapesp., Damazio 1994DAMAZIO, Sylvia. (1994), Da elite ao povo. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil., Gama 2001GAMA, Ramiro. (2001), Lindos casos de Bezerra de Menezes . São Paulo: LAKE., Giumbelli 1997a____________. (1997a), O cuidado dos mortos: Uma história da condenação e legitimação do Espiritismo. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional. , Machado 1983MACHADO, Ubiratan. (1983), Os intelectuais e o espiritismo. Rio de Janeiro: Edições Antares., Wantuil 2002WANTUIL, Zêus. (2002), Grandes espíritas do Brasil. Rio de Janeiro: FEB ., Warren 1984WARREN, Donald. (1984), “A terapia espírita no Rio de Janeiro por volta de 1900”. Religião e Sociedade , Rio de Janeiro, n.º11(3). e 1986). Juntos, e com mais alguns companheiros, formavam o então denominado grupo dos religiosos ou místicos (Abreu 1996a: 9; Arribas 2010: 94-99; Giumbelli 1997a____________. (1997a), O cuidado dos mortos: Uma história da condenação e legitimação do Espiritismo. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional. : 113-118), estudiosos das obras de Allan Kardec e de Jean-Baptiste Roustaing. O seu envolvimento com a doutrina acabou por conduzi-lo à presidência da instituição em 1900.

Cirne tinha como meta, como já o tivera Bezerra de Menezes, a união do movimento espírita. Foi nesse sentido que em 1902 renovou o estatuto da FEB, instituindo o estudo das obras completas de Allan Kardec como referência básica da instituição, com o cuidado de retirar dele a paridade que a obra de Roustaing gozava ao lado da de Kardec em estatutos anteriores, compreendendo que a adoção das ideias roustainguistas era fonte de fortes desavenças entre os espíritas e, logo, de desunião.

Durante o período em que esteve à frente da instituição, Cirne ministrou palestras, traduziu vários livros, publicou outros tantos e escreveu uma série de artigos no Reformador, órgão de divulgação da FEB. Sua gestão foi igualmente marcada por pelo menos mais dois elementos importantes. O primeiro deles tratava-se do projeto de implantar uma “escola de médiuns”, empreendimento frustrado que o levou à perda de liderança e à derrota da presidência em 1913. Antes, porém, de se afastar, Cirne teve um papel organizacional de relevo - segundo elemento fundamental. Durante a sua presidência foi iniciada a construção da sede própria da FEB, inaugurada em 1911. O feito foi visto à época como sinônimo do fortalecimento do espiritismo em solo brasileiro, mas não deixou de ser também um sinônimo da arrancada da FEB em relação às demais instituições espíritas4 4 Alguns jornais da capital trouxeram apreciações positivas sobre o evento: A Noite, em 08/12/1911, A Imprensa e o Correio da Manhã, ambos de 09/12/1911, e O Paiz, de 10/12/1911.). .

Uma das medidas promovidas no evento de comemoração do centenário de Allan Kardec concretizou-se na aprovação das “Bases da Organização Espírita”5 5 Reformador, jan./1979. , documento que tinha como elemento central, do ponto de vista dos arranjos institucionais, a proposta de criação, em cada estado, de uma entidade federativa ligada diretamente à FEB, formando, assim, uma rede de entidades que ficariam submetidas à sua orientação6 6 Na época existiam apenas três casas que reuniam os centros espíritas locais: a Sociedade Espírita do Rio Grande do Sul (1887), a Federação Espírita Amazonense (1901) e a Federação Espírita do Paraná (1903). . Do ponto de vista doutrinário, o documento apresentava um programa elementar cujas bases se assentavam, para “a parte experimental”, na criação da escola de médiuns, adotando-se como referência de estudos O Livro dos Médiuns, de Kardec; para “a parte filosófica” a base seria O Livro dos Espíritos, podendo ser completado com O Céu e o Inferno, ambos de Kardec; e para “a parte moral”, no estudo dos Evangelhos, orientado pelas leituras de O Evangelho segundo o Espiritismo, de Kardec, ou Os Quatro Evangelhos, de Jean-Baptiste Roustaing. Recomendava-se ainda, entre outras providências, a criação de “caixas de socorro”, a disponibilização de serviços de curas através de passes e receituário homeopático, e a instrução escolar elementar e secundária para combate ao analfabetismo, com uma parte consagrada ao ensino da moral espírita. O documento traduzia, assim, a necessidade, que viam muitos, sobretudo os integrantes da FEB, de promover a unificação institucional e de traçar as diretrizes básicas para o movimento espírita, não sem antes contar com adversários e partidários, sobretudo no que diz respeito ao estudo das obras de Roustaing e à criação de escolas de médiuns, dois pontos candentes em torno dos quais girava o debate espírita, além da questão da oferta da cura por passes e receituário homeopático.

As teses de Roustaing, advogado bordelês da segunda metade do século XIX, defendiam a metempsicose e o panteísmo e negavam a existência de um corpo material a Jesus, asseverando que ele viera desempenhar sua “missão” revestido de um “corpo fluídico”, porém tangível. Muitos de seus críticos viram nisso incompatibilidades com a doutrina elaborada por Kardec, além de resquícios do pensamento católico, dada a manutenção da crença na virgindade de Maria, da visão de Jesus como uma espécie de homem-deus e da doutrina do pecado original (Arribas 2010ARRIBAS, Célia. (2010), Afinal, espiritismo é religião? São Paulo: Ed. Alameda/Fapesp.: 219-239).

Quanto às discussões sobre as escolas de médiuns, o que estava em questão eram concepções, estatuto e significados distintos de mediunidade (Giumbelli 1997a____________. (1997a), O cuidado dos mortos: Uma história da condenação e legitimação do Espiritismo. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional. : 182-184). Para uns, a mediunidade era vista como uma faculdade natural dos seres “encarnados”. Para o seu exercício, bastaria somente um treinamento adequado e uma preparação doutrinária sólida que auxiliassem o médium a realizar a comunicação de forma segura. Já para outros, a mediunidade era tida como uma espécie de dom divino, e o médium como um ser dotado de uma missão, razão pela qual não poderia dispor de seu dom a especulações ou ao emprego metódico ou fútil. Neste caso, o desenvolvimento da mediunidade não poderia se dar via aprimoramento doutrinário ou via treinamento mecânico; ele deveria vir acompanhado de um aprimoramento das qualidades morais. Ocorre que esse tipo de associação entre mediunidade e dom acabou levando parte do meio espírita a encarar a mediunidade como uma graça de Deus, fazendo do médium mais que um instrumento dos espíritos, como seria para o primeiro caso, um intercessor divino. Na prática, a consequência mais imediata desse tipo de concepção propiciou o desenvolvimento de uma espécie de culto em torno da figura do médium, dotando-o, por assim dizer, de certa áurea, transmutada em um tipo de autoridade importante dentro do meio espírita, a autoridade carismática (Arribas 2014__________. (2014), No princípio era o verbo. Espíritas e espiritismos na modernidade religiosa brasileira. Tese de doutorado em Sociologia, USP.: 149-154).

Não menos importante era o terceiro ponto de discussões: a cura espírita, ofertada através de passes e medicamentos homeopáticos. O tema se tornou controverso não porque entre os espíritas houvesse dissensões, mas porque alguns médiuns foram indiciados por exercício ilegal da medicina, enquadrados no Código Penal e no Regulamento Sanitário, que previam, ambos, apenas aos diplomados a concessão da arte de curar (Almeida 2007ALMEIDA, Angélica. (2007), Uma fábrica de loucos: psiquiatria x espiritismo no Brasil (1900-1950). Tese de doutorado em História, Unicamp.; Damazio 1994DAMAZIO, Sylvia. (1994), Da elite ao povo. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil.; Giumbelli 1997a____________. (1997a), O cuidado dos mortos: Uma história da condenação e legitimação do Espiritismo. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional. , 1997b____________. (1997b), “Heresia, doença, crime ou religião: O espiritismo no discurso de médicos e cientistas sociais”. Revista de Antropologia. São Paulo, USP, vol. 40, n.º 2: 33-82. ; Hess 1987aHESS, David. (1987a), “The many rooms of Spiritism in Brazil”. Luso-Brazilian Review, XXIV, n.2: 15-34., 1987b_______. (1987b), “O espiritismo e as ciências”. Religião e Sociedade. Rio de Janeiro, n.º4(3): 40-54.; Maggie 1986, 1992MAGGIE, Yvonne. (1992), Medo do feitiço: Relações entre magia e poder no Brasil. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional .; Schritzmeyer 2004SCHRITZMEYER, Ana Lúcia. (2004), Sortilégio de saberes: curandeiros e juízes nos tribunais brasileiros (1900-1990) . São Paulo: IBCCRIM. ). A FEB, por conta disso, foi intimada algumas vezes a comparecer ao Juízo dos Feitos da Saúde Pública e para a sua defesa contou com o empenho, dentre outros, do advogado, jornalista e deputado Aristides de Souza Spínola (1850-1925)7 7 http://www.neim.org.br/arq/livros_diversos/escorco_historico_feb.pdf. Acessado em 05/03/2012. .

