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Desafios da educação ambiental em uma instituição hospitalar

Resumos

o estudo objetivou conhecer os desafios da educação ambiental em um hospital, sob a ótica dos indivíduos envolvidos no seu planejamento e execução. Pesquisa de abordagem qualitativa, do tipo estudo de caso, tendo como sujeitos os trabalhadores do Núcleo de Educação Ambiental de um grupo hospitalar do Rio Grande do Sul. Os dados foram coletados entre agosto de 2011 e janeiro de 2012, por pesquisa documental e entrevista e sofreram análise de conteúdo. Os desafios da educação ambiental na instituição investigada englobam, principalmente, a carência de uma política ambiental institucional que funcione como um arcabouço financeiro, legal, estrutural e humano para o desenvolvimento de ações voltadas ao tema. Destaca-se, ainda, a falta de uma formação acadêmica preocupada com a sustentabilidade socioambiental. Trabalhar esses desafios, e contorná-los durante o desenvolvimento de ações de educação ambiental, é uma prerrogativa para a construção de um saber em prol da sustentabilidade socioambiental.

Meio ambiente; Enfermagem; Educação ambiental


A study aimed to get to know the challenges of environmental education in a hospital, from the perspective of the individuals involved in its planning and execution. The research used a qualitative approach, case study type, using the workers of the Center for Environmental Education of a hospital group in the Rio Grande do Sul state, Brazil, as subjects. Data were collected, between August 2011 and January 2012, through documental research and interviews, and analyzed by content analysis. The challenges of environmental education include the lack of an institutional environmental policy that works as a financial, legal, human, and structural background for the development of actions focused on this topic. It was also observed that academic graduation does not consider environmental sustainability. It is clear that to work on these institutional challenges and overcome them during the development of environmental education is a prerogative for the construction of knowledge in environmental sustainability.

Environment; Nursing; Environmental education


el objetivo de este estudio es conocer los desafíos de la educación ambiental en el contexto hospitalario, desde la perspectiva de los individuos involucrados en la planificación y ejecución. Investigación cualitativa de tipo estudio de caso, realizada con los trabajadores del Grupo de Educación Ambiental de un grupo hospitalario del estado de Rio Grande do Sul, Brasil. Los datos fueron recolectados, entre agosto de 2011 y enero de 2012, mediante recolección documental y entrevistas, sometidas a análisis de contenido. Los desafíos de la educación ambiental engloban la carencia de una política ambiental institucional que funcione como un sistema financiero, legal, estructural y humano para el desarrollo de las acciones relacionadas al tema. También se destaca la falta de una formación académica preocupada con la sostenibilidad socio-ambiental. Trabajar estos desafíos durante las acciones de educación ambiental, es primordial para la creación de conocimientos acerca de la sostenibilidad socio-ambiental.

Ambiente; Enfermería; Educación ambiental


INTRODUÇÃO

Nos últimos anos, é evidente a contínua e diária veiculação de informações acerca de catástrofes ambientais esperadas e inesperadas, sobre problemas ecológicos e seus impactos na sociedade, que decorrem, sobretudo, da globalização do mundo e da lógica científica cartesiana dominante no pensamento humano. Esse processo de degradação ambiental cresce, assombrosamente, e seus reflexos são sentidos no cotidiano social e nos espaços de trabalho. Contudo, apesar disso, poucas medidas são tomadas no sentido de freá-lo ou reduzi-lo.

Parte desta questão pode ser explicada, talvez, ao se retomar às circunstâncias histórico-sociais, envoltas na sua determinação, na medida em que esta situação de crise centra-se em longa história de dominação da natureza pelo ser humano, com raízes filosóficas assentadas desde a Idade Antiga e reforçadas pela tônica cartesiana/baconiana de que o homem é o senhor e possuidor do mundo.1 1. Camponogara S. Saúde e meio ambiente na contemporaneidade: o necessário resgate do legado de Florence Nightingale. Esc Anna Nery. 2012 Jan-Mar; 16(1):178-84.Daí a procedência e o perpetuar de atitudes profundamente antiecológicas, a compreenderem o progresso material como ilimitado, construído sobre e pelo domínio, manipulação e exploração da natureza.

Em consequência desse ideário, o mundo de hoje pode ser dito ecologicamente perigoso, porque introduz riscos que gerações anteriores não tiveram de enfrentar. São ameaças que resultam da própria ação humana, mediada pelo impacto do industrialismo sobre o meio material.2 2. Giddens A. Modernidade e identidade. Rio de Janeiro (RJ): Jorge Zahar; 2002.Nesse sentido, sociólogos contemporâneos sinalizam que vivemos, atualmente, na chamada "Sociedade de Risco", porque os riscos fazem parte do cotidiano dos seres humanos.22. Giddens A. Modernidade e identidade. Rio de Janeiro (RJ): Jorge Zahar; 2002. - 33. Beck U. Sociedade de risco: rumo a uma outra modernidade. Tradução de Sebastião Nascimento. São Paulo (SP): Editora 34; 2010. A problemática ambiental não é um fato isolado do tecido social, mas fruto de uma complexa e delicada teia de relações imbricadas com os diversos atores sociais.11. Camponogara S. Saúde e meio ambiente na contemporaneidade: o necessário resgate do legado de Florence Nightingale. Esc Anna Nery. 2012 Jan-Mar; 16(1):178-84.

