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Desenvolvimento local - ou sobre exegeses ideológicas, lutas hegemônicas e descaminhos societários

Local development - or about ideological exegeses, hegemonic struggles and corporate detours

Resumos

Este artigo examina a natureza e as implicações do chamado Desenvolvimento Local (DL). Para tal, tendo em vista o também chamado Desenvolvimento Econômico (DE), bem como as transformações estruturais operadas no capitalismo contemporâneo, ele dialoga com temas como "Estruturas produtivas e seus espaços", "Estado e práxis escalares", mostrando a apropriação procedida pelos liberais acerca deles, toda ela orientada para a afirmação de uma dada perspectiva - com pretensões hegemônicas -, a saber: a da inexistência de caminhos societários de desenvolvimento alternativos ao DL. O autor defende ainda que a proclamada modéstia dos partidários do DL não resiste à análise mais séria, nem tampouco seu também proclamado caráter progressista, posto ser essa práxis ora ressurgida, ao fim e ao cabo, uma das faces da hodierna internacionalização do capital. O autor, ainda, igualmente defende que o DE também se afirmou historicamente com as mesmas pretensões exegéticas e hegemônicas, conquanto dos delistas receba tantas e tamanhas críticas mais por suas virtudes que propriamente pelos seus defeitos. Por fim, provocativamente, pergunta se não seria o velho desenvolvimentismo a resistência possível (e não o DL) ou se não seria o caso de se voltar a invocar alguma alternativa verdadeiramente insurgente (?).

desenvolvimento local; desenvolvimento econômico; ideologia; políticas públicas e projetos sociais insurgentes


This article examines the nature and implications of the socalled Local Development (LD). To this end, in view of the also socalled Economic Development (ED), as well as of the structural transformations operated in contemporary capitalism, it converses with themes such as 'productive structures and spaces' and 'State and scalar praxis,' showing the appropriation the liberals have made of them geared to claim a certain perspective - with hegemonic pretensions -, namely the absence of paths for corporate development that could be alternative to LD. The author also argues that the proclaimed modesty of the LD supporters does not stand when submitted to more serious analyses, nor does its also proclaimed progressive nature, since this now resurgent practice, at the end of the day, is one of the faces of today's internationalization of capital. The author also argues that ED affirmed itself historically with the same exegetical and hegemonic pretensions, though from those supporting ED it gets just as much criticism for its virtues as actually for its defects. Finally, the article provocatively asks whether the old developmentalism would be the possible resistance (and not LD), or whether it would be appropriate to re-invoke some truly insurgent alternative (?).

local development; economic development; ideology, public policy and insurgent social projects


DEBATE DEBATE

Desenvolvimento local - ou sobre exegeses ideológicas, lutas hegemônicas e descaminhos societários

Local development - or about ideological exegeses, hegemonic struggles and corporate detours

Jorge Luiz Alves Natal1 1 Professor do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IPPUR/UFRJ). Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Doutor em Economia pelo Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (IE/Unicamp). < jlanatal@gmail.com>

Correspondência Correspondência: Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IPPUR/UFRJ) Prédio da Reitoria, sala 543, CEP 21941-590 Cidade Universitária, Ilha do Fundão, Rio de Janeiro, RJ, Brasil

RESUMO

Este artigo examina a natureza e as implicações do chamado Desenvolvimento Local (DL). Para tal, tendo em vista o também chamado Desenvolvimento Econômico (DE), bem como as transformações estruturais operadas no capitalismo contemporâneo, ele dialoga com temas como "Estruturas produtivas e seus espaços", "Estado e práxis escalares", mostrando a apropriação procedida pelos liberais acerca deles, toda ela orientada para a afirmação de uma dada perspectiva - com pretensões hegemônicas -, a saber: a da inexistência de caminhos societários de desenvolvimento alternativos ao DL. O autor defende ainda que a proclamada modéstia dos partidários do DL não resiste à análise mais séria, nem tampouco seu também proclamado caráter progressista, posto ser essa práxis ora ressurgida, ao fim e ao cabo, uma das faces da hodierna internacionalização do capital. O autor, ainda, igualmente defende que o DE também se afirmou historicamente com as mesmas pretensões exegéticas e hegemônicas, conquanto dos delistas receba tantas e tamanhas críticas mais por suas virtudes que propriamente pelos seus defeitos. Por fim, provocativamente, pergunta se não seria o velho desenvolvimentismo a resistência possível (e não o DL) ou se não seria o caso de se voltar a invocar alguma alternativa verdadeiramente insurgente (?).

