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Relações laborais e emprego

Labor relations and employment

Resumos

A problemática da transformação das relações laborais por pressão das mudanças económicas, tecnológicas e sociais em curso tem vindo a suscitar um interesse crescente dos analistas sociais, nas últimas décadas. O debate é intenso e a multiplicidade de obras publicadas apontam evoluções complexas e contraditórias. Este artigo começa por situar os termos mais importantes desse debate. Em seguida, procura dar conta das principais tendências do sistema de relações laborais português. Assim, são analisadas questões como a conflitualidade laboral manifesta em greve, a sindicalização e a negociação colectiva na sua estrutura e conteúdos. Por último, é o problema do processo de modernização das empresas das empresas que é analisado. Trata-se de mostrar em que medida os sindicatos, através da negociação, agem sobre os processos de reestruturação e de mudança técnico-organizativa das empresas e os problemas com os quais se confrontam com vista à defesa do emprego.

Relações laborais; negociação colectiva; mudanças técnico-organizativas; emprego


The issues of changes on labor relations resulting from ongoing economic, technological and social changes have raised a growing interest by social analysts in recent decades. The debate is strong and the diversity of works published points to complex and conflicting developments. This article starts by presenting the most important terms in that debate. Afterwards, it attempts to cover the main trends in the Portuguese labor system. Therefore, issues such as the labor conflictuality expressed in strikes, union membership, and collective negotiation in its structure and contexts are analyzed. Finally, the modernization process in businesses is examined in order to show how unions, through negotiation, act upon businesses' technical and organizational processes of restructuring and change as well as the problems they face when defending their jobs.

Labor relations; collective negotiation; technical and organizational change; employment


DOSSIÊ NOVAS REALIDADES DO TRABALHO - BRASIL E PORTUGAL

Relações laborais e emprego1 1 Este artigo insere-se no projecto de investigação, intitulado "As formas flexíveis de emprego: riscos e oportunidades", financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (POCTI N.º 33042/SOC/2000), bem como no projecto de cooperação "Transformações do Trabalho e do Emprego no Contexto da Reestruturação Económica" no âmbito do Convénio GRICES/CAPES (Brasil) e SOCIUS/ISEG-UTL (Portugal).

Labor relations and employment

Maria da Conceição Cerdeira

Investigadora do SOCIUS/ISEG – Universidade Técnica de Lisboa, Portugal

RESUMO

A problemática da transformação das relações laborais por pressão das mudanças económicas, tecnológicas e sociais em curso tem vindo a suscitar um interesse crescente dos analistas sociais, nas últimas décadas. O debate é intenso e a multiplicidade de obras publicadas apontam evoluções complexas e contraditórias. Este artigo começa por situar os termos mais importantes desse debate. Em seguida, procura dar conta das principais tendências do sistema de relações laborais português. Assim, são analisadas questões como a conflitualidade laboral manifesta em greve, a sindicalização e a negociação colectiva na sua estrutura e conteúdos.

Por último, é o problema do processo de modernização das empresas das empresas que é analisado. Trata-se de mostrar em que medida os sindicatos, através da negociação, agem sobre os processos de reestruturação e de mudança técnico-organizativa das empresas e os problemas com os quais se confrontam com vista à defesa do emprego.

Palavras-chave: Relações laborais, negociação colectiva, mudanças técnico-organizativas, emprego.

ABSTRACT

The issues of changes on labor relations resulting from ongoing economic, technological and social changes have raised a growing interest by social analysts in recent decades. The debate is strong and the diversity of works published points to complex and conflicting developments. This article starts by presenting the most important terms in that debate. Afterwards, it attempts to cover the main trends in the Portuguese labor system. Therefore, issues such as the labor conflictuality expressed in strikes, union membership, and collective negotiation in its structure and contexts are analyzed. Finally, the modernization process in businesses is examined in order to show how unions, through negotiation, act upon businesses' technical and organizational processes of restructuring and change as well as the problems they face when defending their jobs.

Keywords: Labor relations, collective negotiation, technical and organizational change, employment.

1 Introdução: o debate actual sobre a transformação das relações laborais2 2 No seguimento de Hyman (2002) entendemos por relações laborais (do latim labõre) a regulação, numa acepção lata, do trabalho e do emprego. Essa regulação integra tanto regras formais (acordos internos, convenções colectivas, leis, regulamentações, etc.) como informais (nomeadamente fundadas sobre os costumes e as tradições) e abrange uma teia complexa de processos sociais e um campo de resistência, ou seja, uma luta real e potencial. O termo é conceptualmente idêntico ao de relações industriais (industrial relations) e relações profissionais ( relations professionnelles), reflectindo as designações adoptadas, respectivamente, nas tradições linguísticas anglo-saxónica e francesa. A proximidade conceptual permite a sua utilização indistinta. Apesar disso, nós privilegiamos a expressão relações laborais, por considerarmos mais ajustado à língua portuguesa.

É consensual a ideia de que as relações laborais estão num processo de transformação, desde há pelo menos duas décadas, por pressão da emergência de um novo paradigma tecnológico e de acréscimo da competitividade internacional, associado com os fenómenos de globalização económica. Menos pacífica é a interpretação dos analistas de tal processo. O tema tem vindo, por essa razão, a ser objecto de controvérsia e a animar um intenso debate com várias orientações, envolvendo um conjunto amplo de actores: teóricos das relações industriais, consultores e gestores de empresas, empregadores, sindicatos, governos, etc. De uma forma resumida, enunciaremos três orientações maiores deste debate, sublinhando, contudo, a sua não auto-exclusão.

Uma primeira orientação diz respeito à convergência versus divergência dos sistemas de relações laborais. É um debate antigo, marcado pelas teses do determinismo tecnológico e suscitado pelos estudos comparativos desenvolvidos nos anos 50 e 60 pela escola «sistémica» americana. As obras de referência mais importantes são a teorização Industrial Relations System de J. Dunlop (anos 50) e a publicação conjunta do autor com Kerr, Harbinson e Myers Industrialism and Industrial Man (1960). O modelo americano é a referência para o movimento de convergência.

Em oposição à tese da convergência defendida pelos autores nessas obras, sublinham-se os trabalhos do grupo de Aix-en Provence (Maurice, Sellier e Silvestre, 1982). Num estudo comparativo entre a França e a Alemanha estes autores encontram coerências específicas, próprias de cada sociedade, ou seja aquilo que os autores designam de «efeito societal» entre estruturas de educação, de organização industrial e de relações profissionais. Também nesta linha de orientação, de defesa da tese da heterogeneidade ou divergência dos sistemas mas em trabalhos mais recentes, integramos os estudos de D'Iribarne (1993) e Hofstede (1997) os quais salientam a especificidade das culturas nacionais na configuração diferenciada de formas organizacionais e modelos de gestão das empresas.

A tese da convergência dos sistemas de relações laborais encontra hoje uma legitimidade acrescida devido ao desenvolvimento e difusão crescente das tecnologias de informação, bem como à intensificação dos processos de globalização económica e social. Considerando que tais fenómenos enfraquecem os fundamentos da autonomia dos sistemas nacionais de relações laborais, é postulada por analistas de orientação muito diversa, nomeadamente da corrente neo-liberal e da escola da economia política. A ideia da convergência, pelo menos de uma forma parcial, é veiculada igualmente pelo paradigma «neocorporatista» e pela escola francesa da Regulação. Apesar de assentarem em pressupostos teóricos e áreas disciplinares muito diferentes, aproxima-os o facto de oporem modelos contrastados de regulação económica e social. O primeiro faz a oposição entre a regulação pluralista e a regulação neocorporatista; o segundo entre a regulação concorrencial e a regulação fordista. Ambos os paradigmas têm presente a ideia de crise profunda do modo de regulação que por ter permitido uma maior estabilidade económica e social é considerado superior. Além disso, ambos preconizam que a saída da crise, a médio ou a longo prazo, conduz à emergência de novos modelos sejam eles «microcorporatistas», «mesocorporatistas» (Schmitter, 1981) ou pós-fordistas, (Boyer e Durand, 1993, 1998).