Spínola ingressou na FEB em 1905 e nela empossou os cargos de vice-presidente (1905-1913; 1920-1921) e de presidente (1914; 1916-1917; 1922-1924). Tendo que lidar com a pressão do poder médico e do Estado, em seu terceiro mandato (1922-1924) propôs a criação de um Conselho Federativo, órgão que se destinaria a congregar as federações estaduais, embrião do que mais tarde se tornaria o Conselho Federativo Nacional (CFN). É importante reter esta informação, porque foi em torno da ideia de um conselho federativo nacional - que promoveria, enfim, a tão almejada unificação, além da proteção legal - que muitos espíritas despenderam pesados esforços.

Para entender esses arranjos institucionais nascentes, lancemos um olhar mais abrangente. Nesse exato momento em que estavam sendo formuladas as diretrizes do movimento espírita, sobretudo as diretrizes relacionadas à atuação unificacionista encabeçada pela FEB, em pleno governo presidencial de Arthur Bernardes (1922-1926) estava sendo promovida uma reforma constitucional de grande importância política. Plínio Marques, deputado católico do Paraná, pretendia introduzir nessa reforma emendas de cunho religioso, oficializando o estudo do catolicismo nas escolas do país, em busca da retomada da posição privilegiada de que desfrutara a Igreja Católica até a proclamação da República. A reação foi imediata da parte dos defensores de uma república laica, sobretudo dos defensores não católicos. Protestantes, espíritas, maçons e outros grupos de interesse se coligaram para derrubar as tais emendas, e nisso tiveram êxito. O segmento espírita dessa associação ecumênica começou a promover reuniões nos centros para obter apoio contra o projeto do deputado. O sucesso dessa mobilização, que em princípio atendia a injunções externas ao movimento espírita, ajudou a impulsionar e ampliar os debates internos no sentido de equacionar a sua unificação. Desses debates surgiu a ideia de realizar, no ano de 1926, o Congresso Constituinte Espírita Nacional.

Um dos principais objetivos desse congresso consistia em fixar uma organização unificacionista modelar e criar uma entidade federativa de âmbito nacional. A questão é que essas já eram precisamente as funções arrogadas pela FEB, o que nos leva a supor que disputas viriam. E de fato vieram, e sem muita delonga, a começar pelo convite que fizeram a Leopoldo Cirne, na época afastado da FEB, para que se solidarizasse com a causa. Afinal, ter como membro do Congresso Constituinte um ex-presidente da FEB, cuja atuação a própria FEB sabia reconhecer, seria de saída algo bastante positivo para esse novo empreendimento.

A direção da FEB e de outras entidades espíritas receberam o convite para participar do congresso, muito embora a comissão preparadora não desconhecesse o papel de liderança que a FEB buscava exercer. A polêmica estava armada: se a FEB aceitasse o convite, estaria aceitando automaticamente a sua subordinação ao congresso; se recusasse, certamente seria acusada de pretensiosa e autoritária. Luiz Barreto (1890-1944), então presidente da Federação, se pronunciou sobre a querela nas linhas do Reformador8 8 Reformador, 01/12/1925. e acelerou as providências para a instalação do Conselho Federativo da FEB, aquele elaborado inicialmente por Aristide Spínola, na intenção de esvaziar o Congresso Constituinte Espírita Nacional.

Os enfrentamentos se estenderam e a redação do Reformador reforçou as críticas aos companheiros que, em sua opinião, estavam semeando “confusão e discórdia”9 9 Reformador, 16/01/1926. no movimento. De sua parte, a comissão preparadora reagiu enviando à FEB uma carta em que refutava uma a uma as críticas a ela dirigidas, carta que foi publicada e respondida também no Reformador10 10 Reformador, 16/02/1926. . Mas a posição da FEB estava dada: ela não participaria do Congresso Constituinte11 11 Reformador, 01/03/1926. e assim o fez.

Sem a presença da FEB12 12 A FEB contava certamente com aliados, dos quais recebeu diversas manifestações de apoio e solidariedade publicadas no Reformador nas edições de 01/01/1926, 01 e 16/02/1926, 16/03/1926 e 01/05/1926. , o Congresso Constituinte Espírita Nacional teve o seu início em março de 1926 no Rio de Janeiro e contou com a presença de 286 das 620 instituições convidadas (Monteiro e D’Olivo 1997MONTEIRO, Eduardo C. e D’OLIVA, Natalino. (1997), USE: 50 anos de unificação. São Paulo: USE.: 34). Foram dez dias de discussões sobre os rumos do movimento espírita brasileiro, e uma das resoluções do congresso foi a criação da Liga Espírita do Brasil (LEB), uma nova entidade federativa nacional que seria seguida pela criação de ligas estaduais e municipais responsáveis por acolher os centros espíritas que desejassem participar desse esquema federativo alternativo à FEB (Amorim 1980AMORIM, Deolindo. (1980), Ideias e reminiscências espíritas. Juiz de Fora: Instituto Maria.: 49; Cirne 1935CIRNE, Leopoldo. (1935), Antichristo. Senhor dos mundos. Rio de Janeiro: FEB.: 284).

A LEB foi então fundada em 1927 e teve como um de seus primeiros presidentes Leôncio Correia (1865-1950), advogado, escritor e jornalista paranaense que ficou na presidência de 1939 a 1942. Mesmo tendo sido figura significativa do ambiente intelectual que se formava em Curitiba no final do século XIX, e mais tarde figura importante no cenário intelectual da capital, Leôncio Correia e seus colegas da LEB não conseguiram usufruir do capital de que dispunham no sentido de manter firme a atuação da instituição. E tanto mais difícil foi mantê-la, quanto mais a FEB investiu pesados esforços na luta pelo controle exclusivo do meio espírita. Como veremos em detalhes mais adiante, a disputa entre LEB e FEB teve seu ápice em 1949, com a assinatura do Pacto Áureo. Foi nesse ano que a LEB se viu constrangida a restringir o seu campo de atuação, tornando-se uma instituição de âmbito estadual simplesmente13 1 “(…) watch the individual ants, and yet never forget the ant-heap” (Namier 1968: 47, minha tradução). .

Ainda que não desfrutasse da mesma notoriedade de que gozava a FEB, a LEB, enquanto esteve ativa, fundou a Faculdade de Estudos Psíquicos que, por sua vez, apoiou a fundação, em 1957, do Instituto de Cultura Espírita (ICEB) (Amorim 1980AMORIM, Deolindo. (1980), Ideias e reminiscências espíritas. Juiz de Fora: Instituto Maria.: 163). Ambas as organizações, diferentemente da FEB e da LEB, não pretendiam ser órgãos federativos. Tratava-se de instituições de “estudo integrado e de pesquisa institucionalizada, como referência nacional e internacional para a cultura espírita”14 14 http://www.portaliceb.org.br/wordpress/?page_id=11. Acessado em 12/07/2013. . O idealizador do ICEB, Deolindo Amorim (1906-1984), via no espiritismo, como em qualquer doutrina espiritualista, as suas decorrências morais, mas nunca defendeu o caráter propriamente de religião e discordava fortemente das teses roustainguistas. Funcionário público e jornalista, Amorim levou os princípios espíritas ao meio universitário, através de palestras e de publicação de livros, estabelecendo diálogos com áreas distintas do conhecimento, entre as quais a psiquiatria, o campo jurídico e as ciências sociais (Arribas 2014__________. (2014), No princípio era o verbo. Espíritas e espiritismos na modernidade religiosa brasileira. Tese de doutorado em Sociologia, USP.: 58-59).

Nesse rol de espíritas que concebiam a doutrina para além das fronteiras da religião estava o advogado e jornalista Carlos ImbassahyIMBASSAHY, Carlos. (2005), O espiritismo à luz dos fatos. Rio de Janeiro: FEB . (1883-1969). Redator-chefe durante muitos anos do Reformador, as preocupações de Imbassahy giravam basicamente em torno de apresentar o espiritismo como uma explicação plausível dos fenômenos ligados ao psiquismo. Sua atuação, no entanto, não se restringiu apenas às discussões no terreno científico. Imbassahy, junto de sua esposa, investiu na elaboração de um Teatro Espírita. Chegou a produzir e a encenar esquetes e pequenas peças durante as Semanas Espíritas15 15 As Semanas Espíritas tinham como objetivo promover discussões doutrinais, peças de teatro, leituras literárias e concertos musicais (Arribas 2014: 59-60). que, não obstante contassem com a presença de espíritas renomados, não duraram muito tempo, tampouco receberam incentivos da FEB, que, a propósito, se mostrou avessa a esse tipo de reunião. A posição da Federação desagradava Imbassahy, mas não havia sido suficiente para levá-lo a romper com a instituição. Ele só o fez quando, ao tomar contato com as obras de Roustaing, sentiu a necessidade de assumir uma posição contrária ao docetismo nelas apresentado. Ao fazê-lo, criou desavenças com o presidente da FEB, Wantuil de Freitas (1895-1974), defensor implacável das teses roustainguistas e para quem era fundamental que todos os participantes dos cargos diretivos da Federação não só fossem adeptos, mas professos militantes do roustainguismo.

