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Editar a literatura brasileira em Portugal: Sousa Pinto e a “Coleção Livros do Brasil”

Resumo:

O presente artigo analisa a experiência de Sousa Pinto enquanto editor para a formação da Livros do Brasil e de sua principal coleção, que carregava um título congênere ao de sua casa editorial, centrando as discussões na edição das obras de Erico Verissimo.

Palavras-chave:
Livros do Brasil; Coleção; Literatura brasileira

Abstract:

This article analyzes the experience of Sousa Pinto as a publisher in the formation of the Livros do Brasil and its main collection, which had the same title as that of its publishing house, centering the discussion on the publication of the works of Erico Verissimo.

Keywords:
Livros do Brasil; Collection; Brazilian Literature

Aproveitando-se do movimento realizado pelas editoras portuguesas que voltavam a publicar as obras dos escritores brasileiros em Portugal,1 1 Na década de 1930, em Portugal, há uma forte presença de livreiros e editores brasileiros vendendo obras dos nossos escritores que eram editadas no Brasil, o que causou um fascínio nos leitores lusitanos pela literatura brasileira, principalmente pela visualidade das edições. Como forma de reação a este processo, as editoras portuguesas retornam a venda de livros de literatura brasileira a preços mais baixos, fator que impediu que filiais de livrarias brasileiras continuassem atuando no mercado editorial lusitano (Medeiros, 2010). na década de 1940, Sousa Pinto (1901-1987) comprou a filial da Livraria Civilização Brasileira (CB) em Lisboa2 2 A filial da Civilização Brasileira em Lisboa foi instalada em 1932, funcionando até 1944. Esse fator revela, pois, a longevidade da atuação de CB por mais de uma década no mercado editorial português e, ao mesmo tempo, dimensiona a sua importância, tendo em vista que, aproveitando o câmbio favorável, contribui para a criação das condições necessárias para a inclusão do livro brasileiro no sistema livresco lusitano. e, em seguida, mudou o nome fantasia para Livros do Brasil (LB).

Apesar da mudança de nome, de Civilização Brasileira para Livros do Brasil, nos primeiros anos de funcionamento, o editor manteve a mesma atividade de Octalles Marcondes Ferreira, ou seja, a comercialização de obras brasileiras editadas no Brasil. Além disso, não houve uma separação entre a Livros de Portugal (LP - sua primeira editora, fundada no Rio de Janeiro, Brasil) e a Livros do Brasil.

Ao contrário, só é possível dimensionar os dois primeiros anos de sua atuação em Portugal a partir das suas relações de dependência com a Livros de Portugal, uma vez que a segunda se tornou o canal de travessia pelo Atlântico dos livros dos brasileiros. Para se ter uma ideia, em 1945, segundo os registros da editora, a LP enviou mais de 200 mil volumes de livros brasileiros para Portugal.

A partir do momento em que a Livros do Brasil passou a, além de vender, editar e publicar os livros de autores brasileiros, foram gestadas outras sensibilidades, foram mobilizadas novas formas de leitura e de recepção literária, tendo em vista que num primeiro momento as obras comercializadas pela LB foram tratadas como um produto importado. Além disso, Sousa Pinto inseriu os textos em outros projetos editoriais, instituiu outras materialidades, e os críticos os encaravam como um texto pertencente a um escritor estrangeiro, mesmo se tratando de dois países de língua portuguesa.

Com o passar do tempo, e dado o sucesso de vendas dos livros dos escritores brasileiros, apenas distribuir já não era o suficiente, tornava-se demasiado caro e cada vez mais inviável devido aos altos custos financeiros para a importação dos exemplares e, consequentemente, ao valor da venda em Lisboa, fazendo com que ele ampliasse as intenções iniciais desse projeto.

Assim sendo, em 1946, Sousa Pinto iniciou o processo de produção e confecção de um catálogo cujo objetivo era divulgar a literatura brasileira em uma coleção que carregava o sinete da editora, que estava passando por dificuldades comuns a outras livrarias da década de 1940, entre elas a falta de recursos financeiros e cambiais, condições estruturais precárias e a dificuldade de formação de um público leitor, ainda que, reitero, se trate de dois países de língua portuguesa.

A formação do catálogo produzido pela Livros do Brasil com uma coleção específica para a literatura brasileira reconfigurou a presença da nossa literatura no mercado livresco lusitano, tônica que se tornou presente nos jornais brasileiros.

Embora anteriormente à atuação da LB já existissem obras de escritores brasileiros circulando em Portugal, a coleção Livros do Brasil possibilitou a designação do sinal de distinção da casa editorial de Sousa Pinto entre as demais editoras portuguesas.

Não se pode negar que o investimento feito por Sousa Pinto foi arriscado, apesar de, já na década de 1930, em Portugal, observar-se um aumento na procura da literatura brasileira. Além disso, a formação de um público leitor sempre é incerta, afinal, o livro não é apenas um produto comercial, mas também uma rede de sensibilidades engendradas através das linguagens materializadas nos textos e no objeto-livro, da potência da escrita literária e de suas relações com os sujeitos leitores.

Ademais, é importante esclarecer que Sousa Pinto conhecia o mercado lusitano no qual estava ingressando e também compreendia como funcionavam as formas de produção e recepção dos livros e o sistema literário brasileiro, uma vez que, durante sua permanência no Brasil, o estabelecimento de redes comerciais advindas do gerenciamento da Livros de Portugal o colocou em contato direto com as principais editoras e livrarias brasileiras.

Acrescente-se a isso o fato de que o trânsito de Sousa Pinto entre o Rio de Janeiro e São Paulo, período em que residiu no Brasil, fez com que ele estabelecesse contato com diversos escritores, entre eles Erico Verissimo. Vale lembrar que a Livros de Portugal3 3 Em 1946, a Livros de Portugal foi transferida para a rua Gonçalves Dias, número 62, no Centro do Rio de Janeiro. A mudança de endereço não distanciou a editora do locus central de circulação e produção de livros da capital carioca naquele momento, tendo em vista que a rua em questão era transversal à rua do Ouvidor. situava-se na rua do Ouvidor, número 106, enquanto a Livraria José Olympio Editora, principal editora do Brasil daquela época, encontrava-se instalada na mesma rua, no número 103. Assim sendo, os encontros entre editores e escritores eram inevitáveis, e Souza Pinto estava inserido na atmosfera das demandas do principal ponto de ebulição do mercado de livros no nosso país.

Sousa Pinto sabia que seria mais fácil e adequado reunir os autores em uma mesma coleção do que divulgá-los individualmente, daí que as publicações lançadas pela Livros do Brasil tenham chegado aos leitores reunidas em um conjunto, no qual era realizado um diálogo entre as obras a partir das estruturas organizativas do mercado editorial ou da crítica literária.

Ao comparar as obras de escritores brasileiros lançadas na coleção Livros do Brasil com as edições brasileiras pertencentes ao sinete da José Olympio Editora (J.O.) é possível notar que Sousa Pinto, apesar de apresentar algumas diferenças visuais, tomou como referência o projeto da J.O., assumindo estratégias semelhantes, como o investimento na inserção de paratextos.

Sousa Pinto, em alguns casos, manteve as condições gráficas e tipográficas das edições brasileiras, haja vista que a circulação das edições da Editora Globo e até mesmo da Livraria José Olympio Editora, já haviam instituído uma cultura visual para as obras em questão e, em certa medida, manter determinados aspectos, como é o caso de paratextos, dava credibilidade à edição, atribuía sentidos e significações positivadas ao texto e à autoria.

As formas de circulação e recepção das obras literárias passam por um reconhecimento visual que se estabelece entre os leitores e os editores, mas sem perder de vista a importância dos textos abrigados nos suportes, pois, para que a literatura brasileira se tornasse popular entre os lusitanos, eram necessárias duas medidas: o estabelecimento de uma rede de sentidos e a construção de sensibilidades em torno do livro brasileiro, o qual, com o investimento da Livros do Brasil, passa a ser, também, um produto português.