A evolução das relações laborais no seio das empresas, à luz do desenvolvimento de novas estratégias de gestão dos recursos humanos, constitui um outro tema de confronto de posições entre os analistas das relações laborais. Mais exactamente, os autores põem o problema da centralidade do papel dos sindicatos e da negociação colectiva na evolução actual das relações do emprego.3 3 Entendemos por relações de emprego, as condições de contratação do trabalhador por parte da empresa e de prestação do trabalho por parte deste no seu seio. Sobre esta questão, importa diferenciar cinco perspectivas diferentes.

A primeira perspectiva sustenta a ideia que a passagem de modelos tradicionais de gestão de recursos humanos (reactivos e geridos segundo princípios burocráticos) para a adopção de modelos estratégicos (pró-activos, contingentes e baseados em novos princípios como a implicação dos assalariados, a participação nas decisões, e a remuneração segundo as suas competências), tem como consequência diminuir a influência da negociação colectiva e dos sindicatos na regulação das relações sociais no seio das empresas (nomeadamente, Kessler, 1993, cf. Larouche, 1996). Constatando, embora, uma evolução similar no que se refere ao desenvolvimento de modelos de gestão que apelam a uma maior participação e implicação dos assalariados, outros autores rejeitam a tese de que tal ocorra em detrimento do papel da negociação colectiva. Pelo contrário, fazem notar que as práticas de gestão de recursos humanos mais pró-activas foram desenvolvidas em empresas com maiores níveis de sindicalização, pese, embora, tais práticas terem sido orientadas em função de interesses e lógicas individuais e não de molde a enquadrar a lógica colectiva existente nas empresas (Sisson, 1993, cf. Larouche, 1996).

Uma conclusão inversa à acabada de referir é avançada por Meltz e Verma (1993), tendo como base de sustentação estudos desenvolvidos em empresas nos Estados Unidos. As suas conclusões sublinham que o desenvolvimento da participação e da implicação dos assalariados nas empresas, ou seja as inovações no domínio da gestão dos recursos humanos, são mais difíceis de implementar em empresas com uma densidade sindical estável ao longo dos anos.

Audet e Bélanger (1989) dão conta, por seu lado, da ocorrência de dois fenómenos simultâneos: o questionamento do papel tradicional dos sindicatos e o desenvolvimento da cooperação e da participação dos trabalhadores na gestão. Os autores defendem que a promoção da participação dos trabalhadores no seio da empresa pressiona os sindicatos a adoptarem comportamentos mais cooperativos com o patronato. Estes comportamentos têm expressão na negociação de condições de trabalho orientados basicamente para objectivos organizacionais como sejam: a rotação dos trabalhadores, o alargamento e enriquecimento das tarefas, a partilha de responsabilidades e de ganhos de produtividade, a auto-supervisão, a participação na gestão, o trabalho de equipa, etc. Assim, na sua óptica, as transformações tecnológicas, culturais, económicas e as exigências da flexibilidade põem em causa os sistemas de relações laborais conflituais, e dão lugar a relações patronais-sindicais fundadas sobre a convergência de interesses, ainda que em função da produtividade e da eficácia organizacional.

Num trabalho mais recente, a partir de observações empíricas em empresas francesas e canadianas, Bélanger e Thuderoz (1998) defendem a tese da emergência de um novo compromisso social. Este compromisso caracteriza-se por substituir o binómio salário-trabalho, específico da relação salarial fordista, pela relação de equivalência entre produtividade e emprego. Esta passagem conjuga transformações tanto no nível da estrutura de negociação colectiva (do sector para a empresa e da empresa para o local de trabalho), como dos processos de regulação social (regras processuais e substantivas), como dos objectos (matérias) sobre as quais incide a negociação.

O terceiro tema que tem vindo a confrontar os estudiosos das relações industriais diz respeito à transformação estrutural dos sistemas nacionais das relações laborais. Tendo origem na obra de Kochan, Katz e Mckersie, intitulada The transformation of American Industrial Relations (1986), esse debate tem sido apoiado pelo desenvolvimento de vários estudos comparados de países europeus, da Ásia, da América Latina, do ex-bloco soviético e de África. De uma forma geral, esses estudos assinalam a coexistência das seguintes cinco tendências comuns mais marcantes:

  1. Tendência para descentralização. Este movimento de descentralização tem como causas maiores a evolução das relações de forças em desfavor do actor sindical, o desenvolvimento de estruturas organizativas menos hierarquizadas e novas formas de organização de trabalho. Expressa-se na desvalorização do nível nacional ou sectorial de decisão das relações laborais e gestão do emprego, a favor da empresa ou mesmo do estabelecimento e da oficina. Este movimento tem como consequência maior conduzir à segmentação da regulação das condições de trabalho entre empresas.

  2. Tendência para a flexibilidade, quer se trate da flexibilidade interna (reorganização do trabalho e das tarefas afectas aos grupos profissionais, gestão do tempo de trabalho, sistemas de retribuição) quer da flexibilidade externa (variação de efectivos, subcontratação de actividades, contratos de trabalho atípicos, mobilidade dos trabalhadores).

  3. Tendência para a implementação de uma lógica de competência profissional alicerçada sobre o indivíduo, em desfavor da lógica tradicional alicerçada sobre a qualificação do posto de trabalho. A passagem do posto de trabalho para o indivíduo é fruto da pressão concorrencial orientada para critérios competitividade baseados na qualidade e flexibilidade. Esta nova lógica de gestão dos recursos humanos apela a maiores investimentos na formação, na motivação, na implicação dos assalariados, traduzindo-se, frequentemente, na implementação de sistemas de remuneração individualizados.

  4. Tendência geral para declínio da sindicalização, associado com as transformações da empresa fordista, o desenvolvimento de novas formas de emprego, a difusão das novas tecnologias, a intensificação das reestruturações produtivas, a hostilidade dos empregadores relativamente à presença de sindicalizados no local de trabalho e a emergência de valores societais mais individualistas e meritocráticos, em desfavor da solidariedade e da igualdade.

  5. Tendência para o desenvolvimento de novas estratégias de gestão dos recursos humanos nas empresas no sentido da maior participação e implicação dos trabalhadores e/ou dos seus representantes na melhoria contínua dos processos de trabalho e dos resultados económicos das empresas, a par de variações nas práticas de emprego e na gestão das condições de trabalho.

Esta constatação de tendências de evolução comuns à generalidade dos países levou um grande número de autores a sustentarem a tese da transformação estrutural dos sistemas nacionais de relações laborais. Tese essa refutada por autores como Crouch (1993), Dunlop (1993) e Hyman (1994). Por exemplo, baseado num estudo sobre países europeus, Crouch faz notar que tais tendências não põem em causa em profundidade os sistemas de relações laborais implantados há mais de cem anos, tratando-se apenas de meros ajustamentos às novas condições económicas e tecnológicas.

Alguns autores fazem ainda notar que há que levar em conta que as tendências identificadas decorrem em contextos nacionais com características do emprego e dos sistemas de relações laborais muito diferenciadas. O que quer dizer que práticas similares podem ter diferentes significados e implicações. Assim, por exemplo, nos Estados Unidos, onde tradicionalmente os empregos são definidos segundo a lógica do posto de trabalho numa concepção taylorista, os empresários para reorganizar o trabalho tendem a enfrentar a forte resistência dos sindicatos e dos trabalhadores. Esta resistência tem como justificação o facto da reorganização proposta eliminar as fronteiras de delimitação das actividades/tarefas dos trabalhadores que servem de base à forma como são determinadas as condições do emprego, isto é, o salário-base, a antiguidade, a progressão profissional e, por vezes mesmo, a segurança do emprego. Comportamentos sindicais idênticos foram observados no Brasil (Cotanda, 2001) e Portugal (Cerdeira, 2001).