A essa altura, final de 1930, início de 1940, Carlos Imbassahy já era conhecido no meio espírita como jornalista, literato e expositor doutrinário. Participou das duas versões do Congresso de Escritores e Jornalistas Espíritas (1939 e 1958) e incrementou o movimento de jovens espíritas, participando do I Congresso Brasileiro de Mocidades Espíritas, em 1948. E, em períodos distintos, fez coro ao lado de outros personagens igualmente críticos à FEB, entre os quais o ex-presidente da LEB, Leôncio Correia, Deolindo Amorim e o filósofo espírita Herculano Pires (1914-1979)16 16 Para mais informações sobre Herculano Pires, ver Arribas (2014: 110-120; 191-231). . E se à altura já fosse espírita, muito provavelmente teria apoiado as iniciativas do Congresso Constituinte Espírita Nacional de 1926. Voltemos a ele.

Explicitamente contrária à sua participação no Congresso Constituinte, a FEB convocou, em resposta, a primeira reunião do seu Conselho Federativo, que contou com a presença de diversas delegações17 17 Ver o opúsculo Resenha dos Trabalhos da Primeira Reunião do Conselho Federativo, editado em 1938 pela FEB, de autoria de Guillon Ribeiro. . Embora internamente ao espiritismo houvesse um fervilhamento que por si só agitava os ânimos espíritas, fosse através das discussões doutrinárias em torno das obras de Roustaing e da criação de escolas de médiuns, fosse na questão da legitimidade institucional federativa, o fato é que no plano político muitas mudanças começavam a tomar forma no Brasil, repercutindo no andamento do movimento espírita. A principal delas culminou com o golpe de Estado em 1930, lançando o país em uma fase de instabilidade. Com esse novo quadro, era praticamente desaconselhável a realização de assembleias, não importando a natureza, e nesse sentido se pronunciou Guillon Ribeiro, presidente da FEB naquele ano e a quem tinha sido delegada a responsabilidade de promover uma segunda reunião do Conselho Federativo da FEB em 1931, reunião que só se realizaria em 1933.

O engenheiro maranhense Guillon Ribeiro (1875-1943), depois de seguir carreira pública no Senado Federal, começou a frequentar o meio espírita por volta de 1911, tendo o seu maior envolvimento se iniciado uma década depois, quando presidiu a FEB de 1920 a 1921. Voltou a ocupar o mesmo posto em 1930, de onde só sairia em 1943. Foram, ao total, 15 anos de presidência durante os quais se dedicou como o idealizar e principal condutor dos mecanismos de filiação à FEB e como diretor do Reformador. Seu legado ao movimento espírita, no entanto, não termina aí. Merecem destaque dois empreendimentos: o primeiro trata-se de suas versões ao vernáculo das obras de Jean-Baptiste Roustaing, Ernesto Bozzano, Pietro Ubaldi e Gabriel Delanne. Embora nem todos os espíritas cultivassem afinidades com esses autores - em especial Roustaing e Ubaldi (Arribas 2014__________. (2014), No princípio era o verbo. Espíritas e espiritismos na modernidade religiosa brasileira. Tese de doutorado em Sociologia, USP.: 62-78; Miguel 2010 ________. (2010), “O espiritismo frente à igreja católica em disputa por espaço na Era Vargas”. Revista Esboços, Florianópolis, v. 17, n. 24, dez.) -, Guillon Ribeiro foi o responsável por formatar parte do pensamento espírita ao apresentar, em português, as obras que complementariam, segundo seu ponto de vista, a produção de Allan Kardec. E se desde 1891 a FEB vinha cultivando o projeto de montar uma oficina tipográfica própria para a impressão do Reformador e de publicações espíritas, foi com Guillon que o velho sonho se realizaria. Em 1939, os espíritas conheceriam a pequena oficina gráfica da FEB, embrião do que veio a se tornar uma das maiores editoras do meio espírita atual18 18 Com 120 anos de existência, a editora conta com mais de 500 títulos, 160 autores e 45 milhões de exemplares vendidos. Em http://www.febnet.org.br/blog/geral/divulgacao/feb-editora-na-22a-bienal-do-livro-de-sao-paulo/. Acessado em 03/06/2013. . Naquele momento, a figura do médium Francisco Cândido Xavier (1910-2002) era parcamente conhecida, mas não tardou em chamar a atenção de Guillon. Já desde o seu primeiro livro, Parnaso de Além-Túmulo, de 1932, a FEB vem editando parte das obras do médium mineiro. Não é difícil perceber que essa empreitada rendeu bons frutos para ambos os lados. Chico passaria a ser nacional e internacionalmente (re)conhecido, fazendo com que a própria imagem do espiritismo no Brasil cambiasse, dando-lhe, inclusive, maior popularidade e certa singularidade (Lewgoy 2004LEWGOY, Bernardo. (2004), O grande mediador. Chico Xavier e a cultura brasileira. Bauru: EDUSC.; Stoll 2003STOLL, Sandra Jaquecline. (2003), Espiritismo à brasileira. São Paulo: Edusp .), enquanto a FEB, além do capital econômico com a venda dos livros, amealhou um grande prestígio, interna e externamente ao meio espírita. Tudo se passava como se a FEB, por deter sob seus cuidados parte das obras de Chico Xavier, recebesse de lambujem o carisma e reconhecimento de que o médium era portador.

A FEB ia, então, construindo os seus fundamentos e sua legitimidade. Angariou muito do seu reconhecimento graças à posição socialmente privilegiada de que desfrutavam seus diretores e graças às suas ações de caráter filantrópico19 19 Vários de seus líderes participaram ativamente da criação de entidades assistenciais, como asilos, escolas, orfanatos, internatos etc., sobretudo entre as décadas de 1920 e 1940 (Giumbelli 1997a: 247). . A propósito, em função de seus serviços assistenciais, em 1934 a FEB recebia da prefeitura do Rio de Janeiro o status de “utilidade pública municipal”, insígnia importante para uma doutrina visada pelo Código Penal. Muito provavelmente trouxe benefícios fiscais à instituição, mas certamente esse reconhecimento do poder público ofereceu-lhe a oportunidade de investir ainda mais na organização federativa, incrementando o número de filiações20 20 O número de sociedades federadas em 1915 era de 23. Em “1924, [passou para] 47; já em 1925, ano em que o ‘regulamento de adesão’ começou a vigorar, o número passou para 72. Posteriormente, os anos de 1928 e 1934 assinalaram as taxas mais expressivas de crescimento; em 1941, a FEB tinha 162 sociedades diretamente filiadas e outras 168 estavam-lhe ligadas através de federações estaduais” (Giumbelli 1997a: 256). . O Regulamento de Adesão, idealizado originalmente em 1927 por Guillon Ribeiro, possibilitava agora à FEB compatibilizar os seus interesses em duas direções. Aproveitando-se da demanda em virtude do Código Penal, a instituição poderia manter a adesão dos centros como uma forma segura e privilegiada de proteção. Por outro lado, mantinha acesas as concepções doutrinárias roustainguistas, que mais à frente, pelos idos de 1940, seriam reforçadas com um novo mecanismo de “união de todas as correntes espíritas do país”, ou seja, “a exclusivamente kardecista”, a “umbandista” e a que “adotava Kardec, Roustaing e outros autores”21 21 Reformador, 01/07/1945. . Nesse sentido, a FEB buscava diluir as diferenças doutrinárias e normatizar o espiritismo no plano institucional. Com o novo mecanismo de coligação, as posições doutrinárias chegariam aos centros através do envio de jornais, livros e impressos. Mas apesar de aumentar o número de filiações, a FEB ainda mantinha adversários ou instituições indiferentes a ela. As forças de oposição mais notórias ao seu projeto unificacionista foram principalmente a Liga Espírita Brasileira (LEB), a Federação Espírita do Estado de São Paulo (FEESP) e a União Social Espírita (USE).

Além das disputas internas ao espiritismo, a FEB, como outras instituições espíritas, também teve de lidar com o recrudescimento do governo de Getúlio Vargas a partir de 1937. Um clima de cerceamento aos mais diversos grupos sociais não deixaria ilesas as entidades espíritas. Muitas delas tiveram suas portas fechadas e a própria FEB foi constrangida a fazer fichamentos policiais de todos os seus dirigentes (Giumbelli 1997a____________. (1997a), O cuidado dos mortos: Uma história da condenação e legitimação do Espiritismo. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional. : 260-261). A solução foi montar, em 1945, uma comissão para dialogar com o Chefe de Polícia. Seu porta-voz, Wantuil de Freitas, então presidente da FEB, argumentava que as instituições espíritas, como quaisquer instituições de caráter religioso, tinham todo o direito de exercer suas atividades, prevista que estava, na Constituição, a liberdade religiosa. A propósito, Wantuil de Freitas não entra nessa história somente como o líder da comissão. De 1936 a 1943 foi o responsável pelas edições do Reformador, aumentando a sua tiragem e imprimindo através do periódico as suas apreciações particulares sobre espiritismo. Em 1943 sucedeu Guillon Ribeiro na presidência, nela permanecendo por 27 anos.

Farmacêutico de formação, após trabalhar em Minas Gerais, onde nasceu, Wantuil mudou sua residência para o Rio de Janeiro, em 1924. Escreveu alguns artigos, notas e livros assinados com diferentes pseudônimos (Anjos 1993ANJOS, Luciano dos. (1993), Os adeptos de Roustaing. Rio de Janeiro: AEEV.: 210). Mas o que nos importa reter nessa sua longa trajetória encabeçando a FEB é o fato de ele manter acesa e difundir as teses de Roustaing - na verdade, foi um dos seus mais ferrenhos defensores (Anjos 1993; Arribas 2014__________. (2014), No princípio era o verbo. Espíritas e espiritismos na modernidade religiosa brasileira. Tese de doutorado em Sociologia, USP.: 84) - e de ter lutado fortemente pela liderança federativa, principalmente contra os personagens do cenário paulista, tendo sido um dos principais artífices do Pacto Áureo.

Espiritismo paulista

Personagens, instituições, temas e dilemas espíritas pululavam aqui e ali, num movimento em perceptível ascensão nas primeiras décadas do século XX, e não somente na capital. O número de centros e de seguidores crescia (Arribas 2014__________. (2014), No princípio era o verbo. Espíritas e espiritismos na modernidade religiosa brasileira. Tese de doutorado em Sociologia, USP.: 79-80), acompanhado do aumento de edições e da fundação de novos jornais e revistas (Rio 2006RIO, João do. (2006), As religiões no Rio. Rio de Janeiro: José Olympio.: 270). O recenseamento oficial de 1940 assinalava a existência de 463.400 espíritas (1,13% da população)22 22 http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/monografias/GEBIS%20-%20RJ/CD1940/Censo%20Demografico%201940%20VII_Brasil.pdf. Acessado em 15/06/2014. que se inscreveram assumidamente como tais na coluna religião. A esse respeito, a LEB instalou um posto exclusivo de atendimento em sua sede com o fim de orientar os centros e seus frequentadores no sentido de que não só a condição de espírita figurasse pela primeira vez nos questionários do Censo, mas também que os próprios espíritas se declarassem enquanto tais, preocupação igualmente abraçada pela FEB nas linhas do Reformador. E, desse total de espíritas, aproximadamente um terço residia em São Paulo.

Mas como ocorria nos demais estados, os paulistas também estavam dispersos, apesar de virem numa crescente de forças e de número. Desde os primeiros agrupamentos espíritas por volta de 1880 até a década de 1910, nenhuma entidade coordenadora do movimento fora criada em São Paulo. Num curto espaço de tempo, entretanto, surgiram pelo menos quatro grupos, todos com o mesmo objetivo: conduzir o espiritismo em terras bandeirantes. Apareceram no cenário a Sinagoga Espírita São Pedro e São Paulo (1916), a Federação Espírita do Estado de São Paulo (1926), a União Federativa Espírita Paulista (1933) e a Liga Espírita do Estado de São Paulo (1944). Entre muitos caciques e poucos índios, diria a sabedoria popular, nada mais propício do que reunir as quatro entidades numa atividade conjunta e favorável ao desenvolvimento do espiritismo em São Paulo. Sem a pretensão de acirrar qualquer confronto entre as partes, mas num claro intuito de liderar, aparecia a figura do coronel da Força Pública do Estado de São Paulo, Edgard Armond (1894-1982), então secretário geral da Federação Espírita do Estado de São Paulo (FEESP). Com o apoio dos conselheiros da FEESP, o Comandante Armond, como era conhecido, resolveu deflagrar nos idos de 1940 um movimento para solucionar a questão e promover a tão almejada unificação das sociedades espíritas, pelo menos em São Paulo. Foi sua a sugestão de realizar um congresso estadual para discutir os rumos do movimento, como veremos adiante.

Já mais adiantado na sua marcha de consolidação no Rio de Janeiro, o espiritismo em São Paulo, apesar de ter centros em várias de suas cidades, contava com “dispersão generalizada e sistemática” (Monteiro e D’Olivo 1997MONTEIRO, Eduardo C. e D’OLIVA, Natalino. (1997), USE: 50 anos de unificação. São Paulo: USE.: 64). A pauta das discussões paulistas, semelhante às preocupações fluminenses, girava em torno da unificação do movimento. Nesse cenário, surgia no ano de 1933 a União Federativa Espírita Paulista (UFEP) com o objetivo de unir, sob sua guarda, os centros espíritas de São Paulo. Até 1940, a UFEP era a maior entidade federativa do estado, aliada à FEB desde a sua fundação, sem significar necessariamente a imediata e/ou automática filiação dos centros paulistas à UFEP e, por conseguinte, à FEB.

A propósito, para quem observa atentamente a história do espiritismo no Brasil, logo vê que o andamento de suas instituições teve muitas idas e vindas. Apenas três anos após a fundação da UFEP, surgia na capital paulista, em 1936, um novo movimento unificacionista com a reinauguração da Federação Espírita do Estado de São Paulo. Embora houvesse tensões entre as instituições, não raras vezes os personagens transitavam entre elas, como foi o caso de Pedro de Camargo (1878-1966), mais conhecido pelo pseudônimo Vinícius. Originário de Piracicaba, Vinícius atuou intensamente no interior paulista com seus trabalhos assistenciais, tendo expandido a sua fé nas tribunas espíritas, na Rádio Piratininga, fundada por ele, na imprensa e na elaboração de vários livros voltados principalmente para a educação espírita. Comprometido inicialmente com a UFEP, tendo assumido a sua presidência em 1938, num primeiro momento preferiu não embarcar nessa nova iniciativa unificacionista promovida pela reinauguração da FEESP, considerando descabida a criação de várias federações, situação que, segundo ele, agravava o quadro de dispersão (Monteiro e D’Olivo 1997MONTEIRO, Eduardo C. e D’OLIVA, Natalino. (1997), USE: 50 anos de unificação. São Paulo: USE.: 40). Alguns anos mais tarde, no entanto, residindo agora na cidade de São Paulo, estreitaria suas relações com a FEESP, contribuindo desse modo para o seu fortalecimento institucional.

São Paulo contou ainda com outros atores que imprimiam igualmente seu nome no movimento espírita, adensando as discussões e dando corpo e vida às instituições. As preocupações de Vinícius também eram compartilhadas, em certa medida, pelo seu amigo Cairbar Schutel, cujo envolvimento com o espiritismo nas cidades do interior na virada do século XIX para o XX rendeu-lhe o expressivo apelido de “Bandeirante do Espiritismo”. Cairbar de Souza Schutel (1868-1938) formou-se em Farmácia na sua cidade natal, Rio de Janeiro, e mudou-se ainda jovem para Matão, em São Paulo, nela residindo 42 anos. Mesmo vivendo em uma cidade relativamente pequena, da qual foi seu primeiro prefeito, estava convencido de que sua missão era a de difundir a doutrina pelos quatro cantos do mundo. Em meio às condições precárias do interior paulista, o Bandeirante do Espiritismo fundou, em 1905, o jornal O Clarim e, em 1925, a Revista Internacional do Espiritismo, periódicos que circulam até hoje. Ministrou conferências radiofônicas pela Rádio Cultura de Araraquara e publicou alguns livros entre o período de 1911 e 1937.

Mas Schutel não estava sozinho. Dentre outros personagens, São Paulo contou também com as atividades de Antônio Gonçalves da Silva (1839-1909), mais conhecido como Batuíra, correspondente paulista do Reformador e criador de vários centros no interior e em outros estados. Batuíra fundou em 1890 o jornal Verdade e Luz e foi o responsável por proferir uma série de conferências em diversas cidades paulistas, fluminenses e mineiras. Minas Gerais, a propósito, contou também com a participação de personagens importantes para a expansão da fé espírita. A região do Triângulo Mineiro, quiçá pela proximidade, esteve sempre muito conectada às discussões que ocorriam no interior de São Paulo e nela vemos surgir a atuação, entre outros, do jornalista e vereador da Câmara Municipal de Sacramento, Eurípedes Barsanulfo (1880-1918). Antes de se tornar espírita, Eurípedes havia montado uma pequena farmácia de homeopatia, ampliando o atendimento após a sua conversão. Fundou o Grupo Espírita Esperança e Caridade, em 1905, assumiu a direção do Sanatório Espírita de Uberaba e, em 1907, criou o primeiro educandário brasileiro de orientação espírita, o Colégio Allan Kardec.

