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Padrão de consumo alimentar gestacional e peso ao nascer

Resumos

OBJETIVO

Analisar se padrões de consumo alimentar durante o terceiro trimestre gestacional estão associados ao peso ao nascer.

MÉTODOS

Estudo longitudinal realizado nos municípios de Petrópolis e Queimados, RJ, entre 2007 e 2008. Foram analisados dados da primeira e segunda onda de seguimento de uma coorte prospectiva. O consumo alimentar de 1.298 gestantes foi aferido por meio de questionário de frequência alimentar semiquantitativo. Os padrões alimentares foram obtidos por análise fatorial exploratória, utilizando o método de rotação Varimax. Aplicou-se modelo de regressão linear multivariado para estimar a associação entre padrões de consumo alimentar e peso ao nascer.

RESULTADOS

Foram identificados quatro padrões de consumo, que explicam 36,4% da variabilidade, compostos da seguinte forma: (1) padrão prudente, composto por leite, iogurte, queijo, frutas e suco natural, biscoito sem recheio e carne de frango/boi/peixe/fígado, que explica 14,9% do consumo; (2) padrão tradicional, composto por feijão, arroz, vegetais, pães, manteiga/margarina e açúcar, que explica 8,8% da variação do consumo; (3) padrão ocidental, composto por batata/aipim/inhame, macarrão, farinha/farofa/angu, pizza/hambúrguer/pastel, refrigerante/refresco e carne de porco/salsicha/linguiça/ovo, que explica 6,9% da variância; e (4) padrão lanche, composto por biscoito recheado, biscoitos tipo salgadinhos, chocolate e achocolatado, que explica 5,7% da variabilidade de consumo. O padrão alimentar lanche associou-se positivamente com o peso ao nascer (β = 56,64; p = 0,04) em gestantes adolescentes.

CONCLUSÕES

Para as gestantes adolescentes, quanto maior a adesão ao padrão alimentar lanche durante a gestação, maior o peso ao nascer do bebê.

Gestantes; Nutrição Pré-Natal; Terceiro Trimestre da Gravidez; Consumo de Alimentos; Peso ao Nascer


OBJECTIVE

To analyze if dietary patterns during the third gestational trimester are associated with birth weight.

METHODS

Longitudinal study conducted in the cities of Petropolis and Queimados, Rio de Janeiro (RJ), Southeastern Brazil, between 2007 and 2008. We analyzed data from the first and second follow-up wave of a prospective cohort. Food consumption of 1,298 pregnant women was assessed using a semi-quantitative questionnaire about food frequency. Dietary patterns were obtained by exploratory factor analysis, using the Varimax rotation method. We also applied the multivariate linear regression model to estimate the association between food consumption patterns and birth weight.

RESULTS

Four patterns of consumption – which explain 36.4% of the variability – were identified and divided as follows: (1) prudent pattern (milk, yogurt, cheese, fruit and fresh-fruit juice, cracker, and chicken/beef/fish/liver), which explained 14.9% of the consumption; (2) traditional pattern, consisting of beans, rice, vegetables, breads, butter/margarine and sugar, which explained 8.8% of the variation in consumption; (3) Western pattern (potato/cassava/yams, macaroni, flour/farofa/grits, pizza/hamburger/deep fried pastries, soft drinks/cool drinks and pork/sausages/egg), which accounts for 6.9% of the variance; and (4) snack pattern (sandwich cookie, salty snacks, chocolate, and chocolate drink mix), which explains 5.7% of the consumption variability. The snack dietary pattern was positively associated with birth weight (β = 56.64; p = 0.04) in pregnant adolescents.

CONCLUSIONS

For pregnant adolescents, the greater the adherence to snack pattern during pregnancy, the greater the baby’s birth weight.

Pregnant Women; Prenatal Nutrition; Pregnancy Third Trimester; Food Consumption; Birth Weight


INTRODUÇÃO

O peso ao nascer é importante indicador da sobrevivência infantil e reflete o risco de morte e agravos à saúde durante o primeiro ano de vida.a a World Health Organization.The global burden of disease: 2004 update. Geneva; 2008 [citado 2015 abr 17]. Disponível em: http://www.who.int/healthinfo/global_burden_disease/2004_report_update/en/ Diversos fatores associam-se às variações no peso ao nascer, destacando-se o consumo alimentar materno.1515 .Knusden VK, Orozova-Bekkevold IM, Mikkelsen TB, Wolff S, Olsen SF. Major dietary patterns in pregnancy and fetal growth. Eur J Clin Nutr. 2008;62(4):463-70. DOI:10.1038/sj.ejcn.1602745 É essencial que a alimentação da gestante contenha energia e nutrientes suficientes para manter a saúde materna e permitir o crescimento e desenvolvimento fetal adequados.7.Cucó G, Fernández-Ballart J, Sala J, Viladrich C, Vila J, Arija V. Dietary patterns and associated lifestyles in preconception, pregnancy and postpartum. Eur J Clin Nutr. 2006;60(3):364-71. DOI:10.1038/sj.ejcn.1602324,3030 .Thompson JMD, Wall C, Becroft DMO, Robinson E, Wild CJ, Mitchell EA. Maternal dietary patterns in pregnancy and the association with small-for-gestational-age infants. Br J Nutr. 2010;103(11):1665-73. DOI:10.1017/S0007114509993606 Avaliar o consumo alimentar, entretanto, é um desafio devido à complexidade da dieta humana, instigando pesquisadores a refinar os métodos de avaliação do consumo alimentar.

