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As centrais sindicais brasileiras e a reestruturação produtiva: análises e propostas

The Brazilian labor federations and productive restructuring: considerations e proposals

Les centrales syndicales brésiliennes et la restructuration productive: analyses et propositions

Resumos

O presente artigo analisa o entendimento de três Centrais sindicais brasileiras - a Central Única dos Trabalhadores (CUT), a Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT) e a Força Sindical (FS) - sobre o processo global de reestruturação produtiva e os seus impactos no Brasil. Além disso, ele analisa as propostas de ação sindical defendidas pelas Centrais no sentido de fazer frente ao quadro em curso.

Centrais sindicais; Reestruturação produtiva; Trabalhadores; Mundo do trabalho; Sindicalismo


This article examines the views of three Brazilian Labor Federations, Central Única dos Trabalhadores-CUT, Central Geral dos Trabalhadores-CGT and Força Sindical-FS, on the global process of productive restructuring and its impacts in Brazil. Besides, it examines the labor action proposals put forward by the three Federations to face the scenario that is under way.

Labor Federations; productive restructuring; workers; World of Labor; labor movement


Cet article analyse la manière dont trois centrales syndicales brésiliennes - Centrale Unique des Travailleurs (CUT), Confédération Générale des Travailleurs (CGT) et Force Syndicale (FS) - considèrent le processus global de restructuration productive et ses impacts sur le Brésil. Il analyse également les propositions d’action syndicale plaidées par les centrales afin de faire face à l’enjeu actuel.

centrales syndicales; restructuration productive; travailleurs; monde du travail; syndicalisme


DOSSIÊ

As centrais sindicais brasileiras e a reestruturação produtiva: análises e propostas

The Brazilian labor federations and productive restructuring: considerations e proposals

Les centrales syndicales brésiliennes et la restructuration productive: analyses et propositions

Marco Aurélio Santana

Professor Adjunto de Sociologia do Departamento de Filosofia e Ciências Sociais e do Mestrado em Memória Social e Documento da Universidade do Rio de Janeiro (UNIRIO)

RESUMO

O presente artigo analisa o entendimento de três Centrais sindicais brasileiras - a Central Única dos Trabalhadores (CUT), a Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT) e a Força Sindical (FS) - sobre o processo global de reestruturação produtiva e os seus impactos no Brasil. Além disso, ele analisa as propostas de ação sindical defendidas pelas Centrais no sentido de fazer frente ao quadro em curso.

Palavras-chave: Centrais sindicais - Reestruturação produtiva – Trabalhadores - Mundo do trabalho - Sindicalismo

ABSTRACT

This article examines the views of three Brazilian Labor Federations, Central Única dos Trabalhadores-CUT, Central Geral dos Trabalhadores-CGT and Força Sindical-FS, on the global process of productive restructuring and its impacts in Brazil. Besides, it examines the labor action proposals put forward by the three Federations to face the scenario that is under way.

Key words: Labor Federations, productive restructuring, workers, World of Labor, labor movement.

RESUMES

Cet article analyse la manière dont trois centrales syndicales brésiliennes - Centrale Unique des Travailleurs (CUT), Confédération Générale des Travailleurs (CGT) et Force Syndicale (FS) - considèrent le processus global de restructuration productive et ses impacts sur le Brésil. Il analyse également les propositions d’action syndicale plaidées par les centrales afin de faire face à l’enjeu actuel.

Mots-clé: centrales syndicales; restructuration productive; travailleurs; monde du travail; syndicalisme.

1. Introdução1 1 Este artigo toma por base uma parte dos resultados da pesquisa "As Centrais Sindicais e os Novos Conceitos de Produção", coordenada pela profa. Neise Deluiz, subprojeto da pesquisa "O Papel da Educação face aos Novos Conceitos de Produção", desenvolvido na Faculdade de Educação da UFRJ, no período de 1998/1999, através do convênio FINEP/FNDCT/BID. Outros resultados da mesma podem ser encontrados em Souza, Santana e Deluiz (1999). Queria agradecer aos amigos Donaldo Bello de Souza e Neise Deluiz pelos enriquecedores comentários que fizeram ao longo das discussões da pesquisa. Gostaria de agradecer aos pareceristas de Sociologias pelas sugestões feitas ao texto.

As profundas transformações por que passa o mundo do trabalho ao redor do globo têm sido alvo de uma série de pesquisas e suscitado variada gama de debates. No caso brasileiro, já é de grande monta a literatura sobre o tema2 2 A prática dos sindicatos no mundo atual, no Brasil e no exterior, em perspectivas bastante variadas, pode ser encontrada, entre outros, em Hyman (1996), Larangeira (1998), Rodrigues e Ramalho (1998), Castro e Wachendorfer (1998), Lojkine (1999), Carvalho Neto e Carvalho (1999), Boito Jr. (1999) e Rodrigues (1999). . Os mais diversos aspectos têm sido perscrutados no sentido de se compreender a escala dos impactos das referidas mudanças. Um desses aspectos, que tem certo destaque, é aquele que se refere aos reflexos de todo esse processo sobre os trabalhadores, seja com relação à sua vida no trabalho, seja em relação às suas formas organizativas.

Uma das características mais sentidas por esses estudos é a identificação das enormes dificuldades que têm sido impostas aos sindicatos. Como em nenhuma outra conjuntura recente, em escala mundial, os sindicatos vêm sendo submetidos a intensa pressão. Os fatores são muitos e conhecidos. Tomemos aqui as indicações de Rodrigues (1998), que faz uma síntese que, embora não exaustiva, pode auxiliar-nos em termos esquemáticos. Segundo ele, alguns pontos estariam servindo de base à diminuição das taxas de sindicalização, o que, de certa forma, poderia indicar o enfraquecimento do poder sindical3 3 A leitura da diminuição das taxas não só de sindicalizados como também do próprio número de trabalhadores empregados e de seu impacto sobre os sindicatos, como o próprio autor já indica, pode ser feita de diversas formas, tendo resultados diferentes. Em seu estudo sobre os metalúrgicos do ABC paulista, Comin et al. (1997:439), por exemplo, assinalam que "A redução do contingente absoluto de trabalhadores, contudo, não significa necessariamente o enfraquecimento dos sindicatos(...). As evidências empíricas mobilizadas apontam para o fato de que a força de trabalho que tende a sobreviver empregada no setor é precisamente aquela que constitui o núcleo mais denso de sustentação dos sindicatos, isto é, trabalhadores produtivos mais maduros, mais qualificados, com maior tempo de emprego, com escolaridade relativamente mais elevada e empregados nas grandes empresas". Por sua vez, Ramalho e Santana (1999) constatam que, no caso dos metalúrgicos do RJ, esta diminuição númerica afetou pofundamente as ações do sindicato. . Entre esses aspectos relevantes estariam incluídos: primeiro, as mudanças na estrutura do emprego provocadas pelo avanço tecnológico e pela automação. Com isso, reduzir-se-ia o volume de trabalhadores manuais, que apresentavam maior propensão à sindicalização. Segundo, o aumento do volume de trabalhadores contratados em meio período (ou em emprego precário), a subcontratação, o aumento da utilização de mulheres de meia idade em tempo parcial, as altas taxas de desemprego, etc. Terceiro, uma maior capacidade de transferência e desconcentração de indústrias, o que possibilitaria a destruição de antigas bases do sindicalismo. Quarto, a introdução, no plano interno das empresas, de novas técnicas de relações humanas e de gerenciamento menos autoritárias, destinadas a desestimular a sindicalização.

Além desses elementos, em alguma medida mais vinculados às relações de trabalho e à vida produtiva no interior das empresas, Rodrigues (1998) menciona os fatores políticos, ideológicos e eleitorais que podem também estar contribuindo, em termos do contexto geral, para a baixa das taxas de sindicalização e a correspondente crise dos sindicatos. Entre eles, poderiam ser listados: a existência de "governos amigos" ou de "governos inimigos" dos sindicatos, geralmente governos social-democratas ou trabalhistas, no primeiro caso, ou governos conservadores, no segundo; a natureza da organização sindical, do sistema de negociação mais centralizada, menos centralizada; o fim dos regimes socialistas do Leste Europeu e as derrotas eleitorais de partidos de esquerda na década dos oitenta e o avanço das concepções liberais e individualistas, conjuntamente com o declínio das concepções holísticas e a hostilidade de parte importante da opinião pública com relação aos sindicatos.

Os efeitos de todo este quadro de mudanças e crise já poderiam ser sentidos na vida organizacional e na prática dos sindicatos. A década de oitenta, que foi o grande laboratório para tais alterações no campo sindical ao redor do globo, é um grande exemplo disso, com o declínio das taxas de sindicalização, perda do poder sindical e redução dos índices mobilizatórios. Em seu conjunto os resultados não foram nada favoráveis aos sindicatos4 4 Como indica Antunes (1993: 67), além da redução do número de greves em vários países centrais, foi sensível o aumento de "casos de corporativismo, xenofobia e racismo no interior da própria classe trabalhadora. Tudo isto permite constatar que o movimento sindical se encontra numa crise de proporções nunca vistas". .

O caso brasileiro, apesar de suas especificidades, não se desenvolveu de modo muito distinto. Nosso sindicalismo, que andara no contrafluxo da crise do movimento sindical internacional, nos anos oitenta, conseguindo apresentar altos índices de mobilização5 5 Para uma análise das greves na década de oitenta ver Noronha (1991). , não logrou manter o ímpeto na década seguinte6 6 Boito Jr. (1999, p. 204) avalia que "O fato mais importante para entender o refluxo e a moderação do movimento sindical é a ofensiva neoliberal." Articulando o cenário brasileiro com o panorama geral, ele assinala que "Essa ofensiva é um fenômeno internacional e está vinculada a fatores econômicos e políticos que se processam também em escala internacional." . Com o Brasil entrando firmemente na lógica global que impõe novos processos socioeconômicos, com correlatas mudanças no mundo da organização da produção e do trabalho, o sindicalismo brasileiro já se sente impactado por tais transformações, vivendo também seus duros momentos7 7 Por exemplo, em seu estudo sobre os metalúrgicos do Rio de Janeiro, Ramalho e Santana (1999, p. 10 e segs.), verificam a verdadeira devastação que atingiu o setor metalúrgico do RJ – com processos como a redução drástica dos postos de trabalho, diminuição do tamanho das empresas, introdução de novas formas de gestão e de tecnologia da produção e crescimento do desemprego. Também outras estratégias como a terceirização fizeram surgir novas empresas de serviços, em boa parte dos casos, formada por ex-funcionários, mas com condições de trabalho mais precárias. Esses problemas se agravaram com a crise do setor naval, que praticamente desapareceu ao longo da década de 90. Como um todo, segundo os autores, constata-se uma situação de muita dificuldade para os trabalhadores metalúrgicos e para o seu sindicato, tanto no campo de organização política quanto no campo da sustentação financeira. A organização sindical vem sofrendo com a redução do número de operários da categoria e de sócios do sindicato, o que tem resultados imediatos no nível de participação nas atividades do sindicato, que também decresce vertiginosamente. O depoimento dos dirigentes aponta, entre outras coisas, um decréscimo bastante sensível na massa de votantes recente (1999, cerca de 5 mil), se comparada aos números da eleição anterior (1996, cerca de 10 mil), sendo que a mesma guarda certa relação com o número de associados. .

O processo de "modernização" da produção e das relações de trabalho, vai ocorrendo em nosso país pela sua forma mais conservadora e desagregadora. A "flexibilização" deu passos largos em termos das relações e contratos de trabalho. Os impactos das mudanças ameaçam exatamente o pólo organizado e formalizado das relações de trabalho8 8 Ver, entre outros, Martins e Ramalho (1994) e Druck (1999). . O formal vai virando informal, e ambos vêem incrementada sua precarização. Isto ocorre nas mais diversas categorias profissionais. Os diferenciados tipos de contrato e formas de trabalho têm encontrado muita aceitação e rápidas perspectivas de implementação pelas elites empresariais e governantes. Tudo isso, com um pano de fundo caracterizado por elevados índices de desemprego, tem trazido sérios reveses ao sindicalismo nacional.

Contudo, se encontra-se sob os duros efeitos da reestruturação produtiva, o sindicalismo brasileiro vai dando sinais de que procura enfrentar o novo contexto. Para pautar suas ações presentes e futuras, o movimento sindical de nosso país tem desenvolvido análises que melhor o orientem em seus passos. Este artigo visa apresentar e discutir de que forma o sindicalismo brasileiro tem analisado o contexto em que se encontra e quais as maneiras avalia serem importantes para enfrentá-lo. Para que tenhamos uma noção mais abrangente dos projetos nacionais desse sindicalismo, transcendendo categorias e setores particulares, centrar-se-á foco em três de suas centrais sindicais: a Central Única dos Trabalhadores (CUT), a Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT) e a Força Sindical (FS).9 9 As três centrais foram escolhidas, como centro da análise deste texto, tendo em vista o que se avaliou ser sua representatividade no cenário político nacional. Além disso, no âmbito geral da pesquisa, por serem as únicas entidades sindicais que, atualmente, deliberam no Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (CODEFAT), espaço que tem obtido certa centralidade na política institucional de parcela importante do sindicalismo brasileiro. Para uma análise do surgimento e do desenvolvimento das centrais, ver Rodrigues (1991) e Cardoso (1999).

A análise do entendimento das centrais acerca do mundo contemporâneo pode lançar luz sobre suas formas de atuação. Embora possam não corresponder estritamente a todas as políticas empreendidas pelas entidades em questão - devemos lembrar as discrepâncias entre as deliberações de congressos e a prática cotidiana dos sindicatos -, elas podem indicar-nos, ao menos, alguns eixos que informam as ações e intervenções de seus formuladores10 10 Vale lembrar que as fontes utilizadas como base de nossa análise correspondem, em grande medida, a deliberações de congressos e reuniões sindicais. Portanto, o material está diretamente relacionado com a correlação de forças no interior das entidades no momento de sua elaboração. Ele não esgota toda a tensão e divergências de opiniões existentes na política sindical. Porém, tendo isso em mente, deve-se dizer também que, quer tenha vindo apenas das definições das forças hegemônicas e/ou do embate e consenso de posições entre estas e as demais, ele é o documento oficial das centrais, correspondendo, ou ao menos deveria, à posição majoritária que orientaria cada central. . Isso fornecerá elementos para uma maior compreensão da prática de parte importante do movimento dos trabalhadores brasileiros. Com isso, tem-se a possibilidade de entender não só a prática das centrais, mas também as idéias que podem estar informando essa prática.

O texto está dividido de forma que cada central tenha sua seção. Cada seção é subdividida em outras três. Uma, na qual se indica a leitura que cada uma das centrais faz do processo de mudança em curso em termos gerais; a segunda, traz a análise das centrais acerca dos impactos do processo no Brasil; e, por último, apresentam-se as propostas de ação sindical advogadas pelas centrais.

2. A CUT e as transformações no mundo do trabalho

2.1 A crítica ao cenário geral

Na análise da CUT, expressa no texto referência sobre Reestruturação Produtiva adotado pela 7a Plenária Nacional da entidade (CUT, 1995b), o processo de reestruturação produtiva em nível internacional teria tomado impulso a partir das crises pelas quais passaram os países desenvolvidos em fins dos anos sessenta e início dos setenta. Ele teria como seus componentes mais marcantes: A geração e a rápida difusão de inovações tecnológicas, organizacionais e gerenciais (CUT, 1995b, p. 2-3). Este comporia um cenário no qual:

A utilização crescente de componentes de base microeletrônica e dos recursos da informática em produtos e processo industrial tem levado a mudança da base técnica de um conjunto de indústrias, à expansão de seus mercados associada à criação de novos produtos e setores e converteu-se na base de transmissão de inovações (CUT, 1995b, p. 2-3).

Esse processo vem modificando profundamente o "perfil e a composição do mercado de trabalho", acelerando:

a diferenciação entre os trabalhadores com a criação de um núcleo mais estável de trabalhadores multiqualificados, responsáveis pela condução da produção nas novas empresas e a desqualificação profissional de um contingente expressivo de trabalhadores (CUT, 1995b, p. 8).

A CUT percebe esta diferenciação não apenas como uma contingência do desenvolvimento produtivo mas, sobretudo, como parte de uma:

ofensiva patronal sobre o papel dos sindicatos na representação dos trabalhadores e o ataque sobre os sistemas de contratação nacionais (...) responsáveis por estabelecer garantias básicas e fundamentais para o conjunto dos trabalhadores (CUT, 1995b, p. 8).

Um outro elemento de peso no processo decorrente da reestruturação seria o desemprego que assumiria uma faceta estrutural e crônica. Este também serviria aos interesses patronais como instrumento de pressão para forçar a informalização e redução dos direitos e garantias sociais e econômicas e mesmo pressionar os trabalhadores para isolar os sindicatos (...) das negociações (CUT, 1995b, p. 8). Além disso, este desemprego, em altos níveis e de longa duração, acarretaria uma corrosão da representatividade sindical, à medida que é capaz de criar uma massa de trabalhadores marginalizados na sociedade, com enormes dificuldades de encontrar a reinserção no mercado formal de trabalho (CUT, 1995b, p. 8).

A CUT identifica que, de forma geral, nos países desenvolvidos ocorreram "ajustes estruturais", mas se trata de ajustes conservadores já que não visam conciliar melhoria da produtividade com o aumento do bem estar social (CUT, 1995b, p. 3). Porém a CUT reconhece que nesses países os Estados adotam políticas ativas nas áreas tecnológicas, de financiamento à atividade produtiva, de educação e Formação Profissional capazes de incidir e influenciar os rumos e perfil da reestruturação (CUT, 1995b, p. 3).

2.2 A reestruturação produtiva no Brasil e seus aspectos negativos

Em sua análise do caso brasileiro, a CUT parte da visão de que, desde o período do ex-presidente Fernando Collor, estendendo-se ao longo do governo Fernando Henrique Cardoso, o Brasil passa por mudanças profundas nas regras de política industrial e tecnológica e do conjunto das políticas de desenvolvimento (CUT, 1995b, p. 4).