Segundo Nuno Medeiros (2010MEDEIROS, Nuno. Edição e editores: o mundo do livro em Portugal 1940-1970. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 2010.), é necessário levar em consideração que, apesar da renovação gráfica e da busca por uma identidade própria, o sistema editorial português não conseguiu desvencilhar-se totalmente do seu modo de produção anterior, marcando profundamente a organização administrativa e os investimentos financeiros das editoras. Assim sendo, a Livros do Brasil mesclou a velha política editorial, a coexistência entre edições próprias destinadas a um público específico e, em paralelo, a importação de livros do além-mar.

A publicação de obras estrangeiras, em Portugal, foi seminal para definir o espaço de atuação da LB no mercado editorial português, tanto que os títulos da literatura brasileira, além de outras coleções direcionadas para os clássicos da literatura mundial, tornaram-se o ponto fulcral do catálogo de Sousa Pinto, ao mesmo tempo em que a venda de livros de ficção científica (levando em consideração o quesito importação), a igualava a outras editoras.

Todavia, diferentemente das duas casas editoriais acima mencionadas, Sousa Pinto foi sensível e estratégico ao investir na literatura brasileira; afinal, ele conhecia tanto o mercado editorial brasileiro quanto as estruturas canônicas, sem contar que foi apenas nos anos 1930, e mais fortemente a partir da década de 1940, como já assinalado, que se notou um crescente interesse dos lusitanos pelos escritores brasileiros.

Na Coleção Livros do Brasil destacam-se, em especial, as obras dos literatos vinculados ao movimento modernista, com ênfase nos escritores do Nordeste, os quais eram editados, no Brasil, pela Livraria José Olympio Editora e estavam inseridos no projeto de José Olympio de discutir o Brasil profundo a partir da literatura.

Apesar de Sousa Pinto ter apresentado esses escritores destacando outros elementos, é possível considerar que os interesses da J.O. não foram silenciados por completo, ou seja, as obras publicadas na Coleção Livros do Brasil poderiam ser um caminho possível de conhecer nosso país a partir de outra perspectiva e a partir de diferentes recortes temáticos, a exemplo de Jorge Amado, cuja recepção em Portugal ocorreu marcadamente pelo discurso em torno do seu posicionamento político, como um escritor comunista. Cabe destacar que Sousa Pinto, nos dois primeiros anos (entre 1946 a 1948), centrou-se na literatura de Erico Verissimo e depois ampliou seu catálogo para uma multiplicidade de atores e temas.

O empreendimento de Sousa Pinto tinha como um dos objetivos a tentativa de aproximar a língua portuguesa de Portugal com a do Brasil, bem como facilitar as demais trocas culturais advindas desse processo, tendo sido a literatura utilizada como meio para estabelecer um caminho possível de ligação entre o Brasil e Portugal.4 4 O próprio Sousa Pinto deixa essa questão evidente em artigo “As relações culturais entre Brasil e Portugal”, publicado no Boletim Livros de Portugal, em 1982. Essa possibilidade de comunicação entre as duas nações estava atrelada às questões lusófonas.

As relações do editor português para alavancar a Livros do Brasil dão-se incialmente com a Editora Globo, que marca a primeira fase de atuação da LB em Portugal, seja pelas permutas para a tradução de obras de língua estrangeira (em especial de língua inglesa), através da distribuição de livros ou pelos primeiros títulos da coleção destinada à literatura brasileira que carregava o sinete da editora.

A respeito dessa questão, a partir do levantamento cronológico das publicações dos títulos das obras brasileiras lançados no catálogo da LB, identifica-se que Erico Verissimo5 5 Desse autor, a editora Livros do Brasil publicou em Portugal, as seguintes obras: O resto é silêncio, romance (1954); Viagem à aurora do mundo, romance da pré-história (1955); Saga, romance (1955); Olhai os lírios do campo, romance (1955); Clarissa, romance (1957); México, história de uma viagem (1957); Um lugar ao sol (1959); Gato preto em campo de neve (1960); O continente (1973); O retrato (1973); Solo de clarineta: memórias (1974) O senhor embaixador (1978); O tempo e o vento (1979); O prisioneiro (1980); Israel em abril (1986) e Incidente em Antares (1988). é o literato que motivou a maior quantidade de edições de diferentes títulos.

A parceria da editora de Sousa Pinto com a José Olympio Editora, apesar de conflituosa, foi a que se tornou mais significativa no tocante à aproximação entre os projetos que as distinguiam das demais editoras localizadas em seus respectivos países. Ambas investiram na divulgação da literatura brasileira, em maior volume nos autores ligados ao movimento modernista.

Assim, tanto no Brasil quanto em Portugal foi lançada uma expressiva quantidade de obras pertencentes a escritores oriundos do Nordeste brasileiro, entre os quais figuram os nomes de José Lins do Rego, José Américo de Almeida, Rachel de Queiroz, Jorge Amado, e Gilberto Freyre; bem como do restante do Brasil, entre eles Lygia Fagundes Teles, Clarice Lispector e Agripino Grieco, apenas para citar alguns.

Embora José Olympio e Sousa Pinto não tenham se reunido para decidir se formariam ou não um catálogo semelhante, pode-se considerar que eles, no que se refere à publicação de tais escritores, apresentaram mais semelhanças do que diferenças em seus projetos editoriais. Se a José Olympio Editora utilizou a literatura associada á coleção Documentos Brasileiros com intuito de levar aos leitores títulos que o público pudesse compreender e interpretar o Brasil; em Portugal, a coleção Livros do Brasil, de Sousa Pinto, também apresentou e construiu uma narrativa de descoberta da nação brasileira ou pelo menos a (re)descoberta da literatura.

Permitindo, além disso, interpretar como o processo de inserção da literatura brasileira no mercado internacional refere-se tanto aos bens simbólicos quanto comerciais. E, mais do que isso: os textos que compõem as coleções abordadas construíram marcas de autoria e narrativas sobre a literatura e os escritores brasileiros.

Contudo, foram os livros de Erico Verissimo que receberam o maior fluxo de participação na composição da Coleção Livros do Brasil, cujas edições podem ser tomadas como uma série para identificar a identidade, as continuidades e particularidades gráficas, tipográficas e materiais mobilizadas por Sousa Pinto no processo de realização do seu projeto editorial.

Sousa Pinto, editor de Erico Verissimo

A vinda de Sousa Pinto ao Brasil para organizar a Exposição do Livro Português, em 1941, e sua permanência até 1944, trabalhando na Livros de Portugal, lhe proporcionou o estabelecer contato com diferentes intelectuais, editores, críticos literários e demais envolvidos no mercado do livro brasileiro.

Ademais, sua experiência enquanto dono de uma editora no Brasil, a Livros de Portugal, fez com que ele compreendesse, ou melhor, percebesse as estruturas de funcionamento do mercado editorial brasileiro, as formas livrescas de produção, circulação e recepção da literatura e, mais ainda, vislumbrasse conexões e projeções desse universo em outros sistemas literários.

Pode-se considerar que foi a partir das suas vivências no Brasil que Sousa Pinto, ao regressar a Portugal para dar continuidade ao seu ofício de editor, encetou as primeiras trocas comerciais com as editoras brasileiras. Esse processo, de início, foi marcadamente experimentado pela continuidade das atividades comerciais exercidas pela sucursal da Livraria Civilização Brasileira, ou seja, a comercialização de obras de literatura brasileira, tratadas como livro importado, que eram produzidas no Brasil e recepcionadas em Lisboa e demais cidades portuguesas.

Contudo, as condições próprias do mercado livresco lusitano, entre elas o alto custo dos livros estrangeiros, a procura do leitor português pelos escritores brasileiros e a favorável recepção dos nossos literatos, levaram Sousa Pinto a transformar, em 1948, a Livros do Brasil em um espaço não apenas de venda de literatura brasileira, mas também de produção.