Nessa perspectiva, a Educação Ambiental (EA) é essencial para preparar novas mentalidades e valores, abrindo portas para um futuro sustentável, equitativo e democrático.44. Leff E. A complexidade ambiental. São Paulo (SP): Cortez; 2003. No âmbito hospitalar, as reflexões propostas pelas atividades de EA podem motivar ações mais responsáveis (por parte dos trabalhadores) para com o meio ambiente, reordenando práticas sociais,55. Camponogara S, Ramos FR, Kirchhof ALC. Reflexividade, conhecimento e consciência ecológica: premissas para uma ação responsável no contexto do trabalho hospitalar. Rev Latino-Am Enferm. 2009 Nov-Dez; 17(6):1030-6 o que tem importância ímpar, considerando que o hospital possui uma gama enorme de atividades com impacto ambiental, gerando inúmeros resíduos e consumindo grande quantidade de recursos ambientais. Ante a inexistência desses espaços de reflexão, perpetua-se o automatismo e a mecanização das condutas. Nessa condição, os sujeitos ficam à margem das esferas participativas, conformando-se com a realidade posta e com a falta de perspectivas que já lhe são comuns ou assumindo discursos banalizados.55. Camponogara S, Ramos FR, Kirchhof ALC. Reflexividade, conhecimento e consciência ecológica: premissas para uma ação responsável no contexto do trabalho hospitalar. Rev Latino-Am Enferm. 2009 Nov-Dez; 17(6):1030-6 - 66. Camponogara S, Ramos FR, Kirchhof ALC. A problemática ecológica na visão dos trabalhadores hospitalares. Ciência Saúde Coletiva. 2011; 16(8):3561-70.

Uma vez que se reconheça a relevância da EA na promoção de mudanças, torna-se necessário discutir sobre as dificuldades encontradas na efetivação dos processos educativos, particularmente, em se tratando do contexto hospitalar, um campo amplo por suas possibilidades, atores e interesses. Olhar para a existência dessas dificuldades, e entendê-las, significa encará-las como desafios a serem transpostos, na tentativa de tornar a EA promotora da sustentabilidade socioambiental. Discutir sobre esses desafios pode ser uma forma de indicar, às instituições de saúde, caminhos (possíveis) para concretizar a EA, apontando exemplos a serem considerados, quando se cogitam investidas nesse âmbito.

Diante disso, o estudo teve como questão norteadora: como acontece a EA em uma instituição hospitalar a partir dos indivíduos diretamente envolvidos no seu planejar e concretizar formal? Para tanto, foi objetivo dessa investigação: conhecer os desafios da educação ambiental no contexto hospitalar, sob a ótica dos indivíduos envolvidos no seu planejamento e execução. Os resultados advindos dessa pesquisa contribuem para o debate do tema, especialmente para a enfermagem, que representa grande parte do contingente de trabalhadores de instituições hospitalares, além de, em muitas dessas instituições, participar diretamente de comissões de gestão ambiental.

METODOLOGIA

A pesquisa foi orientada pela abordagem qualitativa, caracterizando-se como Estudo de Caso (EC) descritivo-exploratório, por propor uma narrativa circunscrita pelo tempo, espaço e circunstâncias em que está inserida.77. Martins GA. Estudo de caso: uma estratégia de pesquisa. 2ª ed. São Paulo (SP): Atlas, 2008. - 88. Yin RK. Estudo de caso: planejamento e métodos. 4ª ed. Porto Alegre (RS): Bookman; 2010. O EC objetiva o estudo de uma unidade social de maneira profunda e intensa, dentro do seu contexto real,7 7. Martins GA. Estudo de caso: uma estratégia de pesquisa. 2ª ed. São Paulo (SP): Atlas, 2008.sendo norteado por questões-problema complexas e contemporâneas, do tipo "como" e "por que",88. Yin RK. Estudo de caso: planejamento e métodos. 4ª ed. Porto Alegre (RS): Bookman; 2010. pouco conhecidas, a exemplo do objeto desta busca. Para este tipo de pesquisa, é conveniente a adoção de diferentes frentes de investigação e o uso de técnicas distintas para coleta das informações, o que é característico do EC. Com isso, tem-se um diálogo entre as evidências encontradas e a garantia de confiabilidade e encadeamento das interpretações tecidas.55. Camponogara S, Ramos FR, Kirchhof ALC. Reflexividade, conhecimento e consciência ecológica: premissas para uma ação responsável no contexto do trabalho hospitalar. Rev Latino-Am Enferm. 2009 Nov-Dez; 17(6):1030-6

O levantamento e análise dos dados foi efetuado entre agosto de 2011 e janeiro de 2012, junto a um grupo hospitalar do estado do Rio Grande do Sul, o qual constitui importante rede pública de hospitais do sul do país e um relevante polo de ensino na região. No vocabulário dessa investigação, definiu-se sujeito pesquisado como qualquer indivíduo trabalhador do grupo hospitalar em questão, que estivesse (diretamente) envolvido no planejamento e/ou concretização da EA nos hospitais desse grupo, o que incluiu: integrantes do Núcleo de Educação Ambiental do grupo hospitalar e informantes-chave por eles indicados, totalizando nove indivíduos.

A coleta de dados baseou-se em pesquisa documental e entrevista individual semiestruturada, sendo encerrada por saturação empírica. A pesquisa documental visou acessar documentos pertinentes ao objeto de estudo, dentre eles: relatórios institucionais, boletins informativos, editais de cursos, atas de reuniões, materiais utilizados na divulgação de seminários, encontros, palestras e visitas técnicas, agendas estratégicas de gestão, plano de gerenciamento de resíduos, etc. As entrevistas, por sua vez, foram pré-agendadas e realizadas em local reservado, gravadas digitalmente, posteriormente, transcritas. Foram orientadas por um roteiro, contendo questões norteadoras acerca do tema em investigação.

Os dados foram analisados com base no referencial proposto para análise de conteúdo,99. Bardin L. Análise de Conteúdo. Versão reatualizada e reimpressa. Lisboa (PT): Edições 70; 2013. com auxilio do software ATLAS.ti (Qualitative Research and Solutions). Esse software destina-se à análise qualitativa de informações na forma textual, gráfica, de áudio ou vídeo, oferecendo ferramentas para administrar, extrair, comparar, explorar e remontar- de forma sistemática, rápida e prática- partes significativas de uma grande quantidade de dados. O programa funciona à semelhança de um "container" inteligente, que armazena o rastreamento da informação gerada no documento primário e os materiais a ele associados, habilitando-os em uma única entidade de trabalho.10 10. Friese S. ATLAS.ti 6 -Tour rápido. ATLAS.ti Scientific Software Development GmbH, Berlim (DE): Tradução à língua portuguesa, García I; 2011.Através desse processo foram construídos quatro eixos temáticos, sendo que um deles discute os desafios da EA em instituições hospitalares, conglomerando seis categorias, que serão apresentadas nesse artigo.