Palavras-chave: desenvolvimento local; desenvolvimento econômico; ideologia; políticas públicas e projetos sociais insurgentes.

ABSTRACT

This article examines the nature and implications of the socalled Local Development (LD). To this end, in view of the also socalled Economic Development (ED), as well as of the structural transformations operated in contemporary capitalism, it converses with themes such as 'productive structures and spaces' and 'State and scalar praxis,' showing the appropriation the liberals have made of them geared to claim a certain perspective - with hegemonic pretensions -, namely the absence of paths for corporate development that could be alternative to LD. The author also argues that the proclaimed modesty of the LD supporters does not stand when submitted to more serious analyses, nor does its also proclaimed progressive nature, since this now resurgent practice, at the end of the day, is one of the faces of today's internationalization of capital. The author also argues that ED affirmed itself historically with the same exegetical and hegemonic pretensions, though from those supporting ED it gets just as much criticism for its virtues as actually for its defects. Finally, the article provocatively asks whether the old developmentalism would be the possible resistance (and not LD), or whether it would be appropriate to re-invoke some truly insurgent alternative (?).

Keywords: local development; economic development; ideology, public policy and insurgent social projects.

(...) uma vez mais a disputa do campo semântico apresenta-se como uma arena política e de hegemonia ideológica que não se pode desconhecer

(Oliveira, 2001, p. 11)

Introdução

O presente artigo2 2 Este artigo resulta de palestra ministrada pelo autor (em 09/10/2012) no curso de atualização intitulado "Papel do Estado no município: integração setorial e mudança social", promovido pelo Fórum Itaboraí: Política, Ciência e Cultura na Saúde/Fundação Oswaldo Cruz, Petrópolis, RJ. tem por objetivo examinar criticamente a natureza e as implicações do temário que o intitula - o Desenvolvimento Local (DL); de outra forma: nele defende-se que o às vezes supostamente novo3 3 A esse respeito, ver Natal e Góes (2009). Nesse trabalho, os autores mostram que a categoria e as experiências sob essa orientação são bem anteriores às verificadas na atual contemporaneidade, sublinhando-se aí o imediato pós Segunda Guerra Mundial; e, ainda, que essas práxis se deram em contraposição ao extraordinário desenvolvimento econômico dos países centrais dessa época que, sabidamente, não alcançou a todas as pessoas e a todos os espaços, inclusive em seus próprios domínios (os dos países centrais). DL, proclamado exegética e hodiernamente como a solução para os problemas do não-Desenvolvimento Local, consiste em flagrante desvio de rota para o alcance de caminhos societários mais equilibrados4 4 Pensa-se aqui especulativamente em sociedades orientadas pela busca da geração da riqueza (mas que respeite o meio ambiente), pela luta em torno da justiça social distributiva e pelo equilíbrio (sem qualquer alusão à abordagem neoclássica) espacial, e tudo isso em processo de radicalização democrática. (como se mostrará adiante). E mais: que ele expressa visão de mundo eivada de pretensões hegemônicas, posto reemergir de maneira fortalecida, não por acaso, nos anos mais recentes em perfeita adequação à chamada 'globalização neoliberal' - como também se mostrará adiante.

É muito provavelmente por isso que o DL dialoga com recorrência, quando não permanência, com o temário do Desenvolvimento Econômico (DE). Explicando: este, como ele, foi durante as três décadas imediatamente anteriores aos referidos anos mais recentes o modelo exegético e hegemônico afirmado como a solução - para os problemas do subdesenvolvimento. Além dessas três décadas, nomeadas na literatura especializada como os Trinta Anos Gloriosos (1945-75), à guisa de ilustração vide o mesmo período histórico no Brasil - os (nossos) anos desenvolvimentistas.