Historicamente, a maior parte dos estudos epidemiológicos tinha como foco principal avaliar a associação entre consumo de nutrientes e desenvolvimento de doenças.2020 .Northstone K, Emmet P, Rogers I. Dietary patterns in pregnancy and associations with socio-demographic and lifestyle factors. Eur J Clin Nutr. 2008;62(4):471-9. DOI:10.1038/sj.ejcn.1602741 Contudo, essa avaliação é considerado reducionista, pois desconsidera a complexa interação entre nutrientes e alimentos. Isto ocorre porque indivíduos não ingerem isoladamente nutrientes e sim refeições compostas por grande variedade de alimentos que interagem entre si.2929 .Sieri S, Krogh V, Pala V, Muti P, Micheli A, Evangelista A, et al. Dietary patterns and risk of breast cancer in the ORDET cohort. Cancer Epidemiol Biomarkers Prev. 2004;13(4):567-2.

Abordar o consumo alimentar através da identificação de padrões alimentares vem sendo descrito como método que mais se aproxima do complexo ato de se alimentar,3131 .Timmermans S, Steegers-Theunissen RP, Vujkovic M, Den Breeijen H, Russcher H, Lindemans J, et al. The Mediterranean diet and fetal size parameters: the Generation R Study. Br J Nutr. 2012;108(8):1399-409. DOI:10.1017/S000711451100691X visto que considera as diferentes combinações e composições das refeições. Além disso, o estudo de padrões alimentares permite a formulação de recomendações dietéticas baseadas em alimentos.3131 .Timmermans S, Steegers-Theunissen RP, Vujkovic M, Den Breeijen H, Russcher H, Lindemans J, et al. The Mediterranean diet and fetal size parameters: the Generation R Study. Br J Nutr. 2012;108(8):1399-409. DOI:10.1017/S000711451100691X

Entretanto, poucos estudos têm avaliado o padrão de consumo alimentar entre as gestantes, particularmente suas repercussões sobre o feto.1010 .Ferrér C, Garcia-Esteban R, Mendez M, Robieu I, Sunyer MTJ. Determinantes sociales de los patrones dietéticos durante el embrazo.Gac Sanit. 2009;23(1):38-43.,2222 .Okubo H, Miyake Y, Sasaki S, Tanaka K, Murakami K, Hirota Y, et al. Maternal dietary patterns in pregnancy and fetal growth in Japan: the Osaka Maternal and Child Health Study. Br J Nutr. 2012;107(10):1526-33. DOI:10.1017/S0007114511004636

Este estudo objetivou analisar se padrões de consumo alimentar durante o terceiro trimestre gestacional estão associados ao peso ao nascer.

MÉTODOS

Este estudo faz parte do projeto “Capital Social e Fatores Psicossociais associados à Prematuridade e ao Baixo Peso ao Nascer”, realizado nos municípios de Petrópolis e Queimados, RJ, entre dezembro de 2007 e agosto de 2008.b b Projeto: “Capital Social e Fatores Psicossociais Associados a Prematuridade e ao Baixo Peso ao Nascer”. Edital MCT/CNPq/MS-SDTIE-DECIT 26/2006 – Estudo de Determinantes Sociais da Saúde, Saúde da Pessoa com Deficiência, Saúde da População Negra, Saúde da População Masculina. Processo nº 409805/2008-8. Trata-se de uma coorte prospectiva com quatro ondas de seguimento: gestação, puerpério, três e seis meses pós-parto. Foram analisados dados da primeira (gestação) e da segunda etapa (pós-parto) de seguimento.

Foram convidadas a participar da coorte todas as gestantes com até 22 semanas de idade gestacional, atendidas nos serviços de pré-natal de 11 unidades de saúde da rede municipal do Sistema Único de Saúde (SUS), sendo oito em Queimados e três em Petrópolis, RJ, as quais detinham 90,0% da cobertura do cuidado pré-natal do SUS.

Para cálculo do tamanho amostral da coorte, considerou-se prevalência de 10,0% de nascimentos prematuros e com baixo peso, nível de significância de 5% e poder de 90,0%, para detectar diferenças de pelo menos 5,0%.1111 .Fleiss JL. Statistical methods for rates and proportions. 2.ed. New York: John Wiley & Sons; 1981. Após ajustes para populações finitas e acréscimo de 20,0% para possíveis perdas durante o acompanhamento das gestantes, o tamanho amostral foi definido em 940 gestantes em Petrópolis e 840 em Queimados.

Devido a nascimentos prematuros (n = 167), perda de seguimento (n = 104), recusas (n = 71), abortos (n = 62), falta de informação do peso ao nascer (n = 31) e presença de gestação gemelar (n = 17), a amostra do presente estudo foi composta por 1.298 mulheres.

O consumo alimentar foi avaliado por meio de questionário de frequência de consumo alimentar (QFA) semiquantitativo, referente ao último trimestre gestacional, composto por 29 itens alimentares e obtido por simplificação do QFA de 80 itens, validado por Sichieri e Everhart.2828 .Sichieri R, Everhart JE. Validity of a Brazilian food frequency questionnaire against dietary recalls and estimated energy intake. Nutr Res 1998;18:1649-59. Para esta simplificação, foi feita análise secundária do banco de dados empregado na construção do QFA original, utilizando-se regressão stepwise que explicasse 95,0% da variância para os seguintes nutrientes: energia, carboidrato, lipídeos, ácidos graxos saturados, monoinsaturados e polinsaturados, colesterol, cálcio e vitamina C.c c Consultoria fornecida por Sichieri R para desenvolvimento do questionário simplificado de consumo alimentar, em 1998.