Essa nova política se articularia em torno de diversos programas estruturais. As diretrizes dos programas em curso seriam, grosso modo, políticas de: liberalização comercial, de atração de capitais estrangeiros, privatização das estatais, reestruturação do modelo empresarial brasileiro e redução dos custos de exportação. Segundo a visão crítica da CUT, estes teriam como características, entre outras: a ausência de política para os setores de ponta e para capacitação tecnológica, ausência de prioridades setoriais, redução das estruturas de pesquisa e desenvolvimento, redução da linha de produtos fabricados por empresa, pouco estímulo a novos investimentos, concentração dos mesmos na modernização do parque existente e criação de ilhas de excelência com manutenção do atraso tecnológico em diversos setores industriais.

No que diz respeito ao processo de inovação tecnológica e organizacional que se desenvolve no Brasil desde os anos 80, a CUT afirma que existe uma grande corrida empresarial em busca de melhorias de desempenho, geralmente traduzidas pelos conceitos de `produtividade' e `qualidade' dos processos (CUT, 1995b, p. 4). Seu conteúdo apresentaria cinco elementos básicos: informática e automação, mudança na relação entre empresas (com destaque para a terceirização de serviços), mudança na organização dos processos de produção/serviços (forte influência da idéia da produção enxuta, com introdução da lógica just in time/kanban), transformações na organização dos processos de trabalho (implementação de esquemas de trabalho polivalente e difusão do trabalho em grupo) e mudanças na gestão do trabalho e na gestão empresarial.

O impacto destas alterações levaria a uma certa fragilidade das empresas, que reduzem seus estoques e a quantidade de recursos que poderiam sanar problemas e imprevistos na produção. Além disso, a interdependência entre as empresas pode levar a interrupções na produção. Segundo a CUT, tentando contrabalançar tal vulnerabilidade, vemos surgirem novas tendências na relação entre algumas empresas e seus trabalhadores (CUT, 1995b, p. 6). Isto pode ser percebido tanto na introdução de Sistemas Participativos (Prêmios por Idéias, Plano de Sugestões, Círculos de Controle de Qualidade, etc.) quanto no crescimento do volume de investimentos em Educação Básica e treinamento dos trabalhadores diretos (CUT, 1995b, p. 6).

Na visão da CUT, todo este processo, não se restringe ao trabalho urbano. Ele poderia ser identificado até mesmo no campo brasileiro. Para a Central, apesar do monopólio da terra que constituiria um elemento impedidor da modernização no campo, As relações entre agricultura e indústria tendem a ser modificadas pela organização flexível do trabalho de fábrica (CUT, 1995b, p. 6); além disso, as alterações (...) Estão obrigando as empresas a repensar sua atividade, desde o cultivo e a produção até o depósito, o transporte e a distribuição (CUT, 1995b, p. 6).

A CUT vê de forma bastante crítica o resultado de todo esse processo para os trabalhadores brasileiros. Um dos elementos de maior negatividade identificado pela Central, seria o crescimento da parcela dos trabalhadores excluídos do mercado de trabalho urbano e rural (CUT, 1995b, p. 9).

Como um cenário geral de efeitos, vivenciado, segundo a CUT, conjunta ou isoladamente em dimensão local, regional ou nacional, poderiam ser apresentados: eliminação de postos de trabalho (no campo: êxodo rural), a precarização das condições e vínculos de trabalho, a manutenção de parcela de trabalhadores semiqualificados e não-qualificados, as recorrentes perdas salariais, a manutenção de políticas de cargos/salários incompatíveis e o aumento do desgaste mental.

Na análise da Central, apesar da evidente permanência dos padrões tradicionais de organização e requisitos profissionais, já se poderia identificar a existência de um novo perfil de trabalhador, que passa, cada vez mais, a ser solicitado ou formado para compor os núcleos principais das empresas reestruturadas (CUT, 1995b, p. 9). Algumas características conformariam este novo perfil: produzir qualidade e não quantidade, multifuncionalidade e capacidade de atuar em grupos, incentivo à permanente solução de problemas com uso da criatividade e iniciativa, níveis mais elevados de escolaridade, classificação abrangente de cargos e redução do leque salarial, desempenho avaliado em função de metas, visão mais abrangente sobre a unidade produtiva e a empresa, e maior "envolvimento" com a política empresarial.

Um elemento de peso no processo de reestruturação produtiva, na análise da CUT, tem sido o projeto de reforma do Estado, levado a cabo pelo governo brasileiro. Para a Central, conforme disposto nas Resoluções de seu 6º Congresso, de 1997 (CUT, 1998a), ele tem tido graves conseqüências para o mundo do trabalho e para a sociedade em geral. Isto porque, ao defender a tese do Estado mínimo, nas esferas federal, estadual e municipal, os governos se preocupam em reduzir a atuação do Estado, especialmente no que se refere à prestação de serviços demandados pela maioria da população, privatizando-os ou terceirizando (CUT, 1998a., p. 94). Ocorrendo o processo inverso com os setores dominantes que receberiam todas as benevolências do Estado, como poderia ser visto nos socorros aos bancos privados, redução de impostos e facilidade na aquisição de financiamentos.

Este tipo de ação do governo teria impactos diretos em setores da classe trabalhadora, via reforma administrativa, à medida que ele tenta retirar os direitos conquistados pelos servidores públicos (...) [,] Efetua cortes no orçamento das áreas sociais, transforma órgãos públicos em organizações sociais e estabelece planos de demissão voluntária dos servidores (CUT, 1998a., p. 94).

Desta forma, segundo a CUT, teríamos como resultado de tais estratégias, a precarização das relações trabalhistas, o endividamento do Estado e o desmonte dos serviços públicos (CUT, 1998a., p. 94). Estes resultados em nada seriam benéficos para os trabalhadores.

2.3 Propostas de ação sindical da CUT

A CUT vem buscando agir no sentido de dar conta do quadro geral apontado e analisado acima. A visão que a Central tem de sua própria forma de enfrentar o problema é bastante crítica. Ela reconhece que, apesar de tentar:

compreender e atuar sobre o processo de inovação tecnológica e reestruturação industrial, (...) não há como negar que a temática diretamente associada à organização dos processos de trabalho e a questão tecnológica (...) permaneceu em um plano inferior na estratégia da Central (CUT, 1995b, p. 10).

Isso poderia ser constatado no fato de que eram raros os sindicatos que incluíam o tema das inovações em suas pautas de campanhas salariais. Alguns acordos coletivos que foram firmados entre sindicato e empresa nos anos 80 acerca do tema, de acordo com a CUT, não saíram do papel. Um dado mais grave é que, por dirigir-se sempre contra as "mudanças" e o novo, em muitos casos, ficou-se aquém de uma crítica mais efetiva das formas de produção taylorista/fordista, como se esse tipo de organização do trabalho fosse satisfatório do nosso ponto-de-vista (CUT, 1995b, p. 10).

A CUT considera que sua postura, em muitos momentos, ao longo dos anos 90, quando a reestruturação produtiva se destacou mais, foi uma atuação essencialmente defensiva (CUT, 1995b, p. 10). Mesmo assim, segundo sua análise, conseguiu sobressair em termos da atenção dada à Formação Profissional e, em maior escala, à terceirização por seu caráter desagregador e degradante, no que diz respeito às condições de trabalho e seus reflexos sobre estrutura e organização sindical (CUT, 1995b, p. 10).

Outro ponto positivo na análise cutista foram as iniciativas sindicais de participação em fóruns institucionais, especialmente as câmaras setoriais (CUT, 1995b, p. 10). Segundo a Central, sua participação nestes fóruns, em vários momentos conseguiu inibir posturas empresariais e governamentais mais truculentas (...) [tendo] ajudado na obtenção de informação sobre as políticas empresariais e governamentais e o andamento da reestruturação produtiva (CUT, 1995b, p. 11).

Porém, mesmo com estes sentidos avanços, a CUT indica que não tem conseguido fazer com que essa participação se combinasse com a conquista de instrumentos para exercer uma influência legal (ou mesmo uma influência contratual) sobre a reestruturação produtiva (CUT, 1995b, p. 11).

A CUT, segundo as resoluções de seu 60 Congresso, de 1997 (CUT, 1998a), busca descartar a idéia de que ela se oporia, pura e simplesmente, aos processos de inovação tecnológica. Segundo sua visão, As inovações podem ter um importante papel na valorização do trabalho e na redução das desigualdades sociais, de renda, regionais e culturais (CUT, 1998a, p. 94). Muito das dificuldades dos setores produtivos de incorporar parcela maior de trabalhadores e gerar mais empregos, segundo a CUT, poderia vir do fato de estes se terem mostrado incapazes de se reestruturar e modernizar.

Na visão da CUT, a experiência internacional seria a grande demonstração do fato de que:

a opção pela recusa à inovação não tem resultado em conquistas para os trabalhadores e muito menos em fortalecimento e maior representatividade dos sindicatos. Ao contrário, essa opção acaba facilitando a estratégia empresarial de estabelecer vínculos individuais ou mesmo coletivos diretamente com os trabalhadores (...) com a conseqüente exclusão dos sindicatos (CUT, 1998a, p. 94).

