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Flora das Restingas de Sergipe: análise da lista de espécies indicadoras dos estágios sucessionais (Resolução CONAMA n° 443/2012)

Flora of the Restingas of Sergipe: analysis of the list of indicator species of successional stages (CONAMA Resolution n° 443/2012)

Resumo

Não obstante sua importância ecológica e status de proteção legal, são vários os tipos de degradação das áreas de Restinga observados ao longo do litoral brasileiro. É necessária a análise dos documentos legais que protegem esses ecossistemas para que estes sejam realmente efetivos. A lista de espécies indicadoras dos estágios sucessionais de vegetação de Restinga para o estado de Sergipe (definida pela Resolução CONAMA n° 443/2012) foi comparada com um banco de dados sobre a composição da flora das Restingas de Sergipe, a fim de analisar a similaridade entre elas e, consequentemente, a adequação desse instrumento legal. Ao todo, 52 espécies (39%) citadas nesta resolução não foram encontradas no banco de dados sobre a flora das Restingas do estado de Sergipe. Dentre estas, para nove e 13 espécies presentes na resolução analisada não foram encontradas, respectivamente, registros de coletas em Sergipe e em municípios sergipanos inseridos na planície costeira. A listagem fornecida pelo CONAMA não reflete a diversidade nativa das Restingas do estado, sendo necessário, portanto, uma revisão cuidadosa da lista apresentada por esta resolução, para uma caracterização realmente representativa da flora das áreas de Restinga do estado que possa servir de forma mais adequada como subsídio legal para a proteção dessas áreas.

Palavras-chave:
Ecossistemas costeiros; Florística; Legislação

Abstract

Despite their ecological importance and legal protection status, several types of degradation forms can be observed in Restinga areas along the Brazilian coast. The analysis of legal documents that protect these ecosystems is required in order to make them truly effective. The list of indicator species of Restinga vegetation successional stages in the State of Sergipe (defined by CONAMA Resolution n. 443/2012) was compared with a floristic composition database from Sergipe Restingas, in order to analyze the similarities between them and, hence, the suitability of such legal instrument. The analysis result shows that 52 species (39%) mentioned in the Resolution were not found in Sergipe State Restingas flora database. Among them, nine species showed no collection record in Sergipe and 13 species showed no collection record in the states’ counties located in the coastal plain. The species list provided by CONAMA’s Resolution does not reflect the diversity of Restingas in Sergipe. Therefore, a careful review of the Resolution is required, so it can be used as a more adequate legal instrument for protecting these areas.

Keywords:
Coastal ecosystems; Floristic; Legislation

Introdução

As Restingas compreendem o ecossistema adjacente ao oceano, que cobre as planícies costeiras arenosas (ARAÚJO; HENRIQUES, 1984). Segundo a definição legal, dada pela Resolução nº 7/1996 do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA) , as Restingas “compreendem o conjunto das comunidades vegetais, fisionomicamente distintas sob influência marinha e fluvio-marinha”, comunidades estas que “distribuídas em mosaico, ocorrem em áreas de grande diversidade ecológica, sendo consideradas comunidades edáficas por dependerem mais da natureza do solo que do clima” (BRASIL - RES. CONAMA, 1996).