Salienta-se que o projeto de pesquisa foi submetido à aprovação da direção institucional e do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos do grupo hospitalar, na intenção de se assegurar o cumprimento da Resolução n. 196/96 do Conselho Nacional de Saúde. Somente após a tramitação de todos os requisitos exigidos, e emissão de carta de aprovação (Projeto 11-127 aprovado em 02/08/2011), foi iniciada a coleta das informações almejadas. Os sujeitos selecionados participaram do estudo após leitura, aceite e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, sendo adotado o uso da letra "E", seguida de um número (1, 2, 3...), para suas identificações, preservando o necessário anonimato.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Quando se visualiza os passos dados pelo grupo hospitalar investigado, em termos de EA, observa-se a presença de algumas conquistas no campo educativo, embora tímidas, pontuais e fragmentadas; e por isso, insuficientes para promover as mudanças necessárias ante a degradação ambiental vigente. Os resultados dessa pesquisa denotam que os fundamentos da EA - no grupo em questão - florescem das iniciativas de alguns defensores apaixonados pelo tema, ou limitam-se a determinados setores do hospital. Tais iniciativas ligaram-se, especialmente, as atividades do Núcleo de Educação Ambiental (existente no grupo hospitalar no período de 2008 a 2011) e remeteram a discussões, palestras, visitas técnicas, seminários e outras ações acerca do gerenciamento de resíduos, preservação e saúde ambiental.

Evidentemente, a insuficiência dos desdobramentos das atividades educativas desenvolvidas, precisa ser analisada sob o ponto de vista da carência de ações e recursos para concretizá-las, mas igualmente, sob a ótica das dificuldades e desafios encontrados pela EA no interior de unidades hospitalares. Algumas dessas dificuldades foram trazidas pelos sujeitos dessa pesquisa e são analisadas nas categorias que seguem.

A categoria 1 "Porque não existe uma política institucional: o desafio de consolidá-la", evidencia a dificuldade de se concretizar ações de EA em um contexto de inexistência de um arcabouço político-institucional que as legitime, oferecendo consistência, objetividade e continuidade ao processo educativo. Talvez esse seja um dos maiores desafios da EA nos hospitais: criar e consolidar essa política institucional. A reflexão ética sobre o tema e a presença de uma política institucional, vinculada ao assunto, são fundamentais para a efetiva conscientização em torno da problemática ambiental.66. Camponogara S, Ramos FR, Kirchhof ALC. A problemática ecológica na visão dos trabalhadores hospitalares. Ciência Saúde Coletiva. 2011; 16(8):3561-70.

Para os entrevistados, a formalização de tal arcabouço, representa a possibilidade real de aporte estrutural, financeiro e humano, bem como, de respaldo legal para as ações de EA. Nessa situação, o hospital assumiria a sua responsabilidade social e "diria" aos seus funcionários: olha a gente pensa que isso aqui é importante (E2); que a questão ambiental não pode ficar no esquecimento. Afinal, quando a EA adquire um lugar formalmente constituído, torna-se viável que as múltiplas ações existentes constituam um mecanismo integrado de gestão ambiental. Porque quando a instituição toma a EA como sua responsabilidade, ela diz ao seu funcionário: [...] está lá na meta, você tem a ver, tem que fazer (E5).

Construir esse arcabouço, e trabalhá-lo junto aos funcionários, é um modo de balançar a rotina, de rachar aquele casulo protetor que se alimenta da rotina de olhar, mas não ver; e de ver sem sentir, de ver sem viver o ambiente.2 2. Giddens A. Modernidade e identidade. Rio de Janeiro (RJ): Jorge Zahar; 2002.E quando se deseja o engajamento de todo o grupo com a problemática ambiental, balançar a rotina é essencial. Logo, para engendrar as transformações necessárias é preciso mais do que mudanças individuais, é imperativo a presença dessa dimensão política, ancorada em práticas institucionais.55. Camponogara S, Ramos FR, Kirchhof ALC. Reflexividade, conhecimento e consciência ecológica: premissas para uma ação responsável no contexto do trabalho hospitalar. Rev Latino-Am Enferm. 2009 Nov-Dez; 17(6):1030-6 Essa condição é preponderante para a solidificação de um espaço efetivo de e para a EA no hospital.

Segundo os sujeitos dessa pesquisa, a oferta desse mote estrutural, financeiro, legal e humano pode transformar ações fragmentadas e pontuais, em contíguas e emanadas do coletivo, aumentando a amplitude de seu alcance. "Dar" condições objetivas e concretas para que a mudança aconteça significa criar condições que garantam a interlocução efetiva e afetiva, viabilizando laços de confiança entre os envolvidos.11 11. Loureiro CFB, Franca N, Layrargues PP, Lopes SA. Cidadania e meio ambiente. Salvador (BA): Centro de Recursos Ambientais; 2003.Semelhante manifestação é revelada em depoimentos como: eu acho que tinha que ser uma política instituída pela direção: 'bom eu quero porque eu sou administrador e entendo que, para reduzir custos, para implementar um plano de gestão ambiental, isso é necessário! E, vai ajudar a cumprir minha função, enquanto hospital, de promover saúde [...]' (E1). [...] então, para a gente conseguir mudar isso precisaria ter uma política ambiental da instituição, uma diretriz [...], eu acho que a falta de orientação, de uma política de EA é um ponto crucial [...] (E2). Portanto, se o hospital não abraçar como meta, como política de gestão, é muito complicado [...] (E9). [...] essa questão ambiental deveria ter um tronco único! [...] Aí sim, haveria certa continuidade, senão, a coisa se perde! (E6).

Ou seja, com a validação de uma política local, a sustentabilidade torna-se uma referência para a instituição, o que viabiliza a construção gradual de um comprometimento institucional e de novas formas de pensar, crer e fazer. Esse compromisso, ao ser tratado abertamente e exposto em uma política estruturada, funciona como um poderoso mecanismo de "pressão" para que os indivíduos pensem e ajam de maneira ambientalmente correta.12 12. Anderson R, Amodeo M, Hartzfeld J. Mudando as Culturas Empresariais Internamente. In: Assadourian E, organizador. Estado do Mundo, 2010: estado do consumo e o consumo sustentável. Salvador (BA): Uma ed; 2010.Em suma, quando o hospital estrutura essa política, ele se compromete com o ostentar de um caráter de totalidade e permanência das ações de EA, criando uma identificação da instituição com a sustentabilidade socioambiental. Uma vez estabelecido esse compromisso, haverá um contínuo relembrar da necessidade de se ter uma visão diferenciada de meio ambiente na instituição. Com isso, a busca da sustentabilidade ambiental tornar-se-á amplamente alinhada aos sistemas, integrada às estruturas e institucionalizada nos processos corporativos.1212. Anderson R, Amodeo M, Hartzfeld J. Mudando as Culturas Empresariais Internamente. In: Assadourian E, organizador. Estado do Mundo, 2010: estado do consumo e o consumo sustentável. Salvador (BA): Uma ed; 2010.

Ante a inexistência e/ou inconsistência dessa política, é possível que as propostas ambientais se tornem vazias e/ou imediatistas, propagando-se em ações pontuais e superficiais, que, paulatinamente, falham em seus ensejos, já que lhes faltam "forças" para um desenvolvimento mais profundo. Sem atentar para essa esfera "política" da EA, é difícil desenvolver a criticidade e a reflexão, necessárias à educação e ao agir coletivo, uma vez que é a dimensão política que permite a participação coletiva, por intermédio da solidariedade.1313. Silveira E. A arte do encontro: a educação estética ambiental atuando com o Teatro do Oprimido. Educ Revista. 2009 Dez; 25(3):369-94.

É preciso assegurar, politicamente, as condições para a mudança, o que é um "dever básico" da instituição. Na proporção em que a organização validar os valores da sustentabilidade, mediante os sucessos alcançados, haverá uma rendição do seu antigo ceticismo ao entendimento de uma complexidade ambiental.1212. Anderson R, Amodeo M, Hartzfeld J. Mudando as Culturas Empresariais Internamente. In: Assadourian E, organizador. Estado do Mundo, 2010: estado do consumo e o consumo sustentável. Salvador (BA): Uma ed; 2010. Só assim as ações educativas irão adquirir consistência, sustento e respaldo; e as coisas terão andamento (E2), em todos os lugares. Caso contrário, o processo de EA se fragmentará, e tudo que se fragmenta, não se sustenta, acaba se dispersando (E1). A existência de pessoas trabalhando em dados setores [...] e estabelecendo algumas ações de EA, não significa, na verdade, um reconhecimento institucional [...] (E9). A existência desses indivíduos, com suas vontades, contribui para a efetivação da EA. Entretanto, pode ser que, com o apoio de uma política institucional, torne-se viável a manutenção de um grupo de trabalho para pensar e concretizar projetos de EA.

A necessidade de constituição desse grupo é apresentada na categoria 2 "Deveria haver uma equipe: faria muita diferença ter pessoas olhando só para isso". Quando os entrevistados defendem a constituição de um grupo para trabalhar, exclusivamente, com EA no hospital, eles reconhecem que essa variável não pode ser movimentada, unicamente, pelo esforço e vontade de alguns (ainda que esse movimento tenha relevância). É imperativa a presença de pessoas pensando sobre meio ambiente e sobre EA; e mais do que pensando, atuando nisso, exercendo suas atividades nessa área em particular. Defendem, portanto, que uma "fórmula" possível para romper com a fragmentação e pontualidade da EA, perpassa pela constituição de um grupo, formal e institucionalizado - ligado a uma política institucional, por ela apoiado e reconhecido como legítimo e permanente, para trabalhar, continuamente, com essa questão e somente com ela.

Assim, ao invés de malabarismos e contorcionismos de alguns, na tentativa de sensibilizar o grande grupo de trabalhadores, haverá uma rede de indivíduos, alicerçados institucionalmente, buscando envolver os demais na causa ambiental. Sobre o que, é necessário considerar, que sendo a defesa dessa mudança cultural um movimento pioneiro na instituição, é importante que se trate de um grupo tentando fazê-la, e não de um indivíduo aqui ou ali. Todavia, para que este não seja apenas mais um grupo, dentre tantos outros, que vêm e vão, ele precisa do alicerce de uma sólida política institucional ou logo sucumbirá.

Então, para os entrevistados, é essencial [...] ter um grupo, mesmo que pequeno, pensando e trabalhando com EA; e não tendo que pensar nisso e também no trabalho que ficou esperando na mesa [...] porque, senão, quando o trabalho aperta [...] será feito aquilo para o que se foi contratado; a tua função, o que é teu dever! Porque, senão, vai ficar ruim para ti, para o teu setor e quem sabe, para a gerência (E2); [...] então, a maneira é essa: é ter um grupo, uma equipe que trabalhe voltada unicamente para isso [...] (E7).

De fato, os depoimentos anteriores ratificam que não há como solidificar um processo de EA nas instituições de saúde, apenas pelo "heroísmo" de alguns. É preciso o aporte de um arcabouço institucional. Afinal, é a estrutura institucional que possibilita a construção de uma política ambiental local, a realização de diagnósticos situacionais, a busca por soluções alternativas aos problemas ambientais e, também, a existência de verbas para programar e executar atividades educativas em prol de ações sustentáveis. Talvez, em um ou dois séculos, essas ações abrangentes (de grupos apoiados em instituições), para liderar uma nova orientação cultural, não sejam mais necessárias, porque as pessoas já terão internalizado muitas dessas novas ideias, enxergando a sustentabilidade como "natural". Contudo, até lá, esses pioneiros culturais serão imprescindíveis para impelir as pessoas, proativa e intencionalmente, a acelerarem, tanto quanto possível, essa mudança.1414. Assadourian E. Ascensão e queda das culturas de consumo. In: Assadourian E, organizador. Estado do Mundo, 2010: estado do consumo e o consumo sustentável. Salvador (BA): Uma Ed; 2010.

Nesse processo é importante (e não menos desafiante) envolver as chefias/os gestores na defesa da sustentabilidade socioambiental no hospital, o que compreende a categoria 3 "Aqui dentro do hospital não se faz nada sem o apoio dos gestores". De fato, trabalhar as diversas facetas da sustentabilidade, com os líderes institucionais, afasta os "possíveis" ceticismos que eles possuam em torno dessa questão, ampliando sua capacidade de resistir às pressões dos paradigmas dominantes no mercado. Sensibilizar a gestão é o caminho para superar a reação natural de defesa do status quo presente nas organizações.1212. Anderson R, Amodeo M, Hartzfeld J. Mudando as Culturas Empresariais Internamente. In: Assadourian E, organizador. Estado do Mundo, 2010: estado do consumo e o consumo sustentável. Salvador (BA): Uma ed; 2010.

O movimento de sensibilizar as chefias exigirá que se posicionem contra ou a favor da sustentabilidade; exigirá uma tomada de atitude neste ou naquele sentido. Sempre que houver uma resposta positiva, a liderança assumirá o papel de mensageiro (a precursora na defesa da questão ambiental dentro da sua instituição), pregador (divulgando a sustentabilidade), professor (ensinando o processo de EA) e de líder de torcida (encorajando valores ambientais na instituição). Ao exercer esses papéis, os gestores buscarão engajar outras pessoas da organização na construção e defesa daquele arcabouço de sustentação para a EA.1212. Anderson R, Amodeo M, Hartzfeld J. Mudando as Culturas Empresariais Internamente. In: Assadourian E, organizador. Estado do Mundo, 2010: estado do consumo e o consumo sustentável. Salvador (BA): Uma ed; 2010.

Por isso, as ações de EA devem ter íntima ligação com os diferentes gestores institucionais (começando pela alta direção), granjeando apoio e estabelecendo os acertos necessários para sua efetivação. Conforme os entrevistados, o envolvimento da gestão é um indicativo, para os demais, de que "é assim que as coisas são feitas por aqui: com sustentabilidade", "é assim que nós (a instituição) queremos agir, é isso que queremos defender, independente de nossos tantos outros problemas". Aparentemente, sem esse aval, o processo de EA não deslancha, fica fragmentado, pontual, em segundo plano; encontra dificuldades estruturais e humanas, é enfraquecido pela falta de respaldo.

Não obstante, há de se considerar neste propósito (de sensibilizar), o que alguns dos sujeitos dessa pesquisa chamam de ocupação política de cargos de chefia. Para eles, essa característica pode (embora não necessariamente) aumentar, substancialmente, os desafios na sensibilização dos gestores, na proporção em que os "novos gestores" poderão ser totalmente leigos em relação à causa ambiental; o que não representa, obviamente, uma não abertura para ela, antes, maior dispêndio temporal para alcançá-la. Isso pode levar a perdas na continuidade dos processos de EA, quando atrelado à ausência de uma política local instituída. Nesse caso, novas sensibilizações seriam requeridas, outras pessoas precisariam ser "angariadas" para a causa; e o trabalho, de certo modo, reiniciaria, ou então, estaria sob o risco de não encontrar o mesmo aporte, o mesmo incentivo ou, ainda, de tomar rumos diferenciados. Além disso, é cansativo, desestimulador e frustrante ter de passar por todo esse processo a cada nova gerência. Essa condição de repetitividade pode, inclusive, minar as energias disponíveis para as ações de EA, ou ainda, desintegrar os grupos formados.

Os seguintes depoimentos evidenciam o quanto a ocupação e troca de cargos de gerência, pode influenciar no desenvolvimento e continuidade das ações de EA: [...] o hospital, em si, é gerenciado por pessoas que não obedecem ao critério técnico; é o critério político para ocupação dos cargos. [...] Esses caras assumem; [...] no primeiro ano ele não sabe o que tem de ser feito, ele não é técnico! No segundo ano, com muita boa vontade, ele experimenta alguma coisa para ver se entendeu, e no terceiro, ele consegue fazer alguma coisa. No quarto, ele já está preocupado com a reeleição do partido. Aí assume outra pessoa e começa tudo de novo, mais uma vez. [...] é muito frustrante [...] (E6). Então [...] daqui a quatro anos muda a gestão e aí se desmonta aquele grupo, porque quem assume decide: bom esse grupo não é mais necessário, não precisa mais trabalhar com meio ambiente, vai cada um para o seu canto, para a sua função inicial [...] (E7).

Sem dúvida, os movimentos em prol da EA encontram barreiras (outras vezes incentivos) nas motivações políticas subjacentes às ocupações dos cargos de gerência; o que explica o porquê de projetos educativos apresentarem dada inconsistência política e imediatismo. Na verdade, até é possível sensibilizar para a causa ambiental grande parte dos gerentes, de uma gestão X ou Y. No entanto, até que ele seja estimulado pelo assunto e busque efetivar alguma ação contínua, já estará no final de seu mandato e, aí, será a vez de outro decidir se deve romper ou dar continuidade ao que vinha sendo feito. Ou seja, a continuidade dependerá das motivações que "esse outro" apresente ao assumir seu cargo. A única forma de romper com esse modelo e, com isso, garantir certa continuidade nas ações, se baseia na transformação da EA em uma política institucional, a ser seguida por todos os gestores, independente das motivações que os levem a "estar" em determinado cargo.

A ausência dessa política local e o não envolvimento (ou o pouco envolvimento) das gerências (e de seus gestores) na sua efetivação podem concorrer para desgastar as forças daqueles envolvidos com a EA, levando-os ao desânimo e à desmotivação. O desafio, dos entrevistados, de vencer o próprio desânimo e superar o desgaste advindo de resultados insuficientes, é discutido na categoria 4 "A gente perde um pouco de força, se desgasta".

Essa categoria reitera que a necessidade de busca contínua, por resultados positivos na EA, pode gerar um estado de desgaste profissional, geralmente, associado às frustrações decorrentes de resultados insuficientes, insatisfatórios. Para os entrevistados, quando o indivíduo tenta "nadar contra a maré"- a maré da política partidária, a maré da falta de uma política local- é possível que as suas expectativas não sejam atingidas, o que pode, com o passar do tempo, desencadear uma vulnerabilidade para a ocorrência de desmotivação. Esta desmotivação, por sua vez, tenderia a levar a um quadro de exaustão emocional, despersonalização e baixa realização com o trabalho, de modo que qualquer novo esforço vira sinônimo de inutilidade. Nesse ponto, também é papel da organização averiguar e analisar os possíveis desmotivadores institucionais e buscar estratégias eficazes para a reversão desse quadro. As organizações precisam investigar a origem dos seus problemas e encontrar meios para solucioná-los, senão, a exemplo das pessoas, acabarão adoecendo.

Ao que tudo indica, no caminho da EA, muitos dos dificultadores fazem com que os indivíduos se desmotivem e, paulatinamente, "entreguem os pontos". Nessa condição, manter-se motivado e "apaixonado" pela causa ambiental, passa a ser mais um dos tantos "desafios", a ser encarado pelos entrevistados. Essa compreensão pode ser visualizada a partir de depoimentos como: [...] me surpreendeu quando ele tomou a decisão de querer sair por não se sentir motivado para fazer aquele mínimo que ele fazia [...] (E2 ). [...] a gente perde um pouco de força, meio se desgasta [...] (E8). Pode-se dizer, então, que [...] as pessoas que trabalham, e que acreditam nesse trabalho, são pessoas, até certo ponto, abnegadas [...] Porque elas sabem que o retorno é lento [...] sabem que se tu não tiveres a persistência, tu desistes [...] tu tens que saber viver na frustração, se tu trabalhas com meio ambiente [...] (E9).

Diante dessas colocações, percebe-se que a constituição de um campo ambiental autônomo no interior das instituições de saúde, enquanto um campo de relações sociais, pode auxiliar no (re) significar da experiência individual e coletiva, a partir da oferta de aporte às atividades educativas. Por outro lado, a ausência desse campo, a demora em sua formulação ou sua heteronomia excessiva, tende, com o tempo, a reduzir as forças e o ânimo dos envolvidos nesse processo, gerando desgastes. O fato é que o campo ambiental, por ser emergente, é de certa maneira frágil e heterônomo, com fronteiras pouco delimitadas. Essa condição o torna passível a atravessamentos de várias ordens (política, de outros campos sociais, de demandas sociais, etc.), determinando uma baixa definição de seu perfil e fragilidades que o desgastam1515. Carvalho ICM. Educação ambiental crítica: nomes e endereçamentos da educação ambiental. In: Layrargues PP, organizador. Identidades da educação ambiental brasileira. Brasília (DF): Edições Ministério do Meio Ambiente; 2004. - 1616. Carvalho ICM. A configuração do campo de pesquisa em educação ambiental: considerações sobre nossos autorretratos. Pesq Educ Ambiental. 2009; 4(2):127-34. ou o fazem sucumbir antes mesmo de nascer. Todavia, à medida que ele for internalizado nas esferas sociais e na consciência dos indivíduos, se processará um reconhecimento de sua legitimidade e a produção de um habitus ecológico capaz de também afetar outros campos sociais17 17. Carvalho ICM, Farias CR, Pereira MV. A missão "ecocivilizatória" e as novas moralidades ecológicas: a educação ambiental entre a norma e a antinormatividade. Ambiente Sociedade. 2011 Jul; 14(2):35-49.e deixar sua marca.

A questão ambiental torna plausível não apenas um discurso político, mas também inaugura um estilo de vida que, no plano individual, leva à incorporação de hábitos e atitudes.1818. Carvalho ICM. Natureza e cultura na psicanálise e no ideário ecológico: duas perspectivas sobre o mal estar na cultura. Revista Electrónica de la Asociación Española de Americanistas [online]. 2010 [acesso 2013 Out 02]; (5):1-11. Disponível em: http://revistas.um.es/navegamerica
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Não obstante, mesmo o indivíduo motivado por ideais de sustentabilidade ambiental, dificilmente consegue efetivá-los ou mantê-los na totalidade das situações cotidianas (tanto mais na ausência daquele arcabouço já comentado), mesmo que tente fazê-lo. Na verdade, à medida que tentam viver de acordo com esses valores ecológicos, esse tentar, certamente, esbarra em vários obstáculos. Alguns dos entraves se devem a permanência de uma sociedade e de instituições com valores menos ecológicos do que seria necessário (algumas, inclusive, não têm nada de ecológico); de jeito que, nem sempre, estimulam políticas e estilos de vida ambientalmente sustentáveis.1919. Carvalho ICM. Subjetividade e sujeito ecológico: contribuições da psicologia social para a educação ambiental. In: Guerra AF, Taglieber E, organizadores. Educação ambiental: fundamentos, práticas e desafios. Itajaí (SC): Editora da Univali; 2007 - 2020. Carvalho ICM. Educação Ambiental: a formação do sujeito ecológico. 6ª ed. São Paulo (SP): Cortez; 2012.

Assim, não é incomum a existência de contradições, conflitos e negociações, mesmo para quem se identifica com a proposta ecológica. Há uma permanente negociação intrapessoal, interpessoal e política em torno das decisões do dia a dia, que invariavelmente, pode resultar em algum desgaste e abatimento. Então, quando a pessoa assume o desejo e o compromisso de manter certa consonância entre sua vida e sua causa,1919. Carvalho ICM. Subjetividade e sujeito ecológico: contribuições da psicologia social para a educação ambiental. In: Guerra AF, Taglieber E, organizadores. Educação ambiental: fundamentos, práticas e desafios. Itajaí (SC): Editora da Univali; 2007 - 2020. Carvalho ICM. Educação Ambiental: a formação do sujeito ecológico. 6ª ed. São Paulo (SP): Cortez; 2012. ela espera que posicionamentos políticos, afinados com os ideais ecológicos, alinhem-se com suas opções individuais e atitudes pessoais e interpessoais. Contudo, quando isso não ocorre, é possível, por sua vez, ou um afastamento dos próprios valores (o que é motivo de uma despersonalização) ou um afastamento daquilo (no caso, a instituição) que não se encaixa com esses valores. Daí a razão para que o desgaste e o fator motivacional estejam entre os tantos outros desafios da EA.

Outro elemento que pode ser incluído entre esses desafios remete à necessária avaliação das ações desenvolvidas, o que é discutido na categoria 5 "Impacto, é difícil a gente medir: a avaliação como desafio". Quando se fala em EA, a manutenção do processo de participação é dependente da contínua renovação, dos avanços, e mesmo, dos vínculos estabelecidos;11 11. Loureiro CFB, Franca N, Layrargues PP, Lopes SA. Cidadania e meio ambiente. Salvador (BA): Centro de Recursos Ambientais; 2003.particularmente, porque as atividades educativas são, profundamente, marcadas pelos seus limites e possibilidades, assim como, pelas disputas internas e externas do campo ambiental.2020. Carvalho ICM. Educação Ambiental: a formação do sujeito ecológico. 6ª ed. São Paulo (SP): Cortez; 2012. Nesse sentido, a avaliação de resultados, parciais e intermediários, é importante para manter, não apenas um dado grupo motivado (o grupo de educadores e de educandos), mas, também, os laços de confiança e de apoio, criados durante o percurso.1111. Loureiro CFB, Franca N, Layrargues PP, Lopes SA. Cidadania e meio ambiente. Salvador (BA): Centro de Recursos Ambientais; 2003. Investir tempo, energia e esforços na reflexão/avaliação (individual e organizacional) acerca das ações de EA, pode ser um meio de estabelecer a tensão necessária para impulsionar a mudança e determinar o nível de comprometimento imprescindível para seguir adiante.1212. Anderson R, Amodeo M, Hartzfeld J. Mudando as Culturas Empresariais Internamente. In: Assadourian E, organizador. Estado do Mundo, 2010: estado do consumo e o consumo sustentável. Salvador (BA): Uma ed; 2010.

Todavia, se existem tantos desafios quantos os já apresentados para a EA construir seu lugar e sua legitimidade, enquanto prática educativa institucional, o que não dizer dos processos de avaliação em EA! Por certo, em um contexto de algumas carências - carência de uma política local, de um grupo maior de indivíduos trabalhando com a questão, de recursos, de tempo disponível, de envolvimento das chefias, etc. - avaliar as atividades empreendidas, pode ser um desafio de considerável dimensão. Esse desafio é expresso nos depoimentos: [...] agora, a longo prazo, não sei quais os impactos que a gente teve, porque a gente não chegou a fazer essa medição de ver se tinha mudado ou não alguma coisa. Isso já seria um segundo passo e a gente não teve perna para fazer, para ver o que mudou [...] (E4); [...] essa é uma grande dificuldade que nós achamos [...]: avaliar o impacto; nós ainda não temos uma metodologia para isso [...] (E5); [...] ver o antes e o depois, não deu para ver [...], por não ter pernas! (E8)

Apesar dessa dificuldade, a avaliação é primordial para que se entenda se a ação empreendida (e sua metodologia) foi capaz de alavancar (re) sensibilizações e experiências significativas. A visualização dos resultados obtidos nas atividades efetivadas é essencial ao aprimoramento das ações e à tomada de decisões sobre os processos educativos subseqüentes, podendo, por exemplo, indicar quais métodos e técnicas de sensibilização favoreceriam a participação dos indivíduos e os resultados mais adequados nas ações de EA. Ou ainda, quais os melhores caminhos a serem trilhados na sensibilização dos diversos grupos, com suas peculiaridades e disparidades.

Em tal contexto, a avaliação seria um movimento reflexivo e retrospectivo, capaz de mostrar o sentido dos processos, dos problemas e das restrições manifestadas durante as ações, bem como as consequências/resultados dessas atividades. Esse processo reflexivo viabiliza o replanejamento das práticas educativas. Não obstante, convém salientar que a avaliação somente se revestirá de sentido, caso exista aquele arcabouço de uma política institucional apoiando as ações e ofertando-lhes os recursos necessários, assim como na presença de envolvimento das chefias e de um grupo totalmente voltado para este tipo de trabalho.

De tudo isso, a conclusão a que se chega é que a EA necessita do apoio de todos esses aspectos levantados anteriormente, mas, talvez, como apregoado pelos próprios entrevistados, essa questão da EA precisa ultrapassar o local de trabalho e ser interiorizada, igualmente, nas instituições de formação profissional. Essa é a abordagem desenvolvida na categoria 6" A formação não te oferece a oportunidade de discutir meio ambiente". Realmente, a tendência dos cursos de formação é de apenas incorporar o tema meio ambiente ao currículo pelo adicionamento/soma de disciplinas à ementa curricular, limitando os problemas ambientais à falta de informação sobre o assunto. Com isso, ofertar informação, em teoria, seria suficiente para "induzir" os estudantes a práticas ambientalmente corretas. Nesse ideário, a EA seria transformada em um simples veículo de comunicação sobre impactos ambientais, suas repercussões na sociedade, e medidas para remediá-los.2121. Riojas J. A complexidade ambiental na universidade. In: Leff E. A complexidade ambiental. São Paulo (SP): Cortez; 2003.

Essa forma de incorporação do meio ambiente à educação formal tende a destacar alguns dos problemas mais visíveis da degradação ambiental, como a contaminação dos recursos naturais, o manejo de lixo e a deposição de dejetos industriais, reduzindo a EA à adoção de uma pequena consciência ecológica dentro de um currículo tradicional.2222. Leff E. Saber ambiental: sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder. 4ª ed. Petrópolis (RJ): Vozes; 2001. Claro que, a despeito dessas limitações, alguns dos estudantes, com certa propensão a interessar-se pelos temas ambientais, podem encontrar uma via de conexão com tal temática e aprofundá-la em outros espaços,21 21. Riojas J. A complexidade ambiental na universidade. In: Leff E. A complexidade ambiental. São Paulo (SP): Cortez; 2003.como aconteceu com os próprios entrevistados desta pesquisa.

Segundo eles (os entrevistados), a formação acadêmico-profissional tem se isentado de trabalhar a interface homem-meio ambiente, na complexidade que esta abordagem requer, limitando-se a debates pontuais e deficitários. Daí indagarem se os diversos cursos, especialmente aqueles na área da saúde (no caso do hospital, sobretudo, a enfermagem, por corresponder ao maior contingente trabalhista), de fato preparam para tal questão: [...] eu questiono essa questão do próprio conhecimento da academia [...] eu não sei se esses cursos preparam as pessoas para isso [...]. Isso quer dizer que o próprio conhecimento não te coloca, não te oferece essa oportunidade de discutir isso! [...] (E6); [...] eu acho que faltam orientações e falta sobre isso na formação [...] (E5); [...] isso tinha que estar mais presente em todos os níveis de educação [...] (E9).

Todavia, mesmo que essa temática tenha suma importância e deva ser discutida nos vários níveis de ensino, formal e/ou informal, sabe-se que ainda é pouco debatida no processo formativo. Sabe-se, porém, que em termos de formação profissional em saúde esse aspecto tem extrema relevância, considerando que os impactos negativos da destruição e desequilíbrio ambiental afetam, direta e indiretamente, a condição de saúde e de doença das populações, trazendo novas demandas à prática do cuidado, para as quais os profissionais precisam estar preparados.2323. Viero CM, Camponogara S, Sari V, Erthal G. Percepção de docentes enfermeiros sobre a problemática ambiental: subsídios para a formação profissional em enfermagem. Texto Contexto Enferm. 2012. Out-Dez; 21(4):757-65.

Ante essas colocações, salienta-se que uma formação voltada para o meio ambiente, em qualquer dos níveis acadêmicos, precisa comportar uma dimensão que transcenda os objetivos programáticos de "ofertar" conhecimento, buscando, antes, a formação de uma identidade, pessoal e profissional, voltada ao ecológico. O saber discutido nesses locais necessita desse caráter diferenciado, de uma visão mais abrangente, que oportunize uma discussão ampla/sistêmica a respeito do meio ambiente. Afinal, para que seja possível desviar da tendência de uma ecologia superficial, a EA deve direcionar o indivíduo a uma consciência plena da sua relação de completude com o meio, viabilizando um processo de desenvolvimento sensível, que ofereça parâmetros para atitudes éticas no decurso existencial. Na ausência disso, se perpetuará uma ecologia superficial, concentrada, unicamente, no controle e gestão do ambiente natural, enquanto que, de outro lado, o movimento ambiental com fundamentos éticos, ampliaria a responsabilidade para com o ecossistema planetário.2424. Bach Júnior J. Educação ecológica e a fenomenologia da natureza de Goethe e Steiner na pedagogia Waldorf: a experiência estética no desenvolvimento da percepção ecológica. Inter-Ação: Rev Fac Educ UFG. 2008. Jan-Jun: 33(1):103-16.

Então, se os problemas ambientais têm origens no modo como as pessoas pensam, são, antes de mais nada, problemas de educação, relativos ao processo e essência do ensino formal e informal. Reconhecer tal fato, por sua vez, reivindica a compreensão de que a educação também pode causar problemas ou, ao menos, perpetuá-los; porque ao incentivarmos ideias educacionais que apenas transmitem/reproduzem dadas informações, incentivamos, igualmente, a ação sem reflexão crítica, ou a continuidade das rotinas estabelecidas e da cultura de padrões insustentáveis. A construção de conhecimentos que favoreçam essa discussão na formação profissional, sem sombra de dúvidas, favorecerá o processo reflexivo e o alcance, por parte dos futuros profissionais, de uma consciência ecológica, oportunizando a construção de valores que orientem um pensar e um agir proativos frente às demandas impostas pela crise ambiental nos seus "futuros espaços" de trabalho.2323. Viero CM, Camponogara S, Sari V, Erthal G. Percepção de docentes enfermeiros sobre a problemática ambiental: subsídios para a formação profissional em enfermagem. Texto Contexto Enferm. 2012. Out-Dez; 21(4):757-65.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os desafios apontados nesse estudo para o desenvolvimento da educação ambiental nas instituições hospitalares endossam que, somente quando a instituição adotar e hastear a "bandeira da sustentabilidade" - incorporando o pensamento sustentável em políticas e metas da organização, como um saber a ser construído e consolidado localmente e não como aparato normativo - haverá a possibilidade de um novo espectro de ação. Em outras palavras, em um cenário de sólida política institucional, existe maior disposição para a formação de um grupo com tempo integral para discutir, arquitetar e concretizar atividades de EA.

A presença de uma política ambiental local ofertará um arcabouço legal, estrutural, financeiro e humano para as ações, congregando o apoio das chefias e a formação de um grupo para a EA. Diante disso, será possível vencer os desgastes advindos das próprias tentativas de concretizar ações de EA; será viável avaliar impactos e exigir, através de uma lógica de mercado, que a formação se preocupe com a crise ambiental e eduque em uma lógica de sustentabilidade socioambiental.

Evidentemente, a sustentabilidade socioambiental, do ponto de vista hospitalar, perpassa pela capacidade institucional de vencer os desafios de criar uma política local, de envolver chefias, de disponibilizar e reunir um grupo de educadores para planejar e concretizar a EA, com recursos suficientes para levar os projetos adiante, avaliá-los e tecer as mudanças necessárias. Isso garantirá resultados positivos e força de vontade para contornar possíveis desânimos, bem como, exigirá formação para que novos profissionais adentrem no universo hospitalar com um olhar para a sustentabilidade socioambiental.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Apr-Jun 2014

Histórico

  • Recebido
    18 Abr 2013
  • Aceito
    14 Abr 2014
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