A informação sobre o peso ao nascer foi extraída dos prontuários médicos. Quando não estava disponível, foram utilizados os dados da caderneta da criança ou da declaração de nascido vivo.

Foram avaliadas as seguintes variáveis de exposição: (i) sociodemográficas: idade das gestantes em anos, estado marital (vive com companheiro; não vive com companheiro), cor de pele autorreferida (branca; preta; parda), escolaridade em anos de estudo, trabalho fora de casa (não; sim), classe econômica (B ou C; D ou E); (ii) tabagismo (não; sim); (iii) doenças crônicas autorreferidas: hipertensão arterial (não; sim), diabetes mellitus (não; sim); (iv) antecedentes obstétricos: paridade (primípara; 2-3 filhos; 4 ou mais filhos), história anterior de óbito perinatal, baixo peso ao nascer ou prematuridade; (v) estado nutricional materno (IMC pré-gestacional e ganho de peso gestacional) e (vi) adequação do pré-natal. A história obstétrica e intercorrências na gestação, como diabetes e hipertensão arterial, foram referidas pela mulher na entrevista na maternidade após o parto, por meio da pergunta: “Você teve algum desses problemas de saúde na gravidez?” Pressão alta ou eclâmpsia (sim; não); Diabetes gestacional (sim; não).

A classificação socioeconômica seguiu critério adotado pela Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa, baseado nos bens da família e no grau de instrução do seu respectivo chefe, constituindo-se escore final que define os grupos socioeconômicos A (o mais alto), B, C, D e E (o mais baixo).1.Associação Nacional de Empresas de Pesquisa. Critério de Classificação Econômica Brasil: manual. São Paulo (SP); 1997. As classes socioeconômicas foram agregadas para análise multivariada em B ou C e D ou E, não tendo nenhuma mulher classificada na categoria A. Para avaliação da adequação do pré-natal foi utilizado o índice de Kotelchuck,1616 .Kotelchuck M. An evaluation of the Kessner Adequacy of Prenatal Care Index and a proposed Adequacy of Prenatal Care Utilization Index.Am J Public Health.1994;84(9):1414-20. que se baseia na idade gestacional no início do pré-natal e no percentual de adequação do número de consultas. Essas duas dimensões foram agrupadas em três categorias: pré-natal mais que adequado; adequado; e parcialmente inadequado e inadequado.

O dado de peso pré-gestacional foi obtido do cartão da gestante até a 13ª semana gestacional ou, quando indisponível, considerou-se o peso pré-gestacional autorrelatado. Esse peso foi utilizado para calcular o índice de massa corporal (IMC) prévio à gestação, permitindo classificar o estado nutricional da gestante em quatro categorias: baixo peso (IMC pré-gestacional < 18,5 kg/m2.Barros FC, Victora CG, Matijasevich A, Santos IS, Horta BL, Silveira MF, et al. Preterm births, low birth weight, and intrauterine growth restriction in three birth cohorts in Southern Brazil: 1982, 1993 and 2004.Cad Saude Publica. 2008;24 Suppl 3:s390-8. DOI:10.1590/S0102-311X2008001500004), peso adequado (IMC pré-gestacional entre 18,5 e 24,9 kg/m2), sobrepeso (IMC pré-gestacional entre 25 e 29,9 kg/m2) e obesidade (IMC pré-gestacional ≥ 30 kg/m2).26 A partir dessas informações, foram determinadas as faixas de adequação de peso para cada gestante, equivalente a ganho ponderal gestacional total de: 12,5 a 18 kg para mulheres com baixo peso pré-gestacional; 11,5 a 16 kg para mulheres eutróficas; 7 a 9 kg para mulheres com sobrepeso; e 7 kg para mulheres obesas.2626 .Rasmussen KM, Yaktine AL, editors. Weight gain during pregnancy: reexamining the guidelines. Washington (DC): National Academies Press; 2009. O peso ao final da gestação foi referido pela mulher durante a entrevista pós-parto. Para o cálculo do ganho de peso gestacional total, subtraiu-se o peso pré-gestacional do peso ao final da gestação.

Para a identificação dos padrões alimentares, os 29 itens listados no QFA foram agrupados em 20 grupos alimentares com base em suas características nutricionais e frequência de consumo.

Análise fatorial exploratória foi utilizada para derivar padrões alimentares baseados na porção diária de consumo de cada grupo alimentar. Uma matriz de correlação foi construída para verificar se as variáveis estavam correlacionadas e se o modelo fatorial era apropriado para os dados. Para isso, utilizou-se o teste de esfericidade de Bartlett (TEB) e a medida de adequação da amostra de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO).

A extração dos fatores foi feita pela análise de componentes principais (ACP), ortogonalmente transformados, utilizando-se a rotação Varimax para obtenção de uma estrutura com independência dos fatores, facilitando a interpretação.

A definição dos fatores a serem retidos baseou-se no scree plot(gráfico que apresenta os autovalores em relação ao número de fatores em sua ordem de extração), no percentual da variância explicada pelos fatores e no conhecimento dos pesquisadores (considerações sobre interpretabilidade e simplicidade dos padrões). Realizou-se então nova análise fatorial fixando-se o número de fatores a serem extraídos.