Mais ainda: ele soube se beneficiar das dinâmicas comerciais dos livros advindas do final da década de 1930 e início da de 1940, período no qual as relações do mercado editorial entre Brasil e Portugal sofreram uma inversão nos processos de produção e circulação, fato este que provocou uma descontinuidade na construção histórica de difusão dos impressos entre os dois países, em que o primeiro era tido como dependente do segundo, tanto na fabricação quanto nas formas comerciais.

Ao refletir sobre essa transformação, Nuno Medeiros (2018MEDEIROS, Nuno. O livro no Portugal contemporâneo. Lisboa: Le Monde Diplomatique/Outro Modo, 2018., p. 188) afirma que

As dinâmicas de mudança exercem efeitos perturbadores da ordem mercantil e representacional instaurada, originando respostas e contra-respostas cuja lógica pode ser descortinada no jogo tensional de estratégias de influência e contra-influência postas em campo por cada um dos sistemas-livro, cada um procurando fazer valer num conjunto de planos [...] Tal parece ser, até certo ponto, o caso do Brasil e de Portugal no que respeita ao livro. O modelo assim traçado sofre, no entanto, o desafio de acção de determinado tipo de agentes, sobretudo individuais (editores e livreiros), que procura concretizar o estabelecimento ou a actualização de vínculos colaborativos através da venda e edição de livros de autores e temas brasileiros em Portugal e vice-versa.

Apesar dessa inversão apresentar pontos positivos, dentre os quais o fim das relações unilaterais entre os dois países no que se refere à circulação de livros, é importante salientar, conforme assinala Medeiros (2018MEDEIROS, Nuno. O livro no Portugal contemporâneo. Lisboa: Le Monde Diplomatique/Outro Modo, 2018.), que mesmo com a modificação dos modos como se davam os trânsitos editoriais e comerciais das obras, sejam elas brasileiras ou de outras nacionalidades, é possível perceber que até 1960 era comum alguns editores portugueses ainda tratarem a produção livresca do Brasil dentro de uma perspectiva de subalternidade e de inferioridade no tocante à ideia de mercado e da possibilidade de encarar o Brasil como país produtor e consumidor de livro enquanto mercadoria.

Essa visão, que certamente gerou discordâncias entre editores brasileiros e portugueses, permaneceu durante um longo período do século XX, mesmo que, tanto no Brasil como em Portugal, o processo de renovação do mercado editorial, no modelo que se tem hoje, tenha ocorrido simultaneamente entre os anos de 1930 e 1940 e pela existência de semelhanças em seu andamento: multiplicidade temática das publicações, diversidade de editoras, novas formas gráficas e tipográficas e crítica literária, para apenas citar algumas características.

É nesse cenário que identifico a segunda fase da atuação de Sousa Pinto, isto é, o momento em que de fato ele passa a assumir a condição de editor de literatura brasileira em Portugal. Nesse processo, a Editora Globo, de Porto Alegre, através de Henrique Bertaso6 6 Henrique Bertaso (1906-1977), em 1940 passou a ingressar o quadro de funcionários da Editora Globo. Antes disso, Bertaso, a partir de 1921, aos 15 anos de idade, desenvolve atividades na imprensa gaúcha. Ele também foi um dos responsáveis pela criação da Revista do Globo (Verissimo, 2011). e Erico Verissimo, teve um importante papel para que tal empreitada fosse possível, pois foi a partir dela que a Livros do Brasil firmou os primeiros acordos de editoração de obras brasileiras.

De modo geral, os convênios de publicação firmados entre a editora portuguesa e a Editora Globo e, mais tarde, com a Livraria José Olympio Editora, marcaram e decidiram definitivamente a história da Livros do Brasil, em especial com a primeira, uma vez que o primeiro livro brasileiro editado por Sousa Pinto foi exatamente Olhai os lírios do campo, de Erico Verissimo. Este, por sua vez, apresentou ao público lusitano a coleção que carregava o nome congênere da editora: a Coleção Livros do Brasil.

O autor foi selecionado para abrir a coleção por diferentes motivos. O primeiro deles é sua relação de amizade com Sousa Pinto, expressa nas missivas e confidências trocadas entre eles, as quais se iniciavam sempre com a indicação para o “meu caro amigo” ou “meu querido amigo”; o segundo devido ao fato de Olhai os lírios do campo, no final da década de 1930, especificamente em 1938 e início dos anos 1940, ter sido um dos livros mais vendidos no Brasil, sendo responsável pela consagração autoral de Verissimo e tornando-se um best-seller em vendas e com recepção crítica positiva, fato este noticiado nos jornais brasileiros:

Erico Verissimo continua sendo o escritor brasileiro mais lido. Publicou os seguintes livros: Caminhos Cruzados (17 edições); Música ao Longe (7 edições); Um Lugar ao Sol (6 edições); Clarissa (5 edições); Olhai os Lírios do Campo (11 edições); Saga (4 edições); O Resto é Silêncio (2 edições); Fantoches (1 edição); As Mãos de Meu Filho (1 edição); A Volta de Joana D’Arc (4 edições); Gato Preto em Campo de Neve (5 edições); dois livros de divulgação e oito volumes para crianças. Em todo o Brasil já foram vendidos 366 mil exemplares de suas obras. Olhai os Lírios do Campo (47 mil exemplares vendidos) foi o romance de maior aceitação. E Fantoches, contos (apenas 1 mil exemplares vendidos) o livro de menor aceitação (Estatística, 19 maio 1946ESTATÍSTICA. Correio da Manhã, Coluna Vida Literária, Rio de Janeiro, 19 maio 1946, p. 2., p. 2; destaques meus).

É possível elencar um terceiro motivo: as qualidades literárias e o estilo narrativo de Verissimo, uma vez que, para

dar um caráter social e engajado a seus romances, Erico Verissimo vai se valer de modernas técnicas narrativas, muitas delas já algum tempo utilizadas na Europa, mas muito pouco conhecidas no Brasil, na esteira de renovação estética do Modernismo de 1922, cuja proposta fora assimilada pelo escritor, embora ele nunca tenha se filiado oficialmente ao movimento (Santos, 2014SANTOS, Donizeth. O projeto literário de Erico Verissimo. Estudos de literatura brasileira contemporânea, n. 44, p. 331-363, jul./dez. 2014., p. 335).

Cabe ressaltar que as edições portuguesas das obras de Erico Verissimo beneficiaram não apenas a Sousa Pinto enquanto editor, mas também contribuíram significativamente para o processo de internacionalização e divulgação da literatura brasileira no sistema literário estrangeiro, mesmo se tratando de um país de língua portuguesa.

O conjunto dos títulos de Erico Verissimo lançados pela Livros do Brasil demonstram que os paratextos presentes nesses livros buscam dar uma conotação valorativa para o significado da publicação das obras do autor e para as atividades editoriais de Sousa Pinto. É o caso de O retrato de Erico Verissimo, presente na orelha da edição portuguesa de O retrato da série O tempo e o vento (1979),7 7 A publicação da primeira edição brasileira é datada de 1951, tendo sido lançada pela Livros do Brasil, em Portugal, em 1979, a que utilizamos nesse artigo. no qual afirma:

Erico Verissimo é, ninguém o ignora já, um dos maiores escritores de língua portuguesa. A literatura constitui desde sempre a sua fundamental preocupação. [...] Foi em 1949 que iniciou a sua obra máxima com a publicação do primeiro volume de O tempo e o vento. Sinfonia grandiosa sem precedentes na literatura do Brasil. [...] Trata-se, sem dúvida, de um dos romances mais imponentes da literatura rica e multiforme do país irmão. Dela disse o eminente sociólogo Gilberto Freyre que é “um grande livro... um dos mais significativos que têm aparecido ultimamente na literatura brasileira”. Ao que podemos acrescentar as palavras expressivas de Oswaldo Aranha, que afirma tratar-se de “um livro que durará e nos fará durar”. “Chega a ser soberbo em sua desafogada atmosfera de epopeia”, conclui Moysés Velhinho, destacado homem brasileiro das letras. Eis, pois, uma obra que urgia trazer ao conhecimento do público português, o qual saberá indubitavelmente admirá-la em toda a sua profunda grandeza (Livros do Brasil, 1979LIVROS DO BRASIL. Retrato de Erico Verissimo. In: Verissimo, Erico. O retrato. Lisboa: Livros do Brasil, 1979, s.p., s.p.).

Note-se que o primeiro recurso eleito por Sousa Pinto é aquele que visa estabelecer os elos conectivos entre a literatura brasileira e a portuguesa a partir das questões linguísticas, ou seja, as obras de Verissimo são, assim, pertencentes à língua portuguesa falada em Portugal e no Brasil, tidos como países irmãos, mesmo que nessa época já existissem publicações e acordos ortográficos reconhecendo as particularidades e as diferenças entre o português falado nas duas nações.

Desde a década de 1930, e mais acentuadamente nos anos 1960, a língua portuguesa foi um ponto articulador nos argumentos para a realização de eventos e trocas editorais cujo objetivo era a aproximação entre os dois países, seja no âmbito da literatura, do mercado editorial ou até mesmo nas relações políticas e comerciais entre Brasil e Portugal.8 8 Para Gabriela Grecco (2018), essas trocas, assim como a institucionalização de prêmios literários, ao mesmo tempo que buscam a nacionalização da cultura brasileira, promovem a sua internacionalização, em alguns casos, como nos regimes ditatoriais, politizam a literatura com o intuito de forjar uma identidade.

Além disso, o destaque dado para a trajetória da produção de O retrato e o lugar que a crítica literária confere a ele no cânone literário brasileiro estabelece uma vinculação entre a obra e o leitor estrangeiro a partir das qualificações atribuídas ao texto ficcional. Desse modo, não é de forma despretensiosa que foram destacados trechos de análises realizadas por Gilberto Freyre, Oswaldo Aranha e Moysés Velhinho, mesmo que o editor português não tenha referenciado tais excertos.

Ainda na mesma edição de O retrato (1979), existe na contracapa o paratexto “Erico Verissimo, o escritor e a crítica”, no qual o editor arrola outros trechos de análises publicadas por críticos portugueses ou por jornais lusitanos, mais uma vez sem fazer as devidas referências bibliográficas:

...o maior romancista de língua portuguesa.

Carlos Queiroz

Erico Verissimo faz-nos penetrar no âmago dos personagens, partilhar dos seus infortúnios, lágrimas, angústias, fugindo a nossa sensibilidade ao seu trágico destino.

Quando o autor consegue identificar o leitor com suas figuras, é porque elas vivem para além da literatura, em humanidade real.

Artur Portela

Erico Verissimo não é apenas um grande escritor brasileiro, limitado ao Brasil. O seu nome e a sua obra ultrapassam as fronteiras do seu país, ganharam a simpatia universal. As páginas dos seus livros estremecem e palpitam, trazem-nos o calor da emoção humana e uma mensagem de poesia e ternura.

Rabelo Bittencourt

... um dos maiores escritores de língua portuguesa. E Portugal vai-o reconhecendo, graças às edições portuguesas da sua grandiosa obra.

(in Jornal do Comércio)

... Erico Verissimo sabiamente equilibra, nos seus romances, o documento humano e a análise psicológica.

José Osório de Oliveira (Livros do Brasil, 1979LIVROS DO BRASIL. Retrato de Erico Verissimo. In: Verissimo, Erico. O retrato. Lisboa: Livros do Brasil, 1979, s.p., s.p.).

Nesse caso, percebe-se que tal conteúdo projeta uma expectativa no leitor e qualifica a obra de Erico Verissimo, uma vez que as críticas são assinadas por sujeitos considerados importantes críticos de literatura no cenário literário português. O nome e a assinatura demarcam um lugar de prestígio e de respeito pelo texto do outro, uma marca tipográfica que confere à escrita de outrem um modo de ler e também de reagir ao que será lido, impactando o processo de invenção autoral e as práticas de leitura.

Dentre os citados no paratexto em discussão, está Artur Portela, que se destacou por seus textos polêmicos no Diário de Notícias (Lisboa), tanto na coluna de literatura como na de artes plásticas, além de ter colaborado com importantes revistas, entre elas a Revista Mundo Gráfico.9 9 A Revista Mundo Gráfico, embora tenha durado apenas oito anos, foi um importante periódico português de circulação quinzenal, fundado em 1940, sendo Artur Portela o primeiro editor. O conteúdo da revista tratava das novidades de Portugal e no âmbito internacional sobre questões gráficas (Tavares, 2018). Outro nome que merece ser mencionado é o de José Osório de Oliveira que, além de poeta, conseguiu se sobressair como crítico literário.

As trajetórias intelectuais dos críticos mencionados suprimiam a ausência de informações complementares sobre eles, e os excertos, aglutinados em um único paratexto, cumpriam uma função autônoma, conectando-se com outros elementos tipográficos que atribuíam valor literário e estético à obra na sua dimensão textual.

Além disso, também inseriam a literatura de Erico Verissimo no gosto de leitura dos portugueses, pois, como é possível perceber, os elementos destacados não se restringiam à condição de Verissimo como escritor de O retrato, mas, principalmente, a de autor, cujos elementos perpassavam toda a sua produção literária.

A fim de realizar um balanço sobre o impacto das obras Erico Verissimo no catálogo da coleção Livros do Brasil, identifica-se que, dos 25 primeiros títulos lançados por ela, 12 são do referido autor: Olhai os lírios do campo (n. 1), Saga (n. 2), Caminhos cruzados (n. 4), Um lugar ao sol (n. 5), A volta do gato preto (n. 6), Clarissa (n. 7), Música ao longe (n. 9), Gato preto em campo de neve (n. 12), O resto é silêncio (n. 14), O tempo e o vento (n. 15), O retrato (n. 18) e Noite (n. 25).

Como é possível observar pela quantidade de títulos, mas expressa, também, pela quantitativo das tiragens das reedições, Sousa Pinto apostou e investiu na literatura de Verissimo. Em média, nas primeiras edições foram impressos 2.800 exemplares, destacando-se os casos de Israel em abril (5.000 exemplares, em 1970), México (4.800 exemplares, em 1957), O senhor Embaixador (4.000 exemplares, em 1965) e Incidente em Antares (3.800 exemplares, em 1971), já na primeira edição (Chaves, 1972CHAVES, Flávio Loureiro. O contador de histórias: 40 anos de vida literária de Erico Verissimo. Porto Alegre: Globo, 1972.).

Sousa Pinto mobilizou, nos paratextos de apresentação dos livros, recursos para a criação de um consenso entre os leitores sobre Erico Verissimo, questionando retoricamente em Saga: “QUEM não conhece em Portugal o nome de Erico Verissimo?”. A questão é respondida destacando que o literato era um dos maiores romancistas brasileiros, mobilizando adjetivações que o caracterizam como admirado e querido, e traçando uma sequência das edições portuguesas de seus livros, com destaque para Saga, na Coleção Livros do Brasil:

O autor de “Música ao longe”, dos “Caminhos cruzados”, de “Olhai os lírios dos campos”, conta com milhares de leitores portugueses e cada leitor o admira com persistente e devoção. “Saga” é um dos livros-chaves das sensibilidades das tendências intelectuais de Erico Verissimo, um desses livros em que a alma e o pensamento do autor, manifestando-se claramente página a página, através de personagens inesquecíveis e duma formosa e cativante narrativa, conquista desde logo as atenções, e prende desde logo o nosso interesse (Verissimo, 1962aVERISSIMO, Erico. Saga. 4. ed. Lisboa: Livros do Brasil, 1962a., s.p.).

