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Incapacidade funcional entre idosos residentes em um município do interior de Minas Gerais

Incapacidad funcional de ancianos residentes en un municipio del interior de Minas Gerais

Limited functional capabilities among elders residing in an urban area of a rural county of Minas Gerais

Resumos

Essa pesquisa objetivou identificar as cinco maiores prevalências dentre as atividades da vida diária que levaram às incapacidades funcionais entre idosos residentes na zona urbana de um município no interior de Minas Gerais e comparar essas atividades entre os sexos e por faixa etária. Participaram 2.924 idosos, entrevistados no domicílio, selecionados através da técnica de amostragem estratificada proporcional com seleção sistemática, considerando os bairros como estratos. Os dados foram digitados, em dupla entrada, no EpiInfo 3.2. Considerou-se análise descritiva seguida de testes chi2 e exato de Fisher (p<0,05). As maiores prevalências foram: cortar unhas dos pés (18,93%); fazer compras diversas (9,4%), subir e descer escadas (4,77%); medicar-se na hora (4,12%) e andar perto de casa (3,82%). Há maior proporção de mulheres com incapacidade funcional quando comparada aos homens. Ao verificar as faixas etárias, no sexo masculino e feminino há maior proporção de incapacidades entre os idosos com 80 anos e mais.

Idoso; Envelhecimento; Enfermagem geriátrica


La presente investigación tiene como objetivo identificar las cinco mayores prevalecías de las actividades de la vida diaria que llevan a la incapacidad funcional entre ancianos residentes en la zona urbana de un municipio en el interior de Minas Gerais, comparando estas actividades por sexos y por área de edad. En la investigación participaron 2.924 ancianos entrevistados en su casa, seleccionados a través de la técnica de muestra estratificada proporcional con selección sistemática, considerando los barrios como áreas o zonas. Los datos fueran procesados en dos entradas en el banco de datos (EpiInfo 3.2.). El análisis consistió de medidas descriptivas y testes ji2 y exacto de Fisher (p<0,05). Las mayores prevalecías fueron: Cortar las uñas de los pies (18,93%); hacer compras diversas (9,4%), subir y bajar escaleras (4,77%), medicarse en la hora (4,12%) y caminar cerca de casa. Existe mayor proporción de mujeres con incapacidad funcional cuando comparada a los hombres. Al verificar estas áreas de edad en el sexo masculino y femenino hay mayor proporción de incapacidad entre los ancianos con 80 años y más.

Anciano; Envejecimiento; Enfermería geriátrica


The objective of the present study was to identify the five most prevalent activities of daily life which led to limited functional capabilities among elders residing in the urban area of a rural county of the state of Minas Gerais, Brazil. This activities were also analyzed according to gender and age. The research counted upon the participation of 2924 elders interviewed at their residences, selected by the proportional stratified sample technique, considering neighborhoods as extracts. The data was processed through double input in the database, EpiInfo 3.2, and analyzed by descriptive measurements, chi2 tests and "Fisher’s exact" (p<0.05). The most prevalent activities were: cut toenails (18.93); shopping (9.4), use stairs (4.77), medicate on time (4.12) and walk close to the house (3.82). There are a higher proportion of females suffering from limited functional capability than males. Regarding age, both genders presented a higher proportion of limited capabilities among people older than 80.

Aged; Aging; Geriatric nursing


ARTIGO ORIGINAL

PESQUISA

Incapacidade funcional entre idosos residentes em um município do interior de Minas Gerais1 1 Esta pesquisa recebeu apoio financeiro da Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG).

Limited functional capabilities among elders residing in an urban area of a rural county of Minas Gerais

Incapacidad funcional de ancianos residentes en un municipio del interior de Minas Gerais

Darlene Mara dos Santos TavaresI; Gilberto de Araújo PereiraII; Helena Hemiko IwamotoIII; Sybelle de Souza Castro MiranzziIV; Leiner Resende RodriguesI; Ana Rita Marinho MachadoV

IDoutora em Enfermagem. Professora Adjunto do Departamento de Enfermagem em Educação e Saúde Comunitária (DEESC) do Centro de Graduação em Enfermagem (CGE) da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM)

