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“É uso do mundo dizer mal dos bons”:* * Sermão da Quinta Dominga da Quaresma (Vieira, 2015, t. II, v. IV, p. 148-166). ruína e restauração do marquês de Montalvão sob as voltas da roda da fortuna

“It is the use of the world to speak ill of the good”: ruin and restoration of the Marquis of Montalvão under the spins of the wheel of fortune

Resumo:

No contexto da Restauração portuguesa, a banalização das confianças promoveu uma profusão de suspeitas, prisões e execuções, mesmo no seio da mais alta fidalguia. Nem sempre a queda daqueles que cercavam o novo rei era definitiva, muito embora frequente. Uma das trajetórias mais representativas do binômio “subir” e “descer”, objeto de tanta tinta de Antônio Vieira, é a do marquês de Montalvão. Preso e libertado algumas vezes, Montalvão sintetizava uma conjuntura de incerteza, que conjugava fracasso e prestígio. Em face de uma carreira instigante e de uma tipologia variada de documentos, este artigo tem a pretensão de discutir a carreira do marquês à luz da ideia de roda da fortuna, alegoria comum nos escritos e representações de época. Uma de suas principais contribuições é a de que, apesar da noção de movimento advinda da roda da fortuna, ela acabava por cristalizar e conservar comportamentos sociais.

Palavras-chave:
Fortuna; Marquês de Montalvão; Restauração portuguesa

Abstract:

In the context of the Portuguese Restoration, the trivialization of trusts promoted a profusion of suspicions, arrests and executions, even within the highest nobility. The fall of those who surrounded the new king was not always definitive, although frequent. One of the most representative trajectories of the binomial “up” and “down”, object of lots of ink by Antônio Vieira, is that of the marquis of Montalvão. Arrested and released a few times, Montalvão synthesized a conjuncture of uncertainty, which combined failure and prestige. Facing an instigating career and a varied typology of documents, this article aims to discuss the marquis’ career bringing the idea of the wheel of fortune, a common allegory in the writings and representations of the time. One of his main contributions is that, despite the notion of constant movement from the wheel of fortune, it ended up crystallizing and conserving social behaviors.

Keywords:
Marquis of Montalvão; Portuguese Restoration

Sobre as águas do mar, um negociante Depois de vastas viagens, Dos ventos triunfando, Foi venturoso e rico. Tão esplêndidos banquetes Vendeu, pelo que quis, tabaco, açúcar, Canela e porcelana: [...] certo amigo, que via Requer donde lhe vinha tão bom pasto. - Donde é que me há-de-vir? Da minha agência. Tudo se deve a mim, ao meu talento, Ao meu desvelo, e a aventurar o tempo [...]. Quanto ganhado havia, arriscou tudo. Mas nada, desta vez, veio a salvo. Quem foi a causa? A imprudência. [...] Súbito se achou pobre; e o seu amigo, Que tão caído o viu: - Donde vem isso? - Ai de mim! Da Fortuna. - Consolai-vos. Se ela não consente Que gozeis de ventura, Tende juízo ao menos.1 1 Jean de La Fontaine, “A ingratidão e injustiça dos homens acerca da fortuna” (Martins, 2001, p. 180).

Fortuna favet fatuis” ou “Fortes fortuna adiuvat”? 2 2 “A fortuna favorece os parvos” ou “a fortuna favorece os audaciosos”?

Os versos acima, extraídos de uma das fábulas de Jean de La Fontaine, tratam de um mercador que atribuía seu enriquecimento à sua própria “agência”. Curiosamente, seu navio, chamado “Fortuna”, arribava em “salvo porto”, em clara alusão às inclemências do mar. Mas, no oceano das vaidades, tudo de repente se perdeu. O próprio “luxo concorreu com o desassiso”. Se antes “seus dias de jejum eram [festas de] noivado”, agora tudo era um ultrapassado “escaparate”. O sucesso era creditado ao seu “bom tino”, enquanto o fracasso à “fortuna”. A ascensão era imanente; o fracasso, transcendente. Mas, na interpretação alheia, de um “certo amigo”, na causa da queda também se inscrevia igualmente a imprudência daqueles que (momentaneamente) triunfam. Nela, o “juízo” prudente figurava necessário tanto para os que gozavam da riqueza, como para aqueles que - desfavorecidos - resignavam-se.

A relevância do “juízo” prudente, fórmula de advertência, ecoava desde a mitologia: Ícaro alçou vôo graças às asas de pluma e de cera, artifício engenhoso fabricado por seu pai, Dédalo. Subvertendo a ordem natural, sentindo-se livre, Ícaro mitigou os conselhos paternos e ousou elevar sua altitude, aproximando-se do sol que, impiedoso, derreteu a manufatura. Decaiu, assim, por um fator extrínseco - os raios solares - potencializados, contudo, por sua imprudência ao insistir em alcançar imponderada altitude. Similarmente, o mercador de La Fontaine se arruinou pelos riscos adstritos ao comércio e às inconstâncias do mar, um fator exógeno; mas, assim como Ícaro, tudo fora amplificado pela sua “imprudência”.

Em Portugal, o impacto das fábulas de La Fontaine fez com que fossem representadas em um conjunto de azulejos, da segunda metade do século XVIII, dispostos no Mosteiro de São Vicente de Fora, em Lisboa (Figura 1). Um deles é justamente “a ingratidão e injustiça dos homens acerca da fortuna”, anedota do desafortunado negociante, que não credita a ela seu sucesso, senão apenas sua queda. Na representação pictórica, agregou-se ainda outro elemento: a virtude da caridade, exercitada pelo amigo que se compadece com a desgraça alheia, doando-lhe uma bolsa de moedas. Uma anedota, algumas virtudes e uma suposta excelência moral: prudência e caridade mobilizadas em um discurso pedagógico em favor do equilíbrio e da temperança, que refreia as paixões positivas; dentre elas, a ambição e o perdularismo.

Figura 1
“A ingratidão e injustiça dos Homens acerca da fortuna”. Das fábulas de La Fontaine; painel de azulejos do Mosteiro de São Vicente de Fora, Lisboa (segunda metade do século XVIII). Foto do autor.

Como o exemplo demonstra, o tema da ascensão e da queda era recorrente e fazia parte do conjunto de saberes que circulava na Europa do Antigo Regime. Desde a literatura medieval, estava vinculado, normalmente, à noção de roda da fortuna. Sugere uma história cíclica, de altos e baixos, mas comandada, em última instância, pela providência divina. Tomás de Aquino escreveria que à divina providência compete o governo de todas as coisas, dirigindo-as para seu “fim natural” (Aquino, 2015COSTA, Ricardo da; ZIERER, Adriana. Boécio e Ramon Llull: a Roda da Fortuna, princípio e fim dos homens. Convenit Internacional. v. 5, p. 63-70, 2000., p. 173-177). Não é por outra razão que a providência será, nas representações iconográficas, o eixo motriz da roda.

O tema da fortuna esteve presente em diversos “espelhos para príncipes” produzidos por humanistas. Por exemplo, Francesco Patrizi (1412-1494), em seu Do reino e da educação do rei; Giovanni Pontano (1426-1503), em Da fortuna; e Baldassare Castiglione (1478-1529), no Livro do cortesão, ressaltaram que os governantes deveriam agir em busca da tríade “honra, glória e fama”, contra a “malícia da fortuna”, que frequentemente poderia causar danos irreparáveis (Skinner, 1996SKINNER, Quentin. A formação do pensamento político moderno. São Paulo: Companhia das Letras, 1996., p. 134-143). Castiglione, para além, lembrava que o serviço ao rei gerava não apenas seu favor, mas também o reconhecimento alheio (Guenée, 2017GUENÉE, Bernard. Corte. In: LE GOFF, Jacques; SCHMITT, Jean-Claude (orgs.). Dicionário analítico do Ocidente medieval, t. I. São Paulo: Unesp, [1997]2017, p. 302-317., p. 315). De fato, já nos tratados medievais a noção de fama e de reputação é motivo de consideração, a ponto de Tomás de Aquino consignar que é “o principal entre os bens exteriores” (Veiga, 2017VEIGA, Bernardo. A ética das virtudes segundo Tomás de Aquino. Campinas: Ecclesiae, 2017., p. 130).