Já na Alemanha, na Dinamarca, na Suécia ou no Japão, onde os empregos são definidos de uma forma mais flexível e a segurança do emprego não depende do controlo dos postos de trabalho, os sindicatos e os trabalhadores tendem a encarar as transformações tecnológicas e a mudança organizacional positivamente, na perspectiva da criação de novas oportunidades de desenvolvimento das suas competências e de reforço da sua iniciativa e autonomia.

Concluímos, pois, que se a pressão das transformações tecnológicas (difusão das tecnologias informáticas) e económicas (globalização e acréscimo de competitividade económica) promovem hoje o desenvolvimento de um movimento geral para flexibilidade do emprego (funcional e/ou quantitativa), essa pressão é filtrada pelos diferentes dispositivos institucionais nacionais existentes: características, organização e estratégias dos actores sociais, normas legais, sistema de formação profissional e de negociação colectiva, etc. Deste modo, as mesmas práticas (a promoção da flexibilidade) podem ter diferentes significados, suscitar estratégias sindicais diferenciadas e conduzir a resultados distintos em cada país.

Apesar disso, estudos desenvolvidos em vários países sublinham que as práticas de flexibilidade quantitativa são mais comuns nas empresas de mão-de-obra intensiva, enquanto as empresas de alta tecnologia promovem mais frequentemente a flexibilidade funcional e a incitação à autonomia e à iniciativa. Assim, é provável encontrar, no plano sectorial, evoluções internacionais convergentes e evoluções nacionais divergentes. Em vez da convergência ou divergência, tal como Sengenberger (1992), consideramos mais correcta a ideia de segmentação dos modelos nacionais e evolução paradoxal da negociação e dos sistemas de relações laborais relativamente ao quadro actual de grandes transformações tecnológicas, económicas e sócio-organizacionais.

Assim, defendemos a tese que não existe qualquer relação automática ou pré-determinada entre as relações laborais e o quadro de actuação das empresas e das trocas económicas, que permita prever, com segurança, quais os efeitos dos sistemas flexíveis de produção sobre o sindicalismo, a negociação colectiva, a organização do trabalho ou o número e a qualidade dos empregos. De igual modo, considerando, embora, que as instituições de regulação social possam condicionar as opções das estratégias de concorrência das empresas, não existe, entre ambas, uma dependência simples e linear. A interacção entre as transformações do sistema produtivo e as relações laborais é, pois, complexa, carecendo a sua apreensão e interpretação do desenvolvimento de estudos sistemáticos aos diferentes níveis (macro, meso e micro).

Incidindo a nossa análise sobre o sistema de relações laborais português, neste texto procuramos dar conta das suas principais tendências de transformação nas últimas duas décadas. Analisamos a conflitualidade laboral, a sindicalização, a estrutura da negociação colectiva e o conteúdo das convenções negociadas pelos actores do sistema de relações laborais nos últimos anos. Porque a negociação colectiva é um elemento essencial da regulação das condições de trabalho, interessa-nos aqui particularmente analisar em que medida os actores institucionais das relações profissionais, através dela, agem sobre as transformações técnico-organizativas das empresas e o emprego.

2 A ambiguidade do modelo e sua evolução recente

Portugal, depois de Abril de 1974, à semelhança de países como a Alemanha e a França, instituiu um modelo dual de representação dos trabalhadores. De um lado, foi prevista a criação de comissões de trabalhadores com um papel mais de «controlo e colaboração» ao nível da empresa. Do outro lado, a criação de sindicatos com um papel orientado para a negociação colectiva e fiscalização de aplicação das normas legais (legislativas e convencionais). A vantagem da introdução do sistema dual consistiria em permitir conservar ao movimento sindical a sua autonomia nas lutas de defesa da repartição da riqueza, e, ao mesmo tempo, a colaboração das comissões de trabalhadores ao nível da empresas e/ou estabelecimento, tendo em vista o controlo da gestão e o desenvolvimento da sua produtividade.

Contudo, depois de um período inicial, sobretudo em 1975/76, em que as comissões de trabalhadores tiveram um papel muito activo no seio das empresas (por vezes, funções de gestão), progressivamente, vão perdendo representação e importância. Actualmente, o número de empresas com comissões de trabalhadores activas é bastante reduzido e, tendencialmente, são constituídas pelos delegados sindicais da empresa que acumulam os dois tipos de representação dos trabalhadores na empresa.

Por seu lado, no interior do movimento sindical estabeleceu-se, desde os finais dos anos setenta, uma forte clivagem político-ideológica entre os sindicatos que defendem «a cooperação e a parceria social» (UGT4 4 União Geral de Trabalhadores. e outros) e aqueles que pretendem conservar a autonomia sindical para criar um «contra-poder sindical» (CGTP-IN5 5 Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses – Intersindical Nacional. ). Como iremos ver mais à frente esta clivagem reflectiu-se na divisão sindical, que se tem vindo a agudizar, nos últimos tempos, pelo desenvolvimento de «corporatismos profissionais».6 6 Por «corporatismos profissionais», entendemos a autonomização em sindicatos próprios de grupos profissionais com estatuto privilegiado na empresa ou na sociedade, ou seja, profissionais com forte poder reivindicativo, quer pela sua competência técnica e raridade no mercado de trabalho (médicos, juízes, etc.) quer pela sua posição estratégica na empresa ou serviço público (pilotos da aviação comercial, electricistas do metropolitano, trabalhadores dos impostos, etc.).

As diferentes concepções políticas e ideológicas sindicais repercutam-se em práticas sindicais diferentes. Porém, de um lado, a maior implantação do sindicalismo de «contra-poder» ou de oposição, e, de um outro lado, a pouca abertura dos gestores portugueses à partilha do poder na empresa, configurou um modelo de relações industriais em que é forte a intervenção do Estado e as relações institucionais tradicionais entre os actores sociais tendem a desenvolverem-se entre dois pólos: conflito – negociação, surgindo esta, muitas vezes, como um meio de transformação e prolongamento do conflito, numa ordem sequencial de reivindicação – conflito – negociação – regra de direito (disposições legais, convenções colectivas)7 7 Para a resolução de conflitos colectivos relacionados com o processo de negociação a legislação prevê conciliação, a mediação e arbitragem. Enquanto a conciliação pode ser solicitada por qualquer uma das partes e até agora tem vindo a ser feita exclusivamente por técnicos especializados do MSST, a mediação é realizada por um mediador escolhido pelas partes e aceite por ambas. A arbitragem é realizada por três árbitros, dois deles nomeados por cada uma das partes e o terceiro escolhido pelos dois precedentes. .

A questão que colocamos aqui é a seguinte: de que modo é que o quadro económico e político actual têm vindo a alterar este tipo de relações institucionais e até que ponto tem sido eficaz, em termos de defesa dos trabalhadores?

2.1 Enfraquecimento e transformação do movimento sindical

Vários factores contribuíram para que o movimento sindical português tenha contabilizado um número bastante elevado de sindicalizados até à primeira metade dos anos 80. Na nossa óptica, os mais importantes foram a existência de uma legislação compulsória à quotização sindical no período corporativo, o fim da interdição à sindicalização de trabalhadores de várias actividades (administração pública central e municipal, pescadores, trabalhadores agrícolas, etc.) depois de Abril de 1974, a difusão de valores socialistas (da solidariedade, da colectividade, da igualdade) e o ambiente político favorável aos sindicatos. A partir de então segue a tendência de evolução que regista a maior parte dos países industrializados, ou seja de decréscimo em número e densidade. Contudo, se o fenómeno de decréscimo é comum à maior parte dos países, Portugal situa-se entre aqueles que registaram as quebras mais elevadas.