E nessa onda de investimentos em educação - uma das preocupações dos espíritas formalizada em 1904 nas “Bases da Organização Espírita” - outra personagem merece destaque: a educadora e escritora Anália Franco (1856-1919), figura de destaque na causa da instrução em São Paulo e uma das poucas mulheres do elenco de líderes espíritas daquela época. Fundadora de uma série de instituições de ensino pelo interior do estado, Anália Franco contribuiu sobremodo na formação de professores e de escolas em todo país. As atividades assistenciais, espíritas e educacionais levadas a cabo por ela também contaram com o apoio de outros nomes do espiritismo, a exemplo do taubateano Silvino Canuto de Abreu (1892-1980), farmacêutico, advogado e intelectual espírita, que se tornou colaborador, em 1934, de uma das mais antigas instituições de assistência à infância em São Paulo fundada por Anália, a Associação Feminina Beneficente e Instrutiva, além de ter trabalhado na construção de internatos em São Paulo e no Rio de Janeiro. Ao longo de sua vida, Canuto de Abreu dedicou-se à formação de sua biblioteca especializada em metapsiquismo e parapsicologia. Foi dele a iniciativa de fundar a Sociedade Metapsíquica de São Paulo e a Revista Metapsíquica, de 1936, para a qual escreveu inúmeros artigos.

As iniciativas desses e de outros espíritas nas primeiras décadas do século XX, olhando para São Paulo em específico, ainda contavam com esforços individuais, pontuais e isolados. Pioneiros da causa espírita, eles não se apoiavam propriamente em grandes instituições, exíguas à época, mas foram os responsáveis pela criação dos embriões da malha doutrinário-institucional que se expandiria depois. Criando escolas aqui, jornais, revistas e rádios ali, centros espíritas e casas editoriais acolá, esse grupo de pessoas - o que não quer dizer que estivessem agindo em conjunto, são antes atores com características sociais e interesses semelhantes - só o fez, em grande medida, porque sua condição socioeconômica o permitia. Oriundos de uma camada socialmente privilegiada, detinham um cabedal de forças e uma cartela de capitais que vinham bem a calhar ao desenvolvimento do espiritismo em solo paulista.

As décadas de 1930 e 1940 demonstrariam consideráveis avanços na direção do adensamento institucional. A FEESP reabre as portas em 1936, tendo como primeiro presidente o médico e um dos pioneiros da homeopatia no Brasil, Augusto Militão Pacheco (1866-1954). Inspetor sanitário do estado de São Paulo, Pacheco viajava com frequência pelo interior paulista, situações em que aproveitava para expandir sua fé espírita, fomentando e participando da fundação de centros e de sociedades beneficentes. Serviu de escudo para o espiritismo nas inúmeras ocasiões em que este foi atacado pelo campo médico, sobretudo pelos psiquiatras, que viam na doutrina um perigo para a saúde mental (Almeida 2007ALMEIDA, Angélica. (2007), Uma fábrica de loucos: psiquiatria x espiritismo no Brasil (1900-1950). Tese de doutorado em História, Unicamp.).

Dois anos depois de reabertas as portas, em 1938, sob a direção do advogado capixaba João Batista Pereira, a sede foi ampliada e fundiram-se à FEESP a Sinagoga Espírita São Pedro e São Paulo e a Sociedade Metapsíquica de São Paulo, dando origem ao que se chamou na época de “A Casa dos Espíritas do Brasil” ou a “nova FEESP”. Com a inauguração dessa sede, a instituição acabou ganhando destaque, atingindo de uma só vez tanto os interesses da União Federativa Espírita Paulista (UFEP) quanto da FEB. Como resultado desse choque, surgiram mais dissensões e prejuízos para a concretização da tão almejada unificação.

As dissenções vinham também por conta de uma nova corrente de pensamento espírita, encabeçada pelo Comandante Edgard Armond. Quando Armond chegou ao espiritismo, na década de 1940, as práticas espíritas se resumiam às palestras realizadas em salões, auditórios e clubes, de livre participação e sem comprometimento, e às reuniões mediúnicas de desobsessão e de efeitos físicos, práticas que os espíritas frequentemente denominaram de “mediunismo sem nenhum vínculo doutrinário”, e que por isso mesmo abriam brechas para os mais diversos tipos de invocações. Cada dirigente tinha seu modus operandi, o que dificultava a uniformização do espiritismo, tanto mais porque não havia escolas preparatórias para “formar” espíritas e médiuns. A entrada de Armond na FEESP, no entanto, iria mudar esse quadro ao propor as bases para o estudo sistemático da doutrina, com escolas e cursos preparatórios, e mais do que isso, de um espiritismo de feições esotéricas, iniciáticas e orientalistas (Souza, Arribas e Simões 2017SOUZA, André; ARRIBAS, Célia; SIMÕES, Pedro. (2017), “Feições expressivas do movimento espírita brasileiro”. Religare, Paraíba, v.14, n.1.; Arribas 2014: 167-190), causando mais atritos entre os espíritas.

A década de 1940 então começava e com ela veio a crise da UFEP manifestada com o seu esvaziamento e a consequente ida de vários de seus líderes para a FEESP. Mas isso não significou, no entanto, que a própria FEESP estivesse mais fortalecida. Embora viesse crescendo relativamente, a instituição se encontrava em situação delicada financeiramente falando, e os seus objetivos de congregar os centros e tornar-se o polo paulista demandavam inúmeros esforços muito além do que os seus atuais dirigentes podiam despender. E a esse panorama somavam-se ainda outros “fatores preocupantes” de inovações doutrinárias que foram reunidos em um comunicado oficial de 1947 (Monteiro e D’Olivo 1997MONTEIRO, Eduardo C. e D’OLIVA, Natalino. (1997), USE: 50 anos de unificação. São Paulo: USE.: 64-65).

O problema da unificação não era uma simples questão de centralização institucional apenas, e isso serve para entender não somente o caso paulista, mas o brasileiro de modo geral. O espiritismo, sem uma diretriz prática, sem um consenso doutrinário e sem uniformidade institucional, como queriam os que hoje conhecemos como “espíritas kardecistas” - lembrando que essa designação só apareceria após o surgimento do que inicialmente fora denominado de “espiritismo de umbanda”, justamente para demarcar a distinção (Giumbelli 2003____________. (2003), “O ‘baixo espiritismo’ e a história dos cultos mediúnicos”. Horizontes Antropológicos. Porto Alegre, ano 9, n. 19: 247-281.) -, dava (1) margem à introdução de práticas “exóticas e estranhas” à doutrina, (2) margem a concepções que fugiam do âmbito puramente religioso, numa tentativa de entrelaçamento com ideais “político-partidários” (Miguel 2009MIGUEL, Sinuê. (2009), “Espiritismo e política: o compasso dos espíritas com a conjuntura dos anos 1930 e 1940”. Debates do NER, ano 10, n. 15, jan./jun.: 51-52), (3) além de contribuir com o avanço de “práticas personalistas arbitrárias”, conforme comunicado oficial. Mais do que unificar, subordinando os centros a essa ou àquela instituição, era necessário também disciplinar a massa espírita, organizando e uniformizando as suas práticas e criando um sentimento de pertencimento à doutrina.

Nesse sentido, paulistas do interior e da capital se reuniram para preparar o I Congresso Espírita do Estado de São Paulo, e decidiram criar (mais) um organismo que trabalhasse para o processo de unificação. Na ocasião (1946), procedeu-se à eleição de uma Comissão Coordenadora que se incumbiria de entrar em entendimento com a UFEP, com a Sinagoga Espírita Nova Jerusalém e com a Liga Espírita do Estado de São Paulo, que juntas filiavam 290 dos 733 centros espíritas de São Paulo (Rizzini 2001RIZZINI, Jorge. (2001), J. Herculano Pires, o apóstolo de Kardec. São Paulo: Paideia.: 71). A primeira reunião da Comissão se realizou no prédio da FEESP, e por sugestão de seu líder, Edgard Armond, ficou decidido que o tal organismo receberia o nome de União Social Espírita (USE), posteriormente denominada de União das Sociedades Espíritas.

Tanto o I Congresso Espírita do Estado de São Paulo, de 1947, quanto o I Congresso Espírita da Alta Paulista, de 1946, foram realizados à revelia da FEB (Rizzini 2001RIZZINI, Jorge. (2001), J. Herculano Pires, o apóstolo de Kardec. São Paulo: Paideia.: 73; Lex 1996LEX, Ary. (1996), 60 anos de espiritismo no Estado de São Paulo. São Paulo: FEESP .: 127), que se mostrou contrária ao movimento de unificação paulista e nunca fez questão de corroborar com ele, só passando a consenti-lo no ano de 1949, quando o movimento espírita paulista começava, de fato, a ampliar o seu âmbito de influência sobre o território nacional, eclipsando, de certa forma, o papel da FEB.