IIMestre em Estatística. Professor Assistente do DEESC/CGE/UFTM

IIIDoutora em Enfermagem. Professora Adjunto do Departamento de Enfermagem da Assistência Hospitalar do CGE da UFTM

IVDoutora em Enfermagem. Professora Adjunto do Departamento de Medicina Social do Curso de Medicina da UFTM

VMestre em Enfermagem. Professora Assistente do DEESC/CGE/UFTM

Endereço Endereço: Darlene Mara dos Santos Tavares Av. Afrânio Azevedo, 2063 38.055-480 - Bairro Olinda, Uberaba, MG E-mail: darlenetavares@netsite.com.br

RESUMO

Essa pesquisa objetivou identificar as cinco maiores prevalências dentre as atividades da vida diária que levaram às incapacidades funcionais entre idosos residentes na zona urbana de um município no interior de Minas Gerais e comparar essas atividades entre os sexos e por faixa etária. Participaram 2.924 idosos, entrevistados no domicílio, selecionados através da técnica de amostragem estratificada proporcional com seleção sistemática, considerando os bairros como estratos. Os dados foram digitados, em dupla entrada, no EpiInfo 3.2. Considerou-se análise descritiva seguida de testes c2 e exato de Fisher (p<0,05). As maiores prevalências foram: cortar unhas dos pés (18,93%); fazer compras diversas (9,4%), subir e descer escadas (4,77%); medicar-se na hora (4,12%) e andar perto de casa (3,82%). Há maior proporção de mulheres com incapacidade funcional quando comparada aos homens. Ao verificar as faixas etárias, no sexo masculino e feminino há maior proporção de incapacidades entre os idosos com 80 anos e mais.

Palavras-chave: Idoso. Envelhecimento. Enfermagem geriátrica.

ABSTRACT

The objective of the present study was to identify the five most prevalent activities of daily life which led to limited functional capabilities among elders residing in the urban area of a rural county of the state of Minas Gerais, Brazil. This activities were also analyzed according to gender and age. The research counted upon the participation of 2924 elders interviewed at their residences, selected by the proportional stratified sample technique, considering neighborhoods as extracts. The data was processed through double input in the database, EpiInfo 3.2, and analyzed by descriptive measurements, c2 tests and “Fisher’s exact” (p<0.05). The most prevalent activities were: cut toenails (18.93); shopping (9.4), use stairs (4.77), medicate on time (4.12) and walk close to the house (3.82). There are a higher proportion of females suffering from limited functional capability than males. Regarding age, both genders presented a higher proportion of limited capabilities among people older than 80.

Keywords: Aged. Aging. Geriatric nursing.

RESUMEN

La presente investigación tiene como objetivo identificar las cinco mayores prevalecías de las actividades de la vida diaria que llevan a la incapacidad funcional entre ancianos residentes en la zona urbana de un municipio en el interior de Minas Gerais, comparando estas actividades por sexos y por área de edad. En la investigación participaron 2.924 ancianos entrevistados en su casa, seleccionados a través de la técnica de muestra estratificada proporcional con selección sistemática, considerando los barrios como áreas o zonas. Los datos fueran procesados en dos entradas en el banco de datos (EpiInfo 3.2.). El análisis consistió de medidas descriptivas y testes c2 y exacto de Fisher (p<0,05). Las mayores prevalecías fueron: Cortar las uñas de los pies (18,93%); hacer compras diversas (9,4%), subir y bajar escaleras (4,77%), medicarse en la hora (4,12%) y caminar cerca de casa. Existe mayor proporción de mujeres con incapacidad funcional cuando comparada a los hombres. Al verificar estas áreas de edad en el sexo masculino y femenino hay mayor proporción de incapacidad entre los ancianos con 80 años y más.

Palabras clave: Anciano. Envejecimiento. Enfermería geriátrica.