De facto, como revelam os valores do quadro 1, em duas décadas (1979-84 a 1991-95) o movimento sindical português perdeu mais de 30% de filiados. Esta perda afectou de uma forma mais gravosa o sector primário (73%), as indústrias transformadoras (52%) e o sector secundário (51%). Os únicos sectores que registam acréscimos de sindicalização em valores absolutos foram os Bancos e Seguros, a Educação e a Administração Pública.


Contudo, se em termos absolutos três sectores não foram afectados por decréscimo de efectivos sindicais, em termos relativos, apenas fogem à regra os Bancos e Seguros, explicável pelo facto do sistema de saúde ser gerido pelos sindicatos do sector.8 8 A densidade sindical ultrapassa mesmo 100% na medida em que muitos trabalhadores afectados pelos processos de racionalização e modernização tecnológica, nos últimos anos, permanecerem sindicalizados, ainda que em situação pré-aposentadoria ou mesmo aposentadoria, como forma de acederem aos serviços de saúde. O quadro 2, revela que a densidade sindical, ou seja a proporção de trabalhadores sindicalizados sofreu uma quebra de perto de 50%. Quer isto dizer que os sindicatos não só perderam sindicalizados como não evidenciaram capacidade de atracção dos que entraram de novo para o mercado de trabalho.


O decréscimo da sindicalização internacional é atribuído a um conjunto de causas exógenas, das quais as mais importantes são: o acréscimo do desemprego, a entrada em crise das grandes empresa fordista, o decréscimo do emprego industrial, o afluxo das mulheres ao mercado de trabalho e a subida dos valores individuais (entre outros, Visser, 1993). Sem menosprezar estas causas de natureza externa, no caso português, há que lhes associar outras ligadas à organização interna dos sindicatos, às suas estratégias e ao seu funcionamento. No nosso entender, duas evoluções importantes trazem contributos importantes para explicar a descida da sindicalização na sociedade portuguesa. A primeira é a ausência de uma política reivindicativa unitária e a politização das organizações sindicais. A segunda o desenvolvimento de um sindicalismo «corporatista».

Com efeito, a grande politização da acção sindical, a emergência de novas identidades profissionais por efeito das transformações económicas, tecnológicas e organizacionais das empresas, a reconfiguração do poder profissional no seio das empresas e da sociedade, originaram um movimento crescente de fragmentação e pluralidade da organização sindical. Este movimento exprime-se tanto na constituição de novos sindicatos coincidentes nos âmbitos profissional e territorial com outros já existentes, como na autonomização de pequenos grupos profissionais relativamente a sindicatos sectoriais ou profissionalmente heterogéneos. No fundo, esta evolução no plano das formas organizativas, representa ao nível da base movimentos do sindicalismo independente9 9 Esta expressão é utilizada para designar o sindicalismo não integrado nas duas confederações mais importantes: UGT e CGTP-IN. A título de exemplos referem-se a criação dos sindicatos: Independente do Sector Energético (1995), Independente dos Trabalhadores da Indústria e Construção (1998) e Independente dos Trabalhadores do Sector Empresarial da Cerâmica, dos Cimentos, do Vidro e Actividade Conexas dos Distritos de Braga, Porto e Viana do Castelo. e dos "corporativismos profissionais" que também emergiram ao nível confederal, de que são exemplo a constituição da Convenção Sindical Independente e Confederação Portuguesa dos Quadros Técnicos e Científicos – Fensiq.

Assim, o decréscimo da sindicalização evolui em paralelo com a divisão sindical, expressa na constituição de sindicatos representativos dos mesmos trabalhadores. São fenómenos que ocorrem num cenário de estabilização política, maior internacionalização da economia portuguesa, grandes transformações tecnológicas e económicas, reestruturação, fragmentação e reprivatização das empresas públicas e de crescimento das assimetrias da repartição da riqueza criada pelas empresas.

Por conseguinte, uma importante característica da evolução do movimento sindical português é a sua crescente atomização. A dimensão média dos sindicatos é hoje bastante menor do que no passado recente (de 4500 em 1979-84 passou para 2900 em 1991-95), tal como ilustra o gráfico 1.


O decréscimo e atomização do sindicalismo português vão a par com uma transformação sociológica da sua composição. Os valores do quadro 1 mostram que os empregados administrativos da administração pública e do comércio, os professores e outras profissões liberais superam em número e em densidade os assalariados sindicalizados do sector secundário e do primário.

Com efeito, os sindicatos recrutam hoje mais filiados no sector de serviços (o qual contribui com 64% para a sindicalização total) do que na indústria e agricultura. Assim, o sector primário e o sector secundário, que uma década antes representavam mais de 50% da sindicalização, diminuem a sua participação na sindicalização para cerca de 35%.

Dentro dos serviços, os sectores que mais contribuem para a sindicalização são a administração pública e os transportes e comunicações, ainda, maioritariamente constituídos por empresas de capital público. Estes sectores, a que se associa o sector da educação (na sua maioria também público), são aqueles que registam uma menor quebra da taxa de sindicalização de 1979 para 1995. Quer isto significar que os níveis mais elevados de densidade sindical se localizam em actividades com relações de emprego mais estáveis e protegidas, nível alto de concentração do emprego (transportes, comunicações, administração pública, bancos, seguros e electricidade) e/ou em actividades com forte presença de um sindicalismo tradicionalmente combativo (bancos, metalurgia e metalomecânica).

Os sectores com maior densidade sindical em 1991-95 (quadro 2) são os seguintes por ordem decrescente: bancos e seguros (106%10 10 Explica que a densidade sindical ultrapasse os trabalhadores activos o facto de muitos trabalhadores afectados pelos processos de racionalização e modernização tecnológica nos últimos anos permanecerem sindicalizados, ainda que em situação pré-aposentadoria ou mesmo aposentadoria. ); transportes e comunicações (69%); indústrias da metalurgia e do metal (62%); electricidade e material eléctrico (47%); administração pública (45%); cerâmica, cimento e vidro (33%); têxtil, vestuário e calçado (31%); hotelaria e turismo e agricultura e pesca (28%); educação e alimentação bebidas e tabaco (27%), indústrias químicas e farmacêuticas (24%), comércio e escritórios (21%), indústrias extractivas (15%) e construção e obras públicas (13%).

2.2 Uma relação mais pacífica entre os actores sociais?

O enfraquecimento e transformação do movimento sindical vão a par com a diminuição do número de conflitos manifestos em greve. Assim, mais uma vez, seguindo uma evolução idêntica àquele que tem vindo a registar a maior parte dos países da OCDE e, sobretudo, os países mediterrâneos (França, Itália e Espanha), os valores estatísticos dos indicadores disponíveis sobre a conflitualidade laboral registam uma tendência significativa de decréscimo.

Como mostra o gráfico 2, o número médio de greves promovidas pelos sindicatos para fazerem aceitar as suas reivindicações, nos últimos anos, representa menos de metade daquele que registou no primeiro quinquénio dos anos 80 (42% de 1996-2000 relativamente a 1981-85). No que se refere ao número de grevistas e de dias perdidos por greve, os valores dos últimos anos, representam apenas cerca de 30% dos valores de 1986/90.