Foram mantidos, nos fatores (padrões), os itens com carga fatorial superior a 0,30 e consideradas aceitáveis comunalidades mínimas de 0,25.2323 .Olinto MTA. Padrões de consumo alimentar: análise por componentes principais. In: Kac G, Sichieri R, Gigante D, organizadores. Epidemiologia nutricional. Rio de Janeiro (RJ): Editora Fiocruz; 2007. p.181-200. A consistência interna de cada fator extraído foi verificada por meio do alpha de Cronbach. Posteriormente, os padrões foram nomeados com base na interpretação dos dados.

A associação entre padrões alimentares e peso ao nascer foi avaliada por modelo de regressão linear multivariado. Inicialmente, foi feita a análise de regressão linear bivariada entre todas as variáveis de exposição e o peso ao nascer, além de análise de regressão linear bivariada entre todas as covariáveis do estudo e os padrões alimentares com o intuito de detectar os possíveis fatores de confusão. Foi realizada análise distinta para cada padrão alimentar. Todas as covariáveis com p < 0,20 em ambas as análises foram consideradas potenciais candidatas para comporem o modelo final. O modelo final também foi mutuamente ajustado pelos demais padrões alimentares, dado que, nesse tipo de análise, os indivíduos participam de mais de um padrão e estes são não correlacionados, devido ao método de rotação empregado.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP/Fiocruz – CAAE 0156.0.031.000-06), estando de acordo com os princípios éticos contidos na Resolução 196/96, do Conselho Nacional de Saúde (CNS, 1996).

As análises estatísticas foram realizadas no programa estatísticoStatistical Package for Social Sciences (SPSS)forWindows, versão 16.0.

RESULTADOS

A idade média das mulheres entrevistadas foi 24,7 anos, a média de anos de estudo foi inferior a oito. A maioria das mulheres estava sem trabalho remunerado (59,7%), e pertencia às classes econômicas B ou C (66,4%). A maioria já possuía mais de um filho e 12,8% apresentava história anterior de recém-nascido com baixo peso ao nascer, prematuridade ou óbito perinatal (Tabela 1).

Tabela 1
Características sociodemográficas, antecedentes obstétricos, características da gestação e parto e do recém-nascido em coorte de gestantes. Petrópolis e Queimados, RJ, 2007-2008.

Considerando-se a adequação do número de consultas de pré-natal para a idade gestacional (índice de Kotelchuck),1616 .Kotelchuck M. An evaluation of the Kessner Adequacy of Prenatal Care Index and a proposed Adequacy of Prenatal Care Utilization Index.Am J Public Health.1994;84(9):1414-20. mais de 70,0% das puérperas teve pré-natal adequado ou mais que adequado. Das entrevistadas, tabagismo foi relatado por 12,0% das mulheres (Tabela 1); 19,0% apresentaram diagnóstico de hipertensão arterial gestacional e 2,5%, de diabetes.

Observou-se que 28,8% das mulheres iniciaram a gestação com estado nutricional inadequado e, destas, 20,0% apresentavam sobrepeso. A média de ganho de peso na gestação foi de 13,3 kg, porém menos de 1/3 das mulheres apresentou ganho de peso considerado adequado e 37,5% apresentou ganho excessivo. Houve predomínio do parto vaginal (55,7%) e o peso médio ao nascer do recém-nascido foi 3.253 g (Tabela 1).

Foram identificados, inicialmente, sete fatores com autovalores maiores que 1,0 e que explicavam 51,3% da variância do consumo alimentar (dados não apresentados em tabela). Com base no scree plot, nos autovalores e considerando a interpretabilidade dos padrões, deveriam ser retidos quatro fatores que, juntos, explicavam 36,4% da variabilidade de consumo (Tabela 2).

Tabela 2
Matriz fatorial rotada, cargas fatoriais, variância e alpha de Cronbach para os quatro padrões alimentares identificados entre gestantes do município de Petrópolis e Queimados, RJ, 2007-2008.

Os quatro padrões de consumo foram denominados e compostos da seguinte forma: (1) padrão prudente, composto por leite, iogurte, queijo, frutas e suco natural, biscoito sem recheio e carne de frango/boi/peixe/fígado, que explicava 14,9% do consumo; (2) padrão tradicional, composto por feijão, arroz, vegetais, pães, manteiga/margarina e açúcar, que respondeu por 8,8% da variação do consumo; (3) padrão ocidental, composto por pizza/hambúrguer/pastel, batata/aipim/inhame, refrigerante/refresco, macarrão, farinha/farofa/angu, carne de porco/salsicha/linguiça/ovo, responsável por 6,9% da explicação da variância; e (4) padrão lanche, composto por biscoito recheado, biscoitos tipo salgadinho, chocolate e achocolatado, explicando 5,7% da variância (Tabela 2).

Todos os grupos alimentares se associaram a algum dos quatro padrões identificados e apenas um item alimentar foi excluído da análise (café/chá preto ou chá mate) por apresentar comunalidade muito baixa, não se enquadrando em nenhum dos padrões definidos.

Na análise bivariada, considerando-se a significância estatística menor que 20,0%, o padrão prudente associou-se positivamente com classe econômica B ou C, trabalho remunerado, idade, escolaridade, pré-natal mais que adequado e excesso de ganho de peso na gestação, e associou-se inversamente com o fumo na gestação. As gestantes classificadas no padrão tradicional ou ocidental apresentaram algumas características comuns, como: maior paridade, fumo na gestação e menor obesidade pré-gestacional. Gestantes classificadas no padrão alimentar lanche eram significativamente mais jovens, com menos sobrepeso e obesidade pré-gestacional e mais pré-natal inadequado (Tabela 3).