Pacto Áureo

No início de 1948, o comitê de preparação do II Congresso Espírita do Estado de São Paulo, continuação do I Congresso, tinha se organizado inicialmente para restringi-lo em termos ainda regionais, embora apenas um pouco mais ampliado, denominando-se agora Congresso Espírita Centro-Sulino. Entretanto, por conta da repercussão que passaram a ter as iniciativas de São Paulo, o comitê viu a possibilidade de alargar a abrangência, já que, sem o prever, mas tendo que lidar com a nova situação, havia recebido pedidos de inscrição do Norte e do Nordeste do país. Com isso, a USE preferiu convidar a FEB, a quem caberia teoricamente a tarefa de organizar eventos em âmbito nacional, para dirigir o evento. A FEB respondeu negativamente (Monteiro e D’Oliva 1997MONTEIRO, Eduardo C. e D’OLIVA, Natalino. (1997), USE: 50 anos de unificação. São Paulo: USE.: 95).

Com ou sem a anuência da FEB, o congresso acabou sendo realizado em 1948 sob os auspícios da USE, então presidida por Armond. Contou com a participação de 16 estados e com a apresentação de nove teses sobre unificação. O evento passou a se chamar Congresso Brasileiro de Unificação Espírita. Doravante, como ficou evidente na nova denominação, na pauta entravam temas que deveriam ser discutidos nacionalmente: “(1) unificação nos estados; (2) unificação no país; e (3) estudo de problemas doutrinários de natureza fundamental e urgente” (Monteiro e D’Oliva 1997MONTEIRO, Eduardo C. e D’OLIVA, Natalino. (1997), USE: 50 anos de unificação. São Paulo: USE.: 114). No documento que registra as resoluções finais do congresso, entre vários pontos, há explicitamente a proposta de criação de um Conselho Federativo Nacional (CFN) (Monteiro e D’Oliva 1997: 116), semelhante àquele modelo discutido em 1926 durante o Congresso Constituinte Espírita Nacional, o qual havia recebido críticas da FEB, que na ocasião também havia proposto, como resposta, a criação do seu próprio conselho. A questão que estava por trás do CFN era a seguinte: muitas organizações, dentre elas a União Espírita Mineira, a Federação Espírita do Rio Grande do Sul e a própria USE, almejavam criar (mais) um órgão federativo nacional e, dessa forma, com o apoio de várias instituições, o âmbito de atuação da FEB, que continuaria existindo com o mesmo nome, ficaria restrito ao Rio de Janeiro, ou seja, mais um episódio de tensão com a FEB. Muito em breve, no entanto, ela iria revidar, dando (ou pelo menos tentando dar) um xeque-mate à situação.

Paralelamente às discussões brasileiras, debates ocorriam também em outros países da América Latina. Em 1946, preocupados com a organização do movimento espírita no continente americano, fora realizado em Buenos Aires o I Congresso Espírita Pan-Americano, a partir do qual se criou a Confederação Espírita Pan-Americana (CEPA). O congresso contou com representantes de 10 países e uma das principais orientações da CEPA, considerada polêmica para alguns espíritas, defendia uma doutrina calcada na filosofia moral de Jesus, mas sem caráter religioso, promovendo a difusão de um espiritismo humanista, laico, livre-pensador, progressista e universalista23 23 http://cepabrasil.blogspot.com.br/. Acessado em 30/01/2018. . O segundo congresso da CEPA seria realizado três anos depois, no Rio de Janeiro, à revelia da FEB e com a participação da USE.

O ano era o de 1949; o local, o Teatro João Caetano. Ali estava sendo realizado o II Congresso Espírita Pan-Americano. Na ocasião, alguns de seus integrantes, encabeçados pelo engenheiro Arthur Lins de Vasconcelos Lopes (1891-1952), presidente da Federação Espírita do Paraná e vice-presidente da LEB, talvez insatisfeitos com os rumos do movimento espírita, promoveram uma reunião com o então presidente da FEB, Wantuil de Freitas. Muito provavelmente durante essa conversa, ou pelo menos a partir dela, teriam os seus participantes elaborado um documento que mais tarde seria chamado de Pacto Áureo. Até aí, nenhum problema. Acontece que não só a forma como ele foi apresentado, mas, sobretudo, o seu conteúdo causaram calorosas discussões. A exemplo do que já tinha sido discutido e aprovado no I Congresso Espírita Pan-Americano a respeito da criação de uma Confederação Espírita Pan-Americana, o II Congresso Espírita Pan-Americano fomentou a ideia de criar, no Brasil, a partir desse modelo, um Conselho Federativo Nacional. A FEB não estava participando desse congresso e, por isso, ao menos teoricamente, não teria como saber o que estava sendo discutido nele. Donde se segue que a tal reunião entre alguns integrantes do II Congresso e a FEB tenha sido de importância nada desprezível para os fatos que se desenrolaram no cenário carioca.

Como vários integrantes do movimento espírita estavam em estância no Rio de Janeiro por conta do II Congresso da CEPA, e como alguns deles se mostraram a favor da FEB a ponto de se reunirem com seu presidente para colocá-lo a par das discussões do congresso, tudo indica que as tensões vividas naquele momento chegaram a tal ponto de mal-estar que os líderes espíritas foram obrigados a convocar uma reunião extraordinária e aberta na própria sede da FEB. Marcada para o dia 5 de outubro de 1949, Wantuil de Freitas, ausente das discussões do II Congresso da CEPA, logo ao chegar à reunião dá a conhecer um documento já totalmente elaborado, que propunha uma (nova) diretriz para a unificação do movimento espírita. O artigo segundo do documento24 24 Reformador, nov./1949. dizia que “A FEB criará um Conselho Federativo Nacional, permanente, com a finalidade de executar, desenvolver e ampliar os planos da sua atual Organização Federativa”, o mesmo modelo que vinha sendo discutido naquele exato momento no II Congresso Espírita Pan-Americano. E esse CFN teria a sua sede na FEB.

Acordo de Cavalheiros, como alguns preferiram designar, ou Pacto Áureo, como ficou mais conhecido, o fato é que parecia que finalmente a tão almejada unificação tinha dado o seu último passo. Esse documento, no entanto, causaria uma série de novas tensões. Dizia o artigo primeiro do Pacto: “Cabe aos Espíritas do Brasil porem em prática a exposição contida no livro ‘Brasil: Coração do Mundo, Pátria do Evangelho’, de maneira a acelerar a marcha evolutiva do Espiritismo”. Publicado em 1938 por Chico Xavier, cuja autoria espiritual é atribuída ao escritor Humberto de Campos, esse livro, que causou atritos no movimento espírita (Arribas 2010ARRIBAS, Célia. (2010), Afinal, espiritismo é religião? São Paulo: Ed. Alameda/Fapesp.: 197-240), narra certos fatos históricos do Brasil à luz do espiritismo e coloca o país como o grande promotor do Evangelho no mundo, tarefa que seria realizada, segundo a narrativa, pela FEB e seus integrantes, sobretudo os pertencentes ao grupo dos religiosos, que figuravam como os eleitos da “Casa Máter” do espiritismo, leia-se FEB. A referência a essa obra, além de enaltecer e consagrar a FEB e seus dirigentes, respondia aos anseios dos roustainguistas, dada a inclusão, nessa versão espírita da história, de Roustaing na “plêiade de auxiliares” de Kardec na missão de levar o Evangelho ao mundo (Xavier 1990XAVIER, Francisco Cândido. (1990), Brasil, coração do mundo, pátria do evangelho. Brasília: FEB.: 176).

Uns defendiam que ali, “em ocasião memorável para o movimento espírita”, havia sido realizado o grande acordo em prol da unificação; outros, porém, menos efusivos, viam nesse fato antes um conchavo do que propriamente um acordo que pressupõe a anuência dos partícipes. A LEB e a USE, naquele momento, acabaram se submetendo às orientações do Pacto, consequentemente, da FEB, embora muitos espíritas paulistas e cariocas tenham se mantido contrários à Federação.

Apesar da oposição e depois de quase cinco décadas de discussão, foi criado por fim o Conselho Federativo Nacional no ano de 1950 com a presença de conselheiros representantes de 11 estados. A necessidade que havia de se contar com a participação a mais ampla possível, sobretudo daqueles estados que não haviam firmado o Pacto Áureo, fez com que o trabalho de articulação para a expansão da adesão se desenvolvesse rapidamente. Nesse sentido fora criada a “Caravana da Fraternidade”, um grupo de espíritas integrantes ou afins à FEB, signatários do Pacto, que se juntaram no intuito de levar às demais regiões do país o “esclarecimento” necessário sobre a importância e as diretrizes do trabalho de união dos espíritas e das instituições (Arribas 2014__________. (2014), No princípio era o verbo. Espíritas e espiritismos na modernidade religiosa brasileira. Tese de doutorado em Sociologia, USP.: 129-130). A empreitada contou basicamente com visitas a centros e aos programas sociais espíritas, e com a promoção de reuniões e conferências públicas para “reajustamento” de pontos de vista (FEB 2010____. (2010), Orientação aos órgãos de unificação. Rio de Janeiro: FEB.: 130). E, claro, era incentivada a participação dessas instituições no Conselho Federativo Nacional, concebido agora como o órgão de “Unificação e da Organização Federativa da Federação Espírita Brasileira”. O CFN, “como representação do Movimento Espírita brasileiro”, passava a exercer a partir de então “funções deliberativas, normativas, orientadoras, coordenadoras e supervisoras” com o objetivo de “(1) unificar e dinamizar o Movimento Espírita brasileiro; (2) facilitar o intercâmbio, o inter-relacionamento e a discussão de problemas comuns às instituições que o compõem; (3) promover a união, a confraternização, a concórdia e a solidariedade entre as instituições, para que se verifique completa harmonia de propósitos e unidade na divulgação e na prática do Espiritismo”25 25 http://www.febnet.org.br/blog/geral/movimento-espirita/o-que-e-o-cfn/. Acessado em 05/06/2013. .