Assim, a tendência que se observa em Portugal vai no sentido do menor recurso sindical à greve. Além de menos frequente esta tende a concentrar-se sobre um número menor de trabalhadores. Sem deixar de levar em conta que esta mudança da estrutura dos conflitos possa estar associada a uma melhor gestão dos conflitos, segundo critérios de minimização dos custos para os trabalhadores, os valores traduzem, também, uma certa evolução qualitativa das greves. Esta caracteriza-se pelo desenvolvimento de conflitos que fazem referência ao grupo profissional e não à classe social. Trata-se de conflitos de natureza «corporativa» de que são exemplo os conflitos dos médicos, dos maquinistas dos caminhos-de-ferro, dos professores, dos electricistas do metropolitano, dos pilotos da aviação civil, dos professores, etc., cuja frequência tem vindo a aumentar, nos últimos anos.

Esta mudança da natureza das greves surge em paralelo com transformações da estrutura dos motivos invocados para a sua realização. Nos anos 80, as reivindicações que mais frequentemente conduziram à eclosão de conflitos laborais diziam respeito a objectivos de natureza pecuniária (59,8%). Nos anos 90, os temas salariais continuam a assumir um peso bastante importante na estrutura dos motivos que conduziram à eclosão de greves.11 11 Sugere-nos invocar três ordens de factores mais importantes para justificar este elevado peso das reivindicações salariais na estrutura dos motivos que conduziram à concretização de conflitos colectivos. O primeiro prende-se com o grande peso da negociação colectiva sectorial e com a heterogeneidade de situações cobertas. Tendo a vantagem de através de um único processo de negociação abranger um número elevado de empresas e trabalhadores, a negociação sectorial tem a desvantagem de cobrir realidades empresariais muito heterogéneas em termos de dimensão (micro-empresas e grandes empresas), modernização tecnológica, poder económico, etc. De uma forma geral, a associação patronal tem a preocupação de não negociar tabelas salariais que possam comprometer a viabilidade económica das empresas de menores recursos económicos. Ao factor anterior associa-se a longa tradição das empresas portuguesas basearem a sua competitividade em baixos custos da mão-de-obra, mais do que em inovações (tecnológicas, organizacionais, de produto, de mercado, etc.) ou na formação e na qualificação da mão-de-obra. O terceiro factor prende-se com a origem do poder sindical e com a tradição das suas políticas. Ao contrário do poder patronal que emana da detenção da propriedade e do capital, o poder sindical é muitas vezes fruto da agregação e mobilização em torno de interesses colectivos. Os temas pecuniários, num quadro de baixos salários são, naturalmente, para a acção sindical, os temas que mais unificam para lutas comuns e, portanto, susceptíveis de mobilizar os trabalhadores para a greve. Apesar disso, o seu peso regride. Em contrapartida, aumentam as greves ligadas à defesa de melhoria das condições de trabalho, nomeadamente, associadas a reivindicações sobre a redução do tempo de trabalho, a higiene e segurança no trabalho e o desenvolvimento da regulamentação colectiva,12 12 Explica o acréscimo da conflitualidade sobre a regulamentação colectiva a recusa patronal em negociar acréscimos salariais (reivindicados pelos sindicatos) sem contrapartidas em termos da introdução de uma maior flexibilidade (funcional e organização dos tempos de trabalho), rejeitada pelos sindicatos. ou seja a renegociação das convenções colectivas (quadro 3).


3 A negociação entre os parceiros sociais com diferentes dinâmicas

Em Portugal, podem celebrar convenções colectivas de trabalho, pelo lado patronal, as associações patronais (suas uniões, federações e confederações) e as próprias entidades patronais, ou seja, os empregadores/empresas; pelo lado sindical, as associações sindicais (suas uniões, federações e confederações). Embora a lei reconheça igualdade de direito de celebração de convenções colectivas a todos os níveis de representação sindical e patronal, a prática social instituída é a da contratação colectiva se fazer pelos sindicatos de base e pelas federações, no que se refere ao actor sindical e, no que respeita ao actor patronal, pelas associações patronais de base e pelos próprios empregadores/empresas.

No que se refere aos níveis da estrutura de negociação, não sendo impeditivo na lei a obediência a um princípio de hierarquia e articulação (nível intersectorial, sectorial, de empresa e estabelecimento), a prática social implementada inclui apenas dois níveis, que se desenvolvem de uma forma independente: o nível sectorial e o nível de empresa.13 13 As convenções colectivas negociadas pelas associações patronais assumem a designação de contratos colectivos de trabalho (CCT) e as convenções negociadas pelas empresas acordos colectivos de trabalho (ACT) ou acordos de empresa (AE), segundo são negociadas por mais de uma empresa ou apenas uma única empresa.

As convenções colectivas negociadas só se aplicam às relações de trabalho entre trabalhadores e entidades patronais (empresas) filiadas, respectivamente, que subscreveram ou negociaram a convenção. Contudo, a lei disponibiliza instrumentos cujo recurso tem permitido estender as normas colectivas a outras entidades que não aquelas que a negociaram. Assim, através de um acordo de adesão (AA) outras entidades (empresas e/ou associações patronais e sindicais) podem aderir à convenção negociada. Por seu lado, a Administração Pública,14 14 Departamentos do Ministério da Segurança Social e do Trabalho. pode emitir uma regulamentação de extensão15 15 Nova designação dada pelo Código de Trabalho a vigorar a partir de 1 de Dezembro de 2003. Antes tinha a denominação de Portaria de Extensão (PE). (RE) e, assim, determinar a aplicação da convenção colectiva (só no caso do CCT) a relações de trabalho entre entidades do mesmo sector e trabalhadores da mesma profissão não filiados nas associações outorgantes. No último caso, trata-se de um acto administrativo e não de uma negociação. Além da regulamentação de extensão, a lei portuguesa prevê ainda, com carácter excepcional, outra forma administrativa de regulamentação colectiva de trabalho que é a emissão de Regulamento de Condições Mínimas16 16 Nova designação dada pelo Código de Trabalho a vigorar a partir de 1 de Dezembro de 2003. Anteriormente denominava-se Portaria de Regulamentação do Trabalho (PRT). (RCM). Estes instrumentos, a que falta acrescentar a decisão de arbitragem facultativa ou obrigatória, que têm base convencional ou base administrativa, designam-se, globalmente, de instrumentos de regulamentação do trabalho (IRCT), os quais abrangem cerca de 98% dos assalariados portugueses.

A lei prevê ainda o direito à negociação colectiva das confederações sindicais e patronais, ou seja, a faculdade de poderem negociar convenções colectivas. Contudo, tal direito nunca foi até agora exercido. Em contrapartida, estas confederações, com base legal distinta, têm vindo a desenvolver negociações tripartidas (com representantes do Estado), celebrando acordos que contribuem para a definição da política de rendimentos e preços, de emprego e formação profissional (artigo 9.º da Lei n.º 108/91, de 17/8) na Comissão Permanente de Concertação Social, uma das comissões do Conselho Económico e Social. Estes acordos resultantes de uma negociação tripartida têm a particularidade de não serem fonte de direito, ou seja, não têm aplicação obrigatória. Com efeito, trata-se de compromissos orientados para a constituição de instrumentos importantes da política económica e social e que têm pretendido, sobretudo, até agora, induzir alterações legislativas, e/ou criar quadros de referência para a negociação colectiva.

Nos anos 80, os acordos de concertação social negociados reflectem preocupações de natureza macroeconómica, balizadas pela necessidade de fazer diminuírem as taxas de inflação, condição requerida pela entrada de Portugal na Comunidade Europeia. Eles, sobretudo, constituíram referências de rendimentos e preços, com vista a influenciar os acréscimos negociais salariais das convenções colectivas. Na década de 90, o leque das matérias dos acordos negociados na macro concertação é muito amplo. Além dos referenciais negociais salariais a concertação social desenvolvida no Conselho Económico e Social teve um papel muito importante na revisão da legislação laboral, ou seja, na flexibilização das leis do trabalho. Ela procurou ainda influenciar conteúdos não pecuniários das convenções colectivas, nomeadamente o regime sobre a redução da organização do tempo de trabalho, as classificações profissionais, o trabalho a tempo parcial, a formação profissional, a igualdade de direitos no que se refere à maternidade e paternidade, etc.