Tabela 3
Estimativa dos parâmetros da regressão linear bivariada* entre padrão alimentar e variáveis maternas em coorte de gestantes. Petrópolis e Queimados, RJ, 2007-2008.

Em relação ao peso ao nascer, mostraram associação positiva as variáveis classe social B ou C, idade materna, escolaridade, sobrepeso ou obesidade pré-gestacional, ganho ponderal excessivo na gestação e parto cesáreo. Contrariamente, não ter companheiro, ser primípara, iniciar o pré-natal com baixo peso, apresentar ganho de peso insuficiente, fazer pré-natal inadequado e fumar durante a gestação associaram-se negativamente com o peso ao nascer (Tabela 4).

Tabela 4
Estimativa dos parâmetros da regressão linear bivariada* entre peso ao nascer e variáveis maternas em coorte de gestantes. Petrópolis e Queimados, RJ, 2007-2008.

As variáveis que apresentaram associação com significância de 20,0% tanto com o peso ao nascer quanto com os padrões alimentares e que entraram no ajuste do modelo final, além dos demais padrões alimentares, foram: classe econômica, idade, escolaridade materna, situação conjugal, paridade, estado nutricional pré-gestacional, adequação do pré-natal, histórico de óbito perinatal, baixo peso ao nascer ou prematuridade, fumo durante a gestação e tipo de parto (Tabelas 3 e 4).

Na análise multivariada, observou-se associação positiva entre consumo do padrão lanche e peso ao nascer, após ajuste por idade materna, escolaridade materna, situação conjugal, classe social, paridade, IMC pré-gestacional, adequação do pré-natal, história anterior de baixo peso/prematuridade, fumo durante a gestação, sexo do bebê e tipo de parto (dados não apresentados). Essa associação foi observada após a inclusão da idade materna no modelo, e não na análise bruta, o que mostra a presença de confusão negativa. Observou-se ainda que a distribuição da média do escore fatorial do padrão lanche também diferiu segundo faixa etária (0,44 nas mulheres entre 10-19 anos e -0,13 nas mulheres com 20 ou mais anos de idade) (dados não apresentados em tabela). Estes achados explicam a atenuação do efeito observada na análise bruta. Assim, o modelo final foi estratificado por idade materna (10 a 19 anos; 20 anos ou mais).

A análise de regressão linear multivariada ajustada para os fatores de confundimento mostrou associação positiva entre o padrão alimentar lanche e o peso ao nascer entre as gestantes adolescentes (Tabela 5).

Tabela 5
Modelo multivariado final entre peso ao nascer e padrão alimentar em coorte de gestantes. Petrópolis e Queimados, RJ, 2007-2008.

DISCUSSÃO

Os resultados deste estudo mostram que, de forma geral, as gestantes atendidas nos serviços de pré-natal das unidades selecionadas dos municípios de Queimados e Petrópolis do Sistema Único de Saúde (SUS) eram jovens e de baixo nível socioeconômico, características semelhantes a de outros estudos realizados com gestantes e puérperas atendidas em unidades básicas do SUS.1717 .Lacerda EMA, Kac G, Cunha CB, Leal MC. Consumo alimentar na gestação e no pós-parto segundo cor de pele no município do Rio de Janeiro.Rev Saude Publica. 2007;41(6):985-94. DOI:10.1590/S0034-89102007000600014,2424 .Oliveira LC, Pacheco AHRN, Rodrigues PL, Schlüssel MM, Spyrides MHC, Kac G. Fatores determinantes da incidência de macrossomia em um estudo com mães e filhos atendidos em uma Unidade Básica de Saúde no município do Rio de Janeiro. Rev Bras Ginecol Obstet 2008;30(10):486-93. DOI:10.1590/S0100-72032008001000002

Com relação à avaliação antropométrica das mulheres, apesar de 64,9% delas terem iniciado a gestação com estado nutricional adequado, a prevalência de excesso de peso foi alta (26,9%). Esse resultado é semelhante ao encontrado no estudo de Nucci et al2121 .Nucci LB, Duncan BB, Mengue SS, Branchtein L, Schmidt MI, Fleck ET. Assessment of weight gain during pregnancy in general prenatal care services in Brazil. Cad Saude Publica. 2001;17(6)1367-74. DOI:10.1590/S0102-311X2001000600020 (2001) que, acompanhando 5.564 gestantes em seis capitais brasileiras, encontraram prevalência de 24,7% de sobrepeso e obesidade.