Tendo uns concordado com o Pacto Áureo, outros no ataque constante a seu teor, a questão é que os espíritas não haviam achado maneira consensual de se definir em termos institucionais, o que significa dizer, em certa medida, que também não haviam chegado a um consenso em termos teórico-doutrinários. Os debates e embates ao longo de cinco décadas em torno da criação de um Conselho Federativo Nacional nos ajudam a discernir com mais clareza sobre esse ponto. As discussões sobre unificação durante a primeira metade do século XX, longe de equacionar a pluralidade de instituições e vertentes, como queria parcela dos espíritas, acabaram contribuindo para a manutenção dessa pluralidade como forma de resistência, de parte de alguns adeptos, a certo enrijecimento burocrático e doutrinário.

Apontamentos finais

As várias apropriações subjetivas de que o espiritismo foi objeto, ensejadas já desde a sua formulação teórica original, levaram seus adeptos, em especial os líderes espíritas, à produção de diversas sistematizações, adaptações e/ou adequações, que propiciaram a fundação de entidades e instituições espíritas, a depender de suas trajetórias sociais, momento histórico e capacidades de compreensão. Embora não tenham encontrado consenso, como pretendia parcela das lideranças do movimento, os eventos que levaram à assinatura do Pacto Áureo e à criação do Conselho Federativo Nacional contribuíram para certa organização doutrinária e centralização institucional, e nos auxiliam a discernir com mais clareza sobre a pluralidade de visões espíritas de mundo. Fato estruturante do espiritismo, a tensão interna expressa por meio dos vários personagens e instituições, alguns deles analisados neste artigo, nos mostra como a luta pela autoridade de ditar o que é ou não espiritismo conduz os diferentes atores a um jogo duplo: de enunciação doutrinal, certamente, mas também - e esse foi o foco central do artigo - de definição e de consolidação do lugar de enunciação legítima: as instituições.

Particularmente férteis foram as discussões no Rio de Janeiro e em São Paulo, em que se assistiu a um expressivo adensamento institucional, com a criação, cisões e fusões de uma série de entidades espíritas, bem como com a realização de congressos - momentos privilegiados de discussões e de enfrentamentos de concepções - e o surgimento de uma malha editorial própria, tornando propício, como consequência, o incremento da produção intelectual espírita, que registrou um crescimento a partir de então e desembocou em mais vertentes espíritas, contribuindo para o adensamento teórico-doutrinário.

As injunções externas enfrentadas pelos espíritas, tanto por parte do Estado quanto do poder médico-científico e das religiões concorrentes, não deixam de ser, em certa medida, consequências ou respostas às próprias discussões internas ao espiritismo. Ainda que a divisão entre as ênfases filosófica, científica e religiosa não seja de todo excludente, tratando-se, antes, de diferenças de abordagem - não impedindo a circulação dos atores entre os grupos -, o estudo dessa dinâmica na primeira metade do século XX nos mostra, através da participação de cada um na história, na formação e na modificação das estruturas de sustentação do espiritismo, algumas das muitas vertentes espíritas, que ora privilegiaram o aspecto religioso, como foi o caso dos roustainguistas e de um espiritismo de tonalidades esotérico-orientalistas, ora o lado científico, com destaque para as discussões sobre cura e homeopatia, os estudos metapsíquicos e parapsicológicos, ora o lado filosófico e humanista, que traz uma propensão à laicidade e à produção literária e artística.

Com um conjunto de organizações e de pessoas cada vez mais bem encorpado e plural, o alastramento de associações, práticas e formas de apropriação, todas elas perfeitamente adjetivadas de espíritas, contribuíram para fomentar, ao mesmo tempo em que são o resultado da tríplice face do espiritismo, que ensejou a que certos grupos e personagens, uns mais afeitos que outros a uma das faces em razão de suas trajetórias sociais, capitais amealhados e capacidades de compreensão, se enfrentassem pelos tipos de autoridade específicos ao espiritismo (Arribas 2014__________. (2014), No princípio era o verbo. Espíritas e espiritismos na modernidade religiosa brasileira. Tese de doutorado em Sociologia, USP.: 133-160) de acordo com suas visões ideais, corporificando-as em instituições às suas imagens e semelhanças.

Bibliografia

  • ABREU, Canuto. (1996), Bezerra de Menezes. São Paulo: FEESP.
  • ALMEIDA, Angélica. (2007), Uma fábrica de loucos: psiquiatria x espiritismo no Brasil (1900-1950). Tese de doutorado em História, Unicamp.
  • AMORIM, Deolindo. (1980), Ideias e reminiscências espíritas. Juiz de Fora: Instituto Maria.
  • _______________. (2011), Espiritismo e Africanismo. São Paulo: Pensamento Social Espírita.
  • ANJOS, Luciano dos. (1993), Os adeptos de Roustaing. Rio de Janeiro: AEEV.
  • AQUARONE, Francisco. (1980), Bezerra de Menezes, o médico dos pobres. São Paulo: Editora Aliança.
  • ARRIBAS, Célia. (2010), Afinal, espiritismo é religião? São Paulo: Ed. Alameda/Fapesp.
  • __________. (2011), “Espiritismo: entre crime e religião”. MNEME - Revista de Humanidades, 11(29), janeiro/julho.
  • __________. (2014), No princípio era o verbo. Espíritas e espiritismos na modernidade religiosa brasileira. Tese de doutorado em Sociologia, USP.
  • AUBRÉE, Marion & LAPLANTINE, François. (1990), La Table, le livre et les esprits. Paris: S.l. Jean Claude Lattes.
  • BOURDIEU, Pierre. (1983), “Mas quem criou os criadores?” Questões de sociologia. Rio de Janeiro: Editora Marco Zero.
  • ___________. (1986), “L’Illusion Biographique”. In: Actes de la Recherche em Sciences Sociales, v. 62, n. 62/62.
  • ___________. (2001), “Gênese e estrutura do campo religioso”; “Uma interpretação da teoria da religião de Max Weber”. A economia das trocas simbólicas. São Paulo: Perspectiva.
  • CIRNE, Leopoldo. (1935), Antichristo. Senhor dos mundos. Rio de Janeiro: FEB.
  • DAMAZIO, Sylvia. (1994), Da elite ao povo. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil.
  • FEB. (1907), As curas espíritas perante a lei. Rio de Janeiro: FEB .
  • ____.(1924), Esboço histórico da FEB. Rio de Janeiro: FEB.
  • ____. (2010), Orientação aos órgãos de unificação. Rio de Janeiro: FEB.
  • GAMA, Ramiro. (2001), Lindos casos de Bezerra de Menezes . São Paulo: LAKE.
  • GIUMBELLI, Emerson. (1995), Em Nome da Caridade: Assistência Social e Religião nas Instituições Espíritas. Rio de Janeiro: Núcleo de Pesquisas do ISER, vol. I.
  • ____________. (1997a), O cuidado dos mortos: Uma história da condenação e legitimação do Espiritismo. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional.
  • ____________. (1997b), “Heresia, doença, crime ou religião: O espiritismo no discurso de médicos e cientistas sociais”. Revista de Antropologia. São Paulo, USP, vol. 40, n.º 2: 33-82.
  • ____________. (1998), “Caridade, assistência social, política e cidadania”. In: LADIN, Leilah (org.). Ações em sociedade: Militância, caridade, assistência. Rio de Janeiro: NAU / ISER.
  • ____________. (2003), “O ‘baixo espiritismo’ e a história dos cultos mediúnicos”. Horizontes Antropológicos. Porto Alegre, ano 9, n. 19: 247-281.
  • GODOY, Paulo Alves & LUCENA, Antônio. (1990), Personagens do Espiritismo. São Paulo: Edições FEESP.
  • HESS, David. (1987a), “The many rooms of Spiritism in Brazil”. Luso-Brazilian Review, XXIV, n.2: 15-34.
  • _______. (1987b), “O espiritismo e as ciências”. Religião e Sociedade. Rio de Janeiro, n.º4(3): 40-54.
  • _______. (1987c), Spiritism and Science in Brazil. An Anthropological interpretation on religion and ideology. Tese de doutorado em Antropologia, Universidade de Cornell, EUA.
  • IMBASSAHY, Carlos. (2005), O espiritismo à luz dos fatos. Rio de Janeiro: FEB .
  • ISAIA, Artur. (2006), “Espiritismo, catolicismo e saber médico psiquiátrico”. ISAIA, Artur (org.). Orixás e Espíritos. Uberlândia: EDUFU.
  • LEWGOY, Bernardo. (2004), O grande mediador. Chico Xavier e a cultura brasileira. Bauru: EDUSC.
  • __________. (2006), “Representações de ciência e religião no espiritismo kardecista: antigas e novas configurações”. Civitas, Porto Alegre, v. 6, n. 2, jul-dez.
  • LEX, Ary. (1996), 60 anos de espiritismo no Estado de São Paulo. São Paulo: FEESP .
  • MACHADO, Ubiratan. (1983), Os intelectuais e o espiritismo. Rio de Janeiro: Edições Antares.
  • MAGGIE, Yvonne. (1992), Medo do feitiço: Relações entre magia e poder no Brasil. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional .
  • MIGUEL, Sinuê. (2009), “Espiritismo e política: o compasso dos espíritas com a conjuntura dos anos 1930 e 1940”. Debates do NER, ano 10, n. 15, jan./jun.
  • ________. (2010), “O espiritismo frente à igreja católica em disputa por espaço na Era Vargas”. Revista Esboços, Florianópolis, v. 17, n. 24, dez.
  • MONTEIRO, Eduardo C. e D’OLIVA, Natalino. (1997), USE: 50 anos de unificação. São Paulo: USE.
  • NAMIER, Lewis B. (1968), “The biography of ordinary men”. Skyscrapers and other essays. Nova Iorque: MacMillan.
  • NEGRÃO, Lísias. (1996), Entre a cruz e a encruzilhada. São Paulo: Edusp.
  • PRANDI, Reginaldo. (2012), Os mortos e os vivos: uma introdução ao espiritismo. São Paulo: Três Estrelas.
  • RIO, João do. (2006), As religiões no Rio. Rio de Janeiro: José Olympio.
  • RIZZINI, Jorge. (2001), J. Herculano Pires, o apóstolo de Kardec. São Paulo: Paideia.
  • SCHRITZMEYER, Ana Lúcia. (2004), Sortilégio de saberes: curandeiros e juízes nos tribunais brasileiros (1900-1990) . São Paulo: IBCCRIM.
  • SOUZA, André; ARRIBAS, Célia; SIMÕES, Pedro. (2017), “Feições expressivas do movimento espírita brasileiro”. Religare, Paraíba, v.14, n.1.
  • STOLL, Sandra Jaquecline. (2003), Espiritismo à brasileira. São Paulo: Edusp .
  • WANTUIL, Zêus. (2002), Grandes espíritas do Brasil. Rio de Janeiro: FEB .
  • WARREN, Donald. (1984), “A terapia espírita no Rio de Janeiro por volta de 1900”. Religião e Sociedade , Rio de Janeiro, n.º11(3).
  • __________. (1986), “A medicina espiritualizada”. Religião e Sociedade, Rio de Janeiro, n.º 13(1).
  • WEBER, Max. (2000), “Sociologia da religião”. Economia e sociedade. Brasília: Ed. Universidade de Brasília.
  • XAVIER, Francisco Cândido. (1990), Brasil, coração do mundo, pátria do evangelho. Brasília: FEB.

