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Sobre afetos e resistências: Uma análise da trajetória da Turma OK (Rio de Janeiro, Brasil)1 1 Uma versão condensada deste texto foi publicada no seguinte livro que comemorou os 40 anos do Movimento LGBT no Brasil: SOLIVA, Thiago B. 2018. “A confraria gay: um estudo sobre a trajetória da Turma OK”. In: GREEN, James; QUINALHA, Renan; FERNANDES, Marisa & CAETANO, Márcio (orgs.). História do Movimento LGBT no Brasil. São Paulo: Alameda Editorial.

About affections and resistances: An analysis of the trajectory of Turma OK (Rio de Janeiro, Brazil)

Sobre afectos y resistencias: Un análisis de la trayectoria de la Turma OK (Rio de Janeiro, Brasil)

Resumo

Este artigo se ocupa da trajetória da Turma OK, grupo fundado em 1961, dedicado a promover a sociabilidade entre homens homossexuais no Rio de Janeiro. Procuro compreender a história desse grupo à luz das tensões entre diferentes processos sociais, identidades e classificações sexuais construídas e reconstruídas pelas turmas de “bichas” nas décadas de 1960 e 1970. Busco compreender também como essa associação passa de um grupo de sociabilidade de “homens homossexuais” da Zona Sul do Rio de Janeiro que fazem reuniões fechadas em apartamentos para um espaço de shows e encontros que pretende se afirmar como um “patrimônio da Lapa”. O trabalho de pesquisa foi fundamentado em observação participante, pesquisa documental e entrevistas em profundidade.

Palavras-chave:
Turma OK; homossociabilidade; homossexualidade; história; trajetória

Abstract

This article analyzes the trajectory of the Turma OK group, founded in 1961 to promote sociability among homosexual men in Rio de Janeiro. The history of this group is understood in light of the tensions between different social processes, identities and sexual classifications constructed and reconstructed by the groups of "bichas" (or “queers”) in the decades of 1960 and 1970. The passage of this association from a group of sociability for "homosexual men” from affluent areas of Rio de Janeiro who held closed meetings in apartments to a space of shows and meetings claiming to be a bohemian "Lapa heritage". The research is based on participant observation, document analysis and in-depth interviews.

Key words:
Turma OK; homosociability; homosexuality; history; trajectory

Resumen

Este artículo se ocupa de la trayectoria de la Turma OK. Buscamos comprender la historia de ese grupo a la luz de las tensiones entre diferentes procesos sociales, identidades y clasificaciones sexuales construidas y reconstruidas por las clases de “bichas” en las décadas de 1960 y 1970. Buscamos comprender también cómo esa asociación pasa de un grupo de sociabilidad de "hombres homosexuales" de la Zona Sur de Río de Janeiro que hacen reuniones cerradas en apartamentos para un espacio de shows y encuentros que pretende afirmarse como un "patrimonio de Lapa". El trabajo de investigación fue fundamentado en observación participante, investigación documental y entrevistas en profundidad.

Palabras clave:
Turma OK; homosociabilidad; homosexualidades; historia, trayectoria

Apresentação

Este artigo se ocupa da trajetória da Turma OK. Trata-se de um grupo formado majoritariamente por “homens homossexuais”2 2 Categoria nativa. Atualmente, os sujeitos que participam das atividades da Turma OK se percebem como “homossexuais” e “gays”, mas nem sempre foi dessa forma. Nas décadas de 1960 e 1970, a expressão que mobilizava significados às experiências desses sujeitos era a noção de “bicha”, forma ainda corrente na fala dos interlocutores, cujas trajetórias são focalizadas neste artigo. Falar de subjetividades e formas de classificação em “tempos que não são o presente” (Passamani, 2015) constitui tarefa difícil. Passamani (2015) aborda “rupturas” e “permanências” em relação a essas formas de classificação que não atendem às percepções mais atuais sobre o que se entende por “orientação sexual” e “identidade de gênero”. Dada essa difícil inteligibilidade, todo uso de expressões com ambições de explicar tal diversidade de experiências é sempre algo contingente e momentâneo (Passamani, 2015). Em função dessas contingências, neste artigo adoto as aspas para me referir a essas formas de classificação. com mais de 60 anos, cuja fundação foi na década de 1960. Atualmente, este grupo possui sua sede na Lapa, bairro boêmio do Rio de Janeiro. Seu espaço congrega um conjunto variado de atividades que incluem festas, reuniões, concursos e, principalmente, os shows de “artistas-transformistas”, itens emblemáticos do grupo.

Os dados para a construção deste texto foram obtidos em trabalho de campo realizado entre os dias 08 de outubro de 2010 e 28 de agosto de 2011. Durante esse período, a Turma OK entrou em recesso duas vezes, nas festas de fim de ano e no Carnaval. O recesso durou, para cada festividade, um final de semana. O objetivo deste artigo é compreender a trajetória do grupo à luz das tensões entre diferentes identidades e classificações sexuais construídas e reconstruídas pelas turmas de “bichas” nas décadas de 1960 e 1970. Busco compreender também como essa associação passa de um grupo de sociabilidade de “homens homossexuais” da Zona Sul do Rio de Janeiro que fazem reuniões em apartamentos para um espaço de shows e encontros que pretende se afirmar como um “patrimônio da Lapa”.3 3 A Lapa é um bairro que se localiza na região central da cidade do Rio de Janeiro. É conhecido por cariocas e turistas por sua vocação boêmia, com ampla oferta de bares, boates e outras opções de entretenimento.

Escolhi a Turma OK para a pesquisa por se tratar de um dos “grupos gays” mais antigos e ainda em funcionamento no Brasil. O estudo também se justifica em função da exiguidade de trabalhos que desvendem a vida social relacionada a essas trajetórias na segunda metade do século XX. Outro dado que chamou a minha atenção para este grupo se relaciona à forma como seus sócios interagem entre si, evocando a ideia de “família” para representar a sua adesão e laços de amizade.

Ao longo do trabalho de campo pude perceber que a trajetória do grupo foi construída a partir das relações de amizade estabelecidas por sujeitos com história de vida semelhantes, os quais, na década de 1960, começaram a se reunir para compartilhar experiências relacionadas às suas sexualidades e performances de gênero não convencionais4 4 A noção de “sexualidades dissidentes” ou “não convencionais” constitui estratégia para evitar o uso de classificações comprometidas tanto com as antigas categorias médicas, como “homossexual”, quanto com as categorias identitárias contemporâneas, como “gay”, “travestis” etc. que marcaram profundamente a sua subjetividade e formas de sociabilidade. Esses sujeitos passaram a se perceber como integrantes de uma “família”, o que distingue o grupo de um clube social comum.

O trabalho de campo

Neste estudo, as histórias de vida e as entrevistas em profundidade foram métodos importantes que, associados à observação participante, produziram um rico material de pesquisa. Construí a trajetória de vida de três sócios fundadores da Turma OK, Agildo Guimarães, Anuar Farah e José Rodrigues.5 5 Os nomes desses três sócios estão disponíveis em diferentes materiais de divulgação (site e redes sociais) adotados pela Turma OK para falar de si. Optei por não usar nomes fictícios, pelo fato de eles serem notoriamente conhecidos pelo grupo como fundamentais no seu processo de constituição. Anuar e Agildo Guimarães foram entrevistados e citados em outros trabalhos, como os de James Green (2000b), sobre a vida social de “bichas” e “bofes” no período anterior à emergência do movimento homossexual. Os outros nomes de interlocutores que aparecem ao longo do texto foram substituídos por nomes fictícios grafados em itálico, de forma a preservar seu anonimato. Os três sócios fizeram parte do período que meus interlocutores classificam como “Primeiro Período” da Turma OK (década de 1960), quando esses homens se reuniam em seus apartamentos para fins de diversão, lazer e sociabilidade. Através de suas trajetórias, consegui recompor um contexto ainda pouco explorado pelas pesquisas que tratam da vida social de homens homossexuais no período anterior à formação do movimento homossexual.

Esta pesquisa analisa dados de fontes documentais, orais e de observação participante. Também reúne fotografias de eventos importantes promovidos pelo grupo, como os registros dos concursos Lady OK, Mister OK, Rainha OK, Rainha da Primavera e Musa OK. As imagens combinam-se ao meu material etnográfico, assim como às anotações do caderno de campo. Destaco ainda a análise de documentos da instituição, como o Estatuto da Turma OK, o Regimento Interno e as atas das Assembleias Mensais de Sócios, que ofereceram dados para entender a estrutura da associação. Em relação às fontes orais, a realização de entrevistas em profundidade, assim como as histórias de vida forneceram materiais importantes para compor, como diria Malinowski, o “esqueleto”, a “carne” e o “sangue” dessa pesquisa.

Consegui o contato de Anuar Farah com uma integrante da Turma OK, a primeira pessoa que entrevistei, no dia 15 de dezembro de 2010. Carla é uma travesti que soube a respeito da Turma OK em 2002, quando participava de um grupo formado por crossdressers, o Brazilian Crossdresser Club.6 6 Um estudo detalhado deste grupo encontra-se na tese de doutorado de Anna Paula Vencato (2009), intitulada “Existimos pelo prazer de ser mulher”: uma análise do Brazilian Crossdresser Club, defendida no âmbito do Programa de Pós-graduação em Sociologia e Antropologia, IFCS-UFRJ. Na ocasião, ela se dizia crossdresser.7 7 De acordo com Anna Paula Vencato (2009), crossdressing seria a prática de vestir-se com roupas e assessórios que socialmente são identificados como do sexo oposto ao da pessoa que as usa. Nessa prática, vestir-se do outro sexo não implica manter relações homossexuais. Contudo, sua inserção em grupos de militância gay fez com que se identificasse como travesti. Carla tem 51 anos, é negra e trabalha como secretária em equipamento público do estado do Rio de Janeiro. Ela frequenta a Turma OK desde 2008. Conheci Carla em uma das muitas noites em que estive na Turma OK, quando fazia questão de me sentar à mesa com pessoas desconhecidas para conversar e colher informações sobre o grupo. Logo que a conheci, apresentei-me como pesquisador, expondo os objetivos de minha pesquisa. Carla mostrou-se sempre muito solícita. Por sua sugestão, cheguei a Anuar. Ela disse quem ele era, e também para eu aguardar seu contato, pois veria com ele a possibilidade de eu entrevistá-lo. Esperei por três dias até que Carla retornou o contato com o número de Anuar.

Liguei para Anuar imediatamente e expliquei a ele os objetivos do estudo. Ele pareceu-me seco na conversa, disse que não queria mais falar sobre a Turma OK, que o faria única e exclusivamente pelo “apreço” que nutria por Carla, que lhe havia solicitado esse favor. Agradeci e marcamos um dia para nos conhecermos e para eu começar o meu trabalho. Em 26 de janeiro de 2011, às 15 horas, estava em frente ao apartamento dele, na Tijuca. Ao tocar a campainha, fui recebido por um senhor moreno, de cabelos curtos e grisalhos, alto, um pouco fora do peso e com uma voz suave. Anuar tinha 72 anos, mas aparentava ter menos. Seu apartamento era pequeno, de um quarto apenas, decorado com quadros e estátuas de inspiração homoerótica. Ele divide esse espaço com um filho de criação, que não cheguei a conhecer, mas com quem falei pelo telefone algumas vezes, já que sempre ligava para Anuar para esclarecer alguma dúvida em relação à Turma OK.

Ao me receber, Anuar disse novamente que não queria falar sobre a Turma OK, pois havia saído da associação muito magoado, em virtude de problemas que enfrentara com alguns dos sócios e que aceitou conceder a entrevista em função da amizade que tinha com Carla. Mais uma vez agradeci e, depois de contar a ele sobre o meu interesse de pesquisa, começamos a conversar. Para a entrevista, adotei o formato de roteiro semiestruturado, dividindo as perguntas de acordo com os objetivos da pesquisa. As perguntas foram organizadas em torno da trajetória da Turma OK, bem como da dinâmica das interações entre seus sócios.

Como resultado, obtive uma história da Turma OK. Aquela que foi contada por ele é uma versão singular, que se relaciona com um contexto mais amplo de transformações socioculturais pelas quais passava a sociedade brasileira. Talvez essa mesma história tivesse sido contada de uma forma diferente se aqueles que detêm a “autoridade narrativa” fossem exclusivamente sócios mais novos, ou mesmo ativistas do movimento LGBT contemporâneo. Ela se inscreve em um processo que Michel Pollak (1989POLLAK, Michael. 1989. “Memória, esquecimento, silêncio”. Estudos Históricos . Vol. 02, nº 03, p. 03-15.) identifica como “enquadramento de memória”. Para o autor:

O trabalho de enquadramento da memória se alimenta do material fornecido pela história. Esse material pode sem dúvida ser interpretado e combinado a um sem-número de referências associadas; guiado pela preocupação não apenas de manter as fronteiras sociais, mas também de modificá-las, esse trabalho reinterpreta incessantemente o passado em função dos combates do presente e do futuro (Pollak, 1989POLLAK, Michael. 1989. “Memória, esquecimento, silêncio”. Estudos Históricos . Vol. 02, nº 03, p. 03-15.: 09).

Essa história é o que podemos classificar de uma “história autorizada”. Trata-se de uma versão que foi traduzida pelos indivíduos que a vivenciaram e a estão narrando a partir de sua experiência. A memória que esses homens constroem tem o objetivo de manter a coesão do grupo, ao mesmo tempo em que define fronteiras de significados em relação a outros grupos, como as outras turmas do passado e, logo depois, com os ativistas do moderno movimento LGBT.

A autoridade da qual são investidos esses indivíduos em relação aos rumos da história narrada os torna, ainda de acordo com Pollak (1989POLLAK, Michael. 1989. “Memória, esquecimento, silêncio”. Estudos Históricos . Vol. 02, nº 03, p. 03-15.), “profissionais da história”, ou como sugere Myriam Lins de Barros (1989LINS DE BARROS, Myriam Moraes. 1989. “Memória e família”. Estudos Históricos, Vol. 02, nº 03, p. 29-42.), “guardiões da memória”. São indivíduos encarregados de reter a memória do grupo, sob pena de ela se perder. Pude observar a atuação desses “profissionais da história” quando, conversando com um dos sócios,8 8 Ofereci um exemplar da minha dissertação ao grupo, assim como convidei meus interlocutores para a defesa da dissertação. Um dos meus interlocutores esteve presente na defesa. ele disse que gostaria de ler minha dissertação antes que eu a defendesse. Presumi que ele estaria preocupado com o tipo de informação que poderia estar contida no trabalho. Tal preocupação se justifica em função da imagem que esses homens querem transmitir para o público.

No fim da entrevista, perguntei a Anuar se sabia onde se encontrava Agildo Guimarães, outro antigo sócio da Turma OK. Anuar disse que Agildo estava muito doente, morando na casa de parentes no bairro de Campo Grande. Contou que ele não conseguia falar e que não poderia receber a visita de um pesquisador interessado em sua trajetória. Essas informações foram confirmadas por outros sócios da Turma OK, como José Rodrigues. Decidi recorrer então a uma estratégia para ter acesso a Agildo. Tinha lido a dissertação de mestrado de Rogério da Costa (2010COSTA, Rogério da Silva Martins da. 2010. Sociabilidade homoerótica masculina no Rio de Janeiro na década de 1960: relatos do jornal O Snob. Dissertação de Mestrado em Bens Culturais e Projetos Sociais, Fundação Getúlio Vargas.) sobre o jornal O Snob alguns meses antes de iniciar meu trabalho de campo. Neste trabalho, o autor entrevistou Agildo Guimarães, além de analisar o conteúdo da publicação idealizada por ele.

Consegui o contato com Rogério através de uma amiga.9 9 Agradeço a Mayara Gonzalez por essa valiosa sugestão. Escrevi um e-mail no qual expus a impossibilidade de entrevistar Agildo e solicitei as entrevistas que tinham sido feitas com ele. Fui atendido prontamente. Rogério cedeu entrevistas que tinha realizado em duas ocasiões, 09 de fevereiro de 2008 e 12 de setembro de 2009, totalizando duas horas e trinta minutos de conversas. As perguntas se aproximavam muito daquelas que eu havia feito a Anuar, girando em torno do contexto sociopolítico da época, dos encontros entre “bichas” nos apartamentos, do que acontecia dentro dessas turmas e também dos pequenos jornais que editavam.

Agildo é pernambucano, chegou ao Rio de Janeiro em 1952. No Rio, fundou o jornal O Snob, uma publicação de circulação restrita responsável por veicular notícias do “gueto”. Este é um personagem central para se compreender o surgimento da Turma OK.

Através de Anuar, pude chegar ainda a José Rodrigues, que foi presidente da Turma OK, além de ter feito parte de várias gestões como diretor cultural. José Rodrigues tem 86 anos, está aposentado, tendo trabalhado durante muito tempo em uma empresa de exportação. Ele chegou ao Rio de Janeiro em 1962, vindo de Recife. De família de poucos recursos, José Rodrigues perdeu a mãe muito cedo, indo morar com uma tia. Logo que chegou ao Rio, trabalhou em diferentes funções. Conseguiu alugar o seu primeiro apartamento em Copacabana com Agildo, mas disse que descobriu que gostava de morar sozinho. Assim que começou a trabalhar em uma empresa multinacional, conseguiu comprar seu imóvel na Avenida Nossa Senhora de Copacabana, onde mora até hoje.

Meu contato com Anuar Farah foi ainda mais intenso. Todos com quem conversava na Turma OK perguntavam se eu já tinha falado com ele. Tive a certeza de que ele era fundamental para escrever este trabalho. Passei a ligar para Anuar quando tinha dúvidas em relação a algum episódio do passado da instituição. Nesses momentos, sempre existia a oportunidade de ter agradáveis conversas com ele.

Entrevistei Anuar em uma outra ocasião, no dia 19 de junho de 2011. Como na entrevista anterior, ele foi muito simpático comigo, mas parecia um pouco mais chateado em falar novamente sobre a Turma OK. Fui entrevistá-lo para saber mais sobre os concursos e o Prêmio JL, criações dele. A conversa, dessa vez, teve a duração de 1 hora e 10 minutos. Anuar estava aborrecido, pois após um tempo sem frequentar a sede da associação, teria ido até lá uma noite para prestigiar um amigo e viu que o casarão estava em estado decadente. Ao fim da entrevista, Anuar me presenteou com um DVD que continha uma apresentação especial promovida por alguns sócios da casa sobre a vida e a obra de Liza Minelli. Segundo ele, eu poderia ver como era sofisticada a Turma OK nos anos em que ele era presidente.