Maquiavel reconheceu que “muitos foram e são da opinião de que as coisas do mundo são governadas de tal modo pela fortuna e por Deus”, sendo mesmo tal “opinião a que tem recebido mais crédito em nossos tempos”. Divergindo, todavia, considerou “a arbitragem da fortuna sobre metade das nossas ações”, restando aos homens “o governo da outra metade”, graças à sua capacidade de previdência (Maquiavel, 2010MAQUIAVEL, Nicolau. O príncipe. São Paulo: Martins Fontes , 2010., p. 121-122). Nesse caso, a fortuna favorece os audazes, do mesmo modo, aliás, que predizia um antigo adágio português;3 3 “Ao homem ousado, a fortuna dá a mão” ou “ao homem de esforço, a fortuna lhe põe em ombro”, conforme o verbete “fortuna” do dicionário de Raphael Bluteau (1728, v. IV, p. 188). seria avassaladora, porém, quando “não há forças (virtú) organizadas que lhe resistam”. Por isso, o príncipe não poderia arrimar suas ações apenas na fortuna, sob o risco de “prosperar e amanhã cair em desgraça”. O secretário florentino arremata um capítulo dedicado à matéria defendendo que “é melhor ser impetuoso do que cauteloso”. Sua justificativa: “a fortuna é mulher, e é necessário, para submetê-la, bater nela e maltratá-la”, e ainda que “como mulher, é sempre amiga dos jovens, porque são menos cautelosos, mais ferozes e a comandam com maior audácia” (Maquiavel, 2010MAQUIAVEL, Nicolau. O príncipe. São Paulo: Martins Fontes , 2010., p. 125).

A partir de então, certa tensão pela causalidade do devir da história se conservou nas narrativas e discursos sobre o fracasso, o sucesso e a fortuna. Mas resta ainda estabelecer melhor se, desde Maquiavel (ou mesmo antes), a ascensão se explicava sobremaneira pela diligência, enquanto o fracasso pela fortuna, exatamente como fez o rico mercador de La Fontaine. Essa questão será retomada adiante.

Em face desse universo temático, este artigo tem por propósito, em primeiro lugar, identificar a concepção de roda da fortuna no imaginário político dos séculos XVI e XVII, com ênfase no Portugal seiscentista, para, em seguida, discutir os sentidos do movimento de ascensão e queda de cortesãos. Em diálogo com essa concepção - e diante da impossibilidade de se apresentar um exame alargado, com variados exemplos - escolheu-se empreender um estudo de caso, a partir da trajetória de D. Jorge de Mascarenhas, marquês de Montalvão, paradigmático em função das oscilações recorrentes, entre o notório poder e o desfortúnio do fracasso. Montalvão, para além, foi um dos personagens mais destacados e controversos da monarquia portuguesa na década de 1640; assumiu cargos relevantes na corte, mas viveu sob o signo da suspeita e da duvidosa lealdade, sendo seguidamente preso e inocentado (White, 2005WHITE, Lorraine. Dom Jorge Mascarenhas, Marques de Montalvão (1579?-1652) and Changing Traditions of Service in Portugal and the Portuguese Empire. Portugese Studies Review.v. 12, n. 2, p. 63-83, 2005.).

A construção dos argumentos em lide se sustenta em documentos de tipologia diversa, a exemplo de textos tratadísticos e literários, dicionários e imagens coetâneas, sermões e consultas de tribunais superiores. O desenvolvimento da redação está organizado em três partes. Primeiro, examina-se brevemente como a ideia de roda da fortuna atravessa séculos, desde os escritos de Boécio até os do padre Antônio Vieira; depois, o texto reverte sua atenção à trajetória de Montalvão. Ao fim, procura-se discutir, ainda que de modo abrangente, uma hipótese de trabalho. Como uma proposição para a reflexão acerca dos significados da queda, tal hipótese se traduz pela noção de que a roda da fortuna, presente nas representações e discursos políticos seiscentistas, apesar de sua dinâmica incessante e aparentemente veloz, acaba por exigir, paradoxalmente, a conservação e reprodução de procedimentos e hierarquias sociais.

Insolens fortuna”! “Sic transit gloria mundi 4 4 “O capricho da fortuna”. “Assim passa a glória do mundo”.

Oh Fortuna, tal a lua, uma forma variável. Sempre enchendo ou encolhendo oh que vida execrável. [...] Bruta sorte, és de morte: tua roda é volúvel, benfazeja, malfazeja, toda sorte é dissolúvel. Disfarçada de boa fada, minha ruína sempre queres; simulando estar brincando minhas costas nuas feres [...] (Woensel, 1994WOENSEL, Maurice van(ed.). Carmina Burana: canções de Beuern. São Paulo: Ars Poética, 1994., p. 175-176, apud Costa e Zierer, 2000COSTA, Ricardo da; ZIERER, Adriana. Boécio e Ramon Llull: a Roda da Fortuna, princípio e fim dos homens. Convenit Internacional. v. 5, p. 63-70, 2000.).

Esses versos profanos advêm de canções germânicas medievais presentes na obra Carmina Burana, uma coletânea de escritos anônimos de 1300. Costa e Zierer (2000COSTA, Ricardo da; ZIERER, Adriana. Boécio e Ramon Llull: a Roda da Fortuna, princípio e fim dos homens. Convenit Internacional. v. 5, p. 63-70, 2000.) sublinham como tais canções referem a instabilidade da fortuna, origem dos sucessos e quedas presentes na vida humana. As representações imagéticas da roda da fortuna, na Idade Média, frequentemente continham ao menos quatro estágios bem delineados: “eu devo reinar” (regnabo); “eu reino”(regno); “eu reinei” (reganvi) e “eu não tenho reino” (sum sine regno). É o que ocorre, por exemplo, no Hortus deliciarum, um espelho para religiosas do século XII que contém muitas iluminuras.

Imagens dessa natureza (Figura 2, por exemplo) foram recebidas como herança de Boécio, autor da Consolatio philosophiae, de 524, livro célebre, de grande circulação e intensa tradução durante a Idade Média. Conforme a tradição, a obra foi redigida quando Boécio estava exatamente no perigeu de sua vida, preso e torturado pelo rei godo Teodorico (Costa e Zierer, 2000COSTA, Ricardo da; ZIERER, Adriana. Boécio e Ramon Llull: a Roda da Fortuna, princípio e fim dos homens. Convenit Internacional. v. 5, p. 63-70, 2000., p. 63-70). A contingência extrema deveria ser razão valorosa, já que, como asseverou Aristóteles, na adversidade a sabedoria é refúgio; ou, como indica a locução latina de sentido estoico, “fortuna magna magna domino est servitus”.5 5 Em tradução livre: “Uma grande riqueza é para quem a possui um pesado cativeiro”.

Figura
2 - La ruota della Fortuna. Liguria, século XV

Na Consolatio, Boécio (1998COSTA, Ricardo da; ZIERER, Adriana. Boécio e Ramon Llull: a Roda da Fortuna, princípio e fim dos homens. Convenit Internacional. v. 5, p. 63-70, 2000., p. 29) lamenta-se de sua fortuna em um diálogo com a filosofia. Em determinado momento do diálogo, para que o combalido autor finalmente entenda sua dinâmica, a filosofia se transmuta em fortuna e assim lhe responde:

Minha natureza, o jogo interminável que jogo é este: virar a Roda [da Fortuna] incessantemente, ter prazer em fazer descer o que está no alto e erguer o que está embaixo: Sobe se tiveres vontade, mas com uma condição: que não consideres injusto descer, quando assim ditarem as regras do jogo.

É assim que a fortuna obriga e coage os homens a exercitar o jogo invencível da vida, subsumindo-os às suas leis e ao teatro do mundo. Nele se inscreve a prosperidade, mas também os flagelos, que exigem uma “submissão às forças indisciplináveis”. Nas fases calamitosas, como o contexto da peste negra, o tema da roda da fortuna se notabilizava, revelando certa tensão entre o otimismo e o pessimismo (Berlioz, 2017BERLIOZ, Jacques. Flagelos. In: LE GOFF, Jacques; SCHMITT, Jean-Claude (org.). Dicionário analítico do Ocidente Medieval. São Paulo: Unesp, [1997] 2017, p. 512-527., p. 521-523).

O tema da roda da fortuna foi representado também em uma expressiva imagem de um manuscrito de 1503, destinado a Luís XII de França, o De remediis utriusque fortunae [remédios contra a fortuna], de Francesco Petrarca. Trata-se de uma coleção de 254 diálogos moralizantes, uma paráfrase da Consolatio (Fumaroli, 1998, p. 23). Petrarca sublinha a inquietude e inconstância da vida e, em resposta, aconselha humildade na prosperidade e fortaleza na adversidade; aliás, trata-se da humildade que o mercador de La Fontaine ignorava.