Este seria um dos principais problemas tendo em vista que as inovações, quase sempre, se efetivariam sem serem acompanhadas de discussão com os sindicatos. Será a partir deste pressuposto que a CUT, baseando-se nas Resoluções de sua 8a Plenária, de 1996 (CUT, 1998c), estabelecerá sua estratégia de ação sindical frente ao cenário das mudanças. Neste sentido, essa ação teria como eixo: fortalecer os laços de solidariedade entre os trabalhadores (dentro das empresas, no ramo, categorias, nacional e internacionalmente); buscar uma política de empregos que contemple o pleno emprego; implantar a organização do sindicato no interior das empresas (local privilegiado da reestruturação); capacitar a militância sindical sobre os "novos temas"; impulsionar a mobilização dos trabalhadores em defesa do emprego e, ainda, utilizar os meios legal, institucional e de negociação direta como pólos de ação.

Nos marcos de uma política propositiva mais ampla, a CUT propõe a democratização do Estado, indicando que o combate aos projetos como a reforma administrativa e da Previdência é a única garantia na manutenção de um Estado provedor de serviços de qualidade e voltado para a maioria da população (CUT, 1998c, p. 95). Além disso, a entidade aponta para o combate às privatizações, acoplado a uma campanha de moralização das estatais; para a reforma tributária, que se estruture tendo como base o imposto direto sobre a renda e o patrimônio, para a formulação de uma política econômica de defesa do emprego e de melhores condições de trabalho e de vida para a maioria da população e, por fim, para a democratização e controle social do sistema financeiro.

3. A CGT e as transformações no mundo do trabalho

3.1 O cenário geral e suas possibilidades

Na análise da CGT, expressa nas resoluções de seu 4º Congresso, em 1996 (CGT, 1996), a classe trabalhadora de todo o mundo estaria enfrentando um de seus momentos mais difíceis no século XX. Para a entidade:

(...) impulsionado pela globalização da economia, pela extraordinária rapidez na difusão de tecnologias revolucionárias e pela intensificação da concorrência entre empresas, regiões e países, o capitalismo passa por uma reestruturação só comparável àquela ocorrida na segunda metade do século passado (CGT, 1996., p. 19).

Na visão cegetista, o cenário geral se constituiria a partir de alguns pontos característicos, tais como:

o avanço da crença exagerada na regulação pelo mercado, a busca da eficiência a qualquer preço e o abandono dos valores da solidariedade e da comunidade (...) [o que produziria] uma competição selvagem entre capitais e entre economias capitalistas, que desconsidera qualquer repercussão sobre a qualidade de vida dos trabalhadores (CGT, 1996, p. 19).

Este processo, portanto, não deixaria os trabalhadores incólumes. A Central assinala que, como em outros momentos de reorganização profunda das economias capitalistas, a classe trabalhadora está em risco de arcar com um custo social insuportável (CGT, 1996, p. 19). De forma crescente, a reestruturação vai mostrando seu não comprometimento face a ética do ser humano (CGT, 1996, p. 19).

Os resultados dos impactos da reestruturação pela qual passa o mundo poderia ser identificado em amplos espectros, do local ao global, do chão de fábrica ao Estado. Como frutos mais duros de todo o processo teríamos ainda, de acordo com a CGT, o desemprego "crescente, em ritmo dramático", a brutal concentração de rendas, o aumento da marginalidade e da violência. Isto porque As empresas se desresponsabilizam pela geração de emprego e pela distribuição dos frutos do avanço tecnológico (...) [e o] Estado se encontra em crise e paralisado (CGT, 1996, p. 19).

As mudanças em curso, segundo a CGT, se atingem o globo como um todo, assumiriam uma feição ainda mais grave na sociedade brasileira (CGT, 1996, p. 19) à medida que, agregadas à dinâmicas internas, serviriam para potenciar o agravamento de nossos problemas sociais.

3.2 Reestruturação produtiva no Brasil: possibilidades?

Conforme destacado pela CGT (1996), a gravidade dos impactos da reestruturação no Brasil deveram muito a problemas internos que, recentes ou antigos, serviram como aditivo para a crise. Assim, aos problemas intensificados pelo "período do milagre econômico" (concentração fundiária, inchamento das cidades, concentração de renda, informalização do emprego, e precarização e marginalização das populações urbanas) associaram-se os problemas trazidos pelas mudanças em curso, tais como aumento do desemprego, desestabilização de certas categorias de trabalhadores ligadas aos setores mais atingidos pelas mudanças econômicas, aumento da informalização e queda de rendimento médio dos trabalhadores (CGT, 1996, p. 20).

A ação dos recentes governos tem contribuído, sobremaneira, para a intensificar a gravidade do quadro sobre os trabalhadores e a sociedade em geral. A forma como eles têm dirigido a entrada do país no processo de internacionalização, segundo a CGT, dá-se de maneira "subordinada e passiva". Ela se basearia em Uma abertura mal conduzida, a desmontagem das estruturas e informações e planejamento do Estado e a ausência de políticas de suporte para que empresas e trabalhadores possam fazer a transição para um modelo mais competitivo (CGT, 1996, p. 20). O resultado seria uma verdadeira devastação de determinados setores e categorias (CGT, 1996, p. 20). Sendo os casos mais dramáticos (...) aqueles ligados às indústrias têxtil, de brinquedos, de calçados e de máquinas e equipamentos, bem como o setor financeiro (CGT, 1996, p. 20).

Na visão da entidade, a crise ganhou mais força a partir de 1990 quando a política econômica se restringiu à prioridade concedida à estabilização-abertura-privatização. Com isso, tivemos uma deterioração da situação do emprego. O desemprego aumentou e a qualidade do emprego piorou. O reflexo disso residiria: na destruição de postos de trabalho visando a busca de eficiência pelas empresas (afetando mais a indústria e menos os serviços), no aumento brutal da precarização do emprego e no aumento da informalidade, e na crescente rotatividade da força de trabalho que atingiu níveis recordes em 1995.

A CGT afirma ainda que, para os trabalhadores brasileiros, as mudanças da forma como se estão dando seriam sinônimo de queda do padrão de vida em todas as suas esferas. No mundo do trabalho, especificamente, pode-se perceber que

Os trabalhadores empregados estão trabalhando mais intensamente, sob maior pressão e ganhando menos. Nas empresas que passaram por processos de terceirização, reengenharia e outras formas de racionalização, os trabalhadores se queixam da intensificação do ritmo de trabalho e do stress advindo da exigência de aumentar a produtividade, sob pressão permanente do medo do desemprego (CGT, 1996, p. 20-21).

Portanto, mesmo os trabalhadores que conseguem manter-se nos empregos, sentem a deterioração e precarização de seu trabalho. Segundo a CGT, tudo isso se agrava pelo fato de que toda pressão para o aumento da produtividade não tem relação com os salários, que permanecem baixos, independente do desempenho dos trabalhadores. Além disso, os trabalhadores necessitam trabalhar sob a tensão do medo de perderem o emprego:

O medo do desemprego e a ansiedade também decorrem das rápidas mudanças pelas quais estão passando os postos de trabalho e as tarefas dos trabalhadores e trabalhadoras que continuam empregados. O conteúdo do trabalho e o perfil das profissões estão mudando: muitas das tarefas passam a exigir algum contato com o microcomputador. Além disso, há uma maior necessidade de trabalho em grupo e de comunicação entre trabalhadores (CGT, 1996, p. 21).

O quadro acima imporia aos trabalhadores a necessidade de obter novas qualificações, não só para a empresa em que trabalha, mas também para o mercado de trabalho. Segundo a CGT, no novo cenário, Mais do que aprender novas tarefas relacionadas com postos de trabalho particulares, os trabalhadores necessitam de educação e formação para desenvolver uma base de conhecimentos (CGT, 1996, p. 21), de modo que sejam capazes de aprender novas tarefas e novos conteúdos de trabalho. Como resultante, os desafios profissionais enfrentados pelos trabalhadores têm aumentado seu interesse pela atualização profissional e pela educação contínua (CGT, 1996, p. 21). Para a central, os trabalhadores seriam os primeiros a entender que sua empregabilidade depende disso (CGT, 1996, p. 21).

No entanto, a CGT chama a atenção para o fato de que as alterações que o mundo do trabalho experimenta tornam explícita uma contradição nas orientações das empresas. Ao mesmo tempo em que solicitam e demandam dos trabalhadores que os mesmos tenham novos conhecimentos e novas qualificações, o esforço das empresas no sentido de treinar e educar os trabalhadores, embora tenha crescido nos últimos anos, é ainda irrisório quando comparado com padrões internacionais (CGT, 1996, p. 21). Prevaleceria a idéia de que o trabalhador está na empresa para ser usado como recurso descartável a qualquer momento, como bem indicariam os altos índices de rotatividade situados entre os maiores do mundo. Esta mentalidade já seria um fato tradicional e histórico em nosso país, o que teria fomentado a constituição de uma força de trabalho que é marcada por um contingente majoritário de trabalhadores com pouca escolaridade e baixa qualificação (CGT, 1996, p. 21).

Um dos maiores problemas identificados pela CGT, no curso das mudanças, tem sido o fato de que, correlatamente à piora das condições de vida, emprego e trabalho para a maioria da população, desenvolveu-se uma maior dificuldade no que diz respeito à ação de suas organizações representativas. Neste sentido, A terceirização, a informalização, o crescimento dos empregos em serviços, assim como o próprio desemprego têm afetado estruturalmente as bases do movimento sindical no Brasil (CGT, 1996,, p. 22). Isso decorreria do fato de que as categorias mais tradicionais e de maior capacidade de luta vêm sofrendo drástica redução em seus números. Junte-se a isso, o dado de que os trabalhadores em serviços e informais, além de não contarem com sindicatos tão fortes, são mais dispersos e mais difíceis de organizar (CGT, 1996, p. 22). Será sob estas condições que o movimento sindical brasileiro terá que enfrentar o desafio colocado pela reestruturação produtiva.