Realizei outras entrevistas em profundidade com sócios ativos da Turma OK. Uma dessas entrevistas foi feita com Pedro Paz, considerado um dos sócios mais antigos da associação. Pedro Paz tem 63 anos e está na Turma OK desde 1985. Ele participou durante alguns anos de grupos ativistas engajados no reconhecimento dos direitos homossexuais. Sua trajetória está intimamente ligada ao movimento antiaids, sendo o fundador de duas das associações mais antigas destinadas a este fim. Poeta e escritor, Pedro é um dos mais assíduos frequentadores da Turma OK. Quase todas as noites em que estive em campo encontrei-me com ele, sempre sentado em uma mesa de frente para o palco com seu copo de refrigerante com gelo. Entrevistei Pedro em uma dessas mesas, um pouco antes de começar o show.

A Turma OK: “uma confraria gay na Lapa”

A Turma OK foi fundada em 13 de janeiro de 1961.10 10 Essa data consta no Estatuto da Turma OK. Iniciou-se então o “Primeiro Período”, como é chamado pelos sócios mais antigos. A ideia de organizar um grupo formado por “bichas” surgiu de um conjunto de amigos que se reuniam periodicamente nos seus apartamentos. De acordo com Agildo Guimarães, a formação da Turma OK não foi intencional, mas algo espontâneo que ocorreu ao longo do tempo.11 11 Não se sabe precisamente em qual ano essas turmas começaram a se reunir em apartamentos. É consenso entre os sócios mais antigos da Turma OK que isso aconteceu entre fins da década de 1950 e início da década de 1960. Essas reuniões aconteciam semanalmente, ou no mínimo de 15 em 15 dias. Muitos desses amigos eram moradores da Zona Sul do Rio de Janeiro, mas também havia aqueles de outras regiões da cidade.

Participavam dessa primeira configuração as seguintes pessoas, acompanhadas dos seus respectivos apelidos femininos (como gostavam de ser chamados durante essas reuniões): Antonio Peres (Condessa de Varsóvia); Nyhlmar Amazonas Coelho (Nini, a imperatriz do Lins, depois Nini Wanderbilt III); Itamar Dias Soares (Didi ou Divina); Lisandro de Matos Peixoto (Lili Bofélia, posteriormente Lili Bombom); Osny José (Dama Antiga); Carlos Chagas (Carlota); Leo Acyr Teixeira (a fabulosa Léa); Renê Patino (Renesita); Djalma Alves de Souza (Vick Lester) e Francisco de Assis (Yma Sumak).

Esses homens eram funcionários públicos, comerciantes ou de profissões ligadas ao mundo da arte e do entretenimento (maquiadores, cabeleireiros, figurinistas etc.). De acordo com Agildo, algumas mulheres também participavam desses encontros, como Marlene Filardi (Miss Buracolina) e Maria Amélia (Tia Mame). Muitas delas eram lésbicas, e frequentavam as reuniões com seus “casos”, conta José Rodrigues. A inserção de mulheres nas atividades parecia tornar o grupo mais heterogêneo, evitando comentários que poderiam existir quanto à presença somente de homens dentro desses apartamentos.

Um dos anfitriões mais famosos desses encontros foi Antônio Peres, um boliviano que abria as portas de seu apartamento no 9° andar do Edifício Varsóvia, situado na Rua Almirante Tamandaré, 41, no bairro do Flamengo. Dessas reuniões surgiu a ideia de formar um grupo cujo nome, “Tudo OK”, teria sido sugerido por Nyhlmar Amazonas Coelho. A alcunha era como uma senha que só fazia sentido entre os associados. A senha servia como uma estratégia para ocultar o verdadeiro motivo de se reunirem: viver abertamente a “homossexualidade”. A partir daí os membros do “Tudo OK” começaram a ser conhecidos como “Turma OK”. Segundo Agildo, desde os primeiros anos de existência, a Turma OK já contava com uma estrutura burocrática com presidente, vice-presidente e tesoureiro. O grupo também registrava suas atividades em atas.12 12 Perguntei aos sócios mais antigos sobre a existência dessas atas e eles me responderam que elas se perderam com o tempo. Acredito que tenham se perdido com a mudança de sede.

Nas reuniões eram lidos jornais com temas variados, eram feitas brincadeiras, como “salada mista”13 13 Trata-se de uma brincadeira infantil na qual o grupo cobre os olhos de um dos membros que aleatoriamente escolhe outro participante e lhe pergunta “pera, uva, maçã ou salada mista?”. Cada uma dessas frutas possui um significado específico, pera = aperto de mãos, uva = abraço, maçã = beijo no rosto e salada mista = “selinho”, um beijo na boca. e “jogo da verdade”.14 14 É um jogo de perguntas e respostas que servem para conhecer mais profundamente o indivíduo que participa da roda de jogo. É obrigatório falar a verdade, caso contrário se paga uma “prenda” previamente estipulada pelo grupo, como um beijo na boca, por exemplo. A bebida mais usual era a Cuba Libre. Havia ainda pequenas apresentações, nas quais homens “vestidos do outro sexo” exibiam roupas e faziam dublagem de importantes cantoras do momento. As apresentações eram aplaudidas com o estalar dos dedos15 15 Os homens se referiam a esta técnica como “castanholar de dedos”. em função do receio de serem descobertos pelos vizinhos e denunciados às instituições responsáveis pela repressão política do regime ditatorial instalado no país depois de 1964. Este episódio é ainda lembrado pelos sócios mais antigos da Turma OK. Os membros referem-se a esse período com muito orgulho, como símbolo da resistência dos que sofriam com a falta de liberdade.

Em 1962, o grupo reforçou seu quadro social com a entrada de pessoas que participavam de outras turmas da Zona Sul carioca. Eles vieram principalmente do Grupo do Snob. Na ocasião, aderiram à Turma OK Carlos Miranda (Ceeme), Agildo Guimarães, Zozô, José de Assis, Sérgio Fernando e outros. Alguns, como Agildo Guimarães, seriam futuramente eleitos presidentes da Turma.

Agildo Guimarães, que entrou para a Turma OK um ano depois de sua fundação, revela que “a essência do grupo era para reunir, conversar e rirmos entre nós... para que a gente existisse como gay/homossexual”. Diante de uma sociedade com poucos espaços onde podiam “ser eles mesmos”, a possibilidade de “existir” como desejavam era o que estimulava a convivência entre os sujeitos dessa primeira formação. Essa possibilidade facultou criar entre eles o sentimento de estarem associados, ou seja, de compartilharem da ideia de que sua sexualidade era um valor que os agregava. Era a sexualidade que fornecia o “impulso de sociabilidade” para que as interações ocorressem (Simmel, 1983SIMMEL, George. 1983. “Sociabilidade - um exemplo de sociologia pura e formal”. In: MORAES FILHO, Evaristo (org.). Georg Simmel: sociologia. Col. Grandes Cientistas Sociais. São Paulo: Ática. p. 165-181.). A necessidade de viver abertamente a sexualidade e a expressão de gênero transgressoras gerou uma “interação entre iguais” (Simmel, 1983), sobrepujando as diferenças sociais que poderiam existir entre eles. Nessas reuniões se aprendia a ser “bicha”, assim como, mais tarde, em reuniões semelhantes, aprendeu-se a ser “militante homossexual”, como destaca MacRae (1990MACRAE, Edward. 1990. A Construção da igualdade: identidade sexual e política no Brasil da “abertura”. 1ª ed. Campinas: Editora Unicamp. 321 p. ) em estudo sobre o grupo Somos em São Paulo.

O relato de Agildo quando dos 40 anos da Turma OK resume a importância dos jornais e dos encontros nos apartamentos para a formação da associação.

Tudo isso foi importante em nossa existência, principalmente na formação da vida social e política do “homossexual”, pois através dos jornais nanicos, como eram chamados, existíamos como seres humanos. Por sua vez, a Turma OK teve uma importância maior, pois se nos jornais falavam da nossa existência, na OK existíamos de verdade. Era e é um lugar onde nós somos e sempre seremos seres humanos, com trejeitos ou não, com sofrimentos e alegrias, desejos, amores e mesmo raiva (Okzinho, ano 18, n. 01, p. 05, 2001VÁRIOS AUTORES. 2001. “40 anos da Turma OK”. OKZINHO, Rio de Janeiro, Edição especial de aniversário. Ano 18, nº 01, jan.).

Assim como acontecia em outros grupos que se reuniam no período da ditadura militar,16 16 Green (2000b) elenca diferentes turmas que existiram e coexistiram no Rio de Janeiro nesse período, muitas delas carregavam os nomes dos seus bairros e regiões da cidade, como a Turma do Subúrbio. esses amigos trocavam de casa a cada encontro, tendo por objetivo despistar a fiscalização da polícia. Para Anuar, durante a ditadura “não existiu gay. Quem era gay deixou de ser, pois tinha que ter muito cuidado na rua, [com quem] sair, com quem falar”. Anuar lembra que muitas “bichas” sumiram e nunca mais apareceram para contar o que tinha acontecido. Agildo acrescenta que ser “bicha” era um problema até mesmo na hora de alugar um apartamento. As dificuldades, entretanto, não impediram que esses homens continuassem mantendo contato. A maior dificuldade, lembra Agildo, era assegurar a discrição para que ele e os seus amigos não despertassem a curiosidade alheia.

Podemos até dizer que nós éramos “desbravadores”, porque realmente era muito cedo para fazer reuniões. Tanto é que depois de... nós fazíamos reuniões primeiro nas residências em que a gente morava e depois nos clubes, porque a coisa foi crescendo muito. Agora, atravessamos muitas dificuldades com isso, sabe? Porque primeiro você não podia... Ainda bem que tinha aquelas mulheres como associadas, porque encobria a coisa, sabe? Não se podia bater palma, palma [Agildo nesse momento bate com as mãos para mostrar o ato], a gente batia palma assim [estala os dedos], entendeu? Uma série de coisas que a gente enfrentou e fomos levando até hoje.