Dessa maneira, quando associados o tracejo das edições com as qualificações literárias do literato, Erico Verissimo é anunciado aos leitores como um autor incontornável para conhecimento da literatura brasileira. O artifício narrativo é repetido em Clarissa, no qual Sousa Pinto o considera, “sem dúvida, um dos maiores escritores com que o mundo conta hoje; as suas personagens tornaram-se queridas do público português” (Verissimo, 1962bVERISSIMO, Erico. Clarissa. 5. ed. Lisboa: Livros do Brasil, 1962b., s.p.); e é retomado em O retrato: “Erico Verissimo é, ninguém ignora já, um dos maiores escritores da língua portuguesa. A Literatura constitui desde sempre uma fundamental preocupação” (Verissimo, 1977VERISSIMO, Erico. O tempo e o vento: o retrato. 2. ed. Lisboa: Livros do Brasil, 1977., s.p.).

A conotação dada pela Livros do Brasil para o estabelecimento dessa singularidade é passível de questionamento, uma vez que a singularização também ocorreu, cada um ao seu modo, com outros autores publicados pela coleção, podendo ser considerado como um artifício do próprio mercado editorial e suas composições narrativas de projeção das obras e dos autores.

A diferença, nesse caso, reside no fato de que Erico Verissimo se diferencia em relação aos que compõem a Coleção Livros do Brasil na medida em que, se levado em consideração apenas um cálculo matemático, o quantitativo de edições e títulos publicados em Portugal pelo selo editorial de Sousa Pinto é superior aos demais.

Na 18ª edição de Olhai os lírios dos campos,10 10 Versão preliminar desse texto já aparece na 4ª edição, que foi sendo atualizado nas posteriores. a orelha de apresentação da obra dedica-se a fazer um balanço sobre a publicação dos livros de Erico Verissimo em Portugal. Segundo a Livros do Brasil, o romance de estreia da coleção “é deveras notável. [...] Se ao número de exemplares das tiragens feitas em Portugal se juntarem os das edições brasileiras, ver-se-á que este livro atinge cifras a que os escritores de língua portuguesa não estão muito habituados” (Verissimo, 1980 VERISSIMO, Erico. Olhai os lírios dos campos. 18. ed. Lisboa: Livros do Brasil, 1980., s.p.).

O interessante é que Sousa Pinto aponta a presença das edições brasileiras, lançadas pela Editora Globo, como justificativa para o sucesso do livro entre os leitores portugueses. Fato interessante, uma vez que, como já apontado, conforma a ideia de que apenas a boa recepção e circulação de uma obra no Brasil não garantiria que o mesmo acontecesse em Portugal. É na relação perceptiva dos dois sistemas literários que o editor foi formando sua coleção, atinando para suas correlações, tanto no que concerne as tiragens, vendas e recepção do público, quanto aos temas e estilos,11 11 É interessante que o mesmo aconteceu com outros autores, tendo em vista que Sousa Pinto comercializava as edições brasileiras em Portugal. Acrescenta-se a isso o fato que os livros de Jorge Amado, por exemplo, já circulavam no mercado livresco português, antes mesmo da atuação da Livros do Brasil, seja como distribuidora ou editora. atentando, dessa maneira, para as qualidades literárias do autor e para a trama do romance que, segundo ele, provocava interesse nos antigos e futuros leitores.

Além disso, o lugar de importância dado a Erico Verissimo por Sousa Pinto na Coleção Livros do Brasil estava expresso na materialidade das publicações. Um exemplo é o do paratexto “Obras de Erico Verissimo”, presente em diversas edições portuguesas de diferentes títulos do autor:

A Figura 1 traz o paratexto da obra já referenciada de Erico Verissimo que foi publicada pela Livros do Brasil e cujas ilustrações receberam a assinatura de Bernardo Marques,12 12 Bernardo Loureiro Marques (1898-1962) foi artista gráfico, ilustrador e pintor. Participou da segunda fase do modernismo português e do movimento de renovação das artes plásticas em Portugal durante o século XX. e a Figura 2, os Poemas reunidos, de Ribeiro Couto, lançados pela José Olympio Editora, com concepção gráfica de Luís Jardim,13 13 Pinto e escritor brasileiro, Luís Jardim (1901-1987) destacou-se por seus artigos sobre pintura, na publicação de obras infantis e pela ilustração de capas de diversos escritores brasileiros, entre eles Rachel de Queiroz. e ambas funcionam como dispositivos editoriais que traçam uma trajetória dos autores no catálogo das suas referidas editoras.

Figura 1
Obras de Erico Verissimo

Figura 2
Paratexto de Poesias reunidas

E, ao mesmo tempo, alinhavam-se à estética da arte concreta ou da poesia concretista, em evidência naquele momento, revelando, pois, que o objeto livro se conecta com outras linguagens e estéticas para o estabelecimento de relações próximas com o leitor, para a ampliação dos espaços de circulação, bem como demonstra que o processo editorial é sempre coletivo e plural.

Em ambos os casos, o recurso tipográfico, elaborado pelos ilustradores e aprovado pelos seus respectivos editores, assume a dimensão visual da palavra, ou seja, a folha em branco ganha contornos geométricos concretizados a partir da organização espacial dos títulos das obras dos autores.

No caso da obra de Ribeiro Couto, Luís Jardim seguiu os elementos mobilizados pelo concretismo: tanto a materialização dos conceitos intelectuais, nesse caso, o título das poesias de Couto, quanto a artificialidade do jogo de cores ao cruzar o vermelho com um tom cinzento (aproximando-se de tons de preto), utilizados para colorir os desenhos curvilíneos que separam os títulos dos poemas.

Tais procedimentos estabelecem uma rede de sentidos a partir de uma pirâmide invertida, conotando, assim, a crescente autoral que não se limita a uma cronologia, a um estado evolutivo no fazer literário, mas evocam uma rede de significados próprios a um autor, como um estilo literário e uma forma particular de escrita.

Ao analisar esses dois casos, eles expõem práticas editoriais, gráficas e tipográficas compartilhadas por José Olympio, no Brasil, e por Sousa Pinto, no outro lado do Atlântico, as quais extrapolam as fronteiras nacionais e se inscrevem nas dinâmicas próprias da fabricação do livro encarado tanto como objeto quanto obra de arte, e que dialoga com outras estéticas e tendências artísticas.

Ademais, referente às publicações dos livros de Erico Verissimo, Sousa Pinto utilizou o mesmo recurso para lançar novas edições da mesma obra ou de outros títulos, nos quais o paratexto em exame foi sofrendo atualizações, mas mantendo a estratégia de tomar o espaço em branco para produção de sentidos, tornando-o em livro-objeto, a partir do qual abandonam-se as linearidades linguísticas e opta-se pela escolha de sentidos produzidos pelas elaborações de formas e linhas, reafirmando os princípios espacial-geométricos da estética concreta.

No que se refere à tentativa da Livros do Brasil de traçar uma historicidade para cada obra publicada, identifiquei apenas o caso de Caminhos cruzados: a segunda edição portuguesa contou com uma orelha que anunciava um conjunto de informações sobre as edições brasileiras. Em primeiro lugar, tal estratégia evidencia o alcance da obra em questão através das suas sucessivas edições pela Editora Globo (1935, 1936, 1937 e 1938) e o agraciamento com o prêmio Graça Aranha. Em segundo, destaca a tradução para o inglês, realizada por Louis Kaplan, com o título Crossroads, lançada pela Macmillan, revelando sua circularidade internacional e o interesse de outros públicos.