A média de ganho de peso gestacional (13,3 kg) assemelha-se à encontrada por Lacerda et al1717 .Lacerda EMA, Kac G, Cunha CB, Leal MC. Consumo alimentar na gestação e no pós-parto segundo cor de pele no município do Rio de Janeiro.Rev Saude Publica. 2007;41(6):985-94. DOI:10.1590/S0034-89102007000600014 (2007) entre gestantes residentes na cidade do Rio de Janeiro, no ano de 2001 (13,4 kg). Os resultados referentes ao ganho de peso gestacional – 37,4% com ganho excessivo e 30,0% com ganho adequado segundo o IMC – estão de acordo com aqueles encontrados em outros estudos.5.Chasan-Taber L, Schmidt MD, Pekow P, Sternfeld B, Solomon CG, Markenson G. Predictors of excessive and inadequate gestational weight gain in Hispanic women. Obesity (Silver Spring). 2008;16(7):1657-66. DOI:10.1038/oby.2008.256,1313 .Kac G, Velásquez-Meléndez G. Ganho de peso gestacional e macrossomia em uma coorte de mães e filhos. J Pediatr.2005;81(1):47-53. DOI:10.2223/JPED.1282

As informações sobre o peso ao nascer mostram que, neste estudo, o peso médio (3.253 g) foi pouco superior (3.142 g) ao encontrado em outra localidade brasileira.4.Carniel EF, Zanolli ML, Antonio MARGM, Morcillo AM. Determinantes do baixo peso ao nascer a partir das Declarações de Nascidos Vivos. Rev Bras Epidemiol. 2008;11(1):169-79. DOI:10.1590/S1415790X2008000100016 Esta média de peso ao nascer mais elevada pode ser explicada pela exclusão de prematuros da amostra estudada. Ainda assim, o peso ao nascer médio encontrado neste estudo não atinge o intervalo de 3.400 a 3.500 g, valores esperados de peso ao nascer em condições ótimas de crescimento fetal.d d World Health Organization. The global burden of disease: 2004 update. Geneva; 2008 [citado 2015 abr 17]. Disponível em:http://www.who.int/healthinfo/global_burden_disease/2004_report_update/en/

A análise fatorial permitiu identificar quatro padrões alimentares, que possuem alimentos em comum com padrões alimentares identificados em outras pesquisas.

O padrão prudente, também designado em outros estudos com gestantes como “saudável”, caracteriza-se pela presença de frutas, suco natural, vegetais, peixes e aves.7.Cucó G, Fernández-Ballart J, Sala J, Viladrich C, Vila J, Arija V. Dietary patterns and associated lifestyles in preconception, pregnancy and postpartum. Eur J Clin Nutr. 2006;60(3):364-71. DOI:10.1038/sj.ejcn.1602324,1515 .Knusden VK, Orozova-Bekkevold IM, Mikkelsen TB, Wolff S, Olsen SF. Major dietary patterns in pregnancy and fetal growth. Eur J Clin Nutr. 2008;62(4):463-70. DOI:10.1038/sj.ejcn.1602745,2020 .Northstone K, Emmet P, Rogers I. Dietary patterns in pregnancy and associations with socio-demographic and lifestyle factors. Eur J Clin Nutr. 2008;62(4):471-9. DOI:10.1038/sj.ejcn.1602741

O padrão tradicional, contendo feijão, arroz, vegetais, pães e manteiga/margarina, representa os alimentos que fazem parte do hábito alimentar brasileiro e se assemelha ao padrão tradicional, encontrado em estudos que utilizaram os mesmos procedimentos de análise para extração de padrões alimentares.8.Cunha DB, Almeida RMVR, Sichieri R, Pereira RA. Association of dietary patterns with BMI and waist circumference in a low-income neighbourhood in Brazil. Br J Nutr. 2010;104(6):908-13. DOI:10.1017/S0007114510001479,1919 .Marchioni DML, Latorre MRDO, Eluf-Neto J, Wunsch-Filho V, Fisberg RM. Identification of dietary patterns using factor analysis in an epidemiological study in São Paulo. Sao Paulo Med J. 2005;123(3):124-7. DOI:10.1590/S1516-31802005000300007

O padrão ocidental é composto por alimentos com elevada densidade energética, baixo valor nutritivo (baixa quantidade ou isentos de micronutrientes) e de baixo custo financeiro, além de conter alimentos com elevada proporção de carboidrato (macarrão, batata/inhame/aipim, farinha/farofa/angu, refrigerante/refresco). Esse padrão também inclui alimentos fonte de proteínas, como carne de porco, ovo, linguiça e salsicha, sendo os dois últimos de baixa qualidade nutricional, pois contêm grande quantidade de gordura saturada, colesterol e sódio. Os alimentos fast foods(pizza/hambúrguer/pastel) também estão presentes nesse padrão e possuem baixo valor nutricional e elevada densidade energética.

O padrão lanche (biscoito recheado, biscoito tipo salgadinho, chocolate e achocolatado) também é composto por alimentos de baixo valor nutritivo e alta densidade energética. No estudo de Northstone et al,2020 .Northstone K, Emmet P, Rogers I. Dietary patterns in pregnancy and associations with socio-demographic and lifestyle factors. Eur J Clin Nutr. 2008;62(4):471-9. DOI:10.1038/sj.ejcn.1602741 foi identificado o padrão alimentar denominado “confeitaria” (chocolate, doces, biscoitos e bolos) que possui alimentos em comum ao padrão lanche.