A fiscalização nas ruas era constante. Aqueles considerados suspeitos de práticas consideradas “subversivas” eram parados e levados para a delegacia. De acordo com Anuar, um chefe de polícia da época tinha o costume de colocar um limão dentro das calças daqueles que usavam roupas mais justas ao corpo. Se caísse, o indivíduo era liberado, pois estava usando uma calça compatível com os padrões de masculinidade legitimados. Mas se ficasse retido no corpo, significava que a calça estava muito apertada e que, portanto, não poderia ser usada por um “homem de verdade”. Essas “atitudes suspeitas” iam desde frequentar espaços conhecidos pela presença constante de “bichas” até o uso de roupas consideradas inadequadas para um homem, como a calça mais justa. Na delegacia, esses homens eram submetidos a árduas tarefas domésticas, como lavar banheiro e faxinar as celas. Muitas “bichas” quando presas, acrescenta Anuar, cortavam-se com lâminas para serem liberadas da humilhante expiação que esses serviços representavam. Trabalhos sobre travestis mais velhas, seguramente incluídas entre as “bichas” a que se refere Agildo, apontam o recurso de “se cortar” como estratégia adotada quando presas pela polícia (Kullick, 2008).

A ênfase dada a tais relatos está associada à forma como esses personagens experienciaram o período associado à angústia que o autorreconhecimento da homossexualidade despertava em um contexto de forte hostilidade social. Vale ressaltar, contudo, que a ditadura brasileira não estruturou uma política específica de combate às sexualidades dissidentes. A preocupação dedicada a esse grupo foi residual e episódica. A repressão às “bichas” se manifestou antes em função da atuação de uma polícia fortemente orientada por valores morais associados à manutenção das relações de gênero vistas como “tradicionais”. Muitas “bichas” também eram militantes de esquerda, fato que acentuaria as chances de sofrerem repressão e outros tipos de violência (Green, 2000aGREEN, James N. 2000a. “‘Mais amor e mais tesão’: a construção de um movimento brasileiro de gays, lésbicas e travestis”. Cadernos Pagu. Nº. 15, p. 271-295. ). Vários trabalhos que tratam da relação entre homossexualidade e envelhecimento (Henning, 2016HENNING, Carlos Eduardo. 2016. “‘Na minha época não tinha escapatória’: teleologias, temporalidade e heteronormatividade”. Cardernos Pagu. Nº 46, p. 341-371, jan-abr.; Saggese, 2015SAGGESE, Gustavo. 2015. Entre perdas e ganhos: homossexualidade masculina, geração e transformação social na cidade de São Paulo. Tese de Doutorado, Universidade de São Paulo. ; Passamani, 2015PASSAMANI, Guilherme. 2015. Batalha de Confete no “Mar de Xarayés”: condutas homossexuais, envelhecimento e regimes de visibilidade. Tese de Doutorado, Universidade Estadual de Campinas.) esforçaram-se em compreender como determinados marcos sociais, como a ditadura brasileira, foram experimentados e vivenciados por homens de meia-idade e idosos identificados como homossexuais.

O trabalho de Henning (2016HENNING, Carlos Eduardo. 2016. “‘Na minha época não tinha escapatória’: teleologias, temporalidade e heteronormatividade”. Cardernos Pagu. Nº 46, p. 341-371, jan-abr.) ajuda a refletir sobre a centralidade da ditadura militar na trajetória de vida de homens como Anuar Farah e Agildo Guimarães. Para o autor, essa geração esteve submetida a uma “forte pressão de cumprimento de certas convenções sociais”. Tais pressões teriam produzido sentidos sobre suas sexualidades, associando-as à transgressão e à clandestinidade. Daí a sensação de angústia, conforme apontada por Saggese (2015SAGGESE, Gustavo. 2015. Entre perdas e ganhos: homossexualidade masculina, geração e transformação social na cidade de São Paulo. Tese de Doutorado, Universidade de São Paulo. ), no ato de narrar suas vidas para evocar um passado no qual a homossexualidade só podia ser vivenciada na chave do sofrimento.

Diante do recrudescimento da ditadura, a Turma OK foi obrigada a diminuir suas atividades. Durante cerca de 15 anos o grupo ficou sem se reunir. Contudo, a amizade entre os membros do grupo inicial foi mantida. Nesse período, revela Anuar, a atividade com os jornais se intensificou, sobretudo com O Snob. Foi somente com o processo de abertura política que as atividades retornaram efetivamente. A chegada da década de 1970 trouxe novo fôlego à Turma OK. Se no “primeiro momento” as reuniões e as atividades desenvolvidas pelo grupo eram associadas a uma certa espontaneidade, no “segundo momento”, elas se ampliaram, consolidando um espaço institucionalizado e cada vez mais especializado na realização de concursos de “beleza transformista”.

Aureliano Lopes (2017SILVA JUNIOR, Aureliano Lopes. 2017. “Para uma história dos concursos de beleza trans: a criação de memórias e tradição para um certame voltado para travestis e mulheres transexuais”. Cadernos Pagu . Nº 50, p. 1-56. ), ao analisar três edições do concurso Miss Boneca Pop (1974-76), oferece uma importante contribuição ao conhecimento do período em que esses concursos floresceram, não somente na Turma OKTURMA OK . Estatuto da Turma OK., mas na sociedade brasileira como um todo. Para o autor, tais concursos possibilitaram projetar uma “comunidade imaginada”, na consagrada expressão de B. Anderson (2008), ao mesmo tempo em que “encarnada” no corpo de suas candidatas. Seguindo o raciocínio do autor, é possível admitir que esses certames constituíram espaços de produção de gênero. Foi a partir deles que a visibilidade passou a ser negociada em meio à produção de feminilidades. No caso da Turma OK, os concursos foram formas privilegiadas de interação com a sociedade carioca. Era um momento único, no qual esses homens podiam sentir-se mais seguros e que o grupo podia promover o reconhecimento social de suas existências.

No Brasil, manifestações artísticas, principalmente na música popular, começavam também a adotar um comportamento contestador das convenções de gênero. Personagens andróginos como Ney Matogrosso (Secos e Molhados), Caetano Veloso (Doces Bárbaros) e o grupo Dzi Croquetes passaram a se destacar na cena pública brasileira, levando milhares de pessoas ao delírio. Seus fãs não admiravam apenas suas performances artísticas, mas também seu estilo de vida, que envolvia a adoção de valores comunitários, o uso de drogas, liberdade sexual etc.

Nesse contexto de florescimento cultural, José Luiz Ferreira Bahiana17 17 Nome presente no site da instituição. (conhecido como o Paizinho), um dos sócios que aderira ao grupo no fim do seu “primeiro período” de existência (meados da década de 1970), vislumbrou a possibilidade de realizar novos encontros, aproveitando-se da relativa abertura no regime. José Luiz Ferreira Bahiana se constituiu em mediador nesse processo de reestruturação do grupo, sendo inclusive confundido como um “sócio fundador” em razão de sua proeminente participação nessa tarefa. Sua primeira iniciativa foi a de começar a receber os antigos amigos da Turma OK em sua casa. A partir desse momento os homens passaram novamente a se encontrar com regularidade. Ele chamou para os encontros Agildo Guimarães e Anuar Farah. A Turma OK viveu então uma atividade intensa, atraindo cada vez mais indivíduos.

Os apartamentos ficaram pequenos para receber o número crescente de amigos que começaram a frequentar as reuniões. Os encontros passaram então a acontecer nas dependências do Clube 1° de Maio, no bairro do Caju. Por virtude da amizade que mantinha com o proprietário do Cabaré Casa Nova (boate na Lapa), Anuar conseguiu trazer para esse espaço as reuniões da Turma, que tinham lugar em todas as segundas-feiras. Essas reuniões traziam benefícios ao dono do Cabaré, já que era uma oportunidade de vender bebidas e guloseimas do bar aos frequentadores. Nesse espaço, os “okeis” permaneceram por três anos, mudando-se depois para uma sede própria que conseguiriam alugar também no bairro Lapa.

Na década de 1980, principalmente a partir do ano de 1983 (Daniel & Míccolis, 1983DANIEL, Herbert & MÍCCOLIS, Leila. 1983. Jacarés e lobisomens: dois ensaios sobre homossexualidade. Rio de Janeiro: Achiamé. 136 p. ),18 18 De acordo com Herbert Daniel, o primeiro caso oficial de morte por decorrência do HIV no Brasil data de 1983, com a morte do cabeleireiro e maquiador Marquito (Daniel & Míccolis, 1983). uma nova página seria escrita na história dos homens que se relacionam sexualmente com outros homens. O advento da AIDS provocaria uma ruptura definitiva na forma com que a história das sexualidades dissidentes vinha sendo escrita. A dinâmica da sociabilidade da Turma OK foi bastante abalada pelo surgimento da doença. José Rodrigues lembra com tristeza desse período.

E quando tudo parecia que estávamos no sétimo céu, eis que as garras cruéis da “peste negra” começaram a decepar cabeças. Foi uma tristeza só. Amigos, artistas geniais, companheiros inesquecíveis começaram a desaparecer, um após outro, deixando uma tremenda lacuna e uma imensa saudade. Morreram muitas pessoas, muitos amigos nossos, muita gente boa, maravilhosa. Para você ter uma ideia, tinha semanas que morriam duas, três pessoas, assim, na fase braba mesmo da AIDS.