INTRODUÇÃO

O aumento da proporção de idosos tem-se configurado um fenômeno global. Na população brasileira o seguimento que mais cresce é o do idoso. Entre 1991 e 2000 o número de habitantes, com sessenta anos e mais de idade, aumentou 2,5 vezes (35%) quando comparado com o restante da população do País (14%).1

Não é possível ter uma única definição de envelhecimento que tenha utilidade em diferentes contextos, pois esse conceito guarda relação com o campo de pesquisa e o objeto de interesse. Portanto, o envelhecimento pode ser compreendido biologicamente, socialmente, intelectualmente, economicamente, funcionalmente e cronologicamente.2 Neste estudo será considerada a definição cronológica, ou seja, sujeitos com 60 anos ou mais, utilizada para os países em desenvolvimento e com 65 anos ou mais para os países desenvolvidos.3

De acordo com a projeção do IBGE em 2004, a população idosa no município de Uberaba representa 10,2% da população total, dos quais 11,1% são mulheres e 9,2% homens. Esses percentuais estão acima dos encontrados para o Estado de Minas Gerais (9,1%) e Brasil (8,6%).4 Tais dados reforçam a necessidade de desenvolver pesquisas em Uberaba, para compreender a dinâmica do seu envelhecimento populacional visando a re-organização da atenção aos idosos.

Sabe-se que, na população idosa, o número de mulheres é maior em relação aos homens, estando essa diferença relacionada à expectativa de vida, assim como as mudanças sociais ocorridas no decorrer dos anos.1 Nesta perspectiva, a feminilização da população idosa gera transformações sociais, que necessitam ser apreendidas para que se possa contribuir com a sua qualidade de vida e sua atividade social. Ademais, ainda está presente o preconceito social negativo em relação ao idoso.5

O processo de envelhecimento populacional ocorrido nas sociedades ocidentais modernas traz várias repercussões para a sociedade, podendo se configurar em problema social. O acometimento de doenças crônicas e as incapacidades funcionais nos idosos têm sido mais difíceis de prevenir do que evitar as mortes.3 Ademais, o cuidado da população idosa representa um desafio para o sistema de saúde, uma vez que há maior ocorrência de doenças crônicas e incapacitantes nesta faixa etária quando compara às outras.6-7

A capacidade funcional é um conceito amplo que abrange "[...] habilidade em executar tarefas físicas, preservação das atividades mentais e uma situação adequada de integração social".8:17 Apesar deste conceito amplo, na prática tem-se trabalhado com o conceito de capacidade/incapacidade.9

A incapacidade funcional tem sido avaliada como a dificuldade de realizar determinadas atividades da vida cotidiana, em razão de alguma deficiência.10 Este conceito será o adotado nesta pesquisa.

O estudo da capacidade funcional tem ajudado tanto a compreender como a longevidade tem sido vivida como contribui para avaliar o estado de saúde dos idosos. Sabe-se que a presença de múltiplas doenças pode apresentar diferentes graus de gravidade, influenciando na vida diária. Desta forma, a capacidade funcional tem sido considerada um indicador do processo saúde doença.11 Tal indicador é imprescindível para a organização da atenção à saúde subsidiando, dentre outros, o cuidado de enfermagem direcionado ao idoso, familiares e cuidadores.12

As desigualdades sociais e de saúde entre os idosos tem-se verificado no Brasil, entretanto, não existem políticas oficiais para aqueles que desenvolvem incapacidade funcional.13 A família e cuidadores têm-se responsabilizado pelo cuidado ao idoso incapacitado, por vezes, tornando-se uma tarefa árdua, em razão das mudanças necessárias que ocorrem na dinâmica familiar e pelo desconhecimento de como cuidar. A enfermagem, membro da equipe interdisciplinar pode contribuir através do atendimento domiciliário, buscando interagir com familiares e cuidadores, compartilhando conhecimentos, promovendo ambientes favoráveis à manutenção da capacidade funcional, de forma a assumir a co-responsabilidade no cuidado ao idoso.

Para tanto, é necessário aprofundar sobre quais as Atividades da Vida Diária (AVD) estão sendo comprometidas que poderão levar a incapacidade funcional e se existem diferenças entre os sexos e faixas etárias.

Os objetivos delineados neste estudo foram identificar as cinco maiores prevalências dentre as atividades da vida diária que levaram às incapacidades funcionais entre idosos residentes na zona urbana de um município no interior de Minas Gerais e comparar essas atividades da vida diária entre os sexos e por faixa etária.

