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A Crise é outra

EDITORIAL

A Crise é outra

Nada mais oportuno neste momento que avaliar a crise mundial deflagrada no segundo semestre de 2008, bem como entender seus efeitos tanto no setor produtivo como na academia. Até o primeiro semestre de 2008, o problema a ser resolvido era como ter mão de obra qualificada (técnicos, engenheiros) para atender aos projetos de expansão e de novas siderúrgicas, estaleiros, portos, prospecção e exploração de petróleo, incluindo o pré-sal, entre outros. Isto sem falar no PAC do governo federal. Dizia-se que os engenheiros metalúrgicos e mecânicos a serem formados nos próximos anos mal conseguiriam repor os que estão se aposentando. Falava-se na falta de 25.000 engenheiros no Brasil e que isto poderia ser um empecilho ao crescimento econômico.

Hoje, em março de 2009, tudo mudou. Vários dos projetos mencionados acima foram interrompidos ou adiados. Muitas empresas do setor metalúrgico e metal mecânico adiaram ou cancelaram seus programas de trainee para 2009. Os setores automobilístico e de autopeças já concederam todas as férias coletivas possíveis e começam a reduzir salários e jornada de trabalho. Demissões, ainda na casa das centenas, já aparecem no noticiário associado a grandes empresas.

Analisando o ambiente acadêmico, onde se concentra a pesquisa no Brasil, esta "crise" descrita acima ainda passa ao largo. De fato, 2008 foi um ano com significativo avanço em recursos provenientes de editais de fomento a pesquisa do CNPq, da FINEP e das agências estaduais de fomento à pesquisa, as FAP´s. A Petrobrás em 2007 e 2008 criou e implementou 27 Redes Temáticas e 7 Núcleos de Excelência, a maioria em áreas da engenharia e tecnologia, tendo injetado cerca de 1 bilhão de reais proveniente de royalties para projetos de infra-estrutura e de P&D junto a Universidades. Como a maioria destes projetos tem período de execução não inferior a 24 meses, grande parte dos pesquisadores (as Universidades por conseqüência) ainda tem recursos para tocar seus projetos em 2009. Para finalizar, no final de 2008 foi aprovada a criação de 101 Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCT), por iniciativa do Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT), que deverão no futuro próximo ocupar posição estratégica no Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação.

Os técnicos e engenheiros do Brasil, incluindo os que estão iniciando a jornada profissional, ainda não têm muito com o que se preocupar. Provavelmente a redução na oferta de empregos de mão de obra qualificada no "pós-crise" será compensada com o insuficiente número de técnicos e engenheiros formados "antes, durante e após a crise". De forma que uma relação mais eqüitativa entre oferta e demanda por empregos qualificados será atingida. Em suma, a academia ainda terá de se preocupar no futuro próximo com a formação de mão de obra qualificada para fazer funcionar as indústrias e erigir obras para o desenvolvimento econômico do Brasil.

A "crise" no ambiente acadêmico é pelo menos diferente da "crise" no setor produtivo. Em relação ao ensino, as Universidades precisam persistir na solução de um problema anterior à crise, que é a necessidade da formação de mais mão de obra qualificada. No âmbito da pesquisa, aparentemente não haverá falta de recursos ao menos até o final de 2009.

Toda esta análise aplica-se ao segmento da tecnologia da soldagem. Resta apreciar suas características especificas. Apesar de recentes avanços e boas perspectivas futuras, este setor não tem conseguido manter-se unido e integrado. Como exemplo, entre os 101 Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCT) recentemente anunciados, não há um único relacionado à tecnologia da soldagem, embora, em vários, poderá vir a atuar de forma coadjuvante. Então, esta parece ser hoje a "crise" deste setor. As atividades ensino, pesquisa e extensão encontram-se diluídas em várias instituições e organizações que, apesar de relativo sucesso, pouco conversam e não conseguem integrar-se como um segmento.

Será este o futuro da soldagem no Brasil? Prosperar, mas diluir-se em outras áreas onde é aplicada.

Para reverter esta tendência será necessária uma nova forma de organização do segmento da tecnologia da soldagem no Brasil, promovendo uma maior interação entre universidades, empresas e instituições governamentais e não-governamentais, trabalhando sob um ambiente de rede de relacionamento, desenvolvendo projetos em linhas de pesquisa definidas em função das necessidades de desenvolvimento e inovação da indústria brasileira.

Temos massa crítica de pesquisadores e profissionais que se dedicam à tecnologia da soldagem, temos um parque industrial bem desenvolvido e há ações governamentais. O que falta é mudar.

Ronaldo Paranhos

LAMAV-CCT-UENF

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Nov 2009
  • Data do Fascículo
    Mar 2009
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