As variáveis selecionadas como fatores de confusão no modelo estatístico final apresentam um racional teórico. O peso ao nascer é um importante indicador de saúde, refletindo indiretamente as condições de vida das populações.4.Carniel EF, Zanolli ML, Antonio MARGM, Morcillo AM. Determinantes do baixo peso ao nascer a partir das Declarações de Nascidos Vivos. Rev Bras Epidemiol. 2008;11(1):169-79. DOI:10.1590/S1415790X2008000100016 Dessa forma, melhores situações socioeconômicas como maior nível de escolaridade materna, melhor classe social e maior acesso a serviços de saúde durante a gestação estão comumente associadas ao consumo alimentar saudável, bem como ao peso adequado ao nascer.4.Carniel EF, Zanolli ML, Antonio MARGM, Morcillo AM. Determinantes do baixo peso ao nascer a partir das Declarações de Nascidos Vivos. Rev Bras Epidemiol. 2008;11(1):169-79. DOI:10.1590/S1415790X2008000100016,7.Cucó G, Fernández-Ballart J, Sala J, Viladrich C, Vila J, Arija V. Dietary patterns and associated lifestyles in preconception, pregnancy and postpartum. Eur J Clin Nutr. 2006;60(3):364-71. DOI:10.1038/sj.ejcn.1602324,1010 .Ferrér C, Garcia-Esteban R, Mendez M, Robieu I, Sunyer MTJ. Determinantes sociales de los patrones dietéticos durante el embrazo.Gac Sanit. 2009;23(1):38-43.,2020 .Northstone K, Emmet P, Rogers I. Dietary patterns in pregnancy and associations with socio-demographic and lifestyle factors. Eur J Clin Nutr. 2008;62(4):471-9. DOI:10.1038/sj.ejcn.1602741 A estrutura familiar também é um fator importante capaz de afetar tanto o consumo alimentar materno quanto o peso ao nascer. Mulheres que vivem com o companheiro e com menor paridade tendem a ter acesso a uma alimentação de melhor qualidade e a dar à luz a bebês com maior peso ao nascer.6.Costa CE, Gotlieb SLD. Estudo epidemiológico do peso ao nascer a partir da Declaração de Nascido Vivo. Rev Saude Publica. 1998;32(4):328-34. DOI:10.1590/S0034-89101998000400004,1010 .Ferrér C, Garcia-Esteban R, Mendez M, Robieu I, Sunyer MTJ. Determinantes sociales de los patrones dietéticos durante el embrazo.Gac Sanit. 2009;23(1):38-43.,2020 .Northstone K, Emmet P, Rogers I. Dietary patterns in pregnancy and associations with socio-demographic and lifestyle factors. Eur J Clin Nutr. 2008;62(4):471-9. DOI:10.1038/sj.ejcn.1602741,2727 .Santos GHN, Martins MG, Souza MS. Gravidez na adolescência e fatores associados com baixo peso ao nascer. Rev Bras Ginecol Obstet. 2008;30(5):224-31. DOI:10.1590/S0034-89102001000100011 A idade materna precoce ou tardia bem como o tabagismo têm sido apontados como fatores de risco para desvios no peso ao nascer.6.Costa CE, Gotlieb SLD. Estudo epidemiológico do peso ao nascer a partir da Declaração de Nascido Vivo. Rev Saude Publica. 1998;32(4):328-34. DOI:10.1590/S0034-89101998000400004 Paralelamente, a literatura mostra que gestantes adolescentes, tabagistas e que consomem bebida alcoólica durante a gravidez têm pior padrão de consumo alimentar.4.Carniel EF, Zanolli ML, Antonio MARGM, Morcillo AM. Determinantes do baixo peso ao nascer a partir das Declarações de Nascidos Vivos. Rev Bras Epidemiol. 2008;11(1):169-79. DOI:10.1590/S1415790X2008000100016,7.Cucó G, Fernández-Ballart J, Sala J, Viladrich C, Vila J, Arija V. Dietary patterns and associated lifestyles in preconception, pregnancy and postpartum. Eur J Clin Nutr. 2006;60(3):364-71. DOI:10.1038/sj.ejcn.1602324,2020 .Northstone K, Emmet P, Rogers I. Dietary patterns in pregnancy and associations with socio-demographic and lifestyle factors. Eur J Clin Nutr. 2008;62(4):471-9. DOI:10.1038/sj.ejcn.1602741 O tipo de parto também influencia o peso ao nascer, pois em muitos casos a gestação é interrompida cirurgicamente antes do início do trabalho de parto, reduzindo o tempo de crescimento e ganho de peso intrauterino.4.Carniel EF, Zanolli ML, Antonio MARGM, Morcillo AM. Determinantes do baixo peso ao nascer a partir das Declarações de Nascidos Vivos. Rev Bras Epidemiol. 2008;11(1):169-79. DOI:10.1590/S1415790X2008000100016 Além disso, a cesariana é mais frequente entre as mulheres com intercorrências gestacionais como diabetes, hipertensão, anemia e outras complicações.2525 .Padua KS, Osis MJD, Faúndes A, Barbosa AH, Moraes Filho OB. Factors associated with cesarean sections in Brazilians hospitals. Rev Saude Publica. 2010;44(1):70-9. DOI:10.1590/S0034-89102010000100008 Muitas dessas doenças são oriundas do consumo alimentar inadequado dessas mulheres.3.Brantsaeter AL, Haugen M, Samuelsen SO, Torjusen H, Trogstad L, Alexander J, et al. A dietary pattern characterized by high intake of vegetables, fruits, and vegetable oils is associated with reduced risk of preeclampsia in nulliparous pregnant Norwegian women. J Nutr.2009;139(6):1162-8. DOI:10.3945/jn.109.104968 Por fim, o IMC materno também influencia diretamente tanto o consumo alimentar materno como o peso ao nascer.4.Carniel EF, Zanolli ML, Antonio MARGM, Morcillo AM. Determinantes do baixo peso ao nascer a partir das Declarações de Nascidos Vivos. Rev Bras Epidemiol. 2008;11(1):169-79. DOI:10.1590/S1415790X2008000100016,9.Fazio ES, Nomura RMY, Dias MCG, Zugaib M. Consumo dietético de gestantes e ganho ponderal materno após aconselhamento nutricional. Rev Bras Ginecol Obstet. 2011;33(2):87-92. DOI:10.1590/S0100-72032011000200006

A análise da relação entre padrões de consumo alimentar e peso ao nascer mostrou que, para as gestantes adolescentes, quanto maior a adesão ao padrão lanche, maior o peso ao nascer do bebê. Possivelmente, esta associação foi observada apenas entre as gestantes mais jovens por serem estas as maiores consumidoras deste padrão, uma vez que apresentaram escore fatorial médio positivo, enquanto que esta média foi negativa dentre as mulheres com 20 ou mais anos de idade.