METODOLOGIA

Estudo tipo inquérito domiciliar, transversal e observacional, realizado na zona urbana do município de Uberaba-MG, que está dividido em três distritos sanitários, que por sua vez subdividem-se em dezoito áreas de abrangências.

A população total de idosos residentes na zona urbana é de 24.714 habitantes, estimada pela Secretaria Municipal de Saúde,14 baseada em dados de 1996 do IBGE. Os critérios de inclusão adotados foram: ter 60 anos ou mais de idade; sexo masculino ou feminino; morar na zona urbana no município e concordar participar da pesquisa.

A amostra populacional foi calculada em 2.892 idosos considerando 95% de confiança, 80% de poder do teste, margem de erro de 4,0% para as estimativas intervalares e uma proporção estimada de p =0,5 para as proporções de interesse, segundo a fórmula:15

Para o cálculo dos idosos em cada bairro, em seus domicílios, utilizou-se a técnica de amostragem estratificada proporcional. Naqueles bairros onde o cálculo amostral foi inferior a cinco, considerou-se pelo menos dez idosos e, utilizou-se a técnica de amostragem sistemática para selecionar os domicílios nos quais os idosos foram entrevistados. Portanto, considerou-se uma amostra inicial de 3.034 idosos, com as perdas obteve-se uma amostra final de 2.924 idosos.

Em cada bairro foi calculado o Intervalo Amostral (IA), e por meio de sorteio aleatório foi selecionado o primeiro domicílio a ser visitado na primeira quadra do bairro. No sentido horário os demais domicílios foram considerados em cada quadra até percorrer o bairro todo. Nos domicílios em que não havia idoso considerou-se o domicílio imediatamente posterior. Realizou-se um sorteio aleatório quando, na residência selecionada, havia mais de um idoso. Quando no domicílio selecionado havia idoso, mas, este não estava em casa, agendou-se outro horário, e se no dia agendado o idoso não estivesse considerou-se o domicílio imediatamente posterior. Em condomínios (prédios ou casas) o entrevistador apresentou-se na portaria e questionou sobre o número de apartamentos ou casas existentes, elaborou um roteiro e deu-se seqüência na seleção dos domicílios. Utilizou-se o mapa de cada bairro disponibilizado pelo Centro de Controle de Zoonoses do Município de Uberaba, como itinerário para a seleção dos domicílios. Quando todo o bairro foi percorrido e não se alcançou o número de idosos desejado, voltou-se ao início do bairro na casa subseqüente a primeira casa selecionada e, repetiu todos os procedimentos até obter o número desejado de idosos.

Para a coleta dos dados foram selecionados dez entrevistadores, com experiência prévia, os quais foram treinados para a realização das entrevistas, incluindo o preenchimento dos instrumentos e dos relatórios, assim como a abordagem ao entrevistado. Reuniões sistemáticas ocorreram para supervisão e orientações necessárias. Foi elaborado manual de orientação para a realização das entrevistas.

Os dados foram coletados, no domicílio, utilizando-se de instrumento estruturado, baseado no questionário Older Americans Resources and Services (OARS), elaborado pela Duke University e adaptado à realidade brasileira por Ramos.16

Antes de iniciar a entrevista foi realizada avaliação cognitiva com o idoso, procurando avaliar a preservação da memória recente para responder as questões propostas. Quando o idoso obteve menos de 13 pontos, solicitou-se um informante. Considerou-se como informante uma pessoa que reside na mesma casa que o entrevistado, e que soubesse oferecer informações sobre o idoso (entrevistado). Ao informante foi aplicada a escala PFEFFER* * Esta escala possui 11 perguntas, realizadas ao informante, que busca verificar a capacidade do idoso em realizar algumas atividades como cuidar de seu próprio dinheiro, fazer compras sozinho, esquentar água para café ou chá e apagar o fogo, manter-se a par dos acontecimentos, lembrar de compromissos e acontecimentos, ficar sozinho em casa sem problemas, dentre outras. Cada questão possui respostas que variam de zero a três pontos (Sim, é capaz – zero ponto; Nunca fez, mas poderia fazer agora - zero ponto; Com alguma dificuldade, mas faz – um ponto; Nunca fez e teria dificuldade agora – um ponto; Necessita de ajuda – dois pontos; Não é capaz – três pontos). . Se o resultado fosse cinco ou menos, a entrevista continuava sendo realizada com o idoso, e as informações complementadas pelo informante, denominado auxiliar. Caso o resultado seja seis ou mais, a entrevista foi conduzida com o informante, denominado substituto.

