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Editorial

Editorial

Este é o sétimo número de Scientiæ udia, que dá início a uma nova seção da revista dedicada a entrevistas publicando o depoimento de Jean-Pierre Berlan, colhido por Isabel Loureiro e Marcos Barbosa de Oliveira com a colaboração de Hugh Lacey. Berlan eleva o tom do debate sobre a biotecnologia para denunciar abertamente a ideologia cientificista que cerca os produtos da biologia aplicada, nos seus dois domínios gêmeos, a agricultura e a medicina, pondo a descoberto as relações entre capitalismo, ciência e técnica. O entrevistado alerta para um uso da linguagem que visa encobrir o verdadeiro sentido dos organismos transgênicos, cuja esterilidade reprodutiva serve unicamente aos interesses econômicos das grandes corporações produtoras de sementes e de agrotóxicos. A mesma lógica se aplica à indústria farmacêutica e seus programas de estímulo ao consumo de medicamentos.

No primeiro artigo deste número, Renan Springer de Freitas defende a seu modo o projeto popperiano de uma epistemologia evolutiva que permita abandonar tanto o projeto posto pela primeira modernidade de procura por um fundamento último do conhecimento como a dupla inflexão do pragmatismo e do kantismo heideggeriano de naturalizar a epistemologia. No segundo artigo, Eduardo de Oliveira Barra discute a correspondência entre a teoria da gravitação universal de Newton e o modelo de unidade arquitetônica proposto por Kant no programa de fundamentação de uma metafísica da natureza, mostrando o sentido kantiano em que a teoria de Newton constitui uma genuína ciência da natureza. Finalmente, no terceiro artigo, Marcus Sacrini investe contra a interpretação de Paolo Rossi segundo a qual Husserl, com sua crítica à ciência galileana, teria fomentado o anticientificismo e o irracionalismo contemporâneos, mostrando que, ao contrário, a iniciativa de Husserl aponta para uma ampliação da racionalidade.

Como documento científico, Scientiæ udia tem a satisfação de republicar um texto escrito originalmente em português por Willard Van Orman Quine, um dos maiores lógicos do século XX. Proferido originalmente como conferência em 1942, na sede em São Paulo da União Cultural Brasil-Estados Unidos, o texto foi publicado em 1945 sob o patrocínio dessa mesma instituição, à qual agradecemos a gentil autorização desta edição. Em sua introdução, Sofia Stein contextualiza a conferência de 1942, fazendo uma breve apresentação do desenvolvimento do pensamento lógico de Quine até 1945, quando publica, também originalmente em português, O sentido da nova lógica.

Na nota crítica, Renato Kinouchi comemora o centenário de "Does consciousness exist?" de William James, no qual o psicólogo americano defende uma descrição funcionalista da consciência, segundo a qual a consciência não é uma substância, como supõe o dualismo cartesiano, mas apenas e tão somente uma função da qual é capaz um agregado complexo de matéria, a saber, a função de pensar, a função de conhecer. Kinouchi esboça, em seu texto, uma arqueologia dessa concepção jamesiana da consciência.

Conclui este número de Scientiæ udia a resenha de A arte secreta de Michelangelo por Eduardo Kickhöfel, que investe contra a ingenuidade daqueles que se encantam com suas próprias hipóteses, propondo interpretações demasiadamente livres acerca da arte e da ciência do Renascimento e a respeito de Michelangelo e de seu lugar na cultura italiana da primeira metade do século XVI. Tais leituras, efetuadas sem a devida contextualização histórico-sociológica, originam visões anacrônicas e distorcidas tanto da arte quanto da ciência, além de prestarem um mau serviço à cultura contemporânea.

Pablo Rubén Mariconda

editor responsável

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Jun 2010
  • Data do Fascículo
    Set 2004
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