Em 2002, a macro concertação teve um papel muito activo na negociação de um anteprojecto à proposta de lei de um novo Código de Trabalho que veio a entrar em vigor em 1 de Dezembro de 2003, depois de aprovado na Assembleia da República. Objecto de forte contestação sindical, sobretudo por parte da CGTP-IN, que na tentativa de o inviabilizar mobilizou várias jornadas de luta e uma greve geral, este Código vem a introduzir uma maior flexibilidade a algumas vertentes jurídicas das relações de trabalho. As matérias sindicalmente mais contestadas foram o alargamento de três para seis anos do regime de contratos a prazo, a diminuição do tempo de trabalho nocturno (das 20 às 22 horas deixou de ser considerado trabalho nocturno), a não obrigatoriedade de reintegração do trabalhador em caso de decisão do Tribunal de Trabalho, o acréscimo das possibilidades de mobilidade geográfica dos trabalhadores e a caducidade das convenções colectivas. O último aspecto não estava previsto em diploma legal anterior. A opinião dos sindicatos é que vai reforçar as posições patronais à não negociação, numa estratégia de acabar com a contratação colectiva

3.1 Uma negociação pouco descentralizada

Como escrevemos atrás, uma das tendências maiores de evolução da negociação colectiva no plano internacional é a sua descentralização, pressionada pelos processos de reestruturação das empresas e transformações técnico-organizacionais e pela necessidade de aproximar as normas negociadas com a sua aplicação. Com efeito, durante muitos anos, na generalidade dos países, a negociação de ramo, tendeu a ser privilegiada pelo conjunto das organizações patronais e sindicais. Para o patronato, a negociação de ramo ou de sector de actividade tinha a vantagem de permitir exercer algum controlo sobre a harmonização das condições sociais da concorrência entre empresas. Para os sindicatos, a negociação de ramo permitia uma maior homogeneização das condições dos salários e do emprego e a garantia de «de um mínimo» para o conjunto dos trabalhadores abrangidos.

Em Portugal, após a instauração do direito constitucional à livre contratação, também os actores sociais consideraram ser de privilegiar a negociação colectiva de ramo sobre qualquer outro nível. De facto, a negociação de ramo, que abrange cerca de 85,5% dos assalariados abrangidos por contratação colectiva, surgiu bem adaptada às características das empresas portuguesas, na medida em que a sua dimensão média não ultrapassa uma dúzia de pessoas. Além disso, mais de 80% são micro-empresas e apenas 1,1% das empresas empregam mais de 100 trabalhadores.

Como já referimos, a negociação de empresa, que de uma forma geral tende a regulamentar condições mais favoráveis para os trabalhadores, limitou-se quase exclusivamente às grandes empresas, na sua maioria, na época, de capital público. Esta negociação tem a particularidade de ser desenvolvida de uma forma autónoma sem qualquer ligação com a negociação sectorial. Tal acontece porque algumas destas empresas representavam o próprio sector, de que é exemplo a EDP, ligada à produção e distribuição da electricidade.

Ainda que os actores sociais, ao longo dos anos, tenham vindo a defender a necessidade de desenvolver a negociação de empresa, num processo de articulação com a negociação sectorial, tal não vem a ocorrer na prática, como mostra o gráfico 3.


Assim, ao longo dos anos, as convenções sectoriais assumem uma representatividade de aproximadamente 75%. O que quer dizer que, de uma forma geral, as normas reguladoras das relações de emprego são definidas num nível muito afastado das realidades concretas das situações de trabalho. Este afastamento, o conflito de interesses entre sindicatos e empregadores em torno da revisão das normas convencionais das matérias não pecuniárias e o acantonamento dos sindicatos, sobretudo, da tendência CGTP-IN, em torno da defesa dos "direitos adquiridos pelos trabalhadores" conduziram a que as novas convenções se tenham limitado praticamente a regulamentar acréscimos salariais.

Durante alguns anos as lutas sindicais foram capazes de mobilizar os trabalhadores para uma acção colectiva, capaz de impor a negociação salarial. Contudo, esta capacidade diminui à medida que o movimento sindical enfraquece e se transforma sociologicamente. Além disso, nos últimos anos, os empregadores e as associações patronais têm vindo a fazer depender da negociação sobre acréscimos salariais, modificações mais qualitativos da relação de trabalho, nomeadamente, a flexibilidade da organização do tempo de trabalho, o conteúdo funcional dos trabalhadores, as classificações profissionais, etc. Em consequência disso, o número de contratos colectivos de trabalho publicados tem vindo a diminuir desde há cerca de uma década, sem que a negociação de empresa se tenha vindo a desenvolver em termos numéricos de uma forma muito significativa.

Com efeito, o acréscimo do número de acordos de empresa na última década (gráfico 4) deve-se mais à negociação de novas convenções nas empresas públicas reprivatizadas, ou seja, em empresas onde tradicionalmente os actores sociais já negociavam convenções de empresa, do que à descentralização da negociação sectorial. Aliás, a percentagem de trabalhadores cobertos por acordos de empresa diminui mesmo cerca de 1% (1994 a 1999), na medida em que o processo de reestruturação e reprivatização das empresas públicas levou à saída de muitos trabalhadores (por via de pré-reformas ou negociação de saídas com os próprios).


3.3 Os conflitos sobre a reestruturação das empresas e a flexibilidade do emprego

As características organizativas dos actores e as fragilidades apontadas da negociação colectiva explicam que, no caso português, haja lugar a uma fraca «regulação conjunta» (Reynaud, 1995) da planificação, preparação e implementação da reestruturação das empresas e das suas transformações tecnológicas e organizativas. Um estudo longitudinal elaborado a todos os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho permitiu constatar que os actores institucionais não negociaram qualquer convenção colectiva formal orientada especificamente para os problemas postos pela implementação de novas tecnologias nas empresas. Os resultados desse estudo mostraram ainda que a abordagem das implicações sociais das transformações tecnológicas e organizativas nas convenções colectivas normais, basicamente, assume uma reacção defensiva e a posteriori da parte sindical (Cerdeira, 2001).

Deste modo, de uma forma geral, o redimensionamento de efectivos e as saídas dos trabalhadores das empresas é negociado directamente pelos gestores com os trabalhadores directamente afectados. Mesmo no caso das empresas públicas, o papel dos sindicatos foi orientado quer para a denúncia e tentativa de impedir os processos de reestruturação (normalmente associados à divisão das empresas e redução de efectivos), quer para o controlo da aplicação da legislação em vigor (ou criada) em termos de contrapartidas financeiras.

As estratégias sindicais de defesa do emprego, sobretudo da tendência CGTP-IN, integraram, ainda, a resistência à flexibilização das normas e, sobretudo, à modificação dos sistemas de classificação profissional e matérias afins (designações profissionais, conteúdos funcionais, progressão profissional, etc.). Com efeito, sendo centrais na definição das condições de trabalho, as matérias sobre classificação profissional, são-o igualmente nos conflitos sobre reestruturações e transformações técnico-organizativas das empresas, face à a ausência de uma intervenção sindical no seu planeamento e implementação.