A aplicação do questionário ocorreu no período de dezembro de 2005 a fevereiro de 2006. Todos os itinerários do entrevistador, no bairro, foram registrados na planilha de campo, e acompanhados por seu respectivo supervisor. Quando alguma informação mostrava-se duvidosa ou o processo de seleção dos domicílios tenha tido algum problema, o supervisor orientava o entrevistador para que voltasse ao bairro, na referida residência, e procedessem as correções.

As variáveis da capacidade funcional estudadas foram: comer; tomar banho; vestir-se; pentear cabelo; deitar/levantar da cama; controle urinário; controle intestinal; andar no plano; subir e descer escadas; transferência de local; cortar unhas dos pés; administrar finanças (atividades básicas da vida diária); medicar-se na hora; andar perto de casa; fazer compras diversas; uso de transporte (táxi/ônibus); fazer limpeza de casa, usar telefone e realizar tarefas domésticas (atividades instrumentais da vida diária).

Conforme as entrevistas estavam sendo realizadas, os instrumentos preenchidos foram entregues aos pesquisadores, que procederam as devidas revisões e codificações. Sempre que necessário, as fichas de entrevistas foram devolvidas para o entrevistador complementar as informações.

Foi construído uma base de dados, no programa EpiInfo 3.2TM, os dados coletados foram digitados em microcomputador, por duas pessoas, em dupla entrada, para posterior verificação da existência de registros de idosos duplicados, assim como de nomes diferentes entre as duas bases de dados. Procedeu-se então, à consistência dos campos verificando digitação errada. Quando havia dados inconsistentes retornava-se para a entrevista original, para confirmação e/ou correção.

Para atender os objetivos propostos foi utilizada inicialmente análise descritiva a partir de freqüências simples absolutas e percentuais, medidas descritivas (média, mediana, desvio padrão e valores máximo e mínimo). As associações entre variáveis categóricas foram estudadas a partir de testes não paramétricos como qui-quadrado e teste exato de Fisher. O nível de significância para todos os testes foi de 5%. A prevalência da incapacidade funcional foi calculada através do número de idosos que referiram não conseguir realizar determinada AVD dividido pelo total de idosos entrevistados, apresentadas em percentual. As faixas etárias de estudo foram: 60|— 70, 70|— 80 e 80 anos e mais de idade.

O projeto desta pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Triângulo Mineiro, protocolo Nº 553, atendendo a Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde. Os idosos foram contactados em seus domicílios, aos quais foram apresentados os objetivos, o termo de consentimento livre e esclarecido e oferecidas as informações pertinentes. Somente após a anuência do entrevistado e assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido, foi conduzida a entrevista.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Foram entrevistados 2.924 idosos, residentes em 101 bairros do município de Uberaba. Em um bairro (condomínio fechado) houve recusa dos idosos para a realização de entrevista, e em três bairros não tinham idosos.

Do total das entrevistas realizadas 92,0% foram com idosos, 4,1% com informante auxiliar (houve contribuição nas respostas de um membro familiar ou cuidador que convive frequentemente com o idoso) e 3,9% com informante substituto (na impossibilidade da entrevista ser realizada com o idoso, essa foi obtida junto à um membro familiar ou cuidador que convive frequentemente com o idoso).

As proporções de entrevistados: "idosos", "informante auxiliar" e "informante substituto" não apresentam diferenças significativas quando comparados os sexos nas faixas etárias: 60|-70 (c2 = 2,52; p = 0,28); 70|-80 (c2 = 2,55; p = 0,28) e 80 e mais (c2 = 1,06; p = 0,59). Entretanto, quando se analisa cada sexo separadamente, verifica-se que conforme aumenta a faixa etária ocorre aumento na proporção de entrevistados "informante substituto", tanto para o sexo masculino (c2 = 71,22; p < 0,0001) quanto feminino (c2 = 159,80; p < 0,0001). Destaca-se, que no sexo feminino ocorre um aumento acentuado na proporção de "entrevistados substitutos" entre as mulheres com 80 anos e mais de idade.

