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A distribuição do peso ao nascer no município de São Paulo, Brasil

Birth-weight distribution in the city of S. Paulo, Brazil

Resumos

Através de levantamento amostral dos nascimentos ocorridos nas maternidades do município de São Paulo, Brasil, em 1976, foi estimada a distribuição do peso ao nascer dos nascidos vivos em São Paulo. As incidências de nascimentos abaixo de 2.501 g. e entre 2.501 e 3.000 g., 9,7% e 28,4%, foram duas vezes superiores às esperadas em uma cidade desenvolvida e concentraram-se mais nas maternidades públicas do que nas privadas.

Peso ao nascer


In 1976, a survey was made of the birth-weight of live births in the maternity hospitals in the city of S. Paulo, Brazil and was used to calculate the distribution of birth-weight in the city. Incidence of birth weight lower than 2,501 grams and between 2,501 and 3,000 grams, 9.7% and 28.4%, was two times greater than that expected in a developed city and occurred more often in public hospitals than in private hospitals.

Birth weight


A distribuição do peso ao nascer no município de São Paulo, Brasil1 1 Financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP-Processo 78/1.109) e pela Secretaria de Estado da Saúde do Estado de São Paulo. 2 Ibanez, N., 1976. Comunicação pessoal. 3 Peso inferior a 2.501 g .: diferença observada 5,10%, diferença crítica 0,76%. Peso entre 2.501 e 3.000 g .: diferença observada 14,59%, diferença crítica 1,22%. Peso entre 3.501 e 4.000 g .: diferença observada 13,72%, diferença crítica 1,41%. Peso superior a 4.000 g.: diferença observada 9,20%, diferença crítica 0,22%. 4 Peso inferior a 2.501 g.: diferença observada 3,27%, diferença crítica 1,80%. Peso entre 2.501 e 3.000 g.: diferença observada 5,04%, diferença crítica 2,75%. Peso entre 3.501 e 4.000 g.: diferença observada 3,97%, diferença crítica 2,39%. Peso superior a 4.001 g.: diferença observada 1,94%, diferença crítica 1,19%.

Birth-weight distribution in the city of S. Paulo, Brazil

Carlos Augusto MonteiroI; Midori IshiiI; Maria Helena D'Aquino BenícioI; Marina Ferreira ReaII

IDo Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública da USP — Av. Dr. Arnaldo, 715 — 01255 — São Paulo, SP — Brasil

IIDa Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo — Rua Conselheiro Nébias, 1355 — 01203 — São Paulo, SP — Brasil

RESUMO

Através de levantamento amostral dos nascimentos ocorridos nas maternidades do município de São Paulo, Brasil, em 1976, foi estimada a distribuição do peso ao nascer dos nascidos vivos em São Paulo. As incidências de nascimentos abaixo de 2.501 g. e entre 2.501 e 3.000 g., 9,7% e 28,4%, foram duas vezes superiores às esperadas em uma cidade desenvolvida e concentraram-se mais nas maternidades públicas do que nas privadas.

Unitermos: Peso ao nascer, S. Paulo, Brasil.

ABSTRACT

In 1976, a survey was made of the birth-weight of live births in the maternity hospitals in the city of S. Paulo, Brazil and was used to calculate the distribution of birth-weight in the city. Incidence of birth weight lower than 2,501 grams and between 2,501 and 3,000 grams, 9.7% and 28.4%, was two times greater than that expected in a developed city and occurred more often in public hospitals than in private hospitals.

Uniterms: Birth weight, S. Paulo, Brazil.

INTRODUÇÃO

Crescente importância vem sendo atribuída à distribuição da variável peso ao nascer no delineamento do desenvolvimento social e das condições de saúde de uma dada população. Esse papel vem sendo sustentado tanto por pesquisas ao nível da influência do peso ao nascer sobre a saúde infantil como por estudos preocupados em estabelecer a vulnerabilidade do feto às condições do ambiente.