3.3 Propostas de ação sindical da CGT

Tendo como orientação sua leitura dos processos correntes, a CGT assinala que, no novo cenário:

os sindicatos tornam-se atores privilegiados com vistas a proposições que possam fazer frente às mudanças já em curso. É parte do `novo papel' posto aos sindicatos, não apenas diagnosticar os `vácuos', as dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores no contexto produtivo atual, mas, principalmente, lançar proposições que dêem conta de recolocar questões que permeiam o cotidiano do trabalhador-cidadão ( CGT, 1997, p. 6).

Na ótica cegetista, o eixo básico prioritário de ação do movimento sindical, exposto nas Resoluções de seu 40 Congresso, em 1996 (CGT, 1996), deveria ser a luta contra o desemprego e pelo aumento da empregabilidade dos trabalhadores. Os trabalhadores organizados teriam uma tarefa importante que seria a de liderar um movimento social amplo contra a desemprego, a deterioração da renda do trabalho e a marginalização da classe trabalhadora (CGT, 1996, p. 22), o que demandaria dos sindicatos políticas mais amplas do que seus interesses corporativos.

Nesta luta contra o desemprego, o movimento sindical deveria também retomar a luta pela redução da jornada de trabalho que, historicamente, lhe serviu de arma contra o desemprego.

Os sindicatos devem estar na linha de frente da busca da qualificação e da empregabilidade. Para tanto, deveriam desenvolver políticas de formação profissional, visando participar da gestão do sistema de formação profissional. Além disso, deviam atuar no sentido de pressionar as empresas a assumirem sua parcela na responsabilidade pela qualificação, levando à mesa de negociação propostas de educação contínua dos trabalhadores, a serem custeadas com fundos das empresas (CGT, 1996, p. 23). Na mesma direção, os trabalhadores deveriam ter como ponto relevante em sua ação, a questão da reforma do sistema educacional (CGT, 1996, p. 23).

Essa proposição visaria, conforme disposto na política educativa da entidade, tornar a idéia da `empregabilidade' uma realidade - transformar a noção abstrata em prática concreta (CGT, 1997, p. 7).

A CGT entende que todo este processo deve dar-se também vinculado à luta por uma política econômica que, assumindo uma característica voltada para a geração de emprego e a melhora das condições de vida e trabalho da classe trabalhadora (CGT, 1996, p. 22), supere a visão de curto prazo e da estabilização a qualquer custo.

Para tanto, a CGT vê como indispensável recuperar a capacidade de investimento do Estado, peça fundamental para a geração de empregos e para um crescimento econômico mais coordenado e socialmente mais justo (CGT, 1996, p. 22). Esse aumento do investimento do Estado permitiria dar um salto qualitativo nos gastos sociais, sobretudo em educação e saúde, novamente combinando a melhora dos serviços públicos com a geração de empregos (CGT, 1996, p. 22).

Segundo a entidade, esta questão requer que se aprofunde o debate em torno da gestão das finanças públicas. Na visão da CGT, A melhora da qualidade do gasto público, a reforma tributária e a revisão da política de endividamento do Estado, estão entre as questões prioritárias nessa área (CGT, 1996, p. 22).

Correlata e concomitantemente a esta luta pelo aumento do investimento público, a CGT propõe que o movimento sindical deve: lutar pela recuperação da importância e credibilidade dos serviços e funções públicas (CGT, 1996, p. 23) e, ainda, combater a visão de que a reestruturação competitiva combinada com eqüidade social deve ser feita com a destruição do Estado. Neste sentido, a reforma administrativa deve significar reconstrução do Estado, valorização da função pública e recuperação da dignidade do servidor público (CGT, 1996, p. 23).

4. A FS e as transformações no mundo do trabalho

4.1. As possibilidades do cenário geral

Segundo as Resoluções de seu 3º Congresso (FS, 1997), a FS qualifica o momento atual como:

uma época de imensas transformações. Mudanças tecnológicas acontecem em todos os setores produtivos. A automação, a informática e a robótica provocam mudanças na organização e na gestão da produção. Mudam também as relações entre empresas e as relações de trabalho no interior delas. Surgem consórcios empresariais e novas relações baseadas na terceirização (FS, 1997, p. 1).

Segundo a FS, conforme seu documento `Um projeto para o Brasil: a proposta da Força Sindical' (FS, 1993), o novo mundo do trabalho poderia ser caracterizado, em seu conjunto, por: alteração da base técnica, aplicação de novas tecnologias à produção, aumento de produtividade e de qualidade dos produtos, novas formas de organização do trabalho, processo de terceirização, diminuição dos níveis hierárquicos, ampliação dos campos de atuação tecnológica dos trabalhadores, participação dos trabalhadores nas decisões e no planejamento.

Na visão da FS, portanto, essas alterações trariam impactos sobre o papel dos trabalhadores no âmbito da produção o que abriria novas perspectivas em termos do conflito trabalho/capital. Assim,

A tradicional divisão técnica do trabalho das unidades fabris das economias mais avançadas vem sendo substituída, gradativamente, por novas formas de organização da produção e de gestão dos recursos humanos, onde o papel do trabalhador, longe de ser substituído, vem transmudando-se de uma dimensão meramente mecanicista para uma atuação substancialmente cerebral, induzindo enfoques e dimensões até então inimagináveis ao eterno conflito trabalho/capital (FS, 1993, p. 271).

A estrutura de empregos seria também atingida pelas mudanças, já que no bojo delas se eliminariam postos de trabalho, agravando o desemprego. As exigências de melhor qualificação profissional e nível de ensino tornariam o trabalho inacessível para um grande contingente de pessoas que não se prepararam para tais exigências. Restaria, segundo a FS, a todo este contingente de trabalhadores aceitar um emprego precário, muitas vezes no setor informal da economia.

É, neste sentido, que a Central assinala a importância da qualificação para os trabalhadores, o que lhes garantiria possibilidades de inserção satisfatória no quadro das mudanças. Na visão da FS, as novas formas de organização do trabalho adotariam métodos que tinham como pressuposto um trabalhador com sólida educação geral e profissionalizante. Isto levaria, em sua implantação, ao correlato processo de elevação salarial para os trabalhadores incluídos nestes marcos.

4.2 Reestruturação produtiva no Brasil: adequação ou crítica?

Em sua análise do processo de reestruturação produtiva no Brasil, a FS parte do que ela chama de herança acumulada, oriunda da década de oitenta. Esta seria configurada a partir de dois fatores centrais: a transição democrática e o colapso de um modelo de desenvolvimento que se teria consolidado no pós-guerra. Tais fatores teriam colocado desafios que precisaram esperar para que deles se tomassem consciência. Para a FS, o país se encontraria, agora, diante do seguinte dilema: Ou vence o desafio da modernidade ou corre o risco de involuir, tanto do ponto de vista das instituições políticas como do sistema produtivo (FS, 1993, p. 27).

O modelo de desenvolvimento anterior é visto com restrições pela central, à medida que este se caracterizaria por elementos tipo: A exploração predatória da mão-de-obra barata e de recursos naturais abundantes, o fraco dinamismo tecnológico e a manutenção de um protecionismo generalizado (FS, 1993, p. 55).

O esgotamento deste modelo não garantiria uma passagem direta e facilitada para o novo contexto anunciado pelas transformações em curso. Ao contrário, a herança deixada pelo quadro anterior, se não superada, serviria mesmo de obstáculo para a entrada do país no novo tempo. Este novo contexto é visto, pela Central, de uma perspectiva favorável se bem aproveitado. Na sua visão, A atual onda de mudança tecnológica, por muitos caracterizada como uma verdadeira revolução, abre grandes possibilidades para o crescimento da produtividade e para o desenvolvimento de novos produtos e mercados (FS, 1993, p. 354-355).

Um dos óbices centrais neste quadro, que poderia deixar nosso país à margem do processo, seria aquilo que a FS caracteriza como o baixo dinamismo tecnológico que encontramos no Brasil. Segundo a FS, seria presente na indústria brasileira uma baixa capacitação tecnológica sustentada por uma dificuldade estrutural em inovar. No cenário geral da indústria nacional teríamos que:

Nos setores mais atualizados (por exemplo, nas indústrias siderúrgica e petroquímica), ainda que se tenha desenvolvido alguma capacitação operacional – capacidade de operar plantas e introduzir pequenos aperfeiçoamentos para melhora de rendimento a partir de tecnologias importadas – muito pouco se avançou (com poucas exceções) no sentido da assimilação efetiva dessas tecnologias, o que seria importante como base para desenvolver a capacidade de desenhar inovações de produtos e processos (FS, 1993, p. 345).

O baixo índice de capacitação tecnológica redundaria em baixa competitividade, o que teria incentivado a idéia da necessidade da proteção exacerbada por parte do Estado. O protecionismo nada mais teria feito do que garantir um nicho para a sobrevivência do pouco dinamismo em termos de tecnologia.