O padrão alimentar lanche é composto por alimentos com altas concentrações de carboidrato simples, lipídeos e baixas quantidades de proteína e micronutrientes. Essa combinação de nutrientes confere a esses alimentos uma elevada densidade energética, favorecendo o ganho de peso gestacional.

Uma dieta com grande quantidade de energia está associada a um maior ganho de peso gestacional1818 .Lagiou P, Tamimi RM, Mucci LA, Adami HO, Hsieh CC, Trichopoulos D. Diet during pregnancy in relation to maternal weight gain and birth size.Eur J Clin Nutr. 2004;58(2):231-7. DOI:10.1038/sj.ejcn.1601771 que, por sua vez, está diretamente relacionado com o peso ao nascer do bebê.2626 .Rasmussen KM, Yaktine AL, editors. Weight gain during pregnancy: reexamining the guidelines. Washington (DC): National Academies Press; 2009. Isso ocorre porque o maior ganho de peso durante a gestação aumenta a disponibilidade e transferência de aminoácidos, glicose, ácidos graxos livres e triglicerídeos dos compartimentos maternos para os compartimentos fetais, aumentando seu crescimento e desenvolvimento.1414 .Kitajima M, Oka S, Yasuhi I, Fukuda M, Rii Y, Ishimaru T. Maternal serum triglyceride at 24–32 weeks’ gestation and newborn weight in nondiabetic women with positive diabetic screens. Obstet Gynecol. 2001;97(5 Pt 1):776-80. Segundo o IOM2626 .Rasmussen KM, Yaktine AL, editors. Weight gain during pregnancy: reexamining the guidelines. Washington (DC): National Academies Press; 2009. (2009), para cada aumento de 1 kg no GPG há um incremento de 16,7 a 22,6 g no peso ao nascer.

Uusitalo et al3232 .Uusitalo U, Arkkola T, Ovaskainen M-L, Kronberg-Kippilä C, Kenward MG, Veijola R, et al. Unhealthy patterns are associated with weight gain during pregnancy among Finnish women. Public Health Nutr. 2009;12(12):2392-9.DOI:10.1017/S136898000900528X (2009) avaliaram a associação entre padrões de consumo alimentar e ganho de peso gestacional, identificando sete padrões, dos quais dois associaram-se ao ganho de peso gestacional: padrão fast food e padrão álcool e gordura. Os autores concluíram que as mulheres que pertenciam ao maior quartil de consumo do padrão fast food ganhavam em média 1,3 kg a mais do que as que pertenciam ao menor quartil deste padrão. Por outro lado, mulheres que pertenciam ao quartil de consumo mais elevado do padrão álcool e gordura ganhavam em média 0,7 kg a menos do que as que pertenciam ao menor quartil de consumo deste padrão.

Algumas limitações metodológicas deste estudo devem ser mencionadas. Dentre elas, o pequeno número de alimentos do QFA e a falta de porções padronizadas para todos os alimentos. Além disso, o QFA utilizado não foi testado quanto à acurácia na estimativa de alimentos, mas apenas de nutrientes. A despeito dessas limitações, os resultados obtidos pelo questionário são coerentes com o de outros estudos, como o realizado por Barros et al,2.Barros FC, Victora CG, Matijasevich A, Santos IS, Horta BL, Silveira MF, et al. Preterm births, low birth weight, and intrauterine growth restriction in three birth cohorts in Southern Brazil: 1982, 1993 and 2004.Cad Saude Publica. 2008;24 Suppl 3:s390-8. DOI:10.1590/S0102-311X2008001500004 que utilizaram questionário semelhante para avaliar o consumo alimentar gestacional de 1.228 adolescentes e também encontraram resultados coerentes com a literatura.

Outro fator importante que se relaciona à subjetividade, envolvendo a análise fatorial, é a especificidade dos resultados obtidos através desta técnica para a população investigada, dificultando a comparação entre os estudos. Além disso, apesar de as mulheres incluídas neste estudo viverem, majoritariamente, em situação de pobreza, os fatores referentes às características socioeconômicas e de estilo de vida apresentaram relação com hábitos alimentares.

Existe consenso na literatura de que a avaliação do consumo alimentar durante a gestação é importante e os estudos que abordam este tema ainda são escassos. Não foram encontrados estudos nacionais que avaliassem o efeito da alimentação materna sobre o peso ao nascer. Assim, esta pesquisa procurou contribuir com a determinação de padrões alimentares durante a gestação. A importância epidemiológica destes resultados, com base no estudo de coorte em dois municípios brasileiros, reside no fornecimento de subsídios para a racionalidade de estratégias nutricionais de intervenção mais apropriadas para gestantes.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2015

Histórico

  • Recebido
    21 Fev 2014
  • Aceito
    8 Fev 2015
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