Falava-se muito sobre o assunto, revela Anuar, vários homens optavam por se “retrair sexualmente”, com medo de serem contaminados pela desconhecida doença. Anuar afirma que muitos não acreditavam que iriam contrair, já que confiavam que a doença só poderia ser transmitida através do sangue.

O surgimento da doença evocou uma série de estereótipos negativos sobre as práticas sexuais entre homens e sobre as “bichas”. Do ponto de vista religioso, havia a crença de que ela seria uma espécie de castigo imputado aos transgressores pelos seus pecados contra a natureza. Já no plano científico, o “homossexual”, como tipo social, passaria de uma patologia amplamente estudada pela ciência para a condição de um “agente patogênico”, como principal grupo transmissor da nova doença (Daniel & Miccolis, 1983DANIEL, Herbert & MÍCCOLIS, Leila. 1983. Jacarés e lobisomens: dois ensaios sobre homossexualidade. Rio de Janeiro: Achiamé. 136 p. ). Paralelamente, a epidemia possibilitou a “remoção do véu que cobria as sexualidades”, como lembra Trevisan, tornando pública a discussão sobre a sexualidade no Brasil (Trevisan, 2000TREVISAN, João Silvério. 2000. Devassos no paraíso: a homossexualidade no Brasil, da colônia à atualidade. Rio de Janeiro: Record. 586 p.). A violência com que a AIDS atingiu a sociedade marcou ainda novas possibilidades de inserção política dos “homossexuais”, visto que os grupos de “militância homossexuais” foram os pioneiros a elaborarem respostas político-sociais às suas vítimas.

De acordo com Agildo, esse período foi marcado pelo desconhecimento das “bichas” em relação ao vírus. Muitos foram os amigos e conhecidos que morreram, incluindo um presidente da Turma OK. Agildo atribui à sorte não ter sido contaminado. Segundo ele, toda vez que se apaixonava por um “bofe” sem ser correspondido, logo depois descobria que esse mesmo rapaz tinha “morrido de AIDS”.

A Turma OK participou ativamente de campanhas que tinham por objetivo esclarecer as pessoas acerca da doença, ainda que não se identificasse como um grupo de combate à AIDS. Segundo Anuar, a Turma OK foi uma pioneira nesse tipo de iniciativa, realizando no início da década de 1980 palestras nas quais médicos, como Eduardo Côrtes, falavam sobre o vírus e suas formas de contágio. Chegou-se mesmo a convidar um médico para ir à sede da Turma OK para coletar sangue de alguns dos sócios para ser testado. O resultado era entregue ao sócio, sendo mantido o sigilo do seu diagnóstico. Na ocasião, Pedro Paz, que também tinha inserção no movimento antiaids, teve importância fundamental, visto que pôde fazer a ligação da Turma OK com os grupos que lutavam contra a doença, como o Triângulo Rosa.

A aproximação da Turma OK com outros movimentos gays organizados do Rio de Janeiro, como o Triângulo Rosa,19 19 Em seu estudo sobre o Triângulo Rosa, Cristina Câmara (2002) revela que a preocupação principal deste grupo era com a defesa dos direitos dos “homossexuais”, em detrimento do combate à AIDS, assim como foi em outros “grupos homossexuais” que existiram no período. A rejeição da AIDS como bandeira política se relacionava à ideia de que a doença reforçava a discriminação contra os “homossexuais”, que passaram a ser associados a ela. o Somos/RJ e o Auê, foi eventual e episódica. Essa ligação ocorreu em função do combate a um inimigo comum, a AIDS. A mobilização em torno do combate à doença fez com que os sócios da Turma OK e os participantes dos outros movimentos dialogassem em uma arena comum. O diálogo acontecia de diferentes maneiras: na assistência direta aos infectados pela doença ou pelo empréstimo da sede da Turma OK para que grupos que não possuíam sede própria se reunissem, como era o caso do Triângulo Rosa (Câmara, 2002CÂMARA, Cristina. 2002. Cidadania e orientação sexual: a trajetória do Triângulo Rosa. 1ª ed. Rio de Janeiro: Academia Avançada. 182 p. ). Alguns ativistas que participavam desses movimentos passaram a frequentar também as reuniões da Turma OK, como Pedro Paz, que conhecera o grupo por intermédio de Agildo Guimarães, que também comparecia nas reuniões do Triângulo Rosa.20 20 Agildo Guimarães conta que participava do Triângulo Rosa por conta própria. A participação nesses grupos não era algo que contasse com a total adesão dos sócios da Turma OK.

Em 1987, os debates em torno da Constituinte movimentaram a sociedade brasileira. Os então chamados de “novos movimentos sociais”21 21 Esses movimentos, além de debaterem a questão da moradia, das relações de trabalho, consideradas tradicionais e primordiais para o movimento operário, evidenciavam a existência de múltiplas relações de poder estruturadas nas desigualdades de gênero e na discriminação em função da cor da pele (Câmara, 2002). foram instados a falar de si, na tentativa de incorporarem as suas demandas ao texto constitucional. Na ocasião, o movimento homossexual vivenciava o esvaziamento de seus quadros provocado pela fragmentação política ocorrida ainda em sua “primeira onda”22 22 Segundo Regina Facchini (2005), a “primeira onda” do Movimento Homossexual Brasileiro teria se iniciado com o lançamento do jornal O Lampião da Esquina em 1978 e, posteriormente, com a fundação do grupo Somos em São Paulo, em 1979. A proposta destes primeiros núcleos de militância era mostrar que os “homossexuais” eram capazes de se realizar a partir da afirmação de uma identidade homossexual. (Facchini, 2005FACCHINI, Regina. 2005. Sopa de letrinhas? Movimento homossexual e produção de identidades coletivas nos anos de 1990. 1ª ed. Rio de Janeiro: Garamond. 304 p. ). Essa crise foi acentuada em função do afluxo dos ativistas em um momento em que os “homossexuais” eram responsabilizados pelo surgimento e a disseminação da AIDS (Góis, 1999GÓIS, João Bosco Hora. 1999. Vestígios da força das palavras: escritos sobre a AIDS. Tese de Doutorado, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.). Diante de tal situação, o movimento homossexual, diferente dos movimentos de mulheres e negros, encontrava-se sem um devido preparo para negociar posições junto ao Estado. A tentativa malsucedida de incluir a “orientação sexual” no Artigo 5° da Constituição de 1988 foi o reflexo mais imediato desse despreparo.

Ao analisar a situação, Cristina Câmara (2002CÂMARA, Cristina. 2002. Cidadania e orientação sexual: a trajetória do Triângulo Rosa. 1ª ed. Rio de Janeiro: Academia Avançada. 182 p. ) mostra que somente um grupo estava diretamente engajado nesse certame jurídico, o Triângulo Rosa. Mesmo assim, ele se encontrava internamente dividido entre aderir ao movimento antiaids ou manter as reivindicações por direitos civis. A segunda postura saiu vitoriosa em virtude dos esforços de um de seus mais destacados membros, João Antônio Mascarenhas, que representaria o movimento homossexual nos debates da Constituinte em Brasília. A luta por direitos implicou um reposicionamento teórico em face da “homossexualidade”, incitando discussões em relação à validade explicativa e política da expressão “orientação sexual”. A Turma OK foi uma das 13 organizações gays que participaram das discussões sobre o uso político da expressão “orientação sexual”. Depois de ser consensualmente escolhida por esses grupos, a expressão foi enviada a um conjunto de intelectuais para ser analisada de forma que seu uso fosse legitimado (Câmara, 2002; Facchini, 2005FACCHINI, Regina. 2005. Sopa de letrinhas? Movimento homossexual e produção de identidades coletivas nos anos de 1990. 1ª ed. Rio de Janeiro: Garamond. 304 p. ). O debate, apesar de não ter tido um desfecho favorável para os “homossexuais”, contribuiu efetivamente para a construção de uma percepção pública desse grupo social como sujeitos demandantes de direitos.

Na década de 1990, a Turma OK continuou afastada do tipo de ativismo adotado pelo Movimento Homossexual Brasileiro (MHB).23 23 Apesar do distanciamento político em relação ao MHB, a Turma OK manteve vínculos amistosos com este movimento e com a sua agenda. Um exemplo dessa ligação foi sua participação no VI Encontro Brasileiro de Homossexuais (VI Ebho), realizado no Rio de Janeiro, entre os dias 29 a 31 de maio de 1992 (Facchini, 2005). Esse afastamento se acirrou durante a “segunda onda” do MHB, quando ocorreu a “ongnização” do ativismo em função da aproximação deste com o movimento de luta contra a AIDS. Para Anuar, esse movimento, que começava a acumular capital político (Góis, 1999GÓIS, João Bosco Hora. 1999. Vestígios da força das palavras: escritos sobre a AIDS. Tese de Doutorado, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.), teria se tornado um mero captador de recursos, desviando-se da “solidariedade pura” perseguida pela Turma OK. Para Anuar, esta era a principal diferença entre a Turma OK e aquele movimento que acabara de ressurgir, posto que a associação continuava mantendo sua assistência às vítimas da AIDS sem angariar, para tanto, recursos junto ao Estado. Entretanto, a distância entre a Turma OK e o MHB pode ser explicada de outras maneiras. Para Pedro Paz, a não adesão da Turma OK ao MHB pode ser compreendida em razão da clandestinidade em que muitos sócios ainda mantinham sua sexualidade e/ou identidade de gênero. Para eles, não era interessante ter uma identificação aberta com a “causa homossexual”, tal como aquela proclamada pelos “grupos homossexuais” organizados, já que ela poderia revelar seus “segredos” mais íntimos.