Vários fatores podem influenciar as habilidades e capacidades cognitivas, dentre eles: idade, escolaridade, doenças e aspectos psíquicos e socioculturais. Nesse estudo, a avaliação cognitiva objetivou verificar se o idoso estava com a memória recente preservada, visto que as questões se referiam ao último ano.

Algumas características da população estudada

Este estudo foi constituído por 64,0% de sujeitos do sexo feminino e 36,0% do masculino. A média de idade representou 70,34 (± 7,86) anos. Não houve diferença significativa da proporção de idosos entrevistados entre os sexos nas faixas etárias estudadas (c2 = 4,95; p = 0,18).

Quanto ao estado conjugal, os maiores percentuais foram para aqueles que moram com esposo(a) ou companheiro(a) (47,0%) e viúvo(a) (36,6%). Verificou-se que 75,6% dos idosos moram em sua casa com acompanhante, 14,5% vivem só e 8,5% moram na casa de outra pessoa. Esses achados sugerem que parte dos idosos pode contar com o apoio familiar quando da ocorrência de incapacidade funcional. Dessa forma, a equipe multidisciplinar deve aprofundar sobre este aspecto para que possa identificar o cuidador e reforçar o apoio familiar.

A mediana da escolaridade foi de três anos, com valores mínimo de zero e máximo de 23 anos. Dados semelhantes foram obtidos no Brasil (3,4) e no Estado de Minas Gerais (3,1), com idosos responsáveis por domicílio.1

A maioria (51,9%) possui renda individual de um salário mínimo (R$300,00) seguidos pelos que possuem 1 a 3 salários mínimo (21,8%) e sem renda (13,2%). Esta variável pode se tornar um complicador frente à incapacidade funcional, em razão das novas demandas necessária para o enfrentamento deste agravo.

Incapacidade funcional

Nesse estudo, a incapacidade funcional foi identificada através das respostas obtidas dos idosos/informante auxiliar/informante substituo que auto-declararam não conseguir realizar uma ou mais atividade da vida diária (AVD). Estas estavam categorizadas em: sem dificuldade, com pouca ou muita dificuldade e não consegue. Na Tabela 1, apresenta-se o número de idosos por categoria de análise, excetuando os que não apresentaram dificuldades.

Na Tabela 1 destacam-se as cinco AVD que apresentaram maior prevalência entre os idosos, obtidas através da resposta "não consegue". Essa categoria representa a incapacidade de realizar a AVD sozinho, necessitando, portanto, de ajuda de outra pessoa, caracterizando assim a dependência do idoso. As cinco AVD foram reagrupadas em "consegue", "consegue com dificuldade" e "não consegue" e estratificadas por sexo e faixa etária para proceder à análise estatística.

Verificou-se que há maior proporção de homens que não apresenta dificuldade para cortar as unhas dos pés, enquanto as mulheres conseguem com dificuldade, na faixa etária de 60|-70 anos (c2= 47,52; p<0,0001). Quanto às faixas de 70|-80 anos (c2= 24,49; p<0,0001) e 80 e mais (c2= 9,94; p=0,009), os homens mantém sem dificuldade e as mulheres não conseguem. Tanto para o sexo masculino (c2= 91,57; p<0,0001) quanto para o feminino (c2= 135,93; p<0,0001) o grau de dificuldade caminha da capacidade até a incapacidade, conforme se eleva a faixa etária.

Nas faixas etária de 60|-70 (c2= 6,45; p=0,039), 70|-80 (c2= 11,68; p=0,0029) e 80 anos e mais (c2= 6,78; p=0,034) há maior proporção de homens que consegue fazer compras diversas em relação às mulheres. No sexo masculino o grau de dificuldade varia de acordo com a faixa etária, não apresentando dificuldade entre 60|-70 anos, realizando com dificuldade entre aqueles com 80 anos e mais e não conseguindo os que possuem 70|-80 (c2= 88,14; p<0,0001). No sexo feminino o grau de dificuldade aumenta de acordo com a elevação da faixa etária (c2= 189,91; p<0,0001).