3.4 As classificações profissionais: um tema de negociação em forte progressão

Apesar da grande estabilidade da negociação colectiva quer na sua estrutura quer no seu conteúdo, na segunda metade dos anos 90, a situação modificou-se ligeiramente. Assim, como já referimos, assiste-se a um acréscimo ligeiro do número de convenções de empresa e à dinamização da negociação colectiva de temas não exclusivamente pecuniários. Assim, cerca de 20% das convenções publicadas anualmente têm vindo a rever matérias não apenas salariais. Por pressão e iniciativa patronal, os temas mais frequentemente renovados têm a ver com as classificações profissionais (designações, conteúdos, hierarquização profissional e carreiras), temas sobre os quais, como referimos, os actores sociais centram os conflitos postos pelas transformações tecnológicas e organizativas. Estes temas representam 23,3% das matérias não salariais das convenções colectivas, com um peso ligeiramente maior nos acordos de empresa. Os acordos concluídos mostram, ainda, que a sua negociação envolveu directamente os actores sem intermediação dos serviços públicos de conciliação, revelando que é em seu torno que emergem novas dinâmicas de negociação.

Depois das classificações profissionais segue-se por ordem decrescente: a duração do tempo normal do trabalho e adaptabilidade de horários (20,2%); férias, faltas e descanso semanal (13,6%) e protecção na maternidade e na paternidade (10,7%).

A análise da evolução do conteúdo das matérias negociadas das convenções colectivas (ACT/AE+CCT) permite ainda sublinhar que é ao nível da empresa e não do sector que se tem vindo a registar a maior dinâmica de renovação dos conteúdos não salariais de 1997 a 2001. Esta observação fundamenta-se no facto de o número médio de acordos de empresa publicados de 1997 a 2001 representar apenas 31% do total do número de convenções negociadas nos mesmos anos. Em contrapartida, os temas não salariais negociados e publicados nos acordos de empresa assumem um peso de 46,7% do total dos temas não salariais do conjunto das convenções colectivas negociadas no mesmo período de tempo (quadro 4).


Outra constatação que ressalta da análise efectuada prende-se com o facto da renovação dos conteúdos dos AE/ACT assumir um carácter mais autónomo do que nos CCT, querendo isto significar a sua maior independência relativamente à publicação de diplomas legislativos. Com efeito, a maior proximidade do nível de negociação da sua aplicação suscita o envolvimento e o compromisso dos actores em torno de problemas muito mais específicos à empresa. Acresce que, de uma forma geral, os AE regulam estatutos de trabalho muito mais favoráveis aos trabalhadores do que os CCT. Por exemplo, a generalidade dos AE/ACT já definiam uma duração normal do tempo de trabalho à volta de 40 horas (ou inferior) quando a Lei (21/96) que vem impor essa duração máxima do tempo de trabalho foi publicada; em contrapartida, a maior parte das convenções sectoriais inscreviam a situação inversa, definindo muitas delas uma duração normal do tempo de trabalho superior a 44 horas. Uma observação equivalente pode ser feita relativamente ao tema do direito à protecção na maternidade e paternidade. Estas notas explicam a diferente hierarquização da estrutura dos temas mais negociados e reflexo maior dos conteúdos dos CCT relativamente à legislação então publicada.17 17 Referimos em particular: a Lei n.º 18/98, de 28 de Abril, sobre a protecção na maternidade e paternidade e o Decreto-lei n.º 21/96, de 23 de Julho, sobre a duração e a organização do tempo de trabalho.

Notas conclusivas

O quadro de internacionalização crescente e concorrência acrescida confronta hoje os actores sociais com novos problemas e cria fortes pressões sobre as relações laborais na generalidade dos países. Contudo, as lógicas de transformação dos sistemas nacionais destas relações são variáveis respondendo a situações de partida diferenciadas, tendo em conta a trajectória de cada país tanto nesse plano como no domínio da relação salarial.

Assim, se no que se refere ao nível em que são negociadas as condições de gestão do emprego, os diferentes sistemas nacionais mostram uma forte tendência para a descentralização a favor da empresa, essa tendência não se traduziu, em alguns países, na diminuição da importância do nível sectorial. Além disso, também se exprime em diferentes modalidades desde a «descentralização coordenada» como nos casos da França, Alemanha e Holanda, à «descentralização desorganizada» como nos casos do Reino Unido e dos Estados Unidos.

No caso português não se tem vindo a registar qualquer tendência para a perda de importância do nível sectorial, predominante após a instituição dos direitos de associação livre e independente e de negociação colectiva, ainda que nos anos 90 tenha vindo a ser caracterizada por uma certa inércia. Em contrapartida, na última década, afirmou-se a presença crescente da macro-concertação, via utilizada pelo Estado, por um lado, para balizar os acréscimos salariais da negociação colectiva e, por outro lado, para a produção da legislação laboral.

Podemos mesmo dizer que a macro-concertação tem procurado dinamizar a negociação sectorial, exercendo influência sobre a sua agenda, em particular nos domínios em que se tem vindo a procurar a flexibilização: redução do tempo de trabalho e da sua adaptabilidade, polivalência funcional, etc.

No que se refere às tendências de evolução das lógicas de flexibilização, aponta-se o facto de ser predominante a flexibilidade quantitativa. De qualquer forma, a flexibilidade, tal como noutros países, tem vindo a afirmar-se em diversos domínios, quer no plano do emprego, afirmando-se na liberalização tanto das formas de emprego (contratos de duração determinada, trabalho temporário, independentes, etc.), como na organização do trabalho e do tempo de trabalho.

Para terminar importa sublinhar que se a negociação de normas que permitam melhorar a competitividade das empresas, e, ao mesmo tempo, a qualidade e segurança do emprego é uma questão central que hoje se põe aos actores sociais em todos os países, em Portugal, o diálogo social entre os parceiros sociais tem vindo a enfrentar várias dificuldades que passam pela debilidade do tecido económico e pela política de rigor salarial seguida pelos diferentes governos. Além disso, a relação salarial fordista, institucionaliza-se em Portugal quando começa a entrar em crise nos países industrializados e esteve associada mais a motivações de ordem política do que ao desenvolvimento da negociação colectiva economicamente sustentada.

Tais debilidades, conjugadas com a pressão para a flexibilidade do emprego, geraram estratégias sindicais fortemente centradas sobre a defesa da «melhoria do poder de compra dos assalariados» e do «legalmente adquirido», o que significa dizer, das normas legais e convencionais instituídas nos anos 70. A partir da segunda metade dos anos 80, o diálogo entre os parceiros sociais conhece, então, duas velocidades bem diferentes: o diálogo na macro concertação é dinâmico e suscita acordos de conteúdos muito variados, embora incompletos e nem sempre estáveis, devido, por exemplo, ao facto dos acordos não reunirem a aprovação da totalidade dos actores, sobretudo da CGTP-IN; a negociação sectorial restringe-se, em grande parte, às matérias salariais da contratação colectiva, deixando para um nível mais informal os planos sociais associados com os processos de reestruturação das empresas e com sua modernização tecnológica e organizacional.

Contudo, embora, a adaptação do volume da mão-de-obra continue a ser difícil de negociar, permanecendo, portanto, uma prerrogativa essencial do empregador, já a sua adaptação qualitativa (flexibilidade funcional) tem vindo a suscitar alguns compromissos ao nível da empresa importantes nos últimos anos. Importa, no entanto, sublinhar duas particularidades importantes destes compromissos. Uma delas prende-se com o facto de ser desenvolvida, de uma forma geral, em empresas ou sectores com níveis de sindicalização elevados. A outra, por dar lugar a uma nova forma de negociação, denominada de concessão (Sengenberger, 1992), por oposição à negociação distributiva típica dos anos 70/80.18 18 Enquanto a negociação distributiva desemboca em acordos que relativamente ao anterior traziam vantagens adicionais para os trabalhadores, a negociação de concessão é uma negociação de tempos de crise que se caracteriza por cada actor, sobretudo o actor sindical, limitar as suas pretenções. Esta negociação desemboca em acordos de tipo "ambos ganham" ( concession bargaining). São deste tipo os acordos de moderação salarial, negociados na macroconcertação, com vista ao de metas orientadas para a estabilização económica do país. Esta constatações, bem como o facto do novo Código do Trabalho permitir a denúncia das convenções em vigor há mais de um ano, põem, então, o problema de saber se no estado actual do sistema de relações laborais, os sindicatos, têm capacidade para estender e generalizar novos compromissos sobre o emprego.