No plano interno, a década de 1980 marcaria a institucionalização da Turma OK, incluindo nesse processo a instalação em uma sede própria e a criação do seu estatuto. A Turma OK passaria então a viver o seu “Segundo Período”. Em 1984, Anuar Augusto Farah y Jaber assumiria a presidência da Turma. A gestão de Anuar seria marcada pela realização dos grandes concursos de “beleza transformista” promovidos pelos “okeis”. Segundo Anuar, foi durante a década de 1980 que os concursos promovidos pela associação deixaram de ser realizados nos apartamentos e passaram a ser feitos em clubes de grande porte, como o Sírio-libanês, e conhecidos pela sociedade mais ampla.

A escolha da “Musa de Inverno” foi um desses concursos cuja realização demandou muito tempo e dedicação de um número expressivo de associados. De acordo com Anuar, a inspiração para fazer o evento veio dos grandes concursos de Miss ocorridos no estádio do Maracanãzinho na década de 1960. Para tanto, Anuar tentou realizá-lo no próprio Maracanãzinho,24 24 Acredito que certamente era um problema na época ceder o mesmo espaço onde ocorriam os famosos concursos de Miss Brasil a uma turma de “bichas”. Creio que seria conceder, no plano simbólico, um estatuto de beleza somente dado àquelas mulheres a um conjunto de “homens que se vestem de mulher”. Este não foi um problema para as “misses renascença” estudadas por Sonia Giacomini (2006). o que foi negado pela Prefeitura. Diante da negativa, ele procurou as dependências do Automóvel Clube do Brasil, situado na Lapa, o que também foi negado. Anuar conseguiu então o clube Sírio-libanês que passaria a hospedar as festas realizadas pela Turma OK durante oito anos.

Nessas festas, era exigida vestimenta adequada, sem a qual não se poderia entrar no clube. Anuar revela que, quando lançava a exigência de um novo traje, como o “esporte-chique”, inventado por ele, avisava aos convidados, que sabiam que não poderiam entrar se não estivessem de acordo com a roupa exigida pelo anfitrião. O “esporte-chique” era uma mistura do “social” com o “esportivo”, diz Anuar. Foi um estilo criado para incluir o uso do tênis no vestuário elegante, quando Anuar percebeu que os preços deste calçado eram tão ou mais elevados que os de um par de sapatos sociais. Na visão de um antigo sócio que deixou de frequentar a Turma OK, esse tipo de iniciativa contribuía para a impopularidade de Anuar entre alguns sócios. Para ele, Anuar tinha uma visão da Turma OK como uma “casa de espetáculo”, ideia não compartilhada por muitos sócios.

Na gestão de Anuar, a Turma OK alugou sua sede. O casarão, que era conhecido como “Sobradão das artes” e servia de ateliê a José Antônio Santa Rosa,25 25 Nome presente no site da Turma OK. sócio da Turma, foi o espaço escolhido para esse fim. Localizava-se na Rua do Rezende, 43. Como a Turma OK ainda não tinha personalidade jurídica, o contrato da nova sede teve que ser firmado por José Luiz Adolpho Bahiana, que junto com Agildo Guimarães e José Antonio Santa Rosa passaram a se responsabilizar pelas obrigações contratuais decorrentes da locação do imóvel. Na segunda gestão de Anuar Farah, a Turma OK conquistou sua personalidade jurídica. A partir de então, pôde firmar seu primeiro contrato de aluguel, em 01 de outubro de 1988. No início, o grupo ocupava um andar, depois foram apropriados os outros três andares do prédio. Anuar lembra com saudades dessa sede, que contava com amplos espaços, como o salão de estar onde se organizava uma recepção. Nas suas paredes eram coladas as fotos e os diplomas que contavam a história da Turma OK.26 26 Com a mudança para a nova sede na Rua do Rezende, 43, em 1984, essas fotos e diplomas foram colocados em um pequeno quarto junto ao camarim, sem qualquer tipo de tratamento adequado para a sua preservação.

De acordo com Anuar, a primeira iniciativa quando do lançamento da sede foi realizar uma exposição com as fotos de várias produções artísticas promovidas pela Turma, incluindo os vestidos utilizados nos espetáculos. Na ocasião, a Turma começava a ser conhecida pela mídia. Anuar diz que a escolha do bairro da Lapa não foi intencional. De acordo com ele, a Lapa, naquela época, ainda guardava vestígios de Madame Satã,27 27 João Francisco dos Santos, conhecido como Madame Satã, famoso boêmio das ruas da Lapa do início do século XX. preso na Ilha Grande, sendo um bairro decadente associado à violência, com aluguéis bastante acessíveis.

Muitos “projetos”28 28 Os “projetos” são os shows realizados nas dependências da Turma OK. foram concebidos também na gestão de Anuar. O “projeto” intitulado “Agora é que são eles e elas”, apresentado por Álvaro Marques e Ilona de Martini, foi um deles, e até hoje está em cartaz. Outro “projeto” de grande repercussão no período e que ainda existe é o “Tula recebe...”. Trata-se de um talk-show comandado por um dos sócios da Turma OK. Quando esse “projeto” foi lançado, seu responsável, vestido de smoking, recebia celebridades do mundo artístico. Anuar contou que a entrevista que mais levou pessoas à casa foi a de Renato Aragão.29 29 Ator que ficou conhecido por seu personagem “Didi” no humorístico Os Trapalhões. Anuar precisou do apoio da polícia para evitar a superlotação do espaço.

Por razões profissionais,30 30 Anuar não foi explícito em relação a este ponto. Contudo, como ele esteve envolvido com eventos de moda, acredito que este seja um dos motivos que o teriam levado a se ausentar da Turma OK nesse período. Anuar se manteve afastado da Turma por 10 anos. Nesse ínterim, vários outros sócios comandaram os destinos da associação, como José Luiz Adolpho Ferreira Bahiana (o “Paizinho”), José Rodrigues de Souza, Gilberto Costa Ribeiro, Agildo Bezerra Guimarães, Roberto Andrade, Adalberto Fonseca Filho, muitos dos quais pertencentes à antiga formação da Turma.31 31 Todos esses nomes estão presentes no site da Turma OK. Somente em 1998 Anuar voltaria a compor o quadro de sócios da Turma, ocupando novamente o cargo de presidente, do qual só se despediria em outubro de 2006. Anuar ocupou seis mandatos de presidente na Turma OK, além de cargos administrativos, como diretor social, em outras gestões.

Em 2008, a Turma OK se mudou para o número 42 na mesma Rua do Rezende. Anuar conta que então passaram a pagar um aluguel mais caro por um espaço menor. A mudança foi o reflexo de uma série de problemas financeiros e de ordem administrativa pelos quais o grupo vinha passando. Na época, presidia a associação Luiz Carlos, apelidado de Mimosa Kerr, filho de José Luiz Adolpho Ferreira Bahiana (o “Paizinho”), a quem se atribui o ressurgimento da Turma OK na década de 1970. Segundo Mimosa Kerr, os problemas financeiros começaram na última gestão de Anuar Farah. As inúmeras festas e concursos, assim como a inadimplência de alguns sócios teriam deixado uma herança de dívidas para a Turma OK. Anuar saiu sob a acusação de desvio de dinheiro, o que o deixou extremamente magoado. Ele diz que tentou se defender, mas alguns “okeis” não queriam ouvir o que ele tinha para falar, fato que teria provocado o seu afastamento definitivo da associação.

Na gestão de Mimosa Kerr as desavenças entre os sócios ficaram ainda mais acirradas. As obras de recuperação da sede causaram grande discussão entre os sócios da Turma OK. Muitas reclamações tinham a ver com o tipo de material comprado para fazer os reparos, considerado muito caro. Segundo Alberto, atual vice-presidente, o piso colocado no camarim foi uma das principais razões para as queixas, por ser um piso caro e pesado, causando o rebaixamento do teto no andar inferior (área do palco), o que demandou mais obras de reparo.

As brigas nas assembleias se tornaram mais frequentes e violentas. Algumas delas terminaram com tapas e ameaças entre os sócios. Mimosa Kerr saiu do cargo acusada de má administração e responsabilizada pela dilapidação do patrimônio da Turma OK. Alguns sócios contaram que depois da gestão de Mimosa Kerr muitas fotos e outras memórias da Turma OK desapareceram.

Depois desse período turbulento, novas eleições foram convocadas, sendo eleito por unanimidade João, presidente na ocasião da pesquisa. De acordo com Anuar, que mesmo fora da associação apoiou e mobilizou amigos para votarem em João, a escolha do novo presidente atendeu a uma demanda por controle das finanças. Para Anuar, João é um homem de comprovada experiência comercial e poderia fazer a Turma OK arrecadar dinheiro e sair da crise na qual se encontrava.

Em janeiro de 2011, a Turma OK fez 50 anos. Para as comemorações do seu Jubileu de Ouro foi rezada uma missa na Igreja de São Crispim e São Crispiniano e houve uma pequena recepção nas dependências da associação para sócios e amigos. Anuar lamenta a pouca pompa com que foi comemorado o aniversário do grupo. De acordo com ele, uma festa de gala deveria ser realizada para celebrar a longevidade da Turma, “uma das mais antigas do mundo”, diz. O tom melancólico de Anuar deixa transparecer seu descontentamento com o que podemos chamar de “nova geração”, percebida por ele como “em débito” com os “mais velhos”. Esse processo ficou bem claro para mim assim que tive meu primeiro encontro com ele.