Além de sua relação com alterações respiratórias e metabólicas de grave repercussão no pós-parto imediato, a condição de baixo peso ao nascer encontra-se associada a seqüelas neurológicas manifestas tanto em provas eletroencefalográficas como em testes de desempenho intelectual. 6,7,9,28 À condição de baixo peso ao nascer tem-se associado igualmente deficiências imunitárias capazes de diminuir a resistência do recém-nascido a infecções.2 O próprio crescimento e desenvolvimento pós-neonatal parece prejudicado pela condição de baixo peso ao nascer, ainda que venha a ocorrer em condições favoráveis.5

Estudos de mortalidade perinatal e infantil têm mostrado em vários contextos sociais a extrema dependência que a probabilidade de sobrevivência no primeiro ano de vida guarda com o estado do peso ao nascer. 3,14,15,16

Diferenciais de mortalidade infantil como os existentes entre os EUA e os países escandinavos ou como os existentes entre a população branca e não branca dos EUA, são atribuídos quase em sua totalidade a diferenças na distribuição do peso ao nascer. 1617 Nos países do terceiro mundo, seria a elevada percentagem de recém-nascidos de baixo peso o fator por sí só mais importante a explicar a excessiva mortalidade perinatal e infantil destes países.25

A ampla gama de conseqüências negativas advindas do baixo peso ao nascer alçaria este, segundo alguns estudiosos, à condição de ser o maior problema singular de saúde pública a ser enfrentado por um grande número de países.12

Por sua vez, estudos operados a nível da vulnerabilidade do crescimento intra-uterino às condições maternas de saúde e alimentação vêm revelando, cada vez mais firmemente, ser errônea a pressuposição de um parasitismo ilimitado do feto sobre as reservas nutricionais da mãe.22 Estes estudos, mais do que diferentes patrimônios genéticos, parecem explicar a heterogênea distribuição do peso ao nascer encontrada ao longo dos países e das classes sociais.1

O impacto exercido pela distribuição do peso ao nascer sobre as condições de saúde e a influência que aquela recebe das condições sócio-econômicas foram revistos recentemente em "workshop" da Organização Mundial de Saúde,26 quando foi afirmado que a distribuição do peso ao nascer exerce um importante papel na definição do nível social de saúde e de desenvolvimento. 25

Séries anuais relativas à distribuição do peso ao nascer são rotineiramente disponíveis em países desenvolvidos como os EUA e alguns países europeus, onde o peso ao nascer acompanha obrigatoriamente o registro de nascimento. Em 1962, o levantamento destas distribuições revelava incidência de baixo peso ao nascer (peso igual ou inferior a 2.500 g.) que iam de 5,0% na Suécia e Holanda a 8,0% nos EUA.16 Mais recentemente, a inclusão compulsória do peso ao nascer nos registros de nascimento da maioria dos países europeus permitiu verificar entre estes, variação de 3 a 13%13. Nos poucos estudos onde há referência a classes sociais, nota-se uma desigual distribuição de recém-nascidos de baixo peso entre as mesmas. Na Inglaterra, 5% a 6% nas classes I e II contra 11% nas classes IV e V 20; nos EUA, 6,8% entre a população branca contra 12,9% na população não branca 18; na Noruega, 5,6% entre a população nativa contra 10,7% entre a população de imigrantes 8.

Em países não desenvolvidos encontram-se apenas estudos esporádicos da distribuição de peso ao nascer, restritos a algumas localidades e, de modo geral, baseados em amostras não representativas da população. Em uma revisão destes estudos foram encontradas incidências de baixo peso ao nascer oscilando de 8 a 10% quando se tratava de estratos populacionais privilegiados, e de 13 a 43% quando se tratava de estratos pobres da população.11

Entre 1968 a 1970, a Investigação Interamericana de Mortalidade na Infância 21 que incluiu 12 áreas latino-americanas, uma delas a cidade de São Paulo, constatou uma extraordinária participação de recém-nascidos de baixo peso entre os óbitos de menores de um ano. Sobre a virtual ausência de estudos da distribuição do peso de nascimentos de recém-nascidos vivos na América Latina, assim se pronunciaram os autores da referida investigação:

"Desgraciadamente, rara vez se reúnen o publican las distribuciones de nacimientos vivos por peso al nacer en una ciudad o pais. Y sin enbargo estos datos revisten una gran importancia para comprender y interpretar las diferencias en la mortalidad en niños menores de 1 año"23.

O município de São Paulo, apesar de dispor de rede hospitalar que cobre praticamente 100% dos partos, e apesar de dispor de um razoável sistema de registros civis, também não dispõe de estatísticas oficiais sobre peso ao nascer, pois a informação sobre o mesmo fica retida em cada maternidade.