Tudo isso para justificar que mesmo Olhai os lírios do campo sendo o livro de Erico Verissimo mais vendido, Caminhos cruzados continuava como a obra preferida de seus leitores, discurso que se tornou uma estratégia comercial com o intuito de atribuir qualidades literárias ao autor, uma vez que a autoria se constrói “não apenas do discurso, mas também de uma materialidade, materialidade e discurso [...] são indissociáveis” (Chartier, 2012CHARTIER, Roger. O que é um autor? Revisão de uma genealogia. Trad. Luzmara Curcino e Carlos Eduardo Bezerra. São Paulo: EdUFSCar, 2012., p. 63). Assim, Sousa Pinto conclui que “a primeira edição portuguesa deste famoso romance na ‘Coleção Livros do Brasil’ esgotou-se rapidamente, o que prova não ter esmorecido o interesse por esta obra do grande escritor riograndense” (Livros do Brasil, 1947, s.p.).

As publicações das obras literárias brasileiras produzidas na contemporaneidade tornaram-se um ponto de conexão entre Brasil e Portugal, criando outra forma de nos relacionar com a terra lusitana, tendo o mundo dos livros e seus agentes como intermediários possíveis de uma nova configuração intelectual e literária a partir de narrativas descoladas do nosso passado colonial, no qual o Brasil era encarado apenas como uma extensão da pátria portuguesa. Apesar disso, tal questão não foi um elemento norteador que atravessou toda a trajetória da Coleção Livros do Brasil, sendo uma presença marcante nas décadas de 1950 a 1970.

Esse ponto ganha contornos mais evidentes na apresentação da edição portuguesa, editada pela Livros do Brasil, de Solo de clarineta: memórias - volume I (1973), na qual Sousa Pinto justifica a publicação afirmando que

Ao atingir o grau excepcional de escritor popular - de escritor capaz de atingir com a sua mensagem poderosamente humana as mais largas camadas de público - dar-se-ia que o escritor contraíra o compromisso das suas revelações. A dimensão da sua obra e a sua repercussão no mundo luso-brasileiro justifica esse balanço do passado, esse recapitular de sua experiência pessoal, variada e enriquecedora, onde enraízam as suas criações ficcionais. Apesar do seu desejo de não se evidenciar como personagem, apesar do seu desprendimento, Erico Verissimo acabou por aceitar a lógica da sua situação de escritor: não para se olhar narcisisticamente ao espelho do passado, mas para animar cada página do livro com o sopro vivificador de um pensamento profundamente liberal e humanístico (Livros do Brasil, 1973LIVROS DO BRASIL. Solo de Clarineta (memórias) por Erico Verissimo. In: Verissimo, Erico. Solo de clarineta. Lisboa: Livros do Brasil, 1973, s.p., s.p.).

Ao eleger o luso-brasileirismo, Sousa Pinto divulgava a obra de Erico Verissimo a partir de uma chave de leitura de unidade, ou seja, de uma perspectiva comum entre os portugueses que dialogava com as idiossincrasias entre Brasil e Portugal ou com o tom de descoberta da literatura brasileira. Essa perspectiva, ou melhor, a decisão de aglutinar o sentido das publicações em torno desse conceito tem relações com a produção intelectual e os livros de Gilberto Freyre que, na década de 1970, já eram populares entre os leitores lusitanos.

Além disso, o editor português estabelece padrões de leitura para Solo de clarineta numa perspectiva reducionista, embora seja evidente que as publicações possuíam outra conotação: o rompimento com a narrativa consolidada da história como um contínuo, estando o Brasil como dependente de Portugal, pelo menos no caso da produção literária.

Todavia, cabe ressaltar que a utilização por Sousa Pinto do luso-brasileiro como discurso de unidade é marcadamente destinada às obras de Gilberto Freyre, numa espécie de justificativa para torná-lo escritor de literatura e, desse modo, fundamentar o lugar do sociólogo em uma coleção literária.

As circunstâncias até aqui analisadas apontam que obras de Erico Verissimo rapidamente fizeram sucesso entre o público português e projetaram a Livros do Brasil como a principal editora em Portugal que se dedicava à produção, à venda e à circulação da literatura brasileira no mercado editorial lusitano.

Além de justificar a popularidade das edições dos livros do autor pelo quantitativo das tiragens e das vendas, fica claro diante do convite de Sousa Pinto para que ele realizasse uma viagem a algumas cidades portuguesas, entre 20 de fevereiro e 10 de março de 1959, sublinhada por tardes de autógrafos, palestras, jantares e celebrações entre os círculos intelectuais portugueses, tanto em Lisboa quanto em cidades vizinhas. Sua passagem por Portugal é descrita no segundo volume de Solo de clarineta (1976):14 14 As citações de Solo de clarineta foram realizadas a partir da edição brasileira. Por esse motivo ela é datada de 1976. Ver Verissimo (1976).

Meu editor Antônio de Souza Pinto e o Eng. Jorge de Sena esperam-nos no cais, em companhia de outras pessoas que - debruçado na amurada do navio - tento mas não consigo identificar. Desembarcamos. Mal ponho os pés em solo português, sinto-me filho nativo desta terra. Pudera! Aqui estão minhas remotas raízes, daqui partiu há cento e cinquenta anos um de meus antepassados, para a aventura brasileira. Estou em casa. Souza Pinto é um homem de meia-idade, altura um pouco acima da mediana, as faces rosadas e carnudas; veste-se com uma elegância britânica e fuma cachimbo. Jorge de Sena é todo um professor, por dentro e por fora. Conheço-lhe os excelentes poemas e ensaios. Tem e merece a reputação de ser homem duma integridade moral e intelectual a toda prova. À primeira vista me parece um tanto retraído e silencioso. Abomina, como eu, o regime salazarista. Estou certo de que vamos entender-nos bem (Verissimo, 1976VERISSIMO, Erico. Solo de clarineta. v.2. Segunda parte, póstuma, organizada por Flávio Loureiro Chaves. Porto Alegre: Globo , 1976., p. 65-66).

É interessante destacar que a construção do livro contou com a colaboração de Sousa Pinto, uma vez que Erico Verissimo solicitou ao seu editor o roteiro de seu trajeto. O mesmo enviou detalhes da primeira (em 1959) e da segunda vigem, realizada em maio de 1966, e solicitou com que o escritor recorresse “ao Jorge de Sena com vista a um avivar de memória acerca da sua memorável primeira visita a Portugal”.15 15 Acervo do Centro de Humanidades da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas/Universidade Nova de Lisboa (CHAM/FCSH/NOVA). Carta de Sousa Pinto para Erico Verissimo. Lisboa, 31 jul. 1975. Sem catalogação, 1975. Segundo Verissimo,

Ao narrar nessa viagem por Portugal neste segundo volume do Solo de Clarineta estou recordando aquele agradável convívio através de Portugal. Aqui e ali é preciso apelar para imaginação para preencher uma lacuna ou dar mais vida a uma cena. Espero, entretanto, nunca enveredar pelo terreno da mentira. As vezes por questões de composição literária e de tempo, misturo na mesma página incidentes ocorridos em várias oportunidades. É o que chamo de “mingau do tempo”. O essencial é que fique o espírito da viagem, o “sumo” de minhas impressões pessoais.16 16 Acervo do Centro de Humanidades da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas/Universidade Nova de Lisboa (CHAM/FCSH/NOVA). Carta de Erico Verissimo para Sousa Pinto. Porto Alegre, 3 jan. 1975. Sem catalogação, 1975.

A presença de Erico Verissimo em Portugal representou uma ponte sobre o Atlântico, o encontro entre o autor e seus livros publicados no além-mar, os quais eram tidos como estrangeiros, mesmo que o escritor se sentisse em casa e reconectado aos seus vínculos familiares ao pisar em solo português. Não obstante, adotou um discurso retórico em sua narrativa para denotar e evidenciar a amizade com seu editor e, além disso, para estabelecer elos conectivos com seus leitores lusitanos, tendo em vista que a obra foi praticamente publicada simultaneamente no Brasil e em Lisboa.

Outro elemento é a ausência de apresentações políticas nos paratextos em alguns dos livros lançados pela Coleção Livros do Brasil.17 17 Ao realizar tal afirmação, não quero dizer que as questões políticas presentes no texto literário tenham desaparecido. A questão aqui suscitada é como os paratextos, que são prescrições de leitura, direcionam o olhar do leitor para determinados aspectos em detrimento de outros. Enquanto a edição brasileira de Incidente em Antares, lançada pela Coleção Sagitário, da editora Globo, destacou que:

Não é pequena (e é certo que não será sem proveito) a ironia deste livro contra a “grandeza” de inúmeros fatos e homens do Brasil. Esta é uma obra escrita sem medo e contemplações, que rememora e adverte lucidamente. Jamais o romancista exprimiu com tal desafogo sua descrença a desencantados “heróis”, aqui despojados do inútil brilho das comendas e reduzidos ao verdadeiro tamanho. Nunca tivemos um Erico Verissimo assim político, o que vale dizer, em rigorosos termos brasileiros, assim apoderado de tão amargas razões, que ele ameniza com seu tom sempre jovial de escrever e com uma bem jogada configuração de sátira que impõe à narrativa (Verissimo, 1971VERISSIMO, Erico. Incidente em Antares. Lisboa: Livros do Brasil, 1971., s.p.; destaque no original).

O termo político é um destaque da própria edição brasileira, muito provavelmente relacionado ao fato do livro ter sido escrito e publicado em pleno regime militar brasileiro, sendo considerado pela crítica literária como uma análise do contexto político vivido pelo país naquele momento.

A edição portuguesa possui suas particularidades. Primeiramente não menciona em nenhum momento que o livro havia sido originalmente publicado numa coleção. E, diferente dos demais livros lançados na Coleção Livros do Brasil, em que o paratexto de apresentação da obra e do autor era realizado pela própria editora, para Incidente em Antares foi solicitado um texto a Erico Verissimo, tendo o mesmo recusado o convite. Da resposta e das justificativas para declinar ao chamamento, foram utilizadas algumas passagens e, de modo geral, a apresentação se limita a informar que

Antares neste caso não é a magnífica constelação de Escorpião, mas uma pequena cidade - imaginária, mas real, explica o romancista - situada ao norte de São Borja, às margens do Rio Uruguai. Erico Verissimo considera Incidente em Antares uma espécie de estuário em que desaguam rios e riachos de várias de suas tendências e características como escritor (Verissimo, 1971VERISSIMO, Erico. Incidente em Antares. Lisboa: Livros do Brasil, 1971., s.p.).

Já em Saga, por exemplo, mesmo que apenas a título de nota, Sousa Pinto menciona que parte da trama tem como cenário a Espanha durante a Guerra Civil. Ademais, nessa edição não foi suprimida a dedicatória de Erico Verissimo, que mesmo sem biografar os agraciados, deixa transparecer conotações políticas, tendo em vista que se trata de ex-combatentes:

Ao ex-combatente da Brigada Internacional que me deu o roteiro de Vasco na jornada da Espanha, além de muitas outras sugestões valiosas; e ao sr. Jesus Corona, a quem devo um punhado de notas sobre o campo de concentração de Argelés-sur-mer - a minha homenagem e os meus agradecimentos (Verissimo, 1962aVERISSIMO, Erico. Saga. 4. ed. Lisboa: Livros do Brasil, 1962a., s.p.).

Já em O senhor embaixador (1968), também produzido no mesmo contexto histórico da obra anterior, para a apresentação portuguesa foi utilizada apenas uma versão reduzida da edição brasileira, mas mantendo elementos que seriam retirados quando da publicação de Incidente em Antares:

tem como cenário a República do Sacramento, ilha do Caribe governada despoticamente por um ditador militar amparado por uma oligarquia rural e duas companhias norte-americanas [...] Neste romance de múltiplas facetas, rico de ação, diálogos e intrigas, agitam-se problemas de nossa época e de nosso continente: relações interamericanas, tanto as políticas e econômicas como também e principalmente as humanas (Verissimo, 1971VERISSIMO, Erico. Incidente em Antares. Lisboa: Livros do Brasil, 1971., s.p.).

Como é possível observar, mesmo com a menção de que a narrativa se passa em um lugar em que há um governo despótico, uma ditadura de militares, marcada pelo regime oligárquico, o espaço é demarcado pelas relações interamericanas, tanto nos aspectos políticos quanto nos econômicas. Em outras palavras, a trama, da forma como é apresentada ao leitor, poderia acontecer no Brasil, assim como em qualquer outro país da América.

As ausências do tom político como prescrição de leitura e marca de autoria que foram mobilizadas nas narrativas produzidas por Sousa Pinto para a literatura brasileira deveriam se fazer presente apenas quando esta relação se passava entre Portugal e o Brasil. Quando estas não estabeleciam uma correlação, era possível apenas adaptar os recursos editoriais da edição de partida.

Apesar de os temas políticos não aparecerem publicamente ou, quando mencionados, serem dispostos apressadamente e sem destaque nos paratextos, na correspondência entre Sousa Pinto e Erico Verissimo eles estão presentes e perpassam as confidências dos dois amigos.

Maus tempos estes, meu Amigo! [...] Bem sei que já enfrentou aí situações idênticas às que experimentamos neste, até agora, pacato país. Não estávamos habituados e o impacto foi grande e doloroso. Passamos de um extremo ao outro, graças à política errada do passado que jamais ensinou o povo nos caminhos da verdadeira democracia. O antídoto do fascismo veio a ser o polo oposto. Neste capítulo temos surpresas diárias e não só as de ordem geral que a politização impõe, como até naquelas pessoas que considerávamos sensatas e honestas e subitamente se transformaram naquilo que, de certo, já eram, mas habitualmente camuflavam (Verissimo, 1950VERISSIMO, Erico. O tempo e o vento: o retrato. Lisboa: Livros do Brasil, 1950., s.p.).

Mas havia um ponto de conciliação quando temas como o da carta acima fossem a público. Ele se chamava Gilberto Freyre. Não foi à toa que depois da viagem de Erico Verissimo a Portugal, e suas críticas ao Estado Novo de Salazar, Sousa Pinto começou a inserir análises de Freyre sobre os livros do literato nas edições lançadas pela Livros do Brasil.

Em O tempo e o vento, um longo trecho ocupa lugar central no paratexto de apresentação, justificando a publicação como “um dos romances mais imponentes na rica literatura e multiforme do país irmão. Dela disse o eminente sociólogo Gilberto Freyre que é ‘um grande livro... um dos mais significativos que têm aparecido ultimamente na literatura brasileira’” (Verissimo, 1950VERISSIMO, Erico. O tempo e o vento: o retrato. Lisboa: Livros do Brasil, 1950., s.p.).