Ao entrar em seu apartamento, na primeira vez em que fui entrevistá-lo, disse que me sentia muito agradecido pela oportunidade de conversar com ele, já que se tratava de um homem tão atuante no cenário gay carioca. Anuar se disse feliz com minhas palavras e lembrou-me de que, se eu naquele momento gozava de tanta liberdade, como a de estar fazendo uma pesquisa sobre “homossexualidade”, era porque, no passado, pessoas como ele existiram. O argumento de Anuar foi repetido em outros momentos, através da fala de alguns sócios da Turma OK que reivindicam um lugar de destaque na história das conquistas pelo direito à livre expressão sexual.

O reforço dessa lembrança muitas vezes evoca um sentimento de mágoa em relação às gerações atuais. Ainda sobre a comemoração do jubileu, Anuar externou seu ressentimento de não ter visto na missa nenhuma atual liderança do movimento LGBT. Sua mágoa foi ainda maior quanto ao suposto esquecimento da data por parte de um dos mais aclamados líderes do movimento LGBT no Rio de Janeiro, que à época ocupava um cargo ligado à defesa dos direitos LGBT no governo do Estado. Segundo Anuar, nem uma carta teria recebido do ativista.

Cabe esclarecer, contudo, que o que Anuar reivindica não é apenas a lembrança do aniversário da Turma OK, mas, antes, o reconhecimento do seu lugar no processo que deu origem ao moderno movimento homossexual brasileiro - um lugar, segundo ele, de “desbravador”, já que teria aberto caminho para esses movimentos, como podemos perceber por sua narrativa.

É uma coisa ridícula! Você não pode se surpreender com a Turma OK, você tem que saber da existência da Turma OK, porque a Turma OK é a realidade gay brasileira. Ela é a quinta no mundo, é a quinta mais antiga. Então não pode, não pode a pessoa dizer que não sabe o que é a Turma OK. Nunca houve aquela história da parte das ONGs de reconhecerem a Turma OK como um símbolo gay. Eles achavam, pelo fato de nós não sermos ativistas, [que] nós éramos qualquer coisa. Por que eles são considerados grandes ativistas, por quê? Porque recebem dinheiro do governo. Nunca a Turma OK foi reconhecida como a líder do movimento, a mais antiga, nada. Essas ONGs acham que nós somos um “clube de bichas velhas” que fazem show. E não é a realidade, nós não somos ativistas, mas quando foi feita a Constituição, nós estávamos lá.

A noção de “desbravador” alicerça a narrativa de Anuar sobre os “homens homossexuais” de sua geração. Tal noção se aproxima muito das “veteranas das antigas” estudadas por Sabatine (2017SABATINE, Thiago Teixeira. 2017. Só as fortes sobrevivem!: envelhecimento, experiências geracionais e relacionamento entre travestis mais velhas e mais jovens. Tese de Doutorado, Universidade de São Paulo. ). Este autor, ao analisar a relação entre travestis mais velhas e mais novas no contexto da prostituição, avalia a importância da experiência no curso de vida como forma de construção de si e como possibilidade de transmissão de conhecimento para “outras iguais”. As chamadas “veteranas das antigas”, “antigas”, “primeiras travestis”, dentre outras classificações, estruturam uma relação entre passado e presente, atualizada na forma como manejam seus “conselhos” às mais novas. É através desses “conselhos” que é compartilhado todo um repertório de aprendizagens ressignificadas pelas experiências das “mais novas”. Ser um “desbravador”, para Anuar, é justamente reter em sua experiência de vida essa função porosa de interligar passado e presente.

Considerações finais: um espaço de memória

Este artigo tratou da trajetória da Turma OK. O surgimento deste grupo na década de 1960 esteve intimamente relacionado ao processo de consolidação de identidades coletivas ligadas à diversidade de gênero e à sexualidade no Rio de Janeiro. A percepção corrente entre os seus membros de que o grupo era uma “família” permitiu criar uma rede social baseada em laços de amizade. Essa rede foi responsável pela integração dos sócios em uma intensa vida social. Ao mesmo tempo, possibilitou “inventar” formas de vir a ser relacionadas às sexualidades não convencionais em um período marcado pela falta de liberdade.

Os shows de artistas transformistas, os concursos e outras apresentações são as principais atividades organizadas pela Turma OK. Em torno dessas atividades estão hoje “homens homossexuais” e “gays”, muitos dos quais envelheceram junto com a Turma OK, outros tendo sido incorporados mais tarde. No passado, esse grupo foi um símbolo de resistência em face do modelo de sociedade desenhado pela ditadura. Hoje, tenta se afirmar como “patrimônio cultural” da Lapa, na busca de receber um público cada vez mais diversificado e interessado em apreciar sua principal criação: a arte transformista.

Durante a pesquisa, nos eventos em que estive presente, sempre houve um momento reservado à recordação do passado. Em todos os eventos, esses homens fizeram questão de lembrar o “mito de origem” da Turma OK, ou seja, quando eles ainda se encontravam nos apartamentos e aplaudiam seus shows com o estalar dos dedos. Acredito que essa iniciativa tem o objetivo de reforçar os laços de amizade a partir de uma memória afetiva comum - a memória de um passado de poucas liberdades, mas ainda assim de conquistas de homens que ousaram. Esse “mito de origem” passa de boca em boca, foi transmitido a mim em uma das primeiras conversas que tive com o vice-presidente da Turma OK. Através dos eventos ele é revivido, sendo reproduzido pelas novas gerações que frequentam o casarão. O esforço de transmissão do patrimônio simbólico é o que confere identidade ao grupo, tornando-o coeso (Peixoto, 1997PEIXOTO, Clarice Ehlers. 1997. “Histórias de mais de 60 anos”. Revista Estudos Feministas. Dossiê Gênero e Velhice. Vol. 5, nº 1, p. 148-158.).

Essa história tem a capacidade de reter a ideia de família com a qual esses sujeitos explicam seu pertencimento ao grupo. Nesse sentido, a lembrança do “castanholar de dedos” remete a uma espécie de “mito familiar”, nos termos adotados por Cynthia Sarti (2004SARTI, Cynthia Andersen. 2004. “A família como ordem simbólica”. Psicologia USP. Vol. 15, nº 03, p. 11-28. ). Para esta autora, cada família, entendida como um conjunto de relações que fogem da ordem do biológico, constitui sua própria história, um discurso idiossincrásico. Essas histórias, segundo a autora, “expressam o significado e a explicação da realidade vivida, com base nos elementos objetiva e subjetivamente acessíveis aos indivíduos na cultura em que vivem” (Sarti, 2004: 13).

Ao mesmo tempo em que reforçam o “patrimônio simbólico” em função do qual esses sujeitos se mantêm coesos, os concursos e as outras formas de sociabilidade desenvolvidas pelo grupo se inserem em um movimento mais amplo de resistência. É através desses momentos de afeto que a memória é produzida e acionada, consolidando um pertencimento coletivo entre os participantes do grupo. Lopes (2017), ao estudar os concursos de “beleza trans”, busca analisar a partir daqueles fragmentos de história a relação entre memória e cultura. Para o autor, a memória pode ser vista com um documento, uma reiterada atualização do sentido, sobre o qual determinado grupo constrói e pensa de si e para si. A produção desse documento vivo está diretamente relacionada à forma como os “okeis” construíram suas subjetividades e identidades em um contexto marcado por grandes incertezas e sofrimento.