A partir do período de 1968 a 1970, estudos exploratórios da distribuição do peso ao nascer em algumas das maternidades de São Paulo deram conta de heterogêneas distribuições, com incidências de baixo peso ao nascer que iam de 7,1% a 18,0%2 1 Financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP-Processo 78/1.109) e pela Secretaria de Estado da Saúde do Estado de São Paulo. 2 Ibanez, N., 1976. Comunicação pessoal. 3 Peso inferior a 2.501 g .: diferença observada 5,10%, diferença crítica 0,76%. Peso entre 2.501 e 3.000 g .: diferença observada 14,59%, diferença crítica 1,22%. Peso entre 3.501 e 4.000 g .: diferença observada 13,72%, diferença crítica 1,41%. Peso superior a 4.000 g.: diferença observada 9,20%, diferença crítica 0,22%. 4 Peso inferior a 2.501 g.: diferença observada 3,27%, diferença crítica 1,80%. Peso entre 2.501 e 3.000 g.: diferença observada 5,04%, diferença crítica 2,75%. Peso entre 3.501 e 4.000 g.: diferença observada 3,97%, diferença crítica 2,39%. Peso superior a 4.001 g.: diferença observada 1,94%, diferença crítica 1,19%. 24,26,29. A heterogeneidade nas distribuições encontradas e a atomização da assistência hospitalar ao parto (80 hospitais-maternidades em 1975) impediram entretanto que a partir daqueles estudos se pudesse levantar qualquer estimativa da real distribuição dos pesos de nascimento no município de São Paulo.

O objetivo deste trabalho é o de prover através de uma amostra probabilística de nascimentos hospitalares, uma estimativa confiável para a distribuição do peso ao nascer vigente no município de São Paulo em 1976.

MATERIAL E MÉTODOS

A população de estudo consistiu da totalidade dos nascidos-vivos das maternidades e hospitais do município de São Paulo em 1976. Uma amostra probabilística destes nascimentos foi extraída admitindo-se uma margem de erro não maior que 1% na estimação da proporção de recém-nascidos de baixo peso (peso ao nascer inferior a 2.501 gramas) e fixando-se um risco a de 5%. Considerando-se a distribuição do peso ao nascer verificada em algumas maternidades desse município, chegou-se à conclusão de que a proporção de recém-nascidos de baixo peso não deveria passar de 16% e que seria suficiente que a amostra contivesse 5.163" nascidos vivos. Como os dados do peso ao nascer seriam obtidos através de prontuários, e estes poderiam estar incompletos ou mesmo referirem-se a natimortos, optou-se por fixar em 6.000 os prontuários da amostra.

O processo de amostragem foi realizado em duas etapas. Na primeira etapa sorteou-se o hospital ou a maternidade e na segunda etapa foram sorteados os prontuários.

Para o sorteio do estabelecimento, as 80 maternidades e hospitais foram relacionados conforme a ordem decrescente do seu movimento de partos em 1975, último ano para o qual a Coordenadoria de Assistência Hospitalar da Secretaria do Estado da Saúde possuia dados. O movimento total de 1975, 224.207 partos foi dividido por 6.000 resultando um intervalo amostral de 37,367833. Este intervalo multiplicado por 100 foi aplicado na mencionada relação total de partos por estabelecimento, sorteando-se 60 unidades primárias de amostragem que corresponderam a 60 conjuntos de 100 partos distribuídos em 45 estabelecimentos. Uma das maternidades sorteadas, a de maior movimento, foi 6 vezes sorteada, cabendo-lhe portanto 600 partos, outra 4 vezes, outra 3 vezes, cinco outras 2 vezes e as trinta e sete restantes uma vez cada.

A segunda etapa do processo de amostragem foi realizada em cada maternidade sorteada na primeira etapa aplicando-se ao seu total de prontuários de 1976 o intervalo amostral resultante da divisão do seu movimento de partos em 1975 pelo número de partos que lhe foram inicialmente atribuídos. Desta forma, eventuais oscilações no movimento de partos de 1975 para 1976 foram compensadas, ou seja, estabelecimentos que reduziram seu movimento em 1976 tiveram também reduzida sua participação na amostra, inversamente ocorrendo com os estabelecimentos que aumentaram o seu movimento em 1976.

Com a aplicação do processo descrito, garantiu-se a cada prontuário de nascido vivo em maternidade ou hospital, em 1976, a mesma chance de integrar a amostra que ao final de 5.734 nascidos vivos.

A relação das maternidades sorteadas e o número de nascimentos estudados em cada uma delas podem ser vistos no Anexo Anexo .

A denominação "maternidades públicas" utilizadas neste trabalho refere-se ao conjunto de maternidades do Município que, pertencendo ao governo ou a entidades filantrópicas, atendem sem nenhuma discriminação a toda população necessitada. A denominação "maternidades privadas" refere-se, por sua vez, às maternidades que atendem o parto apenas mediante pagamento da paciente e/ou da Previdência Social.