Figura 3
- La roue du destin et de la Fortune. Manuscrito destinado à Luís XII. De remediis fortunae, de Petrarca

Na composição do manuscrito oferecido a Luís XII (Figura 3), três figuras se destacam: no centro, em maior dimensão, a Fortuna, ladeada na direita pelo seu atributo de prosperidade (ou fortuna próspera) e, na esquerda, pelo seu componente de adversidade (ou fortuna adversa). Coroada, a Fortuna aparece vendada, inviabilizando, portanto, o oferecimento e a distribuição de uma justiça equitativa, parametrizada em função de categorias sociais. Todos são subordinados implacavelmente aos seus desígnios. Dotada de muitas mãos, pela direita distribui aos diversos estamentos da sociedade os símbolos de seu poder: tiaras aos papas; coroas a imperadores e reis; bolsas a mercadores. Na contrapartida, ela obriga os homens ao espólio e à queda (Gauvard, Cornette e Fureix, 2008GAUVARD, Claude; CORNETTE, Joel; FUREIX, Emmanuel. Souverains et rois de France. Paris: Chêne, 2008., p. 139).

A Iconologia de Cesare Ripa (1765RIPA, Cesare. Iconologia. t. III. Perugia: Stamperia di Piergiovanni Constantini, 1765., p. 113-114) também se ocupou da fortuna e de suas representações, explicitando textualmente sua dinâmica:

Se pinta comumente [a fortuna] para mostrar que não favorece mais um homem que outro, mas a todos indiferentemente ama e odeia [...]; por isso é que muitas vezes exalta um homem perverso, que se faria à primeira vista digno do suplício, e a outro merecedor deixa que caia em miséria, calamidade. [...] A verdade é que tudo dispõe da providência divina, como ensina São Tomás no livro III [da Suma] contra o gentio.

Em Portugal, nesse mesmo momento, a temática da sorte e da fortuna esteve presente em muitas obras. Por exemplo, na Prosopopeia, de Bento Teixeira, tradicionalmente considerado o primeiro poema da literatura barroca portuguesa, a sorte também guarda a perfídia da inconstância, capaz de alterar tempestivamente os estatutos sociais de modo imprevisível e, por isso mesmo, ameaçar a estabilidade secular:

Ó sorte tão cruel como mudável Por que usurpas aos bons o seu direito? Escolhes sempre o mais abominável, Reprovas e abominas o perfeito. O menos digno fazes agradável, O agradável mais, menos aceito. Ó frágil, inconstante, quebradiça, Roubadora dos bens e da Justiça! (Teixeira, 1601TEIXEIRA, Bento. Prosopopéia. Lisboa, 1601. Disponível em: Prosopopéia.PDF (culturatura.com.br). Acesso em:30 maio 2021., estrofe XXXV)6 6 Bluteau (1728, v. VII, p. 731) entende “sorte” como “tudo que sucede acaso, sem princípio certo, nem causa conhecida”.

Em síntese, a ideia era a de que a fortuna afeta, de maneira inopinada, a ordem natural e a disciplina do mundo. Noutros termos, estremece a segurança e a conservação das coisas no seu devido lugar, causando a desarmonia, subvertendo hierarquias sociais e constituições de poder. Numa palavra, provoca a inconstância (propria fortuna varietas). Raphael Bluteau (1728BLUTEAU, Raphael. Vocabulário Portuguez & Latino. 1728. Disponível em:Disponível em:http://www.brasiliana.usp.br/dicionario/1/sorte . Acesso em:30 ago. 2020.
http://www.brasiliana.usp.br/dicionario/...
, v. IV, p. 95), autor do primeiro dicionário da língua portuguesa, define a “inconstância” como um “vício, que faz o ânimo humano mudável nas suas determinações, sem razão”. Trata-se mesmo de uma “falta de firmeza nas resoluções que se tomam”, que colocam em risco as reputações conferidas e legadas pelo rigor da vitalidade do tempo sobre o mundo. Tanto é assim que o padre logo associa a inconstância à “fortuna volubilitas”.

Algumas décadas mais tarde, o padre Vieira afirmaria que “os outros lugares quanto mais altos tanto menos segurança têm, e a sua mesma altura é o prognóstico certo da sua ruína”, em uma referência sutil ao movimento da roda da fortuna. De fato, sua concepção de roda da fortuna pode ser aproximada àquela de Boécio, senão veja: “nesta perpétua roda em que se resolve o mundo, tudo se move, tudo se altera, tudo se muda, tudo está em contínua agitação, sem consistência, nem firmeza; nem há lugar algum que se goze de quietação e sossego”.7 7 Sermão da Dominga Décima Sexta Post Pentecostem (Vieira, 2015, t. II, v. V, p. 283, 287).

A incerteza promovida pela conjuntura crítica da Restauração, momento de guerra, crise financeira, instabilidade política, fê-lo vociferar também que “não há coisa menos segura que a graça dos príncipes”.8 8 Sermão da Terceira Quarta-feira da Quaresma (Vieira, 2015, t. II, v. III, p. 220). Até porque, nas cortes, “não basta ter a graça do rei, ou a graça do príncipe, se não tiverdes também a dos ministros que assistem ao trono”.9 9 Sermão de São Roque (1652) (Vieira, 2015, t. II, v. IX, p. 404). Nesse contexto, era incontornável a necessidade permanente de fazer demonstrações de adesão ao novo rei e, ainda, dissimular com prudência (Lozano, 2009LOZANO, Antonio Terrasa. De la raya de Portugal a la frontera de guerra: los Mascarenhas y las prácticas nobiliarias de supervivencia política durante la Guerra de la Restauração. In: CASALILLA, Bartolomé Yun(dir.). Las redes del império: élites sociales em la articulación de la monarquia hispânica, 1492-1714. Madrid: Marcial Pons, 2009, p. 233-258., p. 244). De todo modo, a banalização das confianças promoveu uma profusão de suspeitas, conspirações, expropriações, prisões e execuções, mesmo no seio da mais alta fidalguia. Já em 1643, Francisco de Lucena e outros de sua qualidade caíram e foram executados. Alguns eram despojados de seus cargos, a exemplo do que se passou com alguns secretários de Estado ao longo da centúria (Costa, 2008COSTA, Leonor Freire; CUNHA, Mafalda Soares da. D. João IV. Lisboa: Temas e Debates, 2008., p. 145-191). Mas a conjuntura específica da Guerra da Restauração, inserida no contexto mais alargado da Guerra dos Trinta Anos, também propiciou muitas quedas na monarquia hispânica, cujo exemplo mais emblemático é, sem paradoxo, o do conde-duque de Olivares (Elliott, 2010ELLIOTT, John. El conde-duque de Olivares. Barcelona: Crítica, [1986]2010., p. 701-734).

“Não é mais dificultoso o subir do que o descer?”

Muito embora recorrente, a queda nem sempre era definitiva. Em Portugal, uma das trajetórias mais representativas do binômio “subir” e “descer”, objeto de tanta tinta de Vieira, é a de D. Jorge de Mascarenhas, marquês de Montalvão. Preso e reabilitado tantas vezes, subordinado ao movimento invencível da roda da fortuna, sua trajetória se distingue mesmo da de seus contemporâneos, como Matias de Albuquerque, que depois de cinco anos encarcerado acabou por se transformar em conde de Alegrete; bem como do próprio Vieira, preso pela Inquisição em 1664, mas depois detentor de alguma voz ativa na formulação política.

Um dos momentos de triunfo do marquês foi na Bahia, quando dispunha do cargo de vice-rei - o “Sol de Justiça”,10 10 Sermão da Visitação de Nossa Senhora (Vieira, 2015, t. II, v. VII, p. 81-82). nos termos de Vieira - cargo inédito nas conquistas lusas na América.11 11 O segundo vice-rei do Brasil foi também um Mascarenhas, conde de Óbidos, em 1663; antes fora governador do Brasil (1639-1640) e vice-rei da Índia (1651). Mas, efêmero triunfo. Aliás, de partida já maculado pelas circunstâncias de desesperação em que se encontrava a Bahia. Fracassada a armada do conde da Torre (outro Mascarenhas, aliás), que deveria ter consumado a expulsão dos holandeses de Pernambuco, Vieira dizia, no seu sermão de boas-vindas ao marquês: “aconteceu-lhe a vossa excelência com o Brasil o que a Cristo com Lázaro; chamaram-lhe para curar um enfermo e quando chegou foi-lhe necessário ressuscitar um morto [... porque] morto está o Brasil”. E embora dispondo de um vice-rei, “podem-lhe servir os títulos [apenas] de epitáfios”.12 12 Sermão da Visitação de Nossa Senhora (Vieira, 2015, t. II, v. VII, p. 83-84).

Poucos meses depois, anunciava-se na Bahia a notícia da “serena e felicíssima aclamação” de D. João IV. Apesar da potência das agruras decorrentes do movimento das notícias na cidade de Salvador, e ainda da presença de uma guarnição de seiscentos soldados castelhanos na praça, do mesmo modo sereno agora a aclamação se reproduzia na capital do Estado do Brasil (Elliott, 2010ELLIOTT, John. El conde-duque de Olivares. Barcelona: Crítica, [1986]2010., p. 668-669). Uma vez alcançada a aclamação, enviou seu filho, D. Fernando, e o jovem Vieira, para dar a notícia da adesão do Brasil à causa do movimento restauracionista.