Referências bibliográficas

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  • COSTA, Rogério da Silva Martins da. 2010. Sociabilidade homoerótica masculina no Rio de Janeiro na década de 1960: relatos do jornal O Snob Dissertação de Mestrado em Bens Culturais e Projetos Sociais, Fundação Getúlio Vargas.
  • DANIEL, Herbert & MÍCCOLIS, Leila. 1983. Jacarés e lobisomens: dois ensaios sobre homossexualidade Rio de Janeiro: Achiamé. 136 p.
  • FACCHINI, Regina. 2005. Sopa de letrinhas? Movimento homossexual e produção de identidades coletivas nos anos de 1990 1ª ed. Rio de Janeiro: Garamond. 304 p.
  • GÓIS, João Bosco Hora. 1999. Vestígios da força das palavras: escritos sobre a AIDS. Tese de Doutorado, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
  • GREEN, James N. 2000a. “‘Mais amor e mais tesão’: a construção de um movimento brasileiro de gays, lésbicas e travestis”. Cadernos Pagu Nº. 15, p. 271-295.
  • GREEN, James N. 2000b. Além do carnaval: a homossexualidade masculina no Brasil do século XX São Paulo: Editora da Unesp. 541 p.
  • HENNING, Carlos Eduardo. 2016. “‘Na minha época não tinha escapatória’: teleologias, temporalidade e heteronormatividade”. Cardernos Pagu Nº 46, p. 341-371, jan-abr.
  • LINS DE BARROS, Myriam Moraes. 1989. “Memória e família”. Estudos Históricos, Vol. 02, nº 03, p. 29-42.
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  • PASSAMANI, Guilherme. 2015. Batalha de Confete no “Mar de Xarayés”: condutas homossexuais, envelhecimento e regimes de visibilidade Tese de Doutorado, Universidade Estadual de Campinas.
  • PEIXOTO, Clarice Ehlers. 1997. “Histórias de mais de 60 anos”. Revista Estudos Feministas Dossiê Gênero e Velhice. Vol. 5, nº 1, p. 148-158.
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  • SABATINE, Thiago Teixeira. 2017. Só as fortes sobrevivem!: envelhecimento, experiências geracionais e relacionamento entre travestis mais velhas e mais jovens Tese de Doutorado, Universidade de São Paulo.
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  • SILVA JUNIOR, Aureliano Lopes. 2017. “Para uma história dos concursos de beleza trans: a criação de memórias e tradição para um certame voltado para travestis e mulheres transexuais”. Cadernos Pagu . Nº 50, p. 1-56.
  • SIMMEL, George. 1983. “Sociabilidade - um exemplo de sociologia pura e formal”. In: MORAES FILHO, Evaristo (org.). Georg Simmel: sociologia. Col. Grandes Cientistas Sociais. São Paulo: Ática. p. 165-181.
  • TURMA OK . Estatuto da Turma OK
  • TREVISAN, João Silvério. 2000. Devassos no paraíso: a homossexualidade no Brasil, da colônia à atualidade Rio de Janeiro: Record. 586 p.
  • VÁRIOS AUTORES. 2001. “40 anos da Turma OK”. OKZINHO, Rio de Janeiro, Edição especial de aniversário. Ano 18, nº 01, jan.
  • 1
    Uma versão condensada deste texto foi publicada no seguinte livro que comemorou os 40 anos do Movimento LGBT no Brasil: SOLIVA, Thiago B. 2018. “A confraria gay: um estudo sobre a trajetória da Turma OK”. In: GREEN, James; QUINALHA, Renan; FERNANDES, Marisa & CAETANO, Márcio (orgs.). História do Movimento LGBT no Brasil. São Paulo: Alameda Editorial.
  • 2
    Categoria nativa. Atualmente, os sujeitos que participam das atividades da Turma OK se percebem como “homossexuais” e “gays”, mas nem sempre foi dessa forma. Nas décadas de 1960 e 1970, a expressão que mobilizava significados às experiências desses sujeitos era a noção de “bicha”, forma ainda corrente na fala dos interlocutores, cujas trajetórias são focalizadas neste artigo. Falar de subjetividades e formas de classificação em “tempos que não são o presente” (Passamani, 2015) constitui tarefa difícil. Passamani (2015) aborda “rupturas” e “permanências” em relação a essas formas de classificação que não atendem às percepções mais atuais sobre o que se entende por “orientação sexual” e “identidade de gênero”. Dada essa difícil inteligibilidade, todo uso de expressões com ambições de explicar tal diversidade de experiências é sempre algo contingente e momentâneo (Passamani, 2015). Em função dessas contingências, neste artigo adoto as aspas para me referir a essas formas de classificação.
  • 3
    A Lapa é um bairro que se localiza na região central da cidade do Rio de Janeiro. É conhecido por cariocas e turistas por sua vocação boêmia, com ampla oferta de bares, boates e outras opções de entretenimento.
  • 4
    A noção de “sexualidades dissidentes” ou “não convencionais” constitui estratégia para evitar o uso de classificações comprometidas tanto com as antigas categorias médicas, como “homossexual”, quanto com as categorias identitárias contemporâneas, como “gay”, “travestis” etc.
  • 5
    Os nomes desses três sócios estão disponíveis em diferentes materiais de divulgação (site e redes sociais) adotados pela Turma OK para falar de si. Optei por não usar nomes fictícios, pelo fato de eles serem notoriamente conhecidos pelo grupo como fundamentais no seu processo de constituição. Anuar e Agildo Guimarães foram entrevistados e citados em outros trabalhos, como os de James Green (2000bGREEN, James N. 2000b. Além do carnaval: a homossexualidade masculina no Brasil do século XX. São Paulo: Editora da Unesp. 541 p. ), sobre a vida social de “bichas” e “bofes” no período anterior à emergência do movimento homossexual. Os outros nomes de interlocutores que aparecem ao longo do texto foram substituídos por nomes fictícios grafados em itálico, de forma a preservar seu anonimato.
  • 6
    Um estudo detalhado deste grupo encontra-se na tese de doutorado de Anna Paula Vencato (2009), intitulada “Existimos pelo prazer de ser mulher”: uma análise do Brazilian Crossdresser Club, defendida no âmbito do Programa de Pós-graduação em Sociologia e Antropologia, IFCS-UFRJ.
  • 7
    De acordo com Anna Paula Vencato (2009), crossdressing seria a prática de vestir-se com roupas e assessórios que socialmente são identificados como do sexo oposto ao da pessoa que as usa. Nessa prática, vestir-se do outro sexo não implica manter relações homossexuais.
  • 8
    Ofereci um exemplar da minha dissertação ao grupo, assim como convidei meus interlocutores para a defesa da dissertação. Um dos meus interlocutores esteve presente na defesa.
  • 9
    Agradeço a Mayara Gonzalez por essa valiosa sugestão.
  • 10
    Essa data consta no Estatuto da Turma OK.
  • 11
    Não se sabe precisamente em qual ano essas turmas começaram a se reunir em apartamentos. É consenso entre os sócios mais antigos da Turma OK que isso aconteceu entre fins da década de 1950 e início da década de 1960.
  • 12
    Perguntei aos sócios mais antigos sobre a existência dessas atas e eles me responderam que elas se perderam com o tempo. Acredito que tenham se perdido com a mudança de sede.
  • 13
    Trata-se de uma brincadeira infantil na qual o grupo cobre os olhos de um dos membros que aleatoriamente escolhe outro participante e lhe pergunta “pera, uva, maçã ou salada mista?”. Cada uma dessas frutas possui um significado específico, pera = aperto de mãos, uva = abraço, maçã = beijo no rosto e salada mista = “selinho”, um beijo na boca.
  • 14
    É um jogo de perguntas e respostas que servem para conhecer mais profundamente o indivíduo que participa da roda de jogo. É obrigatório falar a verdade, caso contrário se paga uma “prenda” previamente estipulada pelo grupo, como um beijo na boca, por exemplo.
  • 15
    Os homens se referiam a esta técnica como “castanholar de dedos”.
  • 16
    Green (2000b) elenca diferentes turmas que existiram e coexistiram no Rio de Janeiro nesse período, muitas delas carregavam os nomes dos seus bairros e regiões da cidade, como a Turma do Subúrbio.
  • 17
    Nome presente no site da instituição.
  • 18
    De acordo com Herbert Daniel, o primeiro caso oficial de morte por decorrência do HIV no Brasil data de 1983, com a morte do cabeleireiro e maquiador Marquito (Daniel & Míccolis, 1983).
  • 19
    Em seu estudo sobre o Triângulo Rosa, Cristina Câmara (2002) revela que a preocupação principal deste grupo era com a defesa dos direitos dos “homossexuais”, em detrimento do combate à AIDS, assim como foi em outros “grupos homossexuais” que existiram no período. A rejeição da AIDS como bandeira política se relacionava à ideia de que a doença reforçava a discriminação contra os “homossexuais”, que passaram a ser associados a ela.
  • 20
    Agildo Guimarães conta que participava do Triângulo Rosa por conta própria. A participação nesses grupos não era algo que contasse com a total adesão dos sócios da Turma OK.
  • 21
    Esses movimentos, além de debaterem a questão da moradia, das relações de trabalho, consideradas tradicionais e primordiais para o movimento operário, evidenciavam a existência de múltiplas relações de poder estruturadas nas desigualdades de gênero e na discriminação em função da cor da pele (Câmara, 2002).
  • 22
    Segundo Regina Facchini (2005), a “primeira onda” do Movimento Homossexual Brasileiro teria se iniciado com o lançamento do jornal O Lampião da Esquina em 1978 e, posteriormente, com a fundação do grupo Somos em São Paulo, em 1979. A proposta destes primeiros núcleos de militância era mostrar que os “homossexuais” eram capazes de se realizar a partir da afirmação de uma identidade homossexual.
  • 23
    Apesar do distanciamento político em relação ao MHB, a Turma OK manteve vínculos amistosos com este movimento e com a sua agenda. Um exemplo dessa ligação foi sua participação no VI Encontro Brasileiro de Homossexuais (VI Ebho), realizado no Rio de Janeiro, entre os dias 29 a 31 de maio de 1992 (Facchini, 2005).
  • 24
    Acredito que certamente era um problema na época ceder o mesmo espaço onde ocorriam os famosos concursos de Miss Brasil a uma turma de “bichas”. Creio que seria conceder, no plano simbólico, um estatuto de beleza somente dado àquelas mulheres a um conjunto de “homens que se vestem de mulher”. Este não foi um problema para as “misses renascença” estudadas por Sonia Giacomini (2006).
  • 25
    Nome presente no site da Turma OK.
  • 26
    Com a mudança para a nova sede na Rua do Rezende, 43, em 1984, essas fotos e diplomas foram colocados em um pequeno quarto junto ao camarim, sem qualquer tipo de tratamento adequado para a sua preservação.
  • 27
    João Francisco dos Santos, conhecido como Madame Satã, famoso boêmio das ruas da Lapa do início do século XX.
  • 28
    Os “projetos” são os shows realizados nas dependências da Turma OK.
  • 29
    Ator que ficou conhecido por seu personagem “Didi” no humorístico Os Trapalhões.
  • 30
    Anuar não foi explícito em relação a este ponto. Contudo, como ele esteve envolvido com eventos de moda, acredito que este seja um dos motivos que o teriam levado a se ausentar da Turma OK nesse período.
  • 31
    Todos esses nomes estão presentes no site da Turma OK.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Abr 2019
  • Data do Fascículo
    Abr 2019

Histórico

  • Recebido
    11 Jul 2016
  • Aceito
    10 Maio 2018
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