As Restingas ocorrem em toda a faixa litorânea do Brasil, estendo-se no sentido oeste em direção ao interior do país (FALKENBERG, 1999FALKENBERG, D. B. Aspectos da flora e da vegetação secundária da restinga de Santa Catarina, Sul do Brasil. Insula, n. 28, p. 1-30, 1999.). Estes ambientes possuem elevada riqueza de espécies vegetais, sendo estimada até o momento a ocorrência de 1.590 espécies de plantas para toda a costa brasileira (RESTINGAS.NET, 2014). A vegetação de Restinga possui papel fundamental na consolidação do substrato arenoso e na manutenção da drenagem natural, prevenindo a erosão nesses ambientes. Essa vegetação oferece recurso alimentar e disponibilidade de locais de nidificação para a fauna residente e migratória (BRASIL, 1999; SCHERER et al., 2005SCHERER, A.; MARASCHIN-SILVA, F.; BAPTISTA, L. R. M. Florística e Estrutura do Componente Arbóreo de Matas de Restinga Arenosa no Parque Estadual de Itapuã, RS, Brasil. Acta Botanica Brasilica, v. 19, n. 4, p. 717-726. 2005. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0102-33062005000400006
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). Além disso, previne a intrusão salina em aquíferos costeiros (RIBEIRO et al., 2013RIBEIRO, J S. et al. Evolução da vulnerabilidade à erosão costeira na Praia de Massaguaçú (SP), Brasil. Revista da Gestão Costeira Integrada, v. 13, n. 3, p. 253-265, 2013. DOI: http://dx.doi.org/10.5894/rgci377
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).

Não obstante sua importância, são vários os tipos de degradação das áreas de Restinga observados ao longo do litoral brasileiro (SANTOS-FILHO, 2009SANTOS-FILHO, F. S. Composição florística e estrutural da vegetação de restinga do Estado do Piauí. Tese (Doutorado em Botânica) - Recife, UFRPE. 2009.), como por exemplo, o extrativismo, urbanização (SACRAMENTO et al., 2007SACRAMENTO, A. C. S.; ALMEIDA Jr., E. B.; ZICKEL, C. S. Aspectos florísticos da vegetação de restinga no litoral de Pernambuco. Revista Árvore, v. 31, n. 6, p. 1121-1130, 2007.) e a pressão causada pelo turismo e lazer (HOLZER et al., 2004HOLZER, W.; CRICHYNO, J.; PIRES, A. C. Sustentabilidade da urbanização em áreas de restinga: uma proposta de avaliação pós-ocupação. Paisagem ambiente, n. 19, p. 49-65, 2004.). A despeito desse quadro de degradação, as Restingas encontram-se sob proteção legal, sendo definidas “como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues”, como Áreas de Preservação Permanente (APP) pela Lei n° 12.651/2012 (Art. 4°, Inciso VI), a qual dispõe sobre a proteção da vegetação nativa (BRASIL - LEI, 2012) . Embora essa redação pouco clara, já que nem todas as Restingas são “fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues”, venha se mantendo nos documentos legais (BRASIL - LEI, 1965, o antigo “Código Florestal”), ela fornece a garantia de proteção legal desse habitat.

Além disso, a proteção das Restingas é garantida pela Lei n° 11.428/2006 (conhecida como a “Lei da Mata Atlântica”), que “dispõe sobre a utilização e proteção da vegetação nativa do bioma Mata Atlântica”, incluindo as Restingas com uma das formações florestais nativas e/ou ecossistemas associados (BRASIL - LEI, 2006). Segundo esta lei, “a definição de vegetação primária e de vegetação secundária nos estágios avançado, médio e inicial de regeneração do bioma Mata Atlântica, nas hipóteses de vegetação nativa localizada, será de iniciativa do Conselho Nacional do Meio Ambiente” (Art. 4º).

Com o intuito de atender a essa determinação legal, a Resolução CONAMA n° 443/2012 aprova a lista de espécies indicadoras dos estágios sucessionais de vegetação de Restinga para o estado de Sergipe, indicando, ainda, suas espécies vegetais endêmicas, raras ou ameaçadas de extinção (BRASIL - RES. CONAMA, 2012). Este documento legal complementa, na esfera estadual, a resolução CONAMA nº 417/2009, a qual dispõe sobre os parâmetros básicos para definir a vegetação primária de Restinga e seus estágios sucessionais (BRASIL - RES. CONAMA, 2009). Segundo esta mesma Resolução, a elaboração de listas de espécies indicadoras dos estágios sucessionais da vegetação se revestem de especial importância quando se considera o fato de que esses documentos devem ser tomados como base para o estabelecimento de “critérios a fim de orientar o licenciamento e outros procedimentos administrativos relativos à autorização de atividades nessas áreas” (BRASIL - RES. CONAMA, 2009).

Em Sergipe, estudos realizados em áreas de Restinga, incluem listagens florísticas e estudos taxonômicos (NASCIMENTO-JR, 2011; OLIVEIRA et al., 2014OLIVEIRA, E. V. S.; LANDIM, M. F. Caracterização fitofisionômica das restingas da Reserva Biológica de Santa Isabel, litoral norte de Sergipe. Scientia Plena, v. 10, n. 10, p. 1-10, 2014.; SILVA, 2014; OLIVEIRA et al., 2015), análises da distribuição e conservação das espécies (SANTOS; SOUZA, 2010SANTOS, S. S. C.; SOUZA, R. M. Dinâmica da paisagem e distribuição fitogeográfica de espécies psamófitas em dunas costeiras - Barra dos Coqueiros, Sergipe. Geoambiente, n. 14, p. 1-17, 2010.; SANTOS et al., 2011; OLIVEIRA; LANDIM, 2016) e caracterização de fitofisiomias (OLIVEIRA; LANDIM, 2014). No entanto, ainda inexistem trabalhos analisando a adequação da legislação atual relativa à conservação e gestão desses ambientes, com base no estado atual de conhecimento científico sobre eles.

Nesse contexto, o objetivo deste trabalho foi avaliar a Resolução CONAMA n° 443/2012 com base no banco de dados sobre a flora das Restingas do estado de Sergipe (OLIVEIRA et al., 2014OLIVEIRA, E. V. S.; LANDIM, M. F. Caracterização fitofisionômica das restingas da Reserva Biológica de Santa Isabel, litoral norte de Sergipe. Scientia Plena, v. 10, n. 10, p. 1-10, 2014.), analisar a similaridade entre elas e, consequentemente, a adequação desse instrumento legal, face o conhecimento científico atual sobre a composição da floral local.

Material e Métodos

Situado na Região Nordeste, o estado de Sergipe está localizado entre as coordenadas 9°30’ e 11°30’ S e 36°20’ e 38°00’ W, limitando-se ao norte com o estado de Alagoas, a leste com o Oceano Atlântico e a sul e oeste com o estado da Bahia. Sergipe possui área de 21.918,354 km2, com uma população de 2.068.017 habitantes, distribuídos em 75 municípios e uma densidade demográfica de 94,35 hab/km² (IBGE, 2010).

O litoral de Sergipe (incluindo a região localizada sobre a planície costeira que adentra em direção ao continente) apresenta dois tipos climáticos distintos, variando em relação aos índices de umidade e temperatura (SEPLAG/SUPES, 2011). O Megatérmico Úmido abrange a faixa costeira que vai do município de Santa Luzia do Itanhy até o município de Santo Amaro das Brotas e apresenta índices de precipitações pluviométricas maiores que 1.600 mm anuais. O Megatérmico Sub-Úmido à Seco compreende a região entre os municípios de Pirambu e Ilha das Flores, sendo observadas precipitações pluviométricas entre 1.000 e 1.200 mm anuais. A média de temperatura de toda a faixa litorânea fica entre 24°C e 26°C (UFS/SEPLAN, 1979).

As Restingas em Sergipe estão localizadas na planície costeira, compreendendo uma extensão de 1.942,867 km2, distribuídos em 168 km de linha de costa (SEMARH/SRH, 2011). Nesta região estão localizados, total ou parcialmente, 11 municípios (Mapa 1).

Mapa 1
Municípios localizados na Planície Costeira, Estado de Sergipe, com áreas de vegetação de Restinga.

A lista florística compilada para as Restingas do estado (OLIVEIRA et al., 2014OLIVEIRA, E. V. S.; LANDIM, M. F. Caracterização fitofisionômica das restingas da Reserva Biológica de Santa Isabel, litoral norte de Sergipe. Scientia Plena, v. 10, n. 10, p. 1-10, 2014.) foi comparada com a lista de espécies indicadoras dos estágios sucessionais de vegetação de Restinga para o estado de Sergipe (BRASIL - RES. CONAMA, 2012). A determinação taxonômica das espécies citadas nesta resolução foi atualizada em consulta à Flora do Brasil 2020 em construção (2018), de modo a permitir a comparação entre as duas listas e a avaliação da adequação desta última. De modo complementar, foram ainda realizadas consultas ao banco de dados do Centro de Referência em Informação Ambiental (http://splink.cria.org.br/) de forma a conferir a ocorrência de espécies no estado (CRIA, 2014).

Resultados e Discussão

No total, 53 das 136 espécies apresentadas na Resolução CONAMA n° 443/2012 (39%) não foram encontradas no banco de dados sobre a flora das Restingas do estado de Sergipe (OLIVEIRA et al., 2014OLIVEIRA, E. V. S.; LANDIM, M. F. Caracterização fitofisionômica das restingas da Reserva Biológica de Santa Isabel, litoral norte de Sergipe. Scientia Plena, v. 10, n. 10, p. 1-10, 2014.), o que causa certa estranheza e preocupação, já que este inventário baseou-se no material botânico já coletado no estado, depositado em herbários, tanto de Sergipe como de outros estados, sendo difícil identificar a origem dos dados referentes a estas 53 espécies. A lista completa destas 53 espécies ausentes na Resolução CONAMA analisada pode ser encontrada como material suplementar a este artigo (<https://doi.org/10.6084/m9.figshare.6817109).

Além disso, para nove destas 53 espécies (Quadro 1) não foram sequer encontrados registros de coletas no estado e no banco de dados do CRIA. No entanto, duas destas espécies têm ocorrência registrada para o estado de Sergipe na Flora do Brasil 2020 em construção (2018), embora não em áreas de Restinga. Cyperus giganteus é descrita como ocorrendo nos domínios fitogeográficos da Amazônia, Caatinga e Cerrado (FLORA DO BRASIL 2020 EM CONSTRUÇÃO, 2018) e Trichocentrum fuscum, nos domínios do Cerrado e Mata Atlântica, mais especificamente em áreas de Floresta Ombrófila (FLORA DO BRASIL 2020 EM CONSTRUÇÃO, 2018).

Quadro 1
Espécies citadas como indicadoras dos estágios sucessionais de vegetação de Restinga para o Estado de Sergipe (BRASIL - RES. CONAMA, 2012), sem registros de coletas no estado ou nos municípios localizados em sua Planície Costeira (CRIA, 2014).

Foi ainda observado que outras 13 espécies presentes na lista do CONAMA embora sejam encontradas em Sergipe, não têm registros de coleta em municípios localizados na planície litorânea do estado (Quadro 1). Com base na localização dos registros de ocorrência destas espécies em Sergipe (IBGE, 2014; CRIA, 2014), percebe-se que cerca de metade destas, possui distribuição para os dois domínios fitogeográficos presentes neste estado, Caatinga e Mata Atlântica (Quadro 1). Essa ampla distribuição observada pode ter sido a razão para sua inclusão, erroneamente, na lista do CONAMA analisada. Estes fatos aqui expostos, reforçam a necessidade de uma reformulação deste documento.

Chama a atenção a inclusão, nesta resolução, de espécies como Chiococca nitida. Todas as sete coletas dessa espécie em Sergipe foram realizadas nos municípios de Areia Branca (B.S. Amorim 187 e 116; K. Mendes 356; e T.V.P. Dantas 88) e Itabaiana (G. Viana 250; V. Almeida 13770; e D. Araújo, 1953), áreas distantes pelo menos 40 km da planície litorânea. Aparentemente, houve um engano por parte dos organizadores da listagem constante nesta resolução, incluindo nela também espécies de formações herbáceo-arbustivas sobre solo arenoso, fisionomicamente semelhantes às Restingas costeiras, localmente chamadas de “areias brancas” (DANTAS et al., 2010DANTAS, T. V. P. et al. Florística e estrutura da vegetação arbustivo-arbórea das Areias Brancas do Parque Nacional Serra de Itabaiana/Sergipe, Brasil. Revista Brasileira de Botânica, v. 33, n. 4, p. 575-588, 2010. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0100-84042010000400006
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) e “Restingas internas” (M.F.L., obs. pess.).

Outro exemplo de equívoco na inclusão de espécies “indicadoras dos estágios sucessionais de vegetação de Restinga” é o de Tillandsia recurvata e T. stricta. Consultas aos herbários cadastrados no banco de dados do CRIA mostram que estas não tem coletas em áreas de Restingas de Sergipe, mas sim em municípios do estado no domínio da Caatinga, como Canindé de São Francisco, Frei Paulo, Nossa Senhora da Glória, Poço Redondo, Riachão do Dantas, Poço Verde, Porto da Folha, Tobias Barreto, Macambira e Areia Branca (no caso de T. recurvata) e Maruim, Tobias Barreto, Japoatã, Poço Redondo, Itabaianinha, Frei Paulo, Nossa Senhora das Dores, Itabaiana, Poço Verde, Riachão do Dantas e Lagarto (com relação a T. stricta).

É interessante notar que das 790 espécies determinadas até o nível específico no levantamento da flora das Restingas do estado (OLIVEIRA et al., 2014OLIVEIRA, E. V. S.; LANDIM, M. F. Caracterização fitofisionômica das restingas da Reserva Biológica de Santa Isabel, litoral norte de Sergipe. Scientia Plena, v. 10, n. 10, p. 1-10, 2014.), somente 82 (10%) estão presentes na lista de espécies indicadoras dos estágios sucessionais de vegetação de Restinga para o Estado de Sergipe (BRASIL - RES. CONAMA, 2012), em todas as tipologias vegetacionais e estágios sucessionais. Embora a Resolução CONAMA nº 417/2009 afirme que “a ausência de uma ou mais espécies indicadoras ou a ocorrência de espécies não citadas nas resoluções específicas referidas no artigo 3° não descaracteriza o respectivo estágio sucessional da vegetação” (Art. 4°), é necessário que essas listagens do CONAMA sejam mais representativas quanto ao número total de espécies para as Restingas de cada estado.

Além de incluir espécies sem ocorrência registrada em Sergipe ou nas áreas de Restinga do estado, o documento analisado ainda falha em não destacar as espécies “identificadas como endêmicas, raras ou ameaçadas de extinção, constantes das listas oficiais da União Federal e dos respectivos Estados”, como determinado pela Resolução CONAMA no 417/2009 (Art. 7º). Apesar da existência, ao final da Resolução CONAMA n° 443/2012, de uma legenda indicando que as “espécies vegetais endêmicas, raras ou ameaçadas de extinção” seriam marcadas com um “*”, nenhuma espécie foi assim indicada no seu texto. Um exemplo disso, é Chamaecrista cytisoides, espécie classificada como rara por Giulietti et al. (2009GIULIETTI, A. M. et al. Plantas raras do Brasil. Belo Horizonte: Conservação Internacional & Universidade Estadual de Feira de Santana, 2009.), e que, embora presente na lista analisada, não tem nela seu status informado (BRASIL - RES. CONAMA, 2012). Outro fato, é a não inserção nessa lista de pelo menos cinco espécies ameaçadas de extinção e seis espécies raras registradas para as Restingas de Sergipe (OLIVEIRA; LANDIM, 2016_______. Flora das Restingas de Sergipe: padrões de distribuição espacial e status de conservação de suas espécies. Natureza Online, v. 14, n. 1, p. 23-31, 2016.).

Dentre as 13 espécies com distribuição mais ampla entre os municípios com áreas de Restinga em Sergipe, apenas três delas (23%), Ocotea notata, Schinus terebinthifolius e Bulbostylis capillaris, estão presentes na lista do CONAMA. Além disso, nenhuma das quatro espécies com distribuição mais ampla nas Restingas de Sergipe (Chamaecrista ramosa, Coccoloba laevis, Borreria verticillata e Eleocharis geniculata) está presente nesta lista (OLIVEIRA, LANDIM 2016_______. Flora das Restingas de Sergipe: padrões de distribuição espacial e status de conservação de suas espécies. Natureza Online, v. 14, n. 1, p. 23-31, 2016.). A resolução CONAMA nº 417/2009 determina apenas que as listas das espécies indicadoras serão estabelecidas “considerando as características específicas de sua vegetação de Restinga” (Art. 3°, § 1º), não fazendo nenhuma menção clara à necessidade de essas listas apresentarem espécies de ampla distribuição nas Restingas do estado, o que facilitaria a identificação in situ das fitofisionomias e estágios sucessionais. Cabe ressaltar que a Lei da Mata Atlântica (BRASIL - LEI, 2006) determina a observação de uma série de de parametros ecológicos para a definição de vegetação primária e dos estágios sucessionais secundários da vegetação de Restinga como: (i) fitofisionomia; (ii) estratos predominantes; (iii) distribuição diamétrica e de altura; (iv) existência, diversidade e quantidade de epífitas e trepadeiras; (v) presença, ausência e características da serrapilheira; (vi) sub-bosque; (vi) diversidade e dominância de espécies; e (vii) espécies vegetais indicadoras (Art. 4°, § 2º). A observação destas características, além da listagem revisada e corrigida da Resolução CONAMA n° 443/2012, deverá permitir uma caracterização mais adequada das fitosionomias e estágios sucessionais da vegetação de Restinga em Sergipe.

Diante do exposto, ressalta-se a necessidadede uma cuidadosa revisão da lista apresentada por esta resolução do CONAMA, para uma caracterização realmente representativa da flora das áreas de Restinga do estado e que possa servir de forma mais adequada como subsídio legal para a proteção dessas áreas. Esta questão se reveste de especial importância, face à crescente ocupação e descaracterização das áreas de Restinga do estado. O fato de a listagem fornecida neste documento legal não refletir a diversidade nativa das Restingas do estado, dificulta, ou mesmo invalida, a sua utilização de forma adequada como instrumento de gestão ambiental.

Considerações Finais

Apesar da importância da Resolução CONAMA n° 443/2012 para o licenciamento ambiental nas áreas de Restinga de Sergipe (BRASIL, 2009), a adequação de sua listagem de espécies indicadoras de cada estágio sucessional nestes ambientes é bastante questionável já que foram incluídas espécies que sequer tem ocorrência no estado ou em suas áreas de Restinga (53 das 136 listadas). Por estes motivos, sugere-se uma revisão cuidadosa desta lista, preferencialmente elaborada com a participação de especialistas.

Destaca-se, ainda, a necessidade da inclusão de espécies raras e ameaçadas presentes nas Restingas de Sergipe e a substituição das espécies sem ocorrência para as áreas de Restinga do estado por aquelas com registros confirmados, incluindo as plantas com distribuição mais ampla pelos municípios inseridos na Planície Costeira.

A observação de características ambientais, definidas pela Lei da Mata Atlantica, além da listagem da Resolução CONAMA n° 443/2012 revisada e corrigida, deverá permitir uma caracterização mais realista das fitosionomias e estágios sucessionais da vegetação de Restinga em Sergipe.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Abr 2023
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2018

Histórico

  • Recebido
    17 Jan 2018
  • Aceito
    06 Ago 2018
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