Da Bahia, tratou o marquês, na companhia de Salvador Correia de Sá e Benevides, então governador do Rio de Janeiro, de convencer parcela da elite de Buenos Aires a jurar fidelidade a D. João IV (Calmon, 1941CALMON, Pedro. História do Brasil: a formação. São Paulo: Brasiliana, 1941., p. 192; Boxer, 1973BOXER, Charles. Salvador Correia de Sá e a luta pelo Brasil e Angola (1602-1686). São Paulo: Cia. Editora Nacional, 1973., p. 161). Como advertia um documento anônimo que circulava na corte lisboeta, Salvador de Sá era “pessoa suspeitosa, filho de mãe castelhana, muito cobiçoso da fazenda e grande mercador, [...] desvanecido por grandezas e honras” (Rau e Silva, 1956RAU, Virginia; SILVA, Maria Fernanda Gomes da(ed.). Os manuscritos do Arquivo da Casa de Cadaval respeitantes ao Brasil. v. I. Lisboa: Acta Universitatis Conimbriensis, 1956., p. 351). Logo em seguida, Montalvão endossava ao novo rei um parecer acerca de um arbítrio, recomendando que as drogas da Índia, o açúcar do Brasil e os escravos de Angola fossem trocados pela prata que afluía de Buenos Aires (p. 28). Noutro papel coetâneo, advertia sua majestade acerca do risco dos tributos, que poderiam causar “má reputação” e, de efeito igualmente grave, a “desesperação” dos vassalos, configurando-se “grande mal que lhe venha a ser mais pesado o remédio que experimentam, que o dano que recebiam” de Felipe IV de Castela. A sugestão de que a casa de Bragança deveria, em prol da restauração do reino, perder algumas de suas rendas - porque afinal é melhor um “rei pobre, e os vassalos ricos, que o rei rico e os vassalos pobres” - pode não ter sido bem recebida.13 13 Biblioteca Nacional de Portugal (BNP), Cod. 894, fl. 15-17v. (apud Costa, 2020, p. 239-240). Talvez, em razão mesmo daquela aproximação com Salvador de Sá - homem de lealdade duvidosa - e de uma suposta simpatia pelos negócios de Castela, ou por ter sido feito conde e depois marquês por Felipe IV, ou ainda pelo tom de seus arbítrios, foi acusado de traição e substituído por uma junta governativa em Salvador, para em seguida ser remetido preso para Lisboa. “Oh, fortuna, ingrata para com os varões valorosos, quão injustamente distribui aos bons teus prêmios”, dizia Hércules, citado por Sêneca, mencionado e difundido por Vieira.14 14 Sermão da Visitação de Nossa Senhora (Vieira, 2015, t. II, v. VII, p. 93).

Mas é ainda imperioso assinalar um elemento fulcral para explicar sua prisão: Pedro de Mascarenhas, primogênito do marquês, acompanhado do irmão, D. Jerônimo, fugiu de Portugal a Castela, para “mostrar a lealdade que devo ao meu rei [Felipe IV]”, como ele mesmo escreveu a seu primo, em fevereiro de 1641.15 15 BNP, Cod. 1697, fl. 54-54v (apud Costa, 2020, p. 353). Na altura, Pedro era o vedor da casa real e, como depois admitiu, esperava receber muitas mercês de Felipe IV de Castela, a ponto de se tornar “maior do que o duque de Bragança”, convertido em D. João IV, a partir da Restauração de 1640. Jerônimo era o cônego da Sé de Coimbra e secretário do cabido. Em Madri, tornou-se logo capelão-mor da rainha, reuniu muitas mercês e cargos, até se tornar bispo de Segóvia, em 1668 (Oliveira, 2008OLIVEIRA, António de. D. Filipe III. Lisboa: Temas e Debates, 2008., p. 223; Valladares, 2016VALLADARES, Rafael.‘Por toda la Tierra’: España y Portugal: globalización y ruptura (1580-1700) Lisboa: Cham, 2016., p. 161).

A fuga dos irmãos Mascarenhas - e a de outros fidalgos - trouxe insegurança, já que demonstrava ausência de unanimidade em torno do novo rei (Costa e Cunha, 2008COSTA, Leonor Freire; CUNHA, Mafalda Soares da. D. João IV. Lisboa: Temas e Debates, 2008., p. 133). Ao pai, D. Pedro escreveu recordando a célebre frase de François I de França à sua esposa, quando cativo de Carlos V: “Madama; tudo se há perdido, se não há honra”. E prosseguia: “o mesmo digo à Vossa Excelência, acrescentando: que mui em breve tempo, com o favor de Deus, hei de recuperar tudo; e que hei de acrescentar a casa de Vossa Excelência, de maneira que todos os da nossa terra tenham muito a invejar”.16 16 BNP, Cod. 1697, fl. 63-63v (apud Costa, 2020, p. 354-355). Embora precisasse do “favor de Deus”, era sobretudo seu ânimo e sua diligência que o levariam novamente ao sucesso.

A passagem recorda a necessidade de reflexão sobre as justificativas e representações em torno da queda e da ascensão. Embora a temática extrapole este artigo, vale retomar as considerações já mencionadas de Maquiavel acerca da previdência e da astúcia, que conformam uma ética da necessidade ou da sobrevivência, como instrumento relativamente eficaz contra os efeitos da fortuna.

A partir de diversos “espelhos”, Antonio Alvariño (2000ALVARIÑO, Antonio. Proteo em palácio: el arte de la disimulación y la simulación del cortesano. In: MORÁN, Miguel; GARCÍA Bernardo(orgs.). El Madrid de Velázquez y Calderón: villa y corte en el siglo XVII. v. I. Madrid: Ayuntamiento de Madrid, 2000, p. 111-137., p. 126-129) refez os debates em torno do arquétipo moral esperado de um cortesão. Para além, demonstrou como o ambiente palaciano dos séculos XVI, e principalmente XVII, exigia atenção constante a certas competências, a exemplo da prudência, discrição, paciência, iniciativa (a esprezzatura, de Castiglione), clarividência e dissimulação. A capacidade de circunspecção - ainda que meramente aparente, mas vinculada frequentemente às noções de artifício, engenho e indústria - tornava-se um instrumento incontornável para o próprio exercício da política. Para evitar a queda e impedir o movimento da fortuna, cabia ao secretário, conselheiro, valido ou mesmo ao rei, saber “dissimular e simular a fim de manter o poder e a sobreviver nas navegações do palácio [...] como um piloto que demonstra sua destreza ante às mudanças de ventos”. Nesse sentido, e na mesma direção de uma fórmula atribuída a Luís XI de França,17 17 “Qui nescit dissimulari, nescit regnare”, ou “quem não sabe dissimular, não sabe reinar” (apud Senellart, 2006, p. 231). Vieira escreveu que D. João IV “sabia reinar, porque sabia dissimular; e reinou, porque não dissimulou”.18 18 Sermão nos Anos da Sereníssima Rainha Nossa Senhora [Maria Francisca de Saboia] (Vieira, 2015, t. II, v. XIII, p. 185; Calafate, 2012, p. 131).

Ao menos desde Maquiavel, a virtude da prudência deixava de se associar a uma “reta razão”, voltada sobretudo para um exame ético interior, e tributária de um pensamento tomista. Ao reverso, aproximava-se mais de um cálculo de circunstâncias, traduzida pela própria ponderação de riscos exógenos, extrovertendo-se das consciências (Senellart, 2006SENELLART, Michel. As artes de governar. São Paulo: Editora34, 2006., p. 225). Em face dessa nova acepção, o prudente não era aquele que separava o certo do errado, em busca da excelência moral, mas sim aquele capaz de manejar os arcanas de Estado com diligência, segredo e silêncio (Cantarino, 2013CANTARINO, Elena. Du silence de la raison aux raison du silence: considérations pour une théorie du silence à l’époque baroque. In: MERLE, Alexandra; GUILLAUME-ALONSO, Araceli (orgs.). Les vois du silence dans l’Espagne des Habsbourg. Paris: Pups, 2013, p. 83-103.).

Ao discutir as articulações entre segredo e justiça no Portugal seiscentista, Maria Fernanda Bicalho (2010BICALHO, Maria Fernanda. As tramas da política: conselhos, secretários e juntas na administração da monarquia portuguesa e de seus domínios ultramarinos. In: FRAGOSO, João; GOUVÊA, Maria de Fátima(orgs.). A trama das redes. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2010, p. 343-372.) demonstra como existia dissenso acerca das possíveis convivências entre essas duas práticas, cujos nexos ficavam sujeitos às conveniências. Conforme sua análise, para muitos juristas e homens de política, a manutenção do segredo nos assuntos de Estado era uma necessidade indiscutível, a ponto de defenderem expedientes diferenciados de governação e diligência, a exemplo das juntas governativas, forma de deliberação mais célere e por isso mais eficiente em relação à guarda de arcanas. Ao reverso, para outros, segredo e justiça tornavam-se práticas completamente inconciliáveis, uma vez que a circulação de informações nos órgãos da monarquia (a exemplo das secretarias e tribunais palacianos) garantia processos decisórios que confluíam para o suposto envolvimento dos ministros na formulação política.

A partir de um ideário dessa natureza - que tende a valorizar mais o engenho, a capacidade de circunspeção, silenciar e agir - seria então a ascensão explicada como um resultado dos expedientes e estratagemas próprios, enquanto os mistérios da fortuna aqueles responsáveis pela queda? Foi exatamente o que Bluteau (1728BLUTEAU, Raphael. Vocabulário Portuguez & Latino. 1728. Disponível em:Disponível em:http://www.brasiliana.usp.br/dicionario/1/sorte . Acesso em:30 ago. 2020.
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, v. IV, p. 186-187) fez questão de consignar em seu verbete “fortuna”, apesar de não nomear o autor de tal raciocínio:

a fortuna [...] não é nada. Quem errou o que havia de acertar, diz que teve má fortuna, por não dizer que foi néscio ou descuidado; e assim [...] a diligência é mãe da boa ventura, porque tudo o mais é imaginação e fingimento. E assim tão errados andam os que têm a fortuna por madrasta de seus gostos, como os que a têm por madrinha de seus atrevimentos.

Nesse mesmo sentido, um adágio português da época salientava que, “quando a fortuna não nos favorece em tudo, é necessário emendá-la com prudência”, sugerindo assim a disposição competente dos homens para se sobrepujar à fortuna.

O discurso de D. Pedro, cuja competência seria capaz de recuperar a casa dos Mascarenhas a ponto de suplantar a casa real, torna-se ainda mais sublinhado se for contrastado com o de sua mãe. Ao tratar de seu momento de ruína, a marquesa de Montalvão escrevia ao marido - a essa altura ainda vice-rei do Estado do Brasil - depositando suas esperanças de proteção não em suas estratégias pessoais, mas sim na providência que gira a roda: “se Deus por sua misericórdia não nos acode, podem-se temer grandes males”. A potência para a reversão da casa estava na iniciativa imanente de D. Pedro, enquanto sua mínima conservação, durante a queda, na transcendência divina.

Nem poderia a marquesa demonstrar o ponto ínfimo a que chegara, já que “por nos dizerem que se haviam de ver as cartas, nos não atrevêssemos a alargar mais que a mostrar grande contentamento [com a aclamação], pelo perigo que havia de se dizer outra coisa”.19 19 BNP, Cod. 1697, fl. 56-58v (apud Costa, 2020, p. 355-356). Nesse mesmo mês, declarava-se em Lisboa que os portugueses fugitivos eram protagonistas de “manifesta rebelião”. Em 1644, os que estavam por Felipe IV tiveram seus bens confiscados (Costa, 2020COSTA, Rodrigo Franco da. A pátria de João Pinto Ribeiro e dos demais repúblicos. Rio de Janeiro: Multifoco, 2020., p. 357).

Após ser recebido preso em Lisboa, o marquês rapidamente foi reabilitado. Em uma espécie de compensação, acumulou os cargos de vedor da Fazenda, conselheiro de Guerra e de Estado. Em 1642, foi procurador nas cortes. Nessa altura, François Lanier, embaixador francês em Portugal, caracterizou-o assim em uma carta de 1643: “é o primeiro homem de Estado, superintendente de finanças [...] tem mais de sessenta anos, o que tem mais experiência que qualquer um [do conselho de Estado]” (Prestage, 1931PRESTAGE, Edgar(ed.). Informes de Francisco Lanier sobre Francisco de Lucena e a corte de D. João IV. Coimbra: Imprensa da Universidade, 1931., p. 15).

D. Jorge de Mascarenhas dispunha de larga experiência militar e ultramarina, tendo servido no norte da África, entre 1615 e 1619, como governador de Mazagão. No seu regresso à corte, em função de um ataque naval argelino, combateu até exaurir seus recursos. Sem mais capacidades, explodiu o paiol de pólvora de seu navio. Graças aos auspícios da fortuna, salvou-se da explosão, sobreviveu ao naufrágio, mas se tornou prisioneiro. Foi resgatado por Felipe III. Depois, governou Tânger, de 1622 a 1624, e foi feito primeiro conde de Castelo Novo. No início da década de 1630, acumulou os cargos de presidente da (recém-criada) Junta de Fazenda, presidente da Câmara de Lisboa e da efêmera Companhia portuguesa das Índias Orientais. Nessa altura, gozava de prestígio junto a Olivares. Assim que perdeu os três cargos, escreveu uma “bateria de arbítrios” para aconselhar sobre a grave conjuntura financeira (Schaub, 2001SCHAUB, Jean-Frédéric. Le Portugal au temps du comte-duc d’Olivares (1621-1640): le conflit de juridictions comme exercice de la politique. Madrid: Casa de Velázquez, 2001., p. 153-160). Mais tarde, em 1639, foi nomeado vice-rei e capitão-general do Brasil, ocasião em que finalmente recebeu de Felipe IV o título de marquês de Montalvão, com tença correspondente (Rau e Silva, 1956RAU, Virginia; SILVA, Maria Fernanda Gomes da(ed.). Os manuscritos do Arquivo da Casa de Cadaval respeitantes ao Brasil. v. I. Lisboa: Acta Universitatis Conimbriensis, 1956., p. 26-27).

Em 1643, ascendeu à presidência do recém-criado Conselho Ultramarino e, nesse mesmo ano, seu filho foi intitulado conde de Serém. Nem sempre seus votos nos tribunais tinham efetividade compatível com as voltas que já dera havia sessenta anos na roda da fortuna. Por exemplo, foi voto vencido quando o Conselho de Guerra e o de Estado, em julho desse ano, decidiram que o rei deveria pessoalmente estar em Évora para “dar calor às suas armas” (Coelho, 1940COELHO, Laranjo(ed.). Cartas de El-Rei D. João IV ao conde da Vidigueira. t. I. Lisboa: Academia Portuguesa da História, 1940., p. 89; Menezes, 1751MENEZES, Luiz, conde de Ericeira. História de Portugal Restaurado. t. I. Lisboa: Oficina Domingos Rodrigues, 1751., p. 400; Costa, 2004COSTA, Fernando Dores. A Guerra da Restauração. Lisboa: Horizonte, 2004., p. 24), embora tivesse conseguido mantê-lo em Lisboa, cerca de um ano antes, quando se discutira nos tribunais a mesma matéria (Costa e Cunha, 2008, p. 163).

Mas, como lembrava Vieira...

A primeira prerrogativa do último lugar [o mais ínfimo] é ser muito fácil de conseguir. Aos outros lugares, ainda que não sejam mais altos, chega-se tarde e com dificuldade; ao último, logo e facilmente. Não é mais dificultoso o subir que o descer? [...] Mas nas cortes [...] cheio de impedimentos e dificuldades, ainda é mais trabalhoso o subir. [...] Muito mais [podem dizer sobre isso] os que depois dos trabalhos, e moléstias do subir, em vez de conseguirem o lugar, só alcançaram, e tarde, o desengano.20 20 Sermão da Dominga Décima Sexta Post Pentecostem (Vieira, 2015, t. II, v. V, p. 279-280).

Então, em 1644, outra queda, dessa vez em conjunto com sua mulher e outros homens de relevância, como o doutor Duarte Alvarez, um desembargador dos agravos da Casa da Suplicação. As mercês e cargos acumulados por Montalvão deviam desagradar os aclamadores (Costa e Cunha, 2008COSTA, Leonor Freire; CUNHA, Mafalda Soares da. D. João IV. Lisboa: Temas e Debates, 2008., p. 177). Mas, como “volta-se o mesmo mundo em perpétua roda, a uns derruba, a outros levanta”,21 21 Sermão da Quarta Dominga da Quaresma (Vieira, 2015, t. II, v. III, p. 312). o próprio D. João IV logo afirmaria que era verdadeira “a fidelidade de seus ânimos [do marquês]” (Coelho, 1940COELHO, Laranjo(ed.). Cartas de El-Rei D. João IV ao conde da Vidigueira. t. I. Lisboa: Academia Portuguesa da História, 1940., p. 173-174). Na reversão da queda, o marquês acrescentou então aos seus antigos encargos o de mestre de campo general junto ao rei, responsável maior pela mobilização para a guerra e, em seguida, tornou-se ainda presidente de uma junta extraordinária, que se ocupou de questões em torno da gestão da guerra de Pernambuco (Coelho, 1940a, p. 272, 274). Em 1645, para explicitar sua lealdade, alertava sobre os rumores que corriam contra el-rei, em função da intensificação da arrecadação fiscal discutida pelas cortes (Cardim, 1998CARDIM, Pedro. Cortes e cultura política no Portugal do Antigo Regime. Lisboa: Cosmos, 1998., p. 100).

No fim dos anos 1640, o fidalgo requeria tenças e outras mercês para si e sua família (Rau e Silva, 1956RAU, Virginia; SILVA, Maria Fernanda Gomes da(ed.). Os manuscritos do Arquivo da Casa de Cadaval respeitantes ao Brasil. v. I. Lisboa: Acta Universitatis Conimbriensis, 1956., p. 381-383). Na sua petição, consignava que esperava “grandes acrescentamentos de honras”, e não a desconfiança e o “discômodo [sic] com as coisas de sua casa”; explicava que logo depois da notícia que D. Fernando levara da aclamação, el-rei lhe prometeu 3.000 cruzados de renda, o que parecia ao marquês uma mercê muito limitada. Naquela altura, esperava receber “de juro” os títulos que possuía de conde e de marquês, bem como o de almirante do Brasil, com as respectivas ancoragens em seus portos. Mas, “dilatando-se-lhe o deferir-se-lhe estas pretensões, sucedeu a sua injusta prisão”. Restituída sua liberdade, lembrava que D. João IV prometeu conceder-lhe ainda “maiores mercês”.

No requerimento, “por remate de tudo”, valorizava as ações de seu governo a frente do Brasil, alegando que, mesmo sem armada e exército, conseguiu que os holandeses demandassem uma “cessação de armas”. Até que foi recebida na Bahia a notícia da “feliz aclamação”, que acabou por ocorrer no Brasil “com tão bizarro modo”. D. João IV fora prontamente obedecido, ficando seu “amor e zelo mais qualificados”. Finalmente, o rei passou a dispor daquele governo “tão estranhamente”, que padecera muito com as barbaridades dos governadores que lhe tinham sucedido. No retorno a Portugal, teve de embarcar preso em uma caravela carregada, arriscando sua vida. Por tudo isso, requeria agora mercês compatíveis com seus serviços (Rau e Silva, 1956RAU, Virginia; SILVA, Maria Fernanda Gomes da(ed.). Os manuscritos do Arquivo da Casa de Cadaval respeitantes ao Brasil. v. I. Lisboa: Acta Universitatis Conimbriensis, 1956., p. 381-383).

Em função de sua grandeza, seu requerimento subiu ao Conselho de Estado. O parecer correlato do conde de Odemira salientava que, quando o marquês esperava as recompensas pela sereníssima aclamação na Bahia, fora retirado do governo, “com muita perda de sua fazenda e reputação”; e lembrava ainda que “com tanta indústria” combateu os holandeses. Aclamou a nova dinastia e nem se quisesse poderia ter procedido de outra forma, já que todos os capitães e oficiais maiores estavam dispostos a fazê-lo (Rau e Silva, 1956RAU, Virginia; SILVA, Maria Fernanda Gomes da(ed.). Os manuscritos do Arquivo da Casa de Cadaval respeitantes ao Brasil. v. I. Lisboa: Acta Universitatis Conimbriensis, 1956., p. 85-86). Apesar de certa ambivalência (ou prudência...), o conde era favorável ao pleito (p. 85). O bispo capelão-mor, também do Conselho de Estado, confirmava a concessão; sugeria que as mercês fossem concedidas por uma vida (p. 86).

Bem articulado em suas redes, e beneficiado pela conjuntura favorável, Montalvão protocolou ainda o pedido da propriedade do ofício de vedor da casa real, para o qual dispôs da confirmação do doutor Francisco Velasco de Gouvêa, nada menos que um dos mais expressivos juristas da Restauração (Rau e Silva, 1956RAU, Virginia; SILVA, Maria Fernanda Gomes da(ed.). Os manuscritos do Arquivo da Casa de Cadaval respeitantes ao Brasil. v. I. Lisboa: Acta Universitatis Conimbriensis, 1956., p. 383). A corte era o locus privilegiado para a ambição; e Montalvão novamente estava no alto. Mas “para um homem se conservar na corte, e na graça dos reis, o meio mais proporcionado, e efetivo, e ainda forçoso, é andar às avessas. Os pés para cima, a cabeça para baixo; [...] para não [tentar] tomar o céu com as mãos, trazer as mãos pela terra”.22 22 Sermão de São Roque (1652) (Vieira, 2015, t. II, v. IX, p. 405).

Tantos cargos, ocupações, novo prestígio, mas logo um percalço se avizinhava... porque, como dizia um adágio seiscentista, “a carga bem se leva, mas a sobrecarga causa a queda” (Bluteau, 1728BLUTEAU, Raphael. Vocabulário Portuguez & Latino. 1728. Disponível em:Disponível em:http://www.brasiliana.usp.br/dicionario/1/sorte . Acesso em:30 ago. 2020.
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, v. IX, p. 200). Ademais, como ensina Vieira, no ambiente de corte “quem em tudo quer parecer maior, não é grande”.23 23 Sermão do Rosário Maria Rosa Mística (XVI) (Vieira, 2015, t. II, v. IX, p. 50). Assim, mais uma vez foi preso o marquês em 1650. Segundo o testemunho do marquês de Niza, seu colega no Conselho de Estado: “Ao marquês de Montalvão mandou el-rei recolher no castelo [de São Jorge]. Notável fortuna foi sempre a deste fidalgo, mas espera-se saia bem” (Serafim, 2011SERAFIM, João Carlos Gonçalves(ed.). Um diálogo epistolar: D. Vicente Nogueira e o marquês de Niza. Porto: Afrontamento; Citcem, 2011., p. 345-352). Se o tempo e a fortuna o tivessem permitido, tudo indica que poderia se sair com êxito, ao menos se tomarmos em conta a impressão de seus contemporâneos. Mas isso não ocorreu, porque faleceu dois anos depois, ainda no mesmo castelo (Castelo-Branco, 1992AQUINO, Tomás de. Suma contra os gentios. t. III. São Paulo: Loyola, 2015., p. 218-219; Myrup, 2006MYRUP, Erik Lars. To Rule from Afar: The Overseas Council and the Making of the Brazilian West, 1642-1807. Tese (Doutorado em História), Yale University. New Haven, 2006., p. 348).

No final da década de 1670, o conde de Ericeira escreveria que o marquês era “um dos que votavam com mais acerto nas matérias mais importantes daquele tempo”. Ainda segundo o conde, foi “a marquesa de Montalvão [pela sua simpatia à Castela], causa total, como sempre se entendeu, da ruína de seu marido” (Menezes, 1751MENEZES, Luiz, conde de Ericeira. História de Portugal Restaurado. t. I. Lisboa: Oficina Domingos Rodrigues, 1751., p. 401). Quase trinta anos depois, tratava-se de uma tentativa lusa de reabilitação post mortem para que sua casa e suas redes de amizade não se maculassem pelos seus infortúnios? Provavelmente.

Considerações finais

Volta-se o mesmo mundo em perpétua roda, a uns derruba, a outros levanta, uns crescem até as nuvens, outros descem até os abismos, e só o só, que está fora da jurisdição da fortuna, nem à próspera tem inveja, nem da adversa tem medo, porque só o seu estado é incapaz de mudança.24 24 Sermão da Quarta Dominga da Quaresma (Vieira, 2015, t. II, v. III, p. 312).

Na Terra tudo são soberbas, ambições, invejas, discórdias, contendas, cavilações, enganos, falsidades, traições, violências, e tratar cada um de subir, ainda que seja pelas ruínas alheias; e para escapar de todos estes males [...] não há outro lugar seguro, e quieto, senão o último.25 25 Sermão da Dominga Décima Sexta Post Pentecostem (Vieira, 2015, t. II, v. V, p. 295).

Em perspectiva analítica, o que se pode extrair de uma trajetória tão intensa quanto a do marquês de Montalvão? Sem uma resposta definitiva, é possível sublinhar alguns aspectos. Antes de tudo, que a ascensão ou a queda de personagens, em uma monarquia corporativa, não pode ser tomada individualmente. Trata-se da dinâmica, antes, de uma casa - em tela, a dos Mascarenhas - e mormente de uma rede de clientes. Daí, sempre “esperava-se que se saísse bem”, como supôs o marquês de Niza.

Mas o contexto era de incerteza para toda a elite: como demonstrou Nuno Gonçalo Monteiro, quase metade das principais casas aristocráticas lusas desapareceu entre 1640 e 1670. Após o conflito, as grandes casas tituladas do Reino passaram a viver em Lisboa, conforme um processo de curialização que, em decorrência, promovia uma reflexão acerca de como devia se comportar um cortesão. A partir de então, constituía-se em uma elite cristalizada, com zelosa estratégia matrimonial, pautada na homogamia social, protegida agora pela Coroa (Monteiro, 2007, p. 110). Essa redefinição dos pactos de vassalagem com a Coroa era fundamental, já que 41 das 56 casas titulares às vésperas da Restauração eram criações filipinas. Ademais, boa parte da aristocracia, desde Tomar, associara-se por seu próprio arbítrio aos Habsburgos, inclusive a casa de Bragança (Schaub, 2001SCHAUB, Jean-Frédéric. Le Portugal au temps du comte-duc d’Olivares (1621-1640): le conflit de juridictions comme exercice de la politique. Madrid: Casa de Velázquez, 2001.a, p. 45).

Montalvão, em alguma medida, era a síntese da aristocracia produzida pela casa de Habsburgo. Após 1640, restava à família, dividida pela guerra, um esforço para resguardar seu patrimônio e diversificar os riscos inerentes à rebelião. Isso pode auxiliar a compreensão da criação do título de conde de Serém, em 1643. Mas, como defendeu Antonio Lozano, Montalvão precisava explicitar sua lealdade aos Bragança, sem descurar, todavia, de comunicar sua lealdade - como fez, provavelmente em 1644, por meio de seus clientes e de um memorial redigido por seu filho, D. Jerônimo - ao próprio Felipe IV. Ao rei católico, alegou que suas ações em Lisboa eram dissimuladas, para que, na verdade, pudesse operacionalizar na corte lusa os interesses de Madri. Nessa oportunidade, valorizava suas diligências e manipulava a ideia de fortuna, agregando-a agora ao artifício da dissimulação, para robustecer a força de seu argumento pró-Castela: segundo o memorial, o fracasso das armadas lusas, embora aparentasse acaso de Deus, “tinha fundamento nas traças do marquês, que lhe haviam acarretado uma má fortuna”.26 26 Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Arquivo da Casa dos condes de Galveias, maço 32, fol. 12v. (apud Lozano, 2009, p. 255). Com isso, provavelmente esperava sobreviver e assegurar um lugar de prestígio em sua corte, caso a rebelião lusa se mostrasse malfadada. Quando se estabeleceu a paz, em 1668, as casas dos Mascarenhas, “sendo amigos e traidores dos Bragança e dos Habusburgos [...], seguiam intactas, senão acrescidas, nas mãos daqueles que as leis da linhagem consideravam seus legítimos herdeiros” (Lozano, 2009, p. 257).

Em segundo lugar, é mister considerar que expungir a casa dos Montalvão também não devia parecer atitude prudente e acertada ao novo rei. Primeiro, sua postura em relação à casa era exemplo do exercício da clemência régia, virtude vinculada à justiça e tão em voga no pensamento de matriz estóica, a começar pelo próprio Justo Lipsio. A clemência era o índice de um rei atento à necessidade de concórdia dos vassalos, já afetados pela guerra e pela carga fiscal, conforme a tríade lipsiana rei clemente, súdito obediente, política estável (Martínez, 2013MARTÍNEZ, Adolfo Carrasco. El estoicismo en la cultura política europea, 1570-1650. In: RODRÍGUEZ, Antonio Cabeza; MARTÍNEZ, Adolfo Carrasco(orgs.). Saber y gobierno. Madrid: Actas, 2013., p. 20). Em segundo lugar, o contexto de guerra e de dúvida exigia amealhar a nobreza e mobilizar seu apoio. Nesse sentido, alguns anos depois do falecimento do marquês e logo após o do rei, o Conselho de Estado advertia a rainha regente, D. Luísa de Gusmão que “a conservação das casas e das famílias é o [modo] com que mais florescem, e no tempo presente deve Vossa Majestade por nisto maior cuidado, porque está a nobreza muito atenuada, huns porque se prenderam com Castela, e outros por falta de sucessão” (Prestage, 1919PRESTAGE, Edgar(ed.). O Conselho de Estado de D. João IV e D. Luísa de Gusmão. Lisboa: AHP, 1919., p. 25).

Assim, exemplo complexo e contraditório, Montalvão ilustrava, em simultâneo, como poderiam receber grandes mercês do novo rei aqueles que serviram aos Felipes, mas agora agiam com lealdade aos Bragança; e também como poderiam ser penalizados aqueles que simulavam lealdade, enquanto de fato conspiravam contra a nova dinastia. Exemplo fluido, manejado conforme as circunstâncias, Montalvão era também a faceta de um rei que jogava com as lealdades e que buscava a estabilidade, inimiga da fortuna. De algum modo, era o que a própria filosofia advertira a Boécio, quando preso e torturado: a fortuna o “lisonjeava”, mas também fazia dele “seu joguete”, a partir de “jogos funestos [...] e é precisamente essa faculdade de passar de um extremo ao outro, que caracteriza a fortuna, que deve fazer com que a desprezemos” (Boécio, 1998, p. 26; Costa e Zierer, 2000COSTA, Ricardo da; ZIERER, Adriana. Boécio e Ramon Llull: a Roda da Fortuna, princípio e fim dos homens. Convenit Internacional. v. 5, p. 63-70, 2000.).

O terceiro aspecto a ser elencado se refere aos efeitos mais alargados de se propor uma análise que tenha por perspectiva não exatamente um fracasso, mas sim um momento de fracasso experimentado pelos atores daquele jogo. Os adágios seiscentistas bem mostram isso: “Em tempo e lugar, o perder é ganhar” (Bluteau, 1728BLUTEAU, Raphael. Vocabulário Portuguez & Latino. 1728. Disponível em:Disponível em:http://www.brasiliana.usp.br/dicionario/1/sorte . Acesso em:30 ago. 2020.
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, v. VI, p. 412). Com outra roupagem, alguns deles ainda parecem permanecer: “para alguém sorrir, outro deve chorar”; “dias de muito, véspera de nada”; “quem ri por último, ri melhor”; “os últimos serão os primeiros”; “um dia da caça, outro do caçador”.

O fracasso, se tomado por definitivo, convida à revolta, porque pressupõe a exclusão do jogo da roda da vida, ou seja, a exclusão dos papéis no teatro do mundo. Instalado assim o desespero, a possibilidade de (re)acomodação demanda a tentativa de destruição das regras que asseveravam os equilíbrios de tensões e que, em seu conjunto, promoveram a situação malfadada. Do contrário, a crença acerca da existência da roda da fortuna, subjacente à noção de amparo divino, adstrito ao providencialismo, oferece, paradoxalmente, a esperança do possível retorno. Não é isso que faz da esperança uma virtude teologal, indispensável a todos que estão vivos? Nesse ideário, a esperança funcionava como a chave para a resignação, capaz por sua vez de reiterar códigos sociais de conduta.

Se isso é verdade (assume-se aqui como uma hipótese futura de trabalho), até que ponto, a despeito de sua dinâmica, a roda da fortuna não tenderia a manter cada um no seu lugar e, em perspectiva ampliada, contribuir para a conservação da ordem existente? Afinal, aqueles que estão nas graças da sorte procuram reproduzir as regras sociais, emulam padrões e adulam os que dispõem de poder ou influência, na sanha de conservação de seu status. “O melhor meio de conservar a segurança é temê-la”, afiançaria, uma vez mais, Vieira.27 27 Sermão de São Roque (1644) (Vieira, 2015, t. II, v. XI, p. 366). Mas sabem que o tempo ceifa tudo, como demonstravam tantas vanitas, do que resulta o limite inexorável do sucesso: se a queda é possível, ou mesmo provável, oportunamente deverão se resignar a ela. Importava assim ser virtuoso, explicitando ou uma fortaleza imensa diante do sofrimento, ou uma passividade característica dos que têm fé, conforme defendia o imaginário estoicista-cristão, naquela altura revisitado (Burke, 2008BURKE, Peter. Tacitism, Scepticism, and Reason of State. In: Burns, James(ed.). The Cambridge History of Political Thought, 1450-1700. Cambridge: CUP, 2008, p. 479-498., p. 479-498; Martínez, 2013MARTÍNEZ, Adolfo Carrasco. El estoicismo en la cultura política europea, 1570-1650. In: RODRÍGUEZ, Antonio Cabeza; MARTÍNEZ, Adolfo Carrasco(orgs.). Saber y gobierno. Madrid: Actas, 2013., p. 39-63).

É exatamente essa resignação o que sugere Bluteau em seu dicionário. Seu reverso seria, segundo o autor, a “desesperação”, um vício, traduzido por um “doloroso movimento do apetite, desconfiado com a representação da impossibilidade”; fonte de “paixões violentas” que “perturbam a imaginação”, a desesperação gerava prenúncios de “calamidades e ruínas” (Bluteau, 1728, v. III, p. 139).

Conforme Raphael Valladares (2012VALLADARES, Rafael. El problema de la obediencia en la Monarquía Hispánica, 1540-1700. In: ESTRÍGANA, Alicia(org.). Servir al rey en la Monarquía de los Austrias. Madrid: Silex, 2012, p. 121-146., p. 137), na monarquia hispânica das décadas de 1630 e 1640, a “desesperação” era empregada pelos vassalos para referir que desconfiavam da possibilidade de aplicação da justiça régia, na prática uma das alavancas da roda da fortuna, sobretudo quando os oficiais régios pretendiam fazer cumprir a eficácia da obediência em detrimento da tradição. Era o último estágio de tensão entre os soberanos e vassalos e poderia até ser deflagrada em revolta, mas antes contornada, se o príncipe abandonasse a tentativa de uma obediência eficaz em prol de outra, negociada e pactuada. Não se tratava, portanto, “de um horizonte emocional, senão de uma categoria de crise”.

Curiosamente, Bluteau (1728BLUTEAU, Raphael. Vocabulário Portuguez & Latino. 1728. Disponível em:Disponível em:http://www.brasiliana.usp.br/dicionario/1/sorte . Acesso em:30 ago. 2020.
http://www.brasiliana.usp.br/dicionario/...
, v. III, p. 139) procura dissuadir seus leitores a se desesperar (ou a se revoltar...); na senda de Tomás de Aquino, salienta, afinal, que “é glória da Providência Divina acudir quando menos se espera”. Quando disserta sobre o verbete “necessidade”, é ainda mais assertivo: “no aperto da necessidade, entregar-se à desesperação é desconfiar daquela piedosa onipotência, que aos servos sabe dar, em horríveis soledades, deliciosos hospícios [...]”. Além de esvaziar o valor do desespero em face dos planos divinos, talvez sua fala estivesse ainda impregnada de um discurso estoico, naquela altura revalorizado, e conformista, senão veja: “a verdadeira prudência consiste em acomodar-se com a necessidade. É preciso dobrar o gênio ao que se não pode evitar, e receber com humilhação os golpes do destino”. Para que não houvesse dúvida da relevância da aceitação das inconstâncias da vida, lembrava ainda uma possível decorrência natural do estado de necessidade: “porque muitas vezes a extrema necessidade, a que os homens se vêem reduzidos, os empenha em trabalhos e empresas, que lhe ocasionam grandes fortunas” (Bluteau, 1728, v. V. p. 696).

Mensagem semelhante, de caráter resignado, também figura sob a pena de Antônio Vieira. Citando Sêneca, o jesuíta sugere que delir a ambição ou a vontade é o único modo de “desarmar” a fortuna: “assim se desarma a fortuna, que só é forte com as armas que nós lhe damos. Todos os poderes da fortuna, em que consistem? Em levantar, e abater: e se eu me contento com o último lugar, nem ela me pode levantar, porque não quero, nem [me] abater, porque [ela] não pode”. Se em Maquiavel, o homem deve mobilizar sua astúcia, sob a égide da cautela, para amenizar a força da fortuna, em Vieira deve abandonar seus estratagemas para neutralizar os efeitos da volatilidade. Seu discurso incita à conformação: “só é verdadeiramente bem-afortunado quem não pode cair; e só não pode cair quem não tem para onde”.28 28 Sermão da Dominga Décima Sexta Post Pentecostem (Vieira, 2015, t. II, v. V, p. 286-287). Mas também acaba por desferir a advertência, já que, se de um lado, valoriza aqueles que estão em posição subalterna, ao mesmo tempo, de outro, prenuncia os riscos adstritos àqueles que estão no poder.

Na queda, a crença na reversibilidade exige a manutenção dos constrangimentos, da polidez, da humildade, da paciência, da fortaleza e da temperança. Nessa cultura política, a queda é ensinamento; momento de reavivar o ânimo e a fé. Na queda (como deveria ter sido na ascensão), “tende juízo ao menos”, como vaticinou La Fontaine. Sobretudo nesses momentos, é preciso ter em mente a sindérese, conceito tomista que pode ser traduzido, em resumo, pela inclinação natural que os homens têm para o bem e para a felicidade decorrente. Entram em cena a esperança e o sonho. Mesmo quem está por baixo mantém-se preso ao jogo, dependente de suas redes de clientela, associado às regras costumeiras, a procedimentos reconhecíveis e à etiqueta. No limite, tais redes podem levar novamente à ocasião do serviço ao rei e podem ensejar, quiçá, novo triunfo, mesmo que efêmero. Em perspectiva abrangente, a ideia da roda da fortuna não altera a sociedade; ela vincula e conserva a ordem social. Nessa lógica, essa é a lei da vida: ou se submeta a ela... ou morra.

Referências

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  • WOENSEL, Maurice van(ed.). Carmina Burana: canções de Beuern São Paulo: Ars Poética, 1994.
  • *
    Sermão da Quinta Dominga da Quaresma (Vieira, 2015, t. II, v. IV, p. 148-166).
  • 1
    Jean de La Fontaine, “A ingratidão e injustiça dos homens acerca da fortuna” (Martins, 2001, p. 180).
  • 2
    “A fortuna favorece os parvos” ou “a fortuna favorece os audaciosos”?
  • 3
    “Ao homem ousado, a fortuna dá a mão” ou “ao homem de esforço, a fortuna lhe põe em ombro”, conforme o verbete “fortuna” do dicionário de Raphael Bluteau (1728, v. IV, p. 188).
  • 4
    “O capricho da fortuna”. “Assim passa a glória do mundo”.
  • 5
    Em tradução livre: “Uma grande riqueza é para quem a possui um pesado cativeiro”.
  • 6
    Bluteau (1728, v. VII, p. 731) entende “sorte” como “tudo que sucede acaso, sem princípio certo, nem causa conhecida”.
  • 7
    Sermão da Dominga Décima Sexta Post Pentecostem (Vieira, 2015, t. II, v. V, p. 283, 287).
  • 8
    Sermão da Terceira Quarta-feira da Quaresma (Vieira, 2015, t. II, v. III, p. 220).
  • 9
    Sermão de São Roque (1652) (Vieira, 2015, t. II, v. IX, p. 404).
  • 10
    Sermão da Visitação de Nossa Senhora (Vieira, 2015, t. II, v. VII, p. 81-82).
  • 11
    O segundo vice-rei do Brasil foi também um Mascarenhas, conde de Óbidos, em 1663; antes fora governador do Brasil (1639-1640) e vice-rei da Índia (1651).
  • 12
    Sermão da Visitação de Nossa Senhora (Vieira, 2015, t. II, v. VII, p. 83-84).
  • 13
    Biblioteca Nacional de Portugal (BNP), Cod. 894, fl. 15-17v. (apud Costa, 2020, p. 239-240).
  • 14
    Sermão da Visitação de Nossa Senhora (Vieira, 2015, t. II, v. VII, p. 93).
  • 15
    BNP, Cod. 1697, fl. 54-54v (apud Costa, 2020, p. 353).
  • 16
    BNP, Cod. 1697, fl. 63-63v (apud Costa, 2020, p. 354-355).
  • 17
    Qui nescit dissimulari, nescit regnare”, ou “quem não sabe dissimular, não sabe reinar” (apud Senellart, 2006, p. 231).
  • 18
    Sermão nos Anos da Sereníssima Rainha Nossa Senhora [Maria Francisca de Saboia] (Vieira, 2015, t. II, v. XIII, p. 185; Calafate, 2012, p. 131).
  • 19
    BNP, Cod. 1697, fl. 56-58v (apud Costa, 2020, p. 355-356).
  • 20
    Sermão da Dominga Décima Sexta Post Pentecostem (Vieira, 2015, t. II, v. V, p. 279-280).
  • 21
    Sermão da Quarta Dominga da Quaresma (Vieira, 2015, t. II, v. III, p. 312).
  • 22
    Sermão de São Roque (1652) (Vieira, 2015, t. II, v. IX, p. 405).
  • 23
    Sermão do Rosário Maria Rosa Mística (XVI) (Vieira, 2015, t. II, v. IX, p. 50).
  • 24
    Sermão da Quarta Dominga da Quaresma (Vieira, 2015, t. II, v. III, p. 312).
  • 25
    Sermão da Dominga Décima Sexta Post Pentecostem (Vieira, 2015, t. II, v. V, p. 295).
  • 26
    Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Arquivo da Casa dos condes de Galveias, maço 32, fol. 12v. (apud Lozano, 2009, p. 255).
  • 27
    Sermão de São Roque (1644) (Vieira, 2015, t. II, v. XI, p. 366).
  • 28
    Sermão da Dominga Décima Sexta Post Pentecostem (Vieira, 2015, t. II, v. V, p. 286-287).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Jul 2022
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2022

Histórico

  • Recebido
    30 Ago 2021
  • Aceito
    19 Abr 2022
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