Registre-se em complemento que o DL, avesso a qualquer perspectiva histórico-estruturalista, não apenas faz tabula rasa do papel do Estado, ou mesmo a ele se opõe (liberalmente), como valoriza estruturas produtivas menores, como se elas fossem de per se virtuosas; e não fora bastante, assumindo ares progressistas e falsamente modestos, se refugia nas microescalas de análise e da intervenção prática. Ou seja: tudo às avessas em relação ao temário do DE, caríssimo aos economistas, notadamente os de tradição histórico-estruturalista, na medida em que ele sempre foi expresso imbricada e majoritariamente com a chamada intervenção do Estado,5 5 Embora usada recorrentemente, como aqui, esta expressão, intervenção do Estado, é em verdade um equívoco, pois sugere um Estado externo à economia e à sociedade capitalistas, o que é uma evidente impossibilidade histórica - para maiores detalhes vide nota 27. com as Estruturas Produtivas (melhor dizendo: com as grandes estruturas produtivas e, em especial, com a Industrialização), bem como com as práxis escalares de âmbito nacional.

É desse conjunto de questões que o artigo se ocupará.

*

Para tal, ele está organizado em cinco seções, além desta Introdução, a saber: na primeira, examina-se o clássico tema do DE em sua imbricação histórica com as Estruturas Produtivas do Capitalismo, e seus Espaços, situando a natureza e as consequências das mudanças recentes a elas atinentes; na segunda, retoma-se o mesmo e clássico tema do DE, agora em sua imbricação com o temário do Estado, à luz da História do Pensamento Econômico (HPE), também situando a natureza e as consequências das mudanças recentes a ele atinentes; na terceira, avança-se ainda mais na discussão do DE, articulando-o com o das Práxis Escalares, tendo outra vez como pano de fundo a HPE, e como nas seções precedentes sublinhando a natureza e as consequências das mudanças que igualmente as atingiram nos supramencionados tempos mais recentes; na quarta, mostra-se que as inflexões discursivas atinentes aos eixos analítico-reflexivos anteriores (Estruturas Produtivas e Espaço, Estado e Práxis Escalares) ao passo que questionaram o DE, contribuíram para a afirmação na atual contemporaneidade, nos moldes já apontados, do DL; e na quinta, de Considerações finais, além da realização do resgate das principais conclusões, são elaboradas reflexões que permitam ao leitor avançar no entendimento do núcleo da presente análise.

Desenvolvimento econômico, estruturas produtivas (e seus espaços)

É fato que o capitalismo nasce com a Primeira Revolução Industrial (1770-1830/40) e se assenta em estruturas produtivas de pequeno porte, principalmente quando comparadas com as que caracterizam a Segunda Revolução Industrial (a da passagem do século XIX para o XX). Isto posto, dois aspectos devem ser sublinhados: um deles é que se, com a segunda etapa histórica do capitalismo, as empresas mais avançadas passaram a se organizar sob a forma de sociedades anônimas (ou por ações), o que ampliava enormemente seus poderes societários e agilidades para fins de valorização dos capitais aplicados, na primeira elas eram do tipo individual ou familiar e, por conseguinte, mais limitadas em face dos poderes e agilidades assinalados; e o outro aspecto é que essas empresas, desde cedo, foram instaladas nos espaços urbanos das cidades maiores dos países desenvolvidos, logo tornados grandes ou mesmo metropolitanos.

Dando um salto temporal, considerada a Terceira Revolução Científica e Tecnológica em curso nos últimos trinta a quarenta anos, também vale sublinhar que passou a ser um dos traços distintivos desta nova etapa do modo de produção em tela o fatiamento das fábricas - isso porque elas puderam atuar em redes (networks), e assim terceirizar atividades antes inteiramente desenvolvidas em seus próprios domínios. Com essa mudança, é trivial, se foi (mais) uma das principais características das duas etapas anteriores do capitalismo, em especial da última, a produção verticalmente integrada (Harvey, 1994).

Com a inexorável economia de custos (dado o just in time) que daí deriva (para o capital), uma outra mudança ocorreu, a saber: as maiores cidades ou metrópoles deixaram de ser os endereços praticamente exclusivos da grande empresa capitalista em vista das possibilidades abertas em termos de desterritorialização.6 6 Mas cuidado: maior possibilidade de desconcentração produtiva não equivale à efetiva desconcentração por causa dos fatores de atração dos grandes negócios existentes nos espaços citadinos economicamente mais dinâmicos. Não obstante, é importante ter em conta que maior possibilidade de desconcentração produtiva ao nível territorial não equivale à descentralização do poder econômico. Ou seja: mesmo quando a empresa se desconcentra, o que o faz é uma parte dela, mas não o centro decisório, já que esse se mantém nas grandes cidades - no mais das vezes inclusive nas mundiais (Sassen, 1991). Enfim: desconcentração econômica é diferente de descentralização do poder, conceitual e concretamente.