A utilização predatória da força-de-trabalho, levada a cabo pelo modelo anterior, também cobraria seu alto preço. Sustentando-se na abundância de mão-de-obra e na idéia da pouca necessidade da qualificação dos trabalhadores, o modelo de desenvolvimento anterior, em nada se teria empenhado para a qualificação de seus quadros. Agora, isto acarretaria sérios problemas tanto para os trabalhadores como para as empresas. No entender da FS, a instrução da mão-de-obra cumpriria papel de destaque no cenário construído pelas mudanças, já que este pressuporia trabalhadores com uma sólida educação geral e profissional.

Nestes termos, a FS indica a necessidade de uma verdadeira "revolução educacional". Isto porque, segundo a Central, com 70% da força-de-trabalho empregada no país sem completar o nível fundamental de ensino,

Os números sobre o grau de instrução da força de trabalho industrial no Brasil são estarrecedores (...). Nesse aspecto, não poderia ser mais acentuado o contraste com os países mais avançados, e mesmo com países recém-industrializados do Leste asiático, nos quais a quase totalidade da mão-de-obra tem educação secundária completa (FS, 1993, p. 58-59).

4.3 Propostas de ação sindical da FS

Partindo do princípio de que vivemos um intenso período de transformações em todas as estruturas e relações existentes em nossa sociedade (FS, 1998, p.1) a FS, em seu documento "Perspectivas e Alternativas para uma Nova Ação Sindical em uma Nova Ordem Política, Econômica e Social", avança algumas propostas que devem balizar a ação do movimento sindical no interior deste processo.

Na visão da Central, a indicação de propostas para a ação do movimento sindical deveria ter como ponto de suporte a aceitação de uma autocrítica e de que:

sobretudo, tenhamos a capacidade de romper com um passado extremamente corporativista e fechado para que possamos assumir de frente os desafios colocados ao sindicalismo no Brasil na busca de sua própria sobrevivência e, principalmente, no avanço da defesa e garantia dos Direitos dos Trabalhadores (FS, 1998, p. 1).

Assim, é preciso que o movimento sindical esteja aberto para as mudanças ocorridas no mundo (FS, 1998, p.1). Esta aceitação, contudo, não deve significar a perda de identidade do movimento sindical enquanto instrumento de organização e mobilização dos trabalhadores por uma qualidade de vida melhor.

Demonstrando preocupação com os impactos das transformações na própria existência dos sindicatos, a FS busca indicar quais as formas e práticas sindicais, em termos da organização e estrutura sindical, que podem servir de sustentação e revigoramento na luta dos trabalhadores por seus direitos.

O desenvolvimento histórico das formas organizativas dos trabalhadores brasileiros nos últimos 50 anos, segundo a FS, teria fornecido certos elementos complicadores para este movimento no novo cenário. Como característica desse desenvolvimento, teríamos o forte atrelamento do movimento sindical ao Estado e ao seu arcabouço de leis11 11 Isto, para a FS, se por um lado, proporcionou o crescimento físico e assistencialista dos sindicatos, por outro, acomodou os mesmos a um cotidiano restrito, preso às questões exclusivas de caráter trabalhista e jurídica, longe de qualquer possibilidade que pudesse entender o trabalhador como um sujeito fora de seu local de trabalho, ou seja, entender o trabalhador como um cidadão (FS, 1998, p. 1). .

Na análise da FS, mediante sucessivas ações no âmbito governamental visando adequação aos novos tempos12 12 Medidas que vão desde a possibilidade de novas formas de negociação até o fim das arrecadações compulsórias que mantêm os sindicatos, federações e confederações. , a estrutura sindical que servira a um só tempo de suporte e limitação ao movimento sindical, está sendo desmantelada, e os sindicatos terão de buscar alternativas de sustentação se quiserem sobreviver.

A Central chega a indicar contradições entre a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) e o que seriam as novas demandas trazidas pelo atual momento pelo qual passa a sociedade contemporânea em geral e a sociedade brasileira em particular13 13 No seu entendimento, com algumas questões, ficaria clara esta contradição: Como seguir na íntegra a CLT (...) em um grave quadro de desemprego estrutural? Ou ainda, é preferível, atualmente, brigarmos pelo que reza a CLT ou mantermos postos de trabalho? As respostas cabem a cada um de nós, mas as perguntas esclarecem bem o momento de transformações que estamos vivendo e a enorme contradição existente entre a Lei e a realidade (FS, 1998, p. 2). . O resultado do histórico atrelamento ao Estado foi um movimento sindical despreparado não só para enfrentar as transformações do mundo em geral, como também aquelas referentes ao seu próprio campo de ação. Na análise da FS,

Uma grande maioria de dirigentes sindicais das mais variadas categorias assumem a incapacidade imediata de cumprirem ou fazer cumprir as novas regras do jogo, o que de fato não são questões simples e que podem ser mudadas através de muita educação e formação profissional (FS, 1998, p. 2-3).

Seria com este despreparo que o movimento sindical teria de enfrentar o novo quadro, que podia ser composto por elementos tais como: reforma nas relações capital/trabalho, livre negociação, participação nos lucros das empresas e o fim do desconto em folha da contribuição para os sindicatos. Além disso, teria de trabalhar no sentido de que as benesses que a Central vê no processo de mudança só chegarão aos trabalhadores se o movimento sindical, entre outras forças, se empenhar para tanto.

No entender da FS, a Central teria um papel importante no processo de preparar os sindicatos para os novos tempos. Neste sentido, ela indica que seria urgente incentivar e promover as necessárias mudanças no âmbito dos sindicatos em breve período de tempo (FS, 1998, p. 4). Em um elenco de pontos, a central assinala os elementos que deveriam sustentar os sindicatos nos marcos da nova realidade. Seriam eles: estruturar departamentos nacionais e regionais por ramo produtivo; redefinir o papel das federações e confederações; organizar sindicatos estaduais, regionais ou municipais por central sindical; garantir a contribuição por sindicato descontada em folha de pagamento com aprovação dos trabalhadores; definir formas de distribuição destas contribuições; definir critérios de filiação e eleições sindicais; lutar pela garantia aos dirigentes sindicais e pelo direito de greve; lutar pelo contrato coletivo de trabalho; definir quem negocia o quê e com quem; e lutar pelo direito de organização dos trabalhadores nos locais de trabalho.

Dos pontos acima referidos, a Central dá relativo destaque ao último. Em sua análise, podemos perceber a dupla importância da organização dos trabalhadores em seus locais de trabalho. Esta organização seria fundamental em dois níveis. Primeiro, pelo fato de que, concebidas exclusivamente para atuar em sintonia com o sindicato, elas seriam o principal objeto de referência para os sindicatos, sua organização e fonte de dados para suas ações (FS, 1998, p. 5). Em segundo lugar, pelo fato de que, apoiando e pressentindo o advento da pluralidade sindical, a Central, preocupada com a competição pela representação oriunda desse processo, vê nas organizações por local de trabalho um ponto de apoio fundamental. Nestes termos, para a FS:

No interior de cada empresa, a atividade principal ou predominante definirá a representação do conjunto de seus trabalhadores. Os nossos sindicatos, desde já, deverão fazer campanhas de sindicalização pensando na sua sobrevivência financeira e política tanto para enfrentar o fim da contribuição compulsória (imposto sindical), como para fazer frente à possibilidade de surgimento de outros sindicatos na mesma base territorial (FS, 1998, p. 4).

Além dessas proposições de cunho mais particular, atinentes à reestruturação das formas organizativas do movimento sindical, a FS vê como primordial a luta em termos mais gerais no sentido de uma adequação à nova realidade emergente. Essa adequação seria a chave, por exemplo, na direção do combate à pobreza, ao atraso tecnológico e à situação pouco favorável de nosso país frente a outros países.

Em seu documento "Um Projeto para o Brasil: A Proposta da Força Sindical" (FS, 1993), a Central, de forma bastante extensa, expõe os pontos que deveriam balizar as transformações estruturais necessárias para que nosso país se posicionasse positiva e satisfatoriamente diante deste processo. Esta proposta tem como preocupações questões tais como: reforma fiscal, discussão acerca do setor produtivo estatal, reforma do sistema judicial, reforma política e da organização da sociedade civil, discussão do papel das Forças Armadas e reestruturação econômica e social.

Um dos elementos importantes nestes marcos é a reforma do Estado que a Central propõe. Na visão da FS, o papel do Estado sofreu uma mudança importante nos últimos tempos, que deveria ser compreendida em todo a sua amplitude. Para ela:

Se no passado o caráter estratégico da ação do Estado na atividade econômica esteve ligado em grande medida à montagem e operação direta de setores produtivos básicos, hoje ele se prende sobretudo à indução, organização e regulação do processo de reestruturação produtiva (FS, 1993, p. 229).

A proposta da Central, em síntese, seria a de que se deveria abandonar o modelo do Estado "produtor", característico de um momento anterior do processo de desenvolvimento nacional, pelo modelo do que seria um Estado "promotor". A perspectiva estratégica a que se obrigaria o Estado, seria uma alternativa à chamada proposta neoliberal. Para a FS, os anos 80 e o início dos anos 90 teriam sido marcados pela avanço do ideário neoliberal e de sua defesa do Estado mínimo. Porém, no entender da Central:

quem apostou no triunfo inelutável do neoliberalismo parece ter feito a aposta errada. A maré montante dos anos 80 começa a encontrar as primeiras pedras no caminho, e a refluir. (...) na contramão do neoliberalismo, consolida-se a idéia de que a experiência bem-sucedida (...)14 14 O documento se refere explicitamente às experiências do Japão e dos chamados "Tigres Asiáticos". deve-se a uma combinação virtuosa de intervenção estatal estratégica e a liberdade de mercado (FS, 1993, p. 136).