Para a AVD subir e descer escadas observou-se que nas faixas etárias de 60|-70 (c2= 14,76; p=0,00062) e 70|-80 anos (c2= 25,24; p<0,0001) a maioria dos homens não apresentam dificuldade para sua realização enquanto as mulheres conseguem, mas com dificuldade. Entre os idosos com 80 anos e mais os homens permanecem sem dificuldade, contudo as mulheres não conseguem (c2= 7,88; p=0,0194). Especificamente no sexo masculino há maior proporção de homens que não tem dificuldade, mudando tal condição para os que possuem 80 anos e mais que não conseguem (c2= 26,75; p=0,00002). No sexo feminino, conforme se eleva a faixa etária, aumenta o grau de dificuldade, caminhando da independência, ou seja, consegue sem dificuldade para a dependência, não consegue (c2= 108,71; p<0,0001).

Ao comparar os sexos não obteve associação significativa na dificuldade de medicar-se na hora entre os sexos nas diversas faixas etárias: 60|-70 (c2= 0,31; p=0,86); 70|-80 (c2= 4,4; p=0,11) e 80 e mais (c2= 1,66; p=0,44). Quanto ao sexo masculino, os homens não conseguem medicar-se no horário somente entre aqueles com 80 anos e mais (c2= 46,16; p<0,0001). O grau de dificuldade no sexo feminino aumenta a cada faixa etária, chegando a não conseguir entre as mulheres com 80 anos e mais (c2= 116,22; p<0,0001).

Não se verificou diferença significativa entre os sexos, nas faixas etárias de 60|-70 (c2= 2,16; p=0,34) e quanto o grau de dificuldade para andar perto de casa. Contudo, entre os idosos com 70|-80 anos há maior proporção de mulheres com dificuldade em relação aos homens, que não a possui (c2= 14,27; p=0,0008). Entre os idosos com 80 anos e mais há maior proporção de mulheres com incapacidade de andar perto de casa enquanto os homens conseguem (c2= 9,29; p=0,00962). Analisando o sexo masculino, nas primeiras duas faixas etárias estudadas a maioria dos homens consegue, enquanto os que estão com 80 anos e mais não conseguem (c2= 35,58 p<0,0001). No sexo feminino o grau de dificuldade aumenta conforme se eleva a idade (c2= 143,16; p<0,0001).

Para todas as cinco AVD estudadas há maior proporção de mulheres, que apresentam incapacidade funcional quando comparada aos homens. Estes dados corroboram os encontrados em pesquisa, realizado com a população idosa brasileira.5 Os estudos de incapacidade funcional têm mostrado maior prevalência entre as mulheres do que nos homens, podendo ser melhor explicado não pela maior ocorrência, mas pelas diferenças na sobrevivência e nas morbidades associadas.10 Tem-se verificado na literatura um maior padrão de consumo de cuidados de saúde para mulheres. Nesta perspectiva, a feminilização da população idosa gera transformações sociais, que necessitam ser apreendidas para que se possa contribuir com a sua qualidade de vida e sua atividade social. A enfermagem deve estar atenta a este fato para que possa desenvolver o cuidado buscando estratégias que diminuam o possível sofrimento cotidiano para o idoso que, com a incapacidade funcional, pode perder também sua autonomia. Por outro lado, diversas alterações podem ocorrer no âmbito familiar envolvendo o afeto, as finanças, as relações de poder, dentre outras.17 O cuidado ao idoso deve ser estimulado e preservado pela equipe multidisciplinar que deve realizar visitas periódicas, no domicílio, visando apoiar, orientar e supervisionar o cuidador, em busca da atenção qualificada ao idoso com incapacidade funcional.11

Os idosos apresentaram incapacidade funcional, majoritariamente, para as AVDs que exigem movimento e deslocamento, como o estudo realizado por Thober, Creutzberg e Viegas.11 Estas atividades podem aumentar a sobrecarga dos cuidadores que, na maioria das vezes são mulheres, mais velhas que ocupam maior parte do seu tempo com os cuidado aos idosos com incapacidade funcional, postergando as suas próprias necessidades.12-14,16