Também não se derive do que veio de ser discutido que a diminuição do tamanho das plantas industriais e a entrada em cena de número expressivo de micros, pequenas ou médias empresas, terceirizadas ou não, fragiliza a economia global. Em verdade, ocorre o contrário, pois a mencionada economia ganha maior plasticidade de atuação e de comando ao nível da competição capitalista, justo porque ela passa a contar com empresas menores - muitas tornadas suas fornecedoras-satélites,7 7 Desde que deixadas à margem de políticas governamentais efetivamente públicas, não cumprirão senão esse papel - e o farão tanto mais ampliem sua escala econômica. sejam as organizadas individual ou familiarmente. Não é incomum, vale a adição, essas empresas e seus trabalhadores passarem a ser submetidos às regras da intensificação do trabalho, da precariedade contratual etc., o que igualmente potencializa o processo de valorização do grande capital. Numa frase: a redução do tamanho das plantas industriais e sua maior capacidade de deslocamento ao nível territorial, por conta da terceirização de variadas atividades, insistindo, nem de longe fragiliza o capitalismo contemporâneo!

Em que pese o que veio de ser exposto, esse contexto/mudança suscitou e suscita a leitura e proposição de que contraditória e dialeticamente o atual capitalismo estaria inaugurando possibilidades progressistas a partir de (novas) organizações econômicas, menores em suas estruturas produtivas, e menos concentradas espacialmente - esta démarche será retomada nas seções quatro e final, tendo em vista o DL.

Desenvolvimento econômico e Estado

Os fisiocratas e os mercantilistas, em suas elaborações orientadas acerca da transição do feudalismo ao capitalismo (século XV ao XVIII), apesar de suas inescapáveis limitações e imprecisões (dado esse tempo histórico, de gestação do novo em meio ao velho), são geniais porque pioneiramente começam a revelar, conceituando, o capitalismo que se avizinhava. E mais: sublinhe-se, que para os fins deste artigo, essas elaborações apontam ainda para uma das maiores e históricas diatribes dos economistas e, por que não dizer, dos cientistas sociais (em sentido amplo), a saber, que trata do papel do Estado.

É assim que enquanto os mercantilistas são ferrenhos defensores do Estado (então materializado na monarquia absolutista), no que concerne à obtenção da riqueza nacional,8 8 Definida pelo acúmulo de metais preciosos na denominada órbita da circulação; é dizer: seja no comércio propriamente dito (comprando mais barato e vendendo mais caro, ou mesmo saqueando colônias), seja através da pirataria etc., e, tudo isso, insistindo, com apoios de todas as ordens dos Estados Nacionais então em gestação. os fisiocratas questionam a presença dessa mesma realeza no que trata da sua apropriação, tanto que a denominam de classe estéril (junto com a ordem religiosa etc.), e de tal sorte que chegam até a invocar um déspota esclarecido, ou seja, um príncipe que arbitrariamente operaria para instaurar de cima o livre mercado, dispensando-se a partir daí todo e qualquer tipo de intervenção estatal.

Já no que concerne à chamada Economia Política Clássica, a formulação teórica por excelência da Primeira Revolução Industrial, aqui resumida aos seus dois principais intelectuais, A. Smith e D. Ricardo, e suas obras clássicas (respectivamente, A riqueza das nações, de 1776, e Princípios da Economia Política e da tributação, de 1817), há claro consenso em seu âmbito, a saber: o de que o mercado deixado a funcionar livremente produziria melhores resultados econômicos e sociais do que sujeito à intervenção estatal. Vide a respeito, apenas como ilustração, a famosa referência de Smith à 'mão invisível' organizadora do mercado e a teoria do comércio internacional, assentada nas 'vantagens comparativas', em livre concorrência, de Ricardo.9 9 Leia-se: a defesa de que a divisão internacional do trabalho em livre concorrência, orientada pela especialização das diversas nações, seria geradora de Ótimos Econômicos na escala-mundo.

Se para a Economia Política Clássica o Liberalismo Econômico era a orientação a ser seguida, para o alemão List, em meados do século XIX, essa doutrina não interessava ao seu país, pelo menos até que ele se ombreasse com a potência de onde provinha a prescrição em exame. Pode-se dizer assim que esse autor, por viver em um país agrário e com estruturas de características feudais, tinha plena consciência do atraso a que estaria condenada a Alemanha, e todos aqueles que seguissem tal orientação. Para List, em síntese, o Liberalismo Econômico deveria interessar apenas à potência onde ela foi elaborada, à Inglaterra.