Referências

  • CHARTIER, Roger. O que é um autor? Revisão de uma genealogia Trad. Luzmara Curcino e Carlos Eduardo Bezerra. São Paulo: EdUFSCar, 2012.
  • CHAVES, Flávio Loureiro. O contador de histórias: 40 anos de vida literária de Erico Verissimo Porto Alegre: Globo, 1972.
  • COUTO, Ribeiro. Poesias reunidas. Rio de Janeiro: José Olympio, 1960.
  • ESTATÍSTICA. Correio da Manhã, Coluna Vida Literária, Rio de Janeiro, 19 maio 1946, p. 2.
  • GRECCO, Gabriela de Lima. Los libros de la Nación: premios literarios en Brasil durante la dictadura de Getúlio Vargas (1937-1945). Revista de Estudos Brasileños, v. 5, n. 9, p. 1-13, 2018.
  • LIVROS DO BRASIL. Caminhos cruzados de Erico Verissimo. In: Verissimo, Erico. Caminhos cruzados Lisboa: Livros do Brasil, 1947, s.p.
  • LIVROS DO BRASIL. Solo de Clarineta (memórias) por Erico Verissimo. In: Verissimo, Erico. Solo de clarineta Lisboa: Livros do Brasil, 1973, s.p.
  • LIVROS DO BRASIL. Retrato de Erico Verissimo. In: Verissimo, Erico. O retrato Lisboa: Livros do Brasil, 1979, s.p.
  • MEDEIROS, Nuno. Edição e editores: o mundo do livro em Portugal 1940-1970 Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 2010.
  • MEDEIROS, Nuno. O livro no Portugal contemporâneo Lisboa: Le Monde Diplomatique/Outro Modo, 2018.
  • SANTOS, Donizeth. O projeto literário de Erico Verissimo. Estudos de literatura brasileira contemporânea, n. 44, p. 331-363, jul./dez. 2014.
  • TAVARES, Ana Catarina Oliveira. Representações da II Guerra Mundial na “Revista Mundo Gráfico” (1940-1946) Dissertação (Mestrado em História Contemporânea), Universidade do Porto. Porto, 2018.
  • VERISSIMO, Erico. O tempo e o vento: o retrato Lisboa: Livros do Brasil, 1950.
  • VERISSIMO, Erico. Saga 4. ed. Lisboa: Livros do Brasil, 1962a.
  • VERISSIMO, Erico. Clarissa 5. ed. Lisboa: Livros do Brasil, 1962b.
  • VERISSIMO, Erico. O prisioneiro Lisboa: Livros do Brasil, 1968.
  • VERISSIMO, Erico. Incidente em Antares Lisboa: Livros do Brasil, 1971.
  • VERISSIMO, Erico. Solo de clarineta v.2. Segunda parte, póstuma, organizada por Flávio Loureiro Chaves. Porto Alegre: Globo , 1976.
  • VERISSIMO, Erico. O tempo e o vento: o retrato 2. ed. Lisboa: Livros do Brasil, 1977.
  • VERISSIMO, Erico. Olhai os lírios dos campos 18. ed. Lisboa: Livros do Brasil, 1980.
  • VERISSIMO, Erico. Um certo Henrique Bertaso São Paulo: Companhia das Letras, 2011.
  • 1
    Na década de 1930, em Portugal, há uma forte presença de livreiros e editores brasileiros vendendo obras dos nossos escritores que eram editadas no Brasil, o que causou um fascínio nos leitores lusitanos pela literatura brasileira, principalmente pela visualidade das edições. Como forma de reação a este processo, as editoras portuguesas retornam a venda de livros de literatura brasileira a preços mais baixos, fator que impediu que filiais de livrarias brasileiras continuassem atuando no mercado editorial lusitano (Medeiros, 2010).
  • 2
    A filial da Civilização Brasileira em Lisboa foi instalada em 1932, funcionando até 1944. Esse fator revela, pois, a longevidade da atuação de CB por mais de uma década no mercado editorial português e, ao mesmo tempo, dimensiona a sua importância, tendo em vista que, aproveitando o câmbio favorável, contribui para a criação das condições necessárias para a inclusão do livro brasileiro no sistema livresco lusitano.
  • 3
    Em 1946, a Livros de Portugal foi transferida para a rua Gonçalves Dias, número 62, no Centro do Rio de Janeiro. A mudança de endereço não distanciou a editora do locus central de circulação e produção de livros da capital carioca naquele momento, tendo em vista que a rua em questão era transversal à rua do Ouvidor.
  • 4
    O próprio Sousa Pinto deixa essa questão evidente em artigo “As relações culturais entre Brasil e Portugal”, publicado no Boletim Livros de Portugal, em 1982.
  • 5
    Desse autor, a editora Livros do Brasil publicou em Portugal, as seguintes obras: O resto é silêncio, romance (1954); Viagem à aurora do mundo, romance da pré-história (1955); Saga, romance (1955); Olhai os lírios do campo, romance (1955); Clarissa, romance (1957); México, história de uma viagem (1957); Um lugar ao sol (1959); Gato preto em campo de neve (1960); O continente (1973); O retrato (1973); Solo de clarineta: memórias (1974) O senhor embaixador (1978); O tempo e o vento (1979); O prisioneiro (1980); Israel em abril (1986) e Incidente em Antares (1988).
  • 6
    Henrique Bertaso (1906-1977), em 1940 passou a ingressar o quadro de funcionários da Editora Globo. Antes disso, Bertaso, a partir de 1921, aos 15 anos de idade, desenvolve atividades na imprensa gaúcha. Ele também foi um dos responsáveis pela criação da Revista do Globo (Verissimo, 2011VERISSIMO, Erico. Um certo Henrique Bertaso. São Paulo: Companhia das Letras, 2011.).
  • 7
    A publicação da primeira edição brasileira é datada de 1951, tendo sido lançada pela Livros do Brasil, em Portugal, em 1979, a que utilizamos nesse artigo.
  • 8
    Para Gabriela Grecco (2018GRECCO, Gabriela de Lima. Los libros de la Nación: premios literarios en Brasil durante la dictadura de Getúlio Vargas (1937-1945). Revista de Estudos Brasileños, v. 5, n. 9, p. 1-13, 2018.), essas trocas, assim como a institucionalização de prêmios literários, ao mesmo tempo que buscam a nacionalização da cultura brasileira, promovem a sua internacionalização, em alguns casos, como nos regimes ditatoriais, politizam a literatura com o intuito de forjar uma identidade.
  • 9
    A Revista Mundo Gráfico, embora tenha durado apenas oito anos, foi um importante periódico português de circulação quinzenal, fundado em 1940, sendo Artur Portela o primeiro editor. O conteúdo da revista tratava das novidades de Portugal e no âmbito internacional sobre questões gráficas (Tavares, 2018TAVARES, Ana Catarina Oliveira. Representações da II Guerra Mundial na “Revista Mundo Gráfico” (1940-1946). Dissertação (Mestrado em História Contemporânea), Universidade do Porto. Porto, 2018.).
  • 10
    Versão preliminar desse texto já aparece na 4ª edição, que foi sendo atualizado nas posteriores.
  • 11
    É interessante que o mesmo aconteceu com outros autores, tendo em vista que Sousa Pinto comercializava as edições brasileiras em Portugal. Acrescenta-se a isso o fato que os livros de Jorge Amado, por exemplo, já circulavam no mercado livresco português, antes mesmo da atuação da Livros do Brasil, seja como distribuidora ou editora.
  • 12
    Bernardo Loureiro Marques (1898-1962) foi artista gráfico, ilustrador e pintor. Participou da segunda fase do modernismo português e do movimento de renovação das artes plásticas em Portugal durante o século XX.
  • 13
    Pinto e escritor brasileiro, Luís Jardim (1901-1987) destacou-se por seus artigos sobre pintura, na publicação de obras infantis e pela ilustração de capas de diversos escritores brasileiros, entre eles Rachel de Queiroz.
  • 14
    As citações de Solo de clarineta foram realizadas a partir da edição brasileira. Por esse motivo ela é datada de 1976. Ver Verissimo (1976).
  • 15
    Acervo do Centro de Humanidades da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas/Universidade Nova de Lisboa (CHAM/FCSH/NOVA). Carta de Sousa Pinto para Erico Verissimo. Lisboa, 31 jul. 1975. Sem catalogação, 1975.
  • 16
    Acervo do Centro de Humanidades da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas/Universidade Nova de Lisboa (CHAM/FCSH/NOVA). Carta de Erico Verissimo para Sousa Pinto. Porto Alegre, 3 jan. 1975. Sem catalogação, 1975.
  • 17
    Ao realizar tal afirmação, não quero dizer que as questões políticas presentes no texto literário tenham desaparecido. A questão aqui suscitada é como os paratextos, que são prescrições de leitura, direcionam o olhar do leitor para determinados aspectos em detrimento de outros.
  • Errata

    Errata DOI: 10.1590/TEM-1980-542X2024v300115 Onde se lia: Gilberto Gilvan Souza de Oliveira - Leia-se:Gilberto Gilvan Souza Oliveira

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jul 2023
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2023

Histórico

  • Recebido
    09 Jun 2022
  • Aceito
    10 Jan 2023
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