A distribuição do peso ao nascer utilizada como padrão de referência para a distribuição de São Paulo corresponde ao conjunto de todos os nascimentos ocorridos na cidade sueca de Göteborg entre 1972 e 1973.4 A escolha desta localidade deveu-se ao elevado nível sócio-econômico de sua população, à existência de um eficaz sistema de proteção à maternidade e à infância, totalmente gratuito e extensível a toda população, e a excelência de seus indicadores de saúde, tais como uma mortalidade infantil de apenas 9 óbitos para cada mil nascidos vivos.

O significado estatístico das diferenças observadas na proporção de recém-nascidos em cada intervalo de peso foi estudado através do teste da diferença de duas proporções, adotando-se o nível crítico de 5% para o risco de falsa rejeição da hipótese nula.

RESULTADOS

A Distribuição do Peso ao Nascer no Município de São Paulo

A distribuição do peso ao nascer observada na amostra dos nascimentos vivos ocorridos nas maternidades em 1976 é apresentada na Tabela 1.

A média do peso dos 5.734 recém-nascidos amostrados foi de 3.133 g. com desvio-padrão de 544 g. A mediana dos pesos situou-se em 3.157 g.

Serrano e Puffer23 defendem o conceito de que do ponto de vista da Saúde Pública é mais seguro supor que, em circunstâncias ideais, o organismo humano tem o mesmo potencial para atingir índices ótimos de crescimento e desenvolvimento uterino, independentemente do lugar geográfico e das características étnicas. E ainda, que as diferenças referentes às distribuições de peso ao nascer de uma para outra área podem ser devidas a diferenças no estado de saúde e nutrição das mães.

Atendendo este conceito é que se procurou cotejar a distribuição do peso ao nascer vigente em São Paulo com a mesma distribuição vigente em outra cidade onde se supõem existir condições ideais para um ótimo crescimento e desenvolvimento intra-uterino.

A Distribuição do Peso ao Nascer em São Paulo versus Göteborg

A distribuição percentual dos pesos de nascimento observados em São Paulo é referida à distribuição encontrada na cidade sueca de Göteborg (Tabela 2 e Fig. 1), depreendendo-se que:


— a incidência do "baixo peso ao nascer" (peso inferior a 2.501 g.) em São Paulo excede em duas vezes a incidência observada em Göteborg, 9,66% contra 4,56%;

— a incidência do "peso deficiente ao nascer" (peso entre 2.501 e 3.000 g.) em São Paulo supera igualmente em duas vezes a incidência observada em Göteborg, 28,44% contra 13,85%;

— o intervalo de peso ao nascer entre 3.501 e 4.000 g., considerado o intervalo mais favorável tendo em vista a sobrevivência do recém-nascido 23, compreende 18,92% dos recém-nascidos de São Paulo e 32,64% dos recém-nascidos de Göteborg;

— os nascimentos com mais 4.000 g. representam 4,06% dos nascimentos ocorridos em São Paulo e 13,26% dos nascimentos em Göteborg.

A análise estatística das diferenças observadas entre o município de São Paulo e a cidade de Göteborg quanto às proporções de recém-nascidos nos quatro intervalos de peso destacados, revela que todas são estatisticamente significantes.3 1 Financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP-Processo 78/1.109) e pela Secretaria de Estado da Saúde do Estado de São Paulo. 2 Ibanez, N., 1976. Comunicação pessoal. 3 Peso inferior a 2.501 g .: diferença observada 5,10%, diferença crítica 0,76%. Peso entre 2.501 e 3.000 g .: diferença observada 14,59%, diferença crítica 1,22%. Peso entre 3.501 e 4.000 g .: diferença observada 13,72%, diferença crítica 1,41%. Peso superior a 4.000 g.: diferença observada 9,20%, diferença crítica 0,22%. 4 Peso inferior a 2.501 g.: diferença observada 3,27%, diferença crítica 1,80%. Peso entre 2.501 e 3.000 g.: diferença observada 5,04%, diferença crítica 2,75%. Peso entre 3.501 e 4.000 g.: diferença observada 3,97%, diferença crítica 2,39%. Peso superior a 4.001 g.: diferença observada 1,94%, diferença crítica 1,19%.

A Distribuição do Peso ao Nascer em Maternidades Públicas versus Maternidades Privadas

Na amostra dos nascimentos hospitalares de 1976 do município de São Paulo, 23,6% ocorreram em maternidades públicas que servem especialmente à população de baixa renda da cidade. A distribuição do peso ao nascer observada nestas maternidades encontra-se na Tabela 3 e Fig. 2 contrastada à distribuição observada nas maternidades privadas do Município. Dali depreende-se que:


— a incidência do baixo "peso ao nascer" nas maternidades públicas de São Paulo é 1,36 vezes superior à incidência observada nas maternidades privadas, 12,11% contra 8,88%;

— a incidência do "peso deficiente ao nascer" nas maternidades públicas excede em 1,19 vezes a incidência observada nas maternidades privadas, 32,45% contra 27,21%;

— o intervalo de peso ao nascer considerado mais favorável para a sobrevivência do recém-nascido, de 3.501 a 4.000 g. compreende 15,89% dos recém-nascidos das maternidades públicas e de 19,86% dos recém-nascidos das maternidades privadas;

— os nascimentos com mais de 4.000 g. representam 2,58% dos nascimentos ocorridos nas maternidades públicas e 4,52% dos ocorridos nas maternidades privadas.

Quanto às proporções de recém-nascidos nos quatro intervalos destacados, a análise estatística das diferenças observadas entre as maternidades públicas e privadas revela que todas são estatisticamente significantes.4 1 Financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP-Processo 78/1.109) e pela Secretaria de Estado da Saúde do Estado de São Paulo. 2 Ibanez, N., 1976. Comunicação pessoal. 3 Peso inferior a 2.501 g .: diferença observada 5,10%, diferença crítica 0,76%. Peso entre 2.501 e 3.000 g .: diferença observada 14,59%, diferença crítica 1,22%. Peso entre 3.501 e 4.000 g .: diferença observada 13,72%, diferença crítica 1,41%. Peso superior a 4.000 g.: diferença observada 9,20%, diferença crítica 0,22%. 4 Peso inferior a 2.501 g.: diferença observada 3,27%, diferença crítica 1,80%. Peso entre 2.501 e 3.000 g.: diferença observada 5,04%, diferença crítica 2,75%. Peso entre 3.501 e 4.000 g.: diferença observada 3,97%, diferença crítica 2,39%. Peso superior a 4.001 g.: diferença observada 1,94%, diferença crítica 1,19%.

COMENTÁRIOS E CONCLUSÕES

A ausência do peso ao nascer nos registros de nascimento do município de São Paulo obrigou a uma busca exaustiva nos arquivos de 45 diferentes maternidades para estimar algo que poderia ser conhecido na sua exatidão, todos os anos, se um procedimento relativamente simples — a transcrição dos pesos obtidos nas maternidades para os registros de nascimento fosse obrigatória aos proprietários dos cartórios civis. Por outro lado, a ausência de sistematização na coleta e arquivo das informações relativas a gestantes impediu que a partir das maternidades se estimasse a associação do peso ao nascer com importantes características maternas e sócio-econômicas. O que de resto, também poderia ser conhecido, se ao lado das demais informações do registro de nascimento fosse incluído o peso ao nascer. Segundo Laurenti,10 seria de todo desejável que se implantasse, em nível nacional, uma declaração de nascimento semelhante à existente em países desenvolvidos e que contivesse informação sobre o peso ao nascer.

A comparação da distribuição do peso ao nascer em São Paulo com a de outras localidades não desenvolvidas fica bastante complexa e exige muita cautela em função da não representatividade populacional da maioria dos estudos realizados. Comparado às localidades não desenvolvidas revisadas por Lechtig e col.,11 o município de São Paulo encontrar-se-ia em posição bastante favorável, com incidência de recém-nascidos de baixo peso próxima à encontrada apenas em estratos privilegiados daquelas populações. A comparação com as outras duas localidades brasileiras incluídas na Investigação Interamericana de Mortalidade na Infância seria favorável a São Paulo no caso de Recife, 19 porém desfavorável no caso de Ribeirão Preto.27Compilando vários estudos realizados na América do Sul, Petros-Barvazian e Behar20 estimam para a região temperada e tropical, respectivamente, 15% e 20% de recém-nascidos de baixo peso, incidências bastante maiores do que as encontradas em São Paulo.

A comparação da distribuição do peso ao nascer de São Paulo com as distribuições nacionais de países desenvolvidos13,16 aponta em geral uma situação desfavorável para São Paulo, ainda que em certos estratos sociais daqueles países8,20 o baixo peso ao nascer possa ser mais freqüente do que no município de São Paulo como um todo.

A existência de um cuidadoso estudo de pesos de nascimento na cidade de Göteborg4 propiciou a oportunidade única de cotejar a distribuição do peso ao nascer de São Paulo com a de uma localidade onde possa se supor excelente condição materna de saúde e nutrição e pleno potencial para se chegar a ótimos índices de crescimento e desenvolvimento intra-uterino. Comparada à distribuição de peso ao nascer observada em Göteborg, a distribuição de São Paulo revelou-se bastante desfavorável não só pela incidência duas vezes maior de "baixos pesos" e "pesos deficientes", como também pela menor alocação dos demais recém-nascidos no intervalo mais favorável de 3.501 a 4.000 g. Isto implicaria para a Saúde Pública, segundo Serrano e Puffer, 23 reconhecer a existência em São Paulo de poderosos impedimentos ao pleno crescimento e desenvolvimento intra-uterino, situados possivelmente na esfera das condições de saúde e nutrição das mães.

A existência de um duplo sistema de atenção hospitalar ao parto em São Paulo, um privado que atende às pacientes com recursos para pagar ou que reúnam as condições para serem cobertas pela Previdência Social e outro público que atende indiscriminadamente toda a população necessitada, permitiu, na falta de outra indicação melhor de classe social, o estudo da distribuição social do peso ao nascer em São Paulo. Comparada à distribuição observada nas maternidades privadas, a distribuição do peso ao nascer das maternidades públicas revelou os mesmos aspectos desfavoráveis surgidos na comparação do município de São Paulo com a cidade de Göteborg, ou seja, maior incidência de "baixos pesos" e "pesos deficientes" e menor alocação relativa dos demais nascimentos no intervalo 3.501-4.000 g. Isto forneceria à Saúde Pública, ainda segundo Serrano e Puffer23, indicações de que o caminho para a resolução dos impedimentos ao pleno crescimento e desenvolvimento intra-uterino em São Paulo passa necessariamente pelo reconhecimento prévio de que estes impedimentos não se encontram homogeneamente distribuídos na sociedade. Estes impedimentos, muito possivelmente relacionados à condição de saúde e nutrição das mães, estão concentrados particularmente junto às camadas mais pobres e desassistidas da população.

Conclui-se que os fatores sócio-econômicos que determinam a desigual distribuição da morbi-mortalidade na sociedade, em São Paulo o fazem já a partir da vida intra-uterina dos indivíduos, o que deve interessar sobremaneira à Saúde Pública dado o importante papel deste período na definição das condições futuras de saúde da criança.

Recebido para publicação em 06/02/1980

Aprovado para publicação em 21/02/1980

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  • 27. TERUEL, J. R. et al. Investigación Interamericana de Mortalidad en la Nińez: peso al nacer en la región de Ribeirăo Preto, Săo Paulo, Brasil. Bol. Ofic. sanit. panamer., 79: 139-45, 1975.
  • 28. WIENER, G. R. et al. Correlates of low birth-weight: psychological status at eight to ten years of age. Pediat. Res., 2: 110-8, 1968.
  • 29. YUNES, J. Principais características médico-sociais do recém-nascido de baixo peso. Săo Paulo, 1975. [Tese de Livre-Docęncia Faculdade de Medicina da USP].

Anexo

  • 1
    Financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP-Processo 78/1.109) e pela Secretaria de Estado da Saúde do Estado de São Paulo.
    2
    Ibanez, N., 1976. Comunicação pessoal.
    3
    Peso inferior a 2.501 g
    .: diferença observada 5,10%, diferença crítica 0,76%.
    Peso entre 2.501 e 3.000 g
    .: diferença observada 14,59%, diferença crítica 1,22%.
    Peso entre 3.501 e 4.000 g
    .: diferença observada 13,72%, diferença crítica 1,41%.
    Peso superior a 4.000 g.: diferença observada 9,20%, diferença crítica 0,22%.
    4
    Peso inferior a 2.501 g.: diferença observada 3,27%, diferença crítica 1,80%.
    Peso entre 2.501 e 3.000
    g.: diferença observada 5,04%, diferença crítica 2,75%.
    Peso entre 3.501 e 4.000 g.: diferença observada 3,97%, diferença crítica 2,39%.
    Peso superior a 4.001 g.: diferença observada 1,94%, diferença crítica 1,19%.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      31 Jan 2006
    • Data do Fascículo
      Jun 1980

    Histórico

    • Aceito
      21 Fev 1980
    • Recebido
      06 Fev 1980
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