Verificou-se que a maior prevalência de incapacidade funcional estava relacionada tanto com as atividades básicas da vida diária (ABVD) (cortar as unhas dos pés, subir e descer escadas) quanto com as atividades instrumentais da vida diária (AIVD) (medicar-se na hora e fazer compras diversas e andar perto de casa). As ABVD estão relacionadas à capacidade do autocuidado pessoal enquanto que as AIVD com a forma de viver independente na comunidade. A incapacidade funcional pode diminuir o relacionamento com amigos e as atividades de lazer, que contribui com o desenvolvimento pessoal e coletivo.18 Desta forma, o tempo, que parece sobrar, precisa ser preenchido, para afastar o fantasma da solidão. A enfermagem deve atentar para este fato, procurando identificar atividades de lazer que podem ser realizadas pelo idoso com incapacidade funcional e pelo seu cuidador. Deve-se compatibilizar tais atividades com os interesses dos idosos, estimulando também sua posição ativa na sociedade.

A incapacidade funcional têm se tornado um desafio a ser enfrentado, uma vez que a expectativa de vida tem aumentado levando ao conseqüente crescimento de idosos com incapacidade funcional. Deve-se implantar uma política intersetorial, estabelecendo a atenção multiprofissional voltada para a promoção da saúde e prevenção de incapacidade funcional entre os idosos.7

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao comparar os sexos, verificou-se que para todas as AVDs, exceto para a capacidade de medicar-se na hora, a proporção de mulheres com incapacidade funcional é maior quando comparada aos homens.

Ao verificar as faixas etárias, no sexo masculino, a incapacidade funcional para subir e descer escadas, andar perto de casa e medicar-se no horário possuem maior proporção entre os idosos com 80 anos e mais. Já para as AVDs fazer compras diversas e cortar as unhas dos pés, a proporção de idosos com incapacidade funcional aumenta de acordo com a elevação da faixa etária. O mesmo ocorre com o sexo feminino, exceto para a AVD cortar as unhas dos pés, que apresenta maior proporção entre as idosas com 80 anos e mais.

Esta pesquisa reforça a necessidade de redirecionar a atenção à saúde do idoso, buscando identificar, no cotidiano dos serviços de saúde, a presença de incapacidade funcional entre os idosos, as principais necessidades de cuidado e o conhecimento do cuidador para lidar com as incapacidades. E, diante das necessidades surgidas nas últimas décadas com o processo de envelhecimento populacional, torna-se imprescindível redirecionar a formação acadêmica e qualificação dos profissionais de saúde valorizando não somente o conteúdo, mas também a sua aplicação na prática profissional. A enfermagem, por sua vez, deverá compor a equipe multidisciplinar enfatizando a promoção à saúde e a prevenção de incapacidades.

Recebido em: 15 de agosto de 2006.

Aprovação final: 27 de dezembro de 2006.

  • 1 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Perfil dos idosos responsáveis pelos domicílios no Brasil, 2000. Rio de Janeiro (RJ):IBGE; 2002.
  • 2 Paschoal SMP. Autonomia e independência. In: Papaléo Netto M. Gerontologia: a velhice e o envelhecimento em visão globalizada. São Paulo (SP)/Rio de Janeiro (RJ)/Belo Horizonte (MG): Atheneu; 1996. p.313-23.
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    Esta escala possui 11 perguntas, realizadas ao informante, que busca verificar a capacidade do idoso em realizar algumas atividades como cuidar de seu próprio dinheiro, fazer compras sozinho, esquentar água para café ou chá e apagar o fogo, manter-se a par dos acontecimentos, lembrar de compromissos e acontecimentos, ficar sozinho em casa sem problemas, dentre outras. Cada questão possui respostas que variam de zero a três pontos (Sim, é capaz – zero ponto; Nunca fez, mas poderia fazer agora - zero ponto; Com alguma dificuldade, mas faz – um ponto; Nunca fez e teria dificuldade agora – um ponto; Necessita de ajuda – dois pontos; Não é capaz – três pontos).
  • 1
    Esta pesquisa recebeu apoio financeiro da Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Set 2007
    • Data do Fascículo
      Mar 2007

    Histórico

    • Aceito
      27 Dez 2006
    • Recebido
      15 Ago 2006
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