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Análise Quantitativa das Fases Presentes no Aço Inoxidável Duplex UNS S31803 Soldado pelo Processo MIG/MAG Curto-Circuito Convencional

Quantitative Analysis of Present Phases in UNS S31803 Duplex Stainless Steel Welded by Conventional Short Circuit MIG/MAG Process

Resumos

Resumo

Os riscos envolvidos em função de deterioração de materiais e falhas de equipamentos devido à corrosão ou à corrosão associada a solicitações mecânicas vêm cada vez mais desafiando a engenharia na busca de novos materiais, ligas, revestimentos, inibidores e novas soluções de projetos e desenhos de equipamentos que ofereçam melhor desempenho e vida útil. O aço inoxidável duplex (AID) vem conquistando cada vez mais espaço justamente por possuir tais requisitos. Atribuem-se suas altas resistências à corrosão e mecânica à sua microestrutura balanceada em aproximadamente 50% de ferrita e 50% de austenita. No presente trabalho, chapas de AID UNS S31803 foram soldadas em chanfro de 45° pelo processo MIG/MAG curto circuito convencional, utilizando-se três diferentes energias de soldagem, na faixa de 0,5-0,8 kJ/mm. Os resultados mostraram que o efeito da energia de soldagem sobre a fração volumétrica de ferrita foi bem marcante na zona termicamente afetada (ZTA) e no metal de solda este efeito não foi tão pronunciado. As propriedades mecânicas de dureza e resistência à corrosão (corrosão intergranular) foram avaliadas em função da energia de soldagem empregada. Em geral, tanto a dureza como a resistência à corrosão intergranular não sofreram influência quando as diversas condições de soldagem foram comparadas.

Palavras-chave:
Processo MIG/MAG; Curto circuito convencional; UNS S31803; Corrosão


Abstract

The risks involved in materials deterioration and equipment failures due to corrosion associated with mechanical demands are increasing the challenge to search for new materials, alloys, coatings, inhibitors and new design solutions on plants and equipment for better performance and service life. Duplex stainless steel (DSS) has been gaining more and more space because it has many of those requirements mentioned above. High mechanical and corrosion resistance are related to balanced microstructure in approximately 50% ferrite and 50% austenite. In present work, UNS S31803 DSS plates were welded in a 45° bevel by conventional short circuit MIG/MAG process, using three different welding energies at 0.5-0.8 kJ/mm. The results showed that the effect of welding energy on the ferrite volumetric fraction was very marked in the heat affected zone (HAZ) and not so pronounced in the weld metal. Hardness and corrosion resistance (intergranular corrosion) were evaluated as a function of welding energy employed and, in general, both were not influenced when the various welding conditions were compared.

Key-words:
MIG/MAG process; Conventional short-circuit; UNS S31803; Corrosion


1. Introdução

O aço inoxidável duplex (AID) vem sendo cada vez mais utilizado em diferentes aplicações, tais como tubulações submarinas e sistema de elevação nas indústrias de petróleo e gás natural, tubos de trocadores de calor refrigerados a água do mar, recipientes sob pressão e caldeiras, instalações de dessalinização e instalações de energia nuclear (Xiong et al., 2013Xiong J, Tan MY, Forsyth M. The corrosion behaviors of stainless steel weldments in sodium chloride solution observed using a novel electrochemical measurement approach. Desalination. 2013;327:39-45. http://dx.doi.org/10.1016/j.desal.2013.08.006.
http://dx.doi.org/10.1016/j.desal.2013.0...
).

A classe de aços inoxidáveis duplex mais comum atualmente é a EN 1.4462 ou SAF 2205 (UNS S31803/S32205). Esse aço possui uma composição nominal de 22% de Cr, 5% de Ni, 3% Mo, e 0,16% de N e é utilizado em um grande número de aplicações e em uma ampla variedade de produtos e formas. As excelentes propriedades dos AID’s são obtidas devido a sua característica microestrutural particular possuindo uma estrutura com orientação pronunciada de ilhas de austenita em uma matriz ferrítica paralelas e transversais à direção de laminação. Dotados de uma resistência à corrosão superior em muitos ambientes ao dos aços inoxidáveis austeníticos tipo AISI 304, 316 e 317, os AID’s são usados frequentemente na forma de tubos soldados ou componentes tubulares, bem como produto de chapas conformadas e soldadas em ambientes onde a resistência à corrosão geral e corrosão sob tensão são fatores importantes (Alvarez-Armas, 2008Alvarez-Armas I. Duplex stainless steels: brief history and some recent alloys. Recent Patents on Mechanical Engineering. 2008;1(1):51-57. http://dx.doi.org/10.2174/2212797610801010051.
http://dx.doi.org/10.2174/22127976108010...
).

Para obter excelentes propriedades, recomenda-se que o AID mantenha uma razão de ferrita/austenita próximo de 1:1 e sem precipitação de fases secundárias. No entanto, este equilíbrio bifásico no metal de solda (MS) e zona termicamente afetada (ZTA) poderá ser alterado durante o processo de soldagem (Guo et al., 2016Guo YJ, Sun TY, Hu JC, Jiang YM, Jiang LZ, Li J. Microstructure evolution and pitting corrosion resistance of the Gleeble-simulated heat-affected zone of a newly developed lean duplex stainless steel. Journal of Alloys and Compounds. 2016;658:1031-1040. http://dx.doi.org/10.1016/j.jallcom.2015.10.218.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jallcom.2015...
).

Segundo Ramkumar et al. (2015)Ramkumar KD, Mishra D, Ganesh Raj B, Vignesh MK, Thiruvengatam G, Sudharshan SP, et al. Effect of optimal weld parameters in the microstructure and mechanical properties of autogeneous gas tungsten arc weldments of super-duplex stainless steel UNS S32750. Materials & Design. 2015;66:356-365. http://dx.doi.org/10.1016/j.matdes.2014.10.084.
http://dx.doi.org/10.1016/j.matdes.2014....
, este tipo de aço (AID), com proporção quase igual de ferrita (α) e austenita (γ), combina a maioria das propriedades benéficas do aço inoxidável austenítico e aço inoxidável ferrítico, incluindo excelentes propriedades mecânicas, boa conformabilidade e soldabilidade, e menor custo em comparação ao aço inoxidável austenítico, devido à adição de baixas quantidades de Ni.

Tanto na ZTA como no metal de solda, a microestrutura sofre ciclos de aquecimento e resfriamento rápidos, que pode resultar assim em um excesso de ferrita e alguns precipitados secundários indesejáveis, tais ​​como nitretos (Cr2N), carbonetos (M23C6) e fases sigma (σ) (García-Rentería et al., 2014García-Rentería MA, López-Morelos VH, García-Hernández R, Dzib-Pérez L, García-Ochoa EM, González-Sánchez J. Improvement of localised corrosion resistance of AISI 2205 Duplex Stainless Steel joints made by gas metal arc welding under electromagnetic interaction of low intensity. Applied Surface Science. 2014;321:252-260. http://dx.doi.org/10.1016/j.apsusc.2014.10.024.
http://dx.doi.org/10.1016/j.apsusc.2014....
).

Essa ferritização excessiva e precipitações indesejáveis ​​podem causar deterioração catastrófica das propriedades mecânicas e resistência à corrosão da junta soldada (Zhang et al.,2016Zhang ZQ, Jing HY, Xu LY, Han YD, Zhao L. Investigation on microstructure evolution and properties of duplex stainless steel joint multi-pass welded by using different methods. Materials & Design. 2016;109:670-685. http://dx.doi.org/10.1016/j.matdes.2016.07.110.
http://dx.doi.org/10.1016/j.matdes.2016....
). A precipitação forma uma zona empobrecida de Cr nos seus arredores, o que acaba por resultar em corrosão localizada (Kim et al., 2014Kim HJ, Jeon SH, Kim ST, Lee IS, Park YS, Kim KT, et al. Investigation of the sensitization and intergranular corrosion of tube-to-tube sheet welds of hyper duplex stainless steel using an electrochemical reactivation method. Corrosion Science. 2014;87:60-70. http://dx.doi.org/10.1016/j.corsci.2014.06.005.
http://dx.doi.org/10.1016/j.corsci.2014....
).

Como alternativa chama-se a atenção o uso do processo de soldagem MIG/MAG convencional operando com transferência por curto-circuito. Esse modo de transferência pode ser empregado quando se tem como requisito uma distorção mínima da peça e na soldagem de juntas tubulares e aços inoxidáveis, ou seja, em operações em que necessitem baixo aporte de calor. Devido aos baixos valores de corrente durante a fase de arco aberto e aos baixos valores de tensão, assim como devido ao fato de que durante parte do processo o arco tende a se apagar, o calor transferido para a peça é reduzido. Essa opção se dá também pela boa produtividade do processo, boa cadência de trabalho (ciclos por hora), relativo baixo custo (em comparação a outros processos), menor radiação para o soldador (diferentes frequências) e facilidade em soldagens posicionais e passes de raiz (Costa, 2014Costa TF. Avaliação de critérios de estabilidade do processo MIG/MAG curto circuito na soldagem de aços inoxidáveis austenítico e duplex [tese]. Uberlândia: Universidade Federal de Uberlândia; 2014.).

Desta forma, este trabalho vem-se buscar, especialmente sobre o aço inoxidável duplex UNS S31803, um melhor entendimento dos efeitos da variação das frações de ferrita e austenita nas propriedades mecânicas e de resistência à corrosão do referido aço, devido ao processo de soldagem MIG/MAG curto-circuito.

2. Materiais e Métodos

Chapas de aço inoxidável duplex AISI/UNS S31803 (SAF 2205) foram utilizadas como metal de base, com espessura de 4,0 mm. O material foi cedido pela empresa Arcelomittal – Aperam, cuja composição química é apresentada na Tabela 1, com base em análises realizadas na empresa.

Tabela 1
Composição química do AISI UNS S31803, em % peso.

Como metal de adição foi utilizado arame-eletrodo AWS ER2209, com diâmetro de 1,2 mm, cedido pela empresa Sandvik Materials Technology. A composição química pode ser verificada na Tabela 2, com base nos dados fornecidos pelo fabricante.

Tabela 2
Composição química do AWS ER2209L, em % peso.

O material foi recebido em forma de chapas, com dimensões de 500×55×4 mm. Em seguida, 09 corpos de prova com dimensões de 200x50x4 mm foram cortados e soldados em chanfros de 45°, com arame-eletrodo AWS ER2209.

Para a soldagem dos corpos de prova utilizou-se uma fonte de soldagem multiprocesso acoplada a uma placa de aquisição de dados. A Tabela 3 apresenta os parâmetros utilizados neste trabalho, com base na pesquisa de Costa (2014)Costa TF. Avaliação de critérios de estabilidade do processo MIG/MAG curto circuito na soldagem de aços inoxidáveis austenítico e duplex [tese]. Uberlândia: Universidade Federal de Uberlândia; 2014., para uma faixa operacional dentro do modo transferência por curto circuito.

Tabela 3
Faixa de parâmetros para transferência curto-circuito (Costa, 2014Costa TF. Avaliação de critérios de estabilidade do processo MIG/MAG curto circuito na soldagem de aços inoxidáveis austenítico e duplex [tese]. Uberlândia: Universidade Federal de Uberlândia; 2014.).

Foram cortadas 09 amostras com dimensões de aproximadamente 10x10x4 mm, na região que compreende a seção transversal do cordão de solda em cortadora metalográfica, tanto para os ensaios metalográficos, quanto para os ensaios de corrosão.

Os corpos de prova para os ensaios de polarização potenciodinâmica foram preparados a partir de chapas cortadas nas dimensões de 10 mm × 10 mm (10 mm2) que inicialmente foram unidas, por brasagem, a fios de cobre isolados de comprimento aproximado de 15 cm para as devidas conexões ao circuito de ligação ao potenciostato. Os corpos de prova foram embutidos em baquelite ficando exposta a área de 10 mm2 para contato com o eletrólito do ensaio. Os corpos de prova foram lixados até a lixa 600 mesh.

Para a revelação da microestrutura foi utilizado o reativo Behara Modificado (Behara II), cuja composição é 20 ml de ácido clorídrico, 80 ml de água destilada e deionizada e 1 g de metabissulfito de potássio. A esta composição foram adicionados 2 g de bifluoreto de amônio no instante do ataque. A metalografia quantitativa realizada por análise de imagem com o auxílio do microscópio ótico foi empregada para avaliar a fração em área de austenita e ferrita nas amostras utilizando o software ImageJ, conforme a norma ASTM E1382-97 (American Society for Testing and Materials, 1997American Society for Testing and Materials – ASTM. ASTM E1382-97. West Conshohocken: ASTM; 1997.).

Para a realização dos ensaios de corrosão por polarização potenciodinâmica foi utilizado um potenciostato SP-150, Marca BioLogic. Inicialmente, após a limpeza dos corpos de prova com acetona e álcool, os mesmos foram colocados na célula para estabilização do potencial de corrosão (Ecor) por 3600s. Posteriormente, aplicou-se potenciais variando-se de -500mV (250mV abaixo do Ecor) a 2000mV, com uma taxa de varredura de 20 mV/s. Foi utilizada uma célula eletroquímica (Becker 250 ml) contendo três eletrodos: eletrodo de referência de calomelano saturado (ECS), contra eletrodo de platina e o eletrodo de trabalho (corpo de prova). Os ensaios foram realizados na temperatura ambiente e repetidos três vezes por amostra.

O ensaio de microdureza foi realizado com a escala Vickers, de acordo com a norma ASTM E384-89 (American Society for Testing and Materials, 1989American Society for Testing and Materials – ASTM. ASTM E384-89. West Conshohocken: ASTM; 1989.). O objetivo foi mapear a variação de dureza desde a zona fundida até o metal de base, passando pela zona termicamente afetada. O equipamento utilizado foi um HMV-G 21ST, marca SHIMADZU e carga aplicada foi de 0,3 kgf.

3. Resultados e Discussões

A Tabela 4 apresenta as condições de soldagem deste trabalho, mantendo constante o diâmetro do arame-eletrodo em 1,2 mm, a velocidade de soldagem em 22 cm/min, velocidade de alimentação em 2,8 m/min e vazão de gás em 14 l/min para todas as condições. Os valores de corrente informados são valores médios da aquisição de dados e os valores de tensão correspondem à condição imposta na fonte de soldagem.

Tabela 4
Parâmetros de soldagem utilizados neste trabalho.

A micrografia apresentada na Figura 1 mostra o material de base como foi recebido, consistindo em grãos lamelares de ferrita (fase mais escura) e austenita (fase mais clara). Nas Figuras 2 a 4, pode-se observar a microestrutura do metal de base (MB), zona termicamente afetada (ZTA) e metal de solda (MS) do aço UNS S31803 soldado com as condições de soldagem apresentadas na Tabela 4.

Figura 1
Micrografia do aço inoxidável duplex UNS S 31803 no estado como-recebido.
Figura 2
Micrografia da amostra 01, soldada com 15,0 V.
Figura 4
Micrografia da amostra 03, soldada com 19,0 V.
Figura 3
Micrografia da amostra 02, soldada com 17,0 V.

Pode-se constatar que a formação de intermetálicos como a fase sigma e nitretos não foi facilmente evidenciada por esse ataque químico, porém diferentes morfologias pontuais. As energias de soldagem utilizadas podem ter evitado a precipitação generalizada de intermetálicos, como já observado por Nunes et al. (2012)Nunes EB, Batista HJ, Barreto AS, Marques JS, Motta MF. Influência da energia de soldagem na microestrutura e na microdureza de revestimentos de aço inoxidável duplex. Soldagem e Inspeção. 2012;17(2):114-122. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-92242012000200005.
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.

As microestruturas observadas no metal de solda nas três condições de soldagem apresentam quatro morfologias da fase austenita, como mostrado na Figura 5. A austenita de contorno de grão ou “grain boundary austenite” (GBA), austenita de Widmänstatten ou “Widmänstatten-type austenite” (WA), austenita intragranular ou “intragranular austenite” (IGA) e austenita secundária (γ2), que pode ser intragranular ou intergranular, com crescimento a partir da austenita primária. A mesma formação dos quatro tipos de austenita já foi relatada por Geng et al. (2015)Geng S, Sun J, Guo L, Wang H. Evolution of microstructure and corrosion behavior in 2205 duplex stainless steel GTA-welding joint. Journal of Manufacturing Processes. 2015;19:32-37. http://dx.doi.org/10.1016/j.jmapro.2015.03.009.
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e Singh e Shahi (2020)Singh J, Shahi AS. Metallurgical and corrosion characterization of electron beam welded duplex stainless steel joints. Journal of Manufacturing Processes. 2020;50:581-595. http://dx.doi.org/10.1016/j.jmapro.2020.01.009.
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.

Figura 5
Micrografia em microscópio ótico mostrando as morfologias da austenita no MS. Austenita de contorno de grão (GBA), austenita de Widmänstatten (WA), austenita intragranular (IGA) e austenita secundária (γ2). 500x.

Após a formação da austenita de contorno de grão (GBA), a morfologia de Widmänstatten (WA) nucleia a partir de contornos de grão da ferrita ou austenita e cresce ao longo de planos no formato de placas paralelas, também evidenciado por Singh e Shahi (2020)Singh J, Shahi AS. Metallurgical and corrosion characterization of electron beam welded duplex stainless steel joints. Journal of Manufacturing Processes. 2020;50:581-595. http://dx.doi.org/10.1016/j.jmapro.2020.01.009.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jmapro.2020....
.

Na região da ZTA, para as condições de soldagem deste trabalho, o uso das energias mais altas provocou maior formação da austenita intragranular. A austenita dissolvida na região da ZTA, durante o ciclo térmico provocado pelo processo de soldagem, permite sua reprecipitação, que inicia primeiramente nos contornos de grão ferrita/ferrita, similar ao mostrado por Geng et al. (2015)Geng S, Sun J, Guo L, Wang H. Evolution of microstructure and corrosion behavior in 2205 duplex stainless steel GTA-welding joint. Journal of Manufacturing Processes. 2015;19:32-37. http://dx.doi.org/10.1016/j.jmapro.2015.03.009.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jmapro.2015....
.

Na Figura 6 é apresentado o difratograma de raios X das amostras soldadas, onde se nota apenas a presença de ferrita (α) e austenita (γ), sem registro de fases intermetálicas, nitretos ou carbonetos formados nestas amostras.

Figura 6
Difratograma de raios X das amostras 01, 02 e 03.

A Figura 7 apresenta a micrografia de entrada na escala cinza e a figura gerada pelo software para quantificação de fases, metodologia avaliada e testa por Hosseini et al. (2019)Hosseini VA, Hurtig K, Eyzop D, Östberg A, Janiak P, Karlsson L. Ferrite content measurement in super duplex stainless steel welds. Welding in the World. 2019;63(2):551-563. http://dx.doi.org/10.1007/s40194-018-00681-1.
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em diferentes tipos de ataques químicos. Na figura, a fase escura corresponde a austenita e clara corresponde a ferrita. Nota-se que a qualidade da imagem de entrada (contraste entre as fases) proporcionou ao software gerar uma ótima imagem de reprodução a ser usada no cálculo das áreas.

Figura 7
Imagens exemplificando o processo de quantificação por análise de imagens.

As proporções em área de ferrita e austenita do metal de base, do metal de solda e da zona termicamente afetada (ZTA) obtidas com o software ImageJ são apresentadas na Tabela 5.

Tabela 5
Proporção em área de ferrita e austenita no MB, MS e ZTA do aço UNS S31803.

Com o aumento da energia de soldagem a quantidade de austenita no metal de solda tendeu a aumentar, conforme apresentado na Figura 8. De acordo com Nunes et al. (2012)Nunes EB, Batista HJ, Barreto AS, Marques JS, Motta MF. Influência da energia de soldagem na microestrutura e na microdureza de revestimentos de aço inoxidável duplex. Soldagem e Inspeção. 2012;17(2):114-122. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-92242012000200005.
http://dx.doi.org/10.1590/S0104-92242012...
, as melhores combinações de propriedades mecânicas e de resistência à corrosão para o aço UNS S31803 são garantidas quando o metal de solda apresenta teores de ferrita na faixa de 35-65%. Lessa et al. (2016)Lessa CR, Martinazzi D, Figueiredo AP, Machado RB, Fanezi C, Strohaecker T. Microstructural behavior of SAF 2205 duplex stainless steel welded by friction hydro pillar processing. Materials Research. 2016;19(4):928-936. http://dx.doi.org/10.1590/1980-5373-MR-2016-0023.
http://dx.doi.org/10.1590/1980-5373-MR-2...
apresenta uma quantidade satisfatória de ferrita na faixa de 55-68%, na região do MS. Lembrando que o valor da concentração de ferrita no MB é de 53,432%.

Figura 8
Quantidade de austenita no metal de solda (MS) e na zona termicamente afetada (ZTA) em função das condições de soldagem.

Em relação à ZTA, houve um aumento da quantidade de austenita com o aumento da energia de soldagem. Pode-se explicar esse fenômeno pelo tempo de exposição ao campo ferrítico ter sido maior. Uma queda da fração volumétrica da ferrita se explica, pois à medida que se aumenta a energia de soldagem, diminui-se a velocidade de resfriamento de forma que há mais tempo para que a transformação ferrita/austenita se proceda. O mesmo é mostrado nos trabalhos de Fonseca et al. (2016)Fonseca CS, Pinheiro IP, Silva SN. Influência do aporte térmico sobre a morfologia da austenita e na quantidade das fases em chapas soldadas de aço inoxidável duplex SAF2205. Revista Matéria. 2016;21(1):227-234. http://dx.doi.org/10.1590/S1517-707620160001.0020.
http://dx.doi.org/10.1590/S1517-70762016...
, Shi et al. (2018)Shi Y, Cui S, Zhu T, Gu S, Shen X. Microstructure and intergranular corrosion behavior of HAZ in DP-TIG welded DSS joints. Journal of Materials Processing Technology. 2018;256:254-261. http://dx.doi.org/10.1016/j.jmatprotec.2018.02.019.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jmatprotec.2...
e Ouali et al. (2019)Ouali N, Khenfer K, Belkessa B, Cheniti B. Effect of welding heat input on microstructure and residual stresses of duplex stainless steel weldments. In: Proceedings of the 72nd IIW Annual Assembly and International Conference; 2019; Bratislava, Slovakia. Denver, CO: IIW; 2019..

Os perfis de microdureza nas amostras soldadas com as 03 energias são apresentados nas Figuras 9 a 11. Os gráficos mostram da esquerda para a direita no eixo das abcissas, metal de solda, ZTA e metal de base.

Figura 9
Perfil de microdureza da Amostra 01.
Figura 11
Perfil de microdureza da Amostra 03.
Figura 10
Perfil de microdureza da Amostra 02.

Os valores de microdureza Vickers obtidos no MS, ZTA e MB para as três energias de soldagem estão situados na faixa de 235-295HV e como já estudados por Aguiar et al. (2015)Aguiar I, Pérez Escobar D, Santos DB, Modenesi PJ. Microstructure characterization of a duplex stainless steel weld by electron backscattering diffraction and orientation imaging microscopy techniques revista. Matéria. 2015;20(1):212-226. http://dx.doi.org/10.1590/S1517-707620150001.0022.
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, não revelam nenhuma zona com durezas excessivas (> 300 HV). Também não indica a formação de quantidades consideráveis de fases duras (intermetálicos) na região da solda. O aumento da quantidade de ferrita eleva a microdureza dos AID, pois a ferrita é a microestrutura mais dura (Nunes et al., 2012Nunes EB, Batista HJ, Barreto AS, Marques JS, Motta MF. Influência da energia de soldagem na microestrutura e na microdureza de revestimentos de aço inoxidável duplex. Soldagem e Inspeção. 2012;17(2):114-122. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-92242012000200005.
http://dx.doi.org/10.1590/S0104-92242012...
). Outra possibilidade é a variação da dureza devido a uma mudança na morfologia das fases, especificamente, seu tamanho de grão.

A Figura 12 mostra as curvas obtidas no ensaio eletroquímico de polarização potenciodinâmica para o material de base como recebido.

Figura 12
Curvas de polarização potenciodinâmica obtidas do metal de base como recebido.

As Figuras 13 a 15 apresentam as curvas obtidas no ensaio eletroquímico de polarização potenciodinâmica nas amostras soldadas com as condições de soldagem apresentadas na Tabela 4.

Figura 13
Curvas de polarização potenciodinâmica obtidas da Amostra 01.
Figura 15
Curvas de polarização potenciodinâmica obtidas da Amostra 03.
Figura 14
Curvas de polarização potenciodinâmica obtidas da Amostra 02.

As três curvas são muito parecidas com a curva obtida para o metal de base, sendo importante salientar que mesmo ocorrendo uma mudança na microestrutura da área exposta para o ensaio, a mesma demonstra não ter relação direta com o comportamento das curvas de polarização potenciodinâmica.

Os parâmetros eletroquímicos obtidos a partir das curvas de polarização são mostrados na Tabela 6 e foram determinados através da média dos valores das repetições de cada condição, com a extrapolação das retas e análise das curvas.

Tabela 6
Parâmetros eletroquímicos obtidos a partir das curvas de polarização.

O menor valor de potencial ECORR, e maior valor de EPIT, indica uma melhor resistência, enquanto que o maior valor de ΔEPASS indica uma maior zona de passivação no meio corrosivo.

Segundo Arturo et al. (2015)Arturo GRM, Hugo LMV, Rafael GH, Egberto BB, Antonio GSJ. Electrochemical characterization of AISI 2205 duplex stainless steel welded joints with electromagnetic interaction. Procedia Materials Science. 2015;8:950-958. http://dx.doi.org/10.1016/j.mspro.2015.04.156.
http://dx.doi.org/10.1016/j.mspro.2015.0...
, quanto maior o potencial de corrosão por pites (EPIT), maior a resistência do material a esse mecanismo de corrosão localizada. Mesmo com valores próximos, a amostra composta pelo MB, resultou em um maior EPIT e ΔEPASS quando comparado às três energias de soldagem.

4. Conclusões

As análises dos resultados obtidos a partir dos procedimentos experimentais utilizados neste trabalho tornaram possível chegar as seguintes conclusões:

  • A quantificação de fases após a soldagem demonstrou a tendência a uma relação mais próxima de 1 de ferrita/austenita na região do MS, onde a maior diferença foi na condição de menor energia de soldagem, onde a quantidade de austenita foi levemente inferior. Já para a região da ZTA, a quantidade de ferrita diminuiu com o aumento da energia de soldagem;

  • Não foram percebidas diferenças significativas nos valores de microdureza Vickers (valores maiores que 300 HV). Todas as condições de soldagem utilizadas demonstraram níveis de microdureza satisfatórios de acordo com as referências. O valor médio mais alto de microdureza foi observado para a condição de menor energia de soldagem;

  • Pode-se afirmar que o aporte de calor desta faixa de diferentes energias não influenciou na resistência à corrosão do material para os ensaios de polarização potenciodinâmica. Não foi possível afirmar sobre diferenças na resistência à corrosão entre regiões das amostras, nem energias de soldagem;

  • Os valores de parâmetros eletroquímicos, como ECORR, EPIT e ΔEPASS foram muito próximos para as regiões analisadas, demonstrando que as alterações após a soldagem não comprometeram de forma significativa a resistência à corrosão das amostras;

  • As mudanças microestruturais nas regiões da solda, nas taxas de α/γ e a formação de intermetálicos após o processo de soldagem MIG/MAG operando no modo curto-circuito convencional, seguindo as metodologias apresentadas e energias de soldagem, não houve alteração de forma significativa na resistência à corrosão da região soldada do AID UNS S31803.

Agradecimentos

Os autores expressam o seu agradecimento às instituições que apoiaram a realização deste trabalho, FAPEMIG, CNPq, CAPES, Laprosolda/UFU e LTM/UFU.

  • Como citar: Souza DDBGS, Vilarinho LO, Hübner HB. Análise quantitativa das fases presentes no aço inoxidável duplex UNS S31803 soldado pelo processo MIG/MAG curto-circuito convencional. Soldagem & Inspeção. 2019;25:e2528. https://doi.org/10.1590/0104-9224/SI25.28

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Out 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    21 Maio 2020
  • Aceito
    29 Jul 2020
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