Neste particular, a FS entende como necessária uma reestruturação estratégica do Estado, que se pautaria por elementos-chave, tais como: 1) privatização de empresas estatais. A privatização de empresas ou de setores inteiros é vista como uma das vertentes centrais da reestruturação; 2) liberalização/desregulamentação de áreas da economia controladas pelo Estado; e 3) rediscussão e aprimoramento da gestão pública e do funcionalismo, conjugando reforma administrativa e capacitação do funcionalismo público.

5. Considerações finais

Colocadas frente a frente, as percepções das Centrais sindicais acerca do quadro pelo qual passa o mundo do trabalho e quais as formas de enfrentá-lo, vão indicar as distinções e separações que, há muito, vêm existindo no movimento sindical brasileiro.

A idéia de que o mundo do trabalho em particular e a sociedade como um todo passam por transformações radicais, com fortes impactos sobre os trabalhadores e suas agremiações, parece ser consensual nas análises das centrais. O problema é exatamente a qualificação, por parte das mesmas, destas mudanças e de seus efeitos. Neste sentido, enquanto a CUT sinaliza com a perspectiva de que o novo quadro pode trazer, e tem trazido, sérios riscos para os trabalhadores, a FS, ainda que timidamente assinale alguns problemas do novo cenário, parece ver nele a possibilidade de espaços a serem utilizados pelos trabalhadores buscando a melhora de sua condição de vida e trabalho. A CGT partiria de uma análise semelhante àquela da CUT, porém como uma visão mais favorável acerca das possibilidades que teriam os trabalhadores para obter melhores espaços no novo quadro.

Uma das grandes distinções entre as leituras e propostas de ação sindical está no fato de que, enquanto a CUT, ainda que indicando a perspectiva individualizada, centra sua análise e proposições na lógica do sistema, as outras Centrais acabam por centrar-se na perspectiva individual. Assim, enquanto a CUT procura combater a visão de uma "adequação" dos trabalhadores às "novas exigências", buscando mesmo disputar as idéias-chaves do processo (como qualidade e produtividade), as duas outras, principalmente a FS, indicam a necessidade de o trabalhador se potencializar no sentido de ocupar seus espaços no "novo modelo".

A distinção entre as Centrais sindicais, neste sentido, diz respeito ao fato de que, enquanto FS e CGT, aquela mais grandemente que esta, tomam como dado os marcos da mudança corrente, buscando uma maior adequação à mesma, a CUT tenta reverter os fundamentos do processo, impondo-lhe outra trajetória. Assim, as duas primeiras, acabam por colocar mais fortemente sobre os trabalhadores a responsabilidade tanto da adaptação aos novos tempos como dos riscos que daí decorrem.

É por isso que raramente encontramos a preocupação com a empregabilidade nos documentos da CUT, e quando o fazemos, é em seu formato crítico ao passo que é bem mais freqüente nos das duas outras centrais. Aqui valeria uma outra distinção, já que a proposta da CGT, ainda que incorporando a perspectiva da empregabilidade assim como o faz a FS, assume uma dimensão mais crítica à medida que busca debater os fundamentos da idéia e, dentro do possível, incorporar a ele outros sentidos.

Baseando-se nos documentos, é possível afirmar que as leituras e propostas de ação sindical da CUT são mais abrangentes do que as das outras duas entidades. A análise da CUT, incorporando a perspectiva crítica, situa de forma mais acabada o desenvolvimento e os impactos dos processos em curso. Em termos das alternativas, a CUT não só trabalha a visão da importância da negociação - nas mais diversas esferas - como também não deixa de fora a dimensão organizativa e mobilizatória como instrumento fundamental e indispensável de barganha dos trabalhadores.

Obviamente, podem-se detectar certas áreas de conjunção entre elas. A CUT e a CGT, por exemplo, defendem ampla mobilização contra o desemprego, que consideram um dos mais cruéis frutos de todo o processo. Ao mesmo tempo, fica patente na proposta das três Centrais, ainda que diferenciadamente, a idéia de que, visando não serem excluídos do mundo do trabalho, os trabalhadores podem e devem se apetrechar para os novos tempos, qualificando-se profissionalmente. E aí, a educação, geral e específica, tem papel destacado na proposição das três Centrais.

Um outro ponto de destaque na leitura e propostas das Centrais é aquele que trata da questão do Estado e seu papel social. Nos documentos da CUT e da CGT têm certa importância as formulações que indicam a necessidade da democratização do Estado, a manutenção de seus investimentos na área social e a valorização do setor público. No entender dessas Centrais, o Estado teria papel preponderante na tentativa de reduzir os efeitos perversos das transformações. Seria através desta intervenção que os trabalhadores poderiam ver garantidos seus direitos básicos como produtores e cidadãos, resguardando-se das possibilidades negativas trazidas pelo novo quadro.

Uma questão de relevo em termos comparativos, digna de nota, tem a ver com a incorporação por parte das Centrais sindicais de muitos dos debates que se desenvolvem no âmbito dos estudos acadêmicos. Em muitos casos, pode-se perceber uma grande relação entre as formulações empreendidas pelas entidades sindicais e aquelas encontradas no interior da literatura pertinente15 15 É bastante nítido o uso compartilhado de conceitos e análises que parecem desenvolver uma circularidade entre o movimento sindical e os estudos acadêmicos. Por exemplo, termos como reestruturação produtiva, empregabilidade, gênero, politecnia, entre outros, já estão incluídos no dicionário e no vocabulário de ambos os setores, aparecendo, na maior parte das vezes, com os mesmos sentidos. .

A incorporação das perspectivas do debate pelas Centrais se efetiva, tendo como referencial seus interesses e leituras dos processos em curso. Fica claro que a literatura que informa as formulações da FS não são as mesmas que fornecem subsídios à CUT. O mesmo pode se dizer da CGT com relação às outras Centrais. Como já indicamos, o tema da empregabilidade, por exemplo, é bem mais aceito pela CGT e pela FS, do que pela CUT que o critica incisivamente. Já a CUT parte para um descentramento do indivíduo, em sua análise, indicando de que forma esta perspectiva acaba por sobrecarregar ainda mais os trabalhadores, visão esta não identificada nos documentos da FS.

As distinções e diferenciações entre as Centrais são bastante óbvias. Porém, deve-se dizer que, diante da radicalidade das questões que têm sido colocadas aos trabalhadores e seus órgãos representativos, o movimento sindical brasileiro tem tentado saídas que incluem a perspectiva unitária16 16 Este processo foi conceituado por Souza, Santana e Deluiz (1999) como uma dinâmica de separação estrutural e aproximação conjuntural. . Nos documentos analisados foram encontradas várias menções a reuniões e encontros entre as Centrais buscando a confecção de uma pauta única de consenso acerca de questões tais como a qualificação profissional, a questão da mulher trabalhadora e o desemprego.

Em termos de ação concreta, vale lembrar aqui o movimento comum levado a cabo pela CUT e pela FS em fins de 1999 na luta pelas 36 horas de trabalho e pelo contrato nacional de trabalho das montadoras. Em conjunto, elas organizaram o chamado "Festival de greves" que paralisou uma série de plantas através do país. Além disso, é no campo da educação dos trabalhadores que as Centrais têm investido grande esforço. Apesar de também aí sentirmos algumas diferenças em termos de princípios, já estão em curso iniciativas que associam as Centrais nessa área. É neste aspecto, ainda, que aparece um debate não só sobre a inserção institucional das Centrais nos fóruns de debates e definições para os usos de fundos públicos (como, por exemplo, o CODEFAT, que tem financiado inúmeras iniciativas sindicais, principalmente no campo educacional), mas, sobretudo, sobre os caminhos e descaminhos na utilização de tais recursos.

Algumas das iniciativas empreendidas, apesar de sua importância, podem ter seu alcance questionado. A inserção das Centrais nos fóruns institucionais deu-se, em grande medida, principalmente no caso da CUT, em detrimento da dinâmica mais viva dos movimentos sindical e social, que foi relegada ao segundo plano e poderia ter sido associada àquela. Daí a sentida paralisia que encontramos na CUT, Central que ao longo dos últimos anos vinha capitalizando as mobilizações mais aguerridas dos trabalhadores17 17 Não se pode atribuir a paralisia da CUT apenas às tensões internas na Central. Ao longo de toda a sua existência, a entidade experimentou este tipo de tensão sem prejuízo de sua ação. .