Recebido: 15/03/2004

Revisado: 13/05/2004

Aceite final: 03/06/2004

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  • 1
    Este artigo insere-se no projecto de investigação, intitulado "As formas flexíveis de emprego: riscos e oportunidades", financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (POCTI N.º 33042/SOC/2000), bem como no projecto de cooperação "Transformações do Trabalho e do Emprego no Contexto da Reestruturação Económica" no âmbito do Convénio GRICES/CAPES (Brasil) e SOCIUS/ISEG-UTL (Portugal).
  • 2
    No seguimento de Hyman (2002) entendemos por relações laborais (do latim labõre) a regulação, numa acepção lata, do trabalho e do emprego. Essa regulação integra tanto regras formais (acordos internos, convenções colectivas, leis, regulamentações, etc.) como informais (nomeadamente fundadas sobre os costumes e as tradições) e abrange uma teia complexa de processos sociais e um campo de resistência, ou seja, uma luta real e potencial. O termo é conceptualmente idêntico ao de relações industriais
    (industrial relations) e relações profissionais (
    relations professionnelles), reflectindo as designações adoptadas, respectivamente, nas tradições linguísticas anglo-saxónica e francesa. A proximidade conceptual permite a sua utilização indistinta. Apesar disso, nós privilegiamos a expressão relações laborais, por considerarmos mais ajustado à língua portuguesa.
  • 3
    Entendemos por relações de emprego, as condições de contratação do trabalhador por parte da empresa e de prestação do trabalho por parte deste no seu seio.
  • 4
    União Geral de Trabalhadores.
  • 5
    Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses – Intersindical Nacional.
  • 6
    Por «corporatismos profissionais», entendemos a autonomização em sindicatos próprios de grupos profissionais com estatuto privilegiado na empresa ou na sociedade, ou seja, profissionais com forte poder reivindicativo, quer pela sua competência técnica e raridade no mercado de trabalho (médicos, juízes, etc.) quer pela sua posição estratégica na empresa ou serviço público (pilotos da aviação comercial, electricistas do metropolitano, trabalhadores dos impostos, etc.).
  • 7
    Para a resolução de conflitos colectivos relacionados com o processo de negociação a legislação prevê conciliação, a mediação e arbitragem. Enquanto a conciliação pode ser solicitada por qualquer uma das partes e até agora tem vindo a ser feita exclusivamente por técnicos especializados do MSST, a mediação é realizada por um mediador escolhido pelas partes e aceite por ambas. A arbitragem é realizada por três árbitros, dois deles nomeados por cada uma das partes e o terceiro escolhido pelos dois precedentes.
  • 8
    A densidade sindical ultrapassa mesmo 100% na medida em que muitos trabalhadores afectados pelos processos de racionalização e modernização tecnológica, nos últimos anos, permanecerem sindicalizados, ainda que em situação pré-aposentadoria ou mesmo aposentadoria, como forma de acederem aos serviços de saúde.
  • 9
    Esta expressão é utilizada para designar o sindicalismo não integrado nas duas confederações mais importantes: UGT e CGTP-IN. A título de exemplos referem-se a criação dos sindicatos: Independente do Sector Energético (1995), Independente dos Trabalhadores da Indústria e Construção (1998) e Independente dos Trabalhadores do Sector Empresarial da Cerâmica, dos Cimentos, do Vidro e Actividade Conexas dos Distritos de Braga, Porto e Viana do Castelo.
  • 10
    Explica que a densidade sindical ultrapasse os trabalhadores activos o facto de muitos trabalhadores afectados pelos processos de racionalização e modernização tecnológica nos últimos anos permanecerem sindicalizados, ainda que em situação pré-aposentadoria ou mesmo aposentadoria.
  • 11
    Sugere-nos invocar três ordens de factores mais importantes para justificar este elevado peso das reivindicações salariais na estrutura dos motivos que conduziram à concretização de conflitos colectivos. O primeiro prende-se com o grande peso da negociação colectiva sectorial e com a heterogeneidade de situações cobertas. Tendo a vantagem de através de um único processo de negociação abranger um número elevado de empresas e trabalhadores, a negociação sectorial tem a desvantagem de cobrir realidades empresariais muito heterogéneas em termos de dimensão (micro-empresas e grandes empresas), modernização tecnológica, poder económico, etc. De uma forma geral, a associação patronal tem a preocupação de não negociar tabelas salariais que possam comprometer a viabilidade económica das empresas de menores recursos económicos. Ao factor anterior associa-se a longa tradição das empresas portuguesas basearem a sua competitividade em baixos custos da mão-de-obra, mais do que em inovações (tecnológicas, organizacionais, de produto, de mercado, etc.) ou na formação e na qualificação da mão-de-obra. O terceiro factor prende-se com a origem do poder sindical e com a tradição das suas políticas. Ao contrário do poder patronal que emana da detenção da propriedade e do capital, o poder sindical é muitas vezes fruto da agregação e mobilização em torno de interesses colectivos. Os temas pecuniários, num quadro de baixos salários são, naturalmente, para a acção sindical, os temas que mais unificam para lutas comuns e, portanto, susceptíveis de mobilizar os trabalhadores para a greve.
  • 12
    Explica o acréscimo da conflitualidade sobre a regulamentação colectiva a recusa patronal em negociar acréscimos salariais (reivindicados pelos sindicatos) sem contrapartidas em termos da introdução de uma maior flexibilidade (funcional e organização dos tempos de trabalho), rejeitada pelos sindicatos.
  • 13
    As convenções colectivas negociadas pelas associações patronais assumem a designação de contratos colectivos de trabalho (CCT) e as convenções negociadas pelas empresas acordos colectivos de trabalho (ACT) ou acordos de empresa (AE), segundo são negociadas por mais de uma empresa ou apenas uma única empresa.
  • 14
    Departamentos do Ministério da Segurança Social e do Trabalho.
  • 15
    Nova designação dada pelo Código de Trabalho a vigorar a partir de 1 de Dezembro de 2003. Antes tinha a denominação de Portaria de Extensão (PE).
  • 16
    Nova designação dada pelo Código de Trabalho a vigorar a partir de 1 de Dezembro de 2003. Anteriormente denominava-se Portaria de Regulamentação do Trabalho (PRT).
  • 17
    Referimos em particular: a Lei n.º 18/98, de 28 de Abril, sobre a protecção na maternidade e paternidade e o Decreto-lei n.º 21/96, de 23 de Julho, sobre a duração e a organização do tempo de trabalho.
  • 18
    Enquanto a negociação distributiva desemboca em acordos que relativamente ao anterior traziam vantagens adicionais para os trabalhadores, a negociação de concessão é uma negociação de tempos de crise que se caracteriza por cada actor, sobretudo o actor sindical, limitar as suas pretenções. Esta negociação desemboca em acordos de tipo "ambos ganham" (
    concession bargaining). São deste tipo os acordos de moderação salarial, negociados na macroconcertação, com vista ao de metas orientadas para a estabilização económica do país.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Nov 2004
    • Data do Fascículo
      Dez 2004

    Histórico

    • Recebido
      15 Mar 2004
    • Aceito
      03 Jun 2004
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