Notas

  • 1
    “(…) watch the individual ants, and yet never forget the ant-heap” (Namier 1968NAMIER, Lewis B. (1968), “The biography of ordinary men”. Skyscrapers and other essays. Nova Iorque: MacMillan.: 47, minha tradução).
  • 2
    No final do século XIX, havia somente no Rio de Janeiro aproximadamente 35 associações espíritas (Giumbelli 1997a____________. (1997a), O cuidado dos mortos: Uma história da condenação e legitimação do Espiritismo. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional. : 59-60).
  • 3
    As biográficas deste artigo foram consultadas em Zêus Wantuil (2002WANTUIL, Zêus. (2002), Grandes espíritas do Brasil. Rio de Janeiro: FEB .) e Godoy & Lucena (1990GODOY, Paulo Alves & LUCENA, Antônio. (1990), Personagens do Espiritismo. São Paulo: Edições FEESP.).
  • 4
    Alguns jornais da capital trouxeram apreciações positivas sobre o evento: A Noite, em 08/12/1911, A Imprensa e o Correio da Manhã, ambos de 09/12/1911, e O Paiz, de 10/12/1911.).
  • 5
    Reformador, jan./1979.
  • 6
    Na época existiam apenas três casas que reuniam os centros espíritas locais: a Sociedade Espírita do Rio Grande do Sul (1887), a Federação Espírita Amazonense (1901) e a Federação Espírita do Paraná (1903).
  • 7
  • 8
    Reformador, 01/12/1925.
  • 9
    Reformador, 16/01/1926.
  • 10
    Reformador, 16/02/1926.
  • 11
    Reformador, 01/03/1926.
  • 12
    A FEB contava certamente com aliados, dos quais recebeu diversas manifestações de apoio e solidariedade publicadas no Reformador nas edições de 01/01/1926, 01 e 16/02/1926, 16/03/1926 e 01/05/1926.
  • 13
    Depois do Pacto Áureo, a LEB restringiu a sua atuação ao Distrito Federal, passando a se denominar Liga Espírita do Distrito Federal (LEDF). No final da década de 1950, com a transferência da capital para Brasília, passou a ter nova denominação: Liga Espírita do Estado da Guanabara (LEEG). Com a fusão do estado da Guanabara com o estado do Rio de Janeiro, em 1975, passou a se denominar Federação Espírita do Estado do Rio de Janeiro – Seção Capital (FEERJ), instituição declaradamente contrária à FEB, vindo a se fundir com a Federação Espírita do Estado do Rio de Janeiro, fundada em 1907FEB. (1907), As curas espíritas perante a lei. Rio de Janeiro: FEB . em Niterói, assumindo esta última a designação Seção Interior. Devido a questionamentos da antiga FEERJ, e para evitar conflitos, a FEERJ – Seção Capital passou a se denominar União das Sociedades Espíritas do Estado do Rio de Janeiro (USEERJ), em 1981. Mais recentemente teve lugar o processo de unificação da FEERJ e da USEERJ. As duas entidades mantiveram as respectivas estruturas jurídicas, mas mudaram a denominação social de USEERJ para Conselho Espírita do Estado do Rio de Janeiro (CEERJ), que recebeu os associados da FEERJ e passou a exercer a função federativa no Conselho Federativo Nacional da FEB. Por seu turno, a FEERJ manteve a sua personalidade jurídica inalterada para continuar com os trabalhos assistenciais e doutrinários, e passou a se denominar Instituto Espírita Bezerra de Menezes, em 2006, colocando fim ao enfrentamento vencido pela FEB.
  • 14
  • 15
    As Semanas Espíritas tinham como objetivo promover discussões doutrinais, peças de teatro, leituras literárias e concertos musicais (Arribas 2014: 59-60).
  • 16
    Para mais informações sobre Herculano Pires, ver Arribas (2014: 110-120; 191-231).
  • 17
    Ver o opúsculo Resenha dos Trabalhos da Primeira Reunião do Conselho Federativo, editado em 1938 pela FEB, de autoria de Guillon Ribeiro.
  • 18
    Com 120 anos de existência, a editora conta com mais de 500 títulos, 160 autores e 45 milhões de exemplares vendidos. Em http://www.febnet.org.br/blog/geral/divulgacao/feb-editora-na-22a-bienal-do-livro-de-sao-paulo/. Acessado em 03/06/2013.
  • 19
    Vários de seus líderes participaram ativamente da criação de entidades assistenciais, como asilos, escolas, orfanatos, internatos etc., sobretudo entre as décadas de 1920 e 1940 (Giumbelli 1997a____________. (1997a), O cuidado dos mortos: Uma história da condenação e legitimação do Espiritismo. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional. : 247).
  • 20
    O número de sociedades federadas em 1915 era de 23. Em “1924, [passou para] 47; já em 1925, ano em que o ‘regulamento de adesão’ começou a vigorar, o número passou para 72. Posteriormente, os anos de 1928 e 1934 assinalaram as taxas mais expressivas de crescimento; em 1941, a FEB tinha 162 sociedades diretamente filiadas e outras 168 estavam-lhe ligadas através de federações estaduais” (Giumbelli 1997a____________. (1997a), O cuidado dos mortos: Uma história da condenação e legitimação do Espiritismo. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional. : 256).
  • 21
    Reformador, 01/07/1945.
  • 22
  • 23
    http://cepabrasil.blogspot.com.br/. Acessado em 30/01/2018.
  • 24
    Reformador, nov./1949.
  • 25

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Dez 2017

Histórico

  • Recebido
    03 Nov 2016
  • Aceito
    21 Out 2017
Instituto de Estudos da Religião ISER - Av. Presidente Vargas, 502 / 16º andar, Centro , CEP 20071-000, Tel: (21) 2558-3764 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: religiaoesociedade@iser.org.br