Por outro lado, a dedicação aos projetos e programas de qualificação, ainda que importante, não poderia ter-se tornado, como parece ser, uma espécie de via única. As Centrais, coerentemente com as suas análises e propostas, têm-se desdobrado no sentido de aumentar a qualificação dos trabalhadores em um processo que se tem utilizado de uma soma considerável de recursos públicos do Fundo de Amparo ao Trabalhador. Porém ainda não existem muitos dados, de conjunto, abrangendo setores e regiões que nos informem da eficiência de tais programas18 18 Para o Ramo Metalúrgico ver CNM/Unitrabalho (1999) , seja no sentido do alcance de seu espectro, seja no sentido de verificar seus impactos frente à exclusão do trabalho promovida nos marcos da reestruturação. No caso da FS, as medidas, para além da qualificação, têm-se centrado também na ligação entre trabalhador e emprego, a partir da constituição de centros de ofertas de vagas em empresas. Alternativa que, apesar da clara relevância, também realça, como as demais, a inserção defensiva do movimento sindical brasileiro.

Isto para se falar apenas em uma das entradas da questão do emprego e do desemprego. Se tomarmos outras problemáticas incluídas nas preocupações e propostas das Centrais, tais como as privatizações, a democratização do Estado, a valorização do serviço público, etc., veremos o quanto ainda estão distantes da realização de seus projetos, talvez até mesmo do empreendimento da luta pelos mesmos. Todavia o questionamento dessas e de outras políticas, não se pode dar de forma dissociada do pano de fundo que auxiliou sobremaneira, embora não exclusivamente, a empurrar o sindicalismo brasileiro para uma situação de verdadeiro encurralamento, frente ao qual ele busca movimentar-se.

Assim, para além das diferenças existentes, o movimento sindical brasileiro vai tentando dar conta do novo cenário no qual se encontra. Certamente, como fica bastante explícito nos documentos das Centrais, diante da conjuntura, o movimento sindical terá de lidar, como já vem lidando, com desafios quantitativa e qualitativamente bastante distintos daqueles que precisou enfrentar ao longo de sua história, à medida que não só a condição de vida e trabalho dos trabalhadores parece estar em xeque, mas também a própria sobrevivência de suas organizações de representação.

Material sindical consultado

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  • 1
    Este artigo toma por base uma parte dos resultados da pesquisa "As Centrais Sindicais e os Novos Conceitos de Produção", coordenada pela profa. Neise Deluiz, subprojeto da pesquisa "O Papel da Educação face aos Novos Conceitos de Produção", desenvolvido na Faculdade de Educação da UFRJ, no período de 1998/1999, através do convênio FINEP/FNDCT/BID. Outros resultados da mesma podem ser encontrados em Souza, Santana e Deluiz (1999). Queria agradecer aos amigos Donaldo Bello de Souza e Neise Deluiz pelos enriquecedores comentários que fizeram ao longo das discussões da pesquisa. Gostaria de agradecer aos pareceristas de Sociologias pelas sugestões feitas ao texto.
  • 2
    A prática dos sindicatos no mundo atual, no Brasil e no exterior, em perspectivas bastante variadas, pode ser encontrada, entre outros, em Hyman (1996), Larangeira (1998), Rodrigues e Ramalho (1998), Castro e Wachendorfer (1998), Lojkine (1999), Carvalho Neto e Carvalho (1999), Boito Jr. (1999) e Rodrigues (1999).
  • 3
    A leitura da diminuição das taxas não só de sindicalizados como também do próprio número de trabalhadores empregados e de seu impacto sobre os sindicatos, como o próprio autor já indica, pode ser feita de diversas formas, tendo resultados diferentes. Em seu estudo sobre os metalúrgicos do ABC paulista, Comin et al. (1997:439), por exemplo, assinalam que "A redução do contingente absoluto de trabalhadores, contudo, não significa necessariamente o enfraquecimento dos sindicatos(...). As evidências empíricas mobilizadas apontam para o fato de que a força de trabalho que tende a sobreviver empregada no setor é precisamente aquela que constitui o núcleo mais denso de sustentação dos sindicatos, isto é, trabalhadores produtivos mais maduros, mais qualificados, com maior tempo de emprego, com escolaridade relativamente mais elevada e empregados nas grandes empresas". Por sua vez, Ramalho e Santana (1999) constatam que, no caso dos metalúrgicos do RJ, esta diminuição númerica afetou pofundamente as ações do sindicato.
  • 4
    Como indica Antunes (1993: 67), além da redução do número de greves em vários países centrais, foi sensível o aumento de "casos de corporativismo, xenofobia e racismo no interior da própria classe trabalhadora. Tudo isto permite constatar que o movimento sindical se encontra numa crise de proporções nunca vistas".
  • 5
    Para uma análise das greves na década de oitenta ver Noronha (1991).
  • 6
    Boito Jr. (1999, p. 204) avalia que "O fato mais importante para entender o refluxo e a moderação do movimento sindical é a ofensiva neoliberal." Articulando o cenário brasileiro com o panorama geral, ele assinala que "Essa ofensiva é um fenômeno internacional e está vinculada a fatores econômicos e políticos que se processam também em escala internacional."
  • 7
    Por exemplo, em seu estudo sobre os metalúrgicos do Rio de Janeiro, Ramalho e Santana (1999, p. 10 e segs.), verificam a verdadeira devastação que atingiu o setor metalúrgico do RJ – com processos como a redução drástica dos postos de trabalho, diminuição do tamanho das empresas, introdução de novas formas de gestão e de tecnologia da produção e crescimento do desemprego. Também outras estratégias como a terceirização fizeram surgir novas empresas de serviços, em boa parte dos casos, formada por ex-funcionários, mas com condições de trabalho mais precárias. Esses problemas se agravaram com a crise do setor naval, que praticamente desapareceu ao longo da década de 90. Como um todo, segundo os autores, constata-se uma situação de muita dificuldade para os trabalhadores metalúrgicos e para o seu sindicato, tanto no campo de organização política quanto no campo da sustentação financeira. A organização sindical vem sofrendo com a redução do número de operários da categoria e de sócios do sindicato, o que tem resultados imediatos no nível de participação nas atividades do sindicato, que também decresce vertiginosamente. O depoimento dos dirigentes aponta, entre outras coisas, um decréscimo bastante sensível na massa de votantes recente (1999, cerca de 5 mil), se comparada aos números da eleição anterior (1996, cerca de 10 mil), sendo que a mesma guarda certa relação com o número de associados.
  • 8
    Ver, entre outros, Martins e Ramalho (1994) e Druck (1999).
  • 9
    As três centrais foram escolhidas, como centro da análise deste texto, tendo em vista o que se avaliou ser sua representatividade no cenário político nacional. Além disso, no âmbito geral da pesquisa, por serem as únicas entidades sindicais que, atualmente, deliberam no Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (CODEFAT), espaço que tem obtido certa centralidade na política institucional de parcela importante do sindicalismo brasileiro. Para uma análise do surgimento e do desenvolvimento das centrais, ver Rodrigues (1991) e Cardoso (1999).
  • 10
    Vale lembrar que as fontes utilizadas como base de nossa análise correspondem, em grande medida, a deliberações de congressos e reuniões sindicais. Portanto, o material está diretamente relacionado com a correlação de forças no interior das entidades no momento de sua elaboração. Ele não esgota toda a tensão e divergências de opiniões existentes na política sindical. Porém, tendo isso em mente, deve-se dizer também que, quer tenha vindo apenas das definições das forças hegemônicas e/ou do embate e consenso de posições entre estas e as demais, ele é o documento oficial das centrais, correspondendo, ou ao menos deveria, à posição majoritária que orientaria cada central.
  • 11
    Isto, para a FS,
    se por um lado, proporcionou o crescimento físico e assistencialista dos sindicatos, por outro, acomodou os mesmos a um cotidiano restrito, preso às questões exclusivas de caráter trabalhista e jurídica, longe de qualquer possibilidade que pudesse entender o trabalhador como um sujeito fora de seu local de trabalho, ou seja, entender o trabalhador como um cidadão (FS, 1998, p. 1).
  • 12
    Medidas que vão desde a possibilidade de novas formas de negociação até o fim das arrecadações compulsórias que mantêm os sindicatos, federações e confederações.
  • 13
    No seu entendimento, com algumas questões, ficaria clara esta contradição:
    Como seguir na íntegra a CLT (...) em um grave quadro de desemprego estrutural? Ou ainda, é preferível, atualmente, brigarmos pelo que reza a CLT ou mantermos postos de trabalho? As respostas cabem a cada um de nós, mas as perguntas esclarecem bem o momento de transformações que estamos vivendo e a enorme contradição existente entre a Lei e a realidade (FS, 1998, p. 2).
  • 14
    O documento se refere explicitamente às experiências do Japão e dos chamados "Tigres Asiáticos".
  • 15
    É bastante nítido o uso compartilhado de conceitos e análises que parecem desenvolver uma circularidade entre o movimento sindical e os estudos acadêmicos. Por exemplo, termos como
    reestruturação produtiva, empregabilidade,
    gênero,
    politecnia, entre outros, já estão incluídos no dicionário e no vocabulário de ambos os setores, aparecendo, na maior parte das vezes, com os mesmos sentidos.
  • 16
    Este processo foi conceituado por Souza, Santana e Deluiz (1999) como uma dinâmica de
    separação estrutural e
    aproximação conjuntural.
  • 17
    Não se pode atribuir a paralisia da CUT apenas às tensões internas na Central. Ao longo de toda a sua existência, a entidade experimentou este tipo de tensão sem prejuízo de sua ação.
  • 18
    Para o Ramo Metalúrgico ver CNM/Unitrabalho (1999)
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Fev 2006
    • Data do Fascículo
      Dez 2000
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