Outro alemão, Karl Marx, também em meados do século retrasado, nem entendia que o Estado era naturalmente (sic) ineficiente e ineficaz nem, muito menos, que ele seria ente alheio à sociedade burguesa - pelo contrário, o Estado lhe seria intrínseco. Nesses termos, Marx diverge radicalmente da perspectiva liberal; e mais: que o Estado, por ser a expressão política por excelência de sociedades de classes, somente seria dispensado, posto que ocioso, em uma sociedade do futuro, a que as abolisse, a sociedade comunista.

Evidentemente esses dois contrapontos, o de List e o de Marx, principalmente este, ainda mais se consideradas todas as suas críticas à gênese e ao modo de funcionamento do capitalismo, bem como as resistências sociais que concretamente foram se desenvolvendo em face da sociedade do capital e sua lógica, calaram fundo junto aos setores compromissados com a manutenção dessa ordem social e, em especial, junto a seus intelectuais orgânicos (Gramsci, 1968). É nesse sentido que vem ao mundo a Economia Neoclássica ou Marginalista.10 10 O termo Marginalista deriva do emprego da Teoria dos Limites que, remetida para as chamadas Equações Diferenciais, permitiria cálculos matemáticos referidos à n-ésima unidade, seja ela de emprego ou de satisfação no consumo, por exemplo, e assim a maximização de determinada função (matemática).

Nascida fundamentalmente no último quartel do século XIX, e desenvolvida no seguinte, ela tem como ponto de partida ensinamentos da Economia Política Clássica e como interlocutores-adversários, reiterando, fundamentalmente os escritos críticos de Marx. É nesses termos que tratam de atribuir a si mesmos as virtudes de finalmente terem construído uma Ciência Econômica, inclusive por ser ela expressa em termos gráficos e matemáticos, rompendo assim, proclamavam, com os elementos ideológicos das formulações anteriores, notadamente a marxista.11 11 Cumpre assinalar que toda e qualquer elaboração do campo das Ciências Sociais, aplicadas ou não, é necessariamente ideológica, posto expressar determinada visão de mundo. A neutralidade plena é uma invenção, mistificadora, do pensamento burguês; a diferença, essa sim a observar, diz respeito aos aportes que contribuem para o entendimento da realidade e quais, dentre eles, têm como objetivo exatamente realizar o inverso, é dizer, encobrir ou lançar nuvem de fumaça sobre os reais determinantes dos fatos e processos sociais capitalistas. Ver a respeito a discussão de Marx, em O capital, sobre o fetiche. No campo da Economia passava a existir, seguiam eles em seus autoelogios, algo do mesmo status científico das revoluções em curso em outros campos do conhecimento, para ilustrar, como no da Física! O uso desabrido da categoria equilíbrio, dentre outras expressões, é um inequívoco exemplo dessa pretensão.

Para não alongar o debate, o posicionamento dos neoclássicos é decisivo para a defesa extremada das virtudes do Mercado - tenha-se em conta neste ponto seu partidarismo do individualismo metodológico e do hedonismo liberal em oposição à visão de classes de Marx. Não foi por acaso que através de tratamentos gráficos e matemáticos buscaram (e buscam) sustentar, além das supostas limitações marxistas, ideológicas (!), que dado o livre funcionamento dos mercados, de bens e serviços, de trabalho e de moeda, todos os Ótimos Econômicos e Sociais12 12 Tais Ótimos, no âmbito da análise neoclássica, são conceitos derivados do modelo de maximização (matematicamente definido), dada à livre concorrência (Henderson e Quandt, 1976). seriam/estariam garantidos.

Com a grande crise de 1929, tal repto (neoclássico) logo foi questionado e, curiosamente, por um dos homens mais bem treinados nessa mesma ortodoxia - J. M. Keynes.13 13 Ele que fora não apenas educado em Cambridge, mas também o mais brilhante aluno de A. Marshall nessa mesma universidade, sendo este possivelmente o mais destacado economista neoclássico de todos os que fundaram tal escola de economia. Para ele, a abordagem neoclássica do livre mercado era a principal responsável pela anotada crise por conta de suas crenças salvacionistas, apoiadas que estavam em teses equivocadas como as do orçamento equilibrado, da moeda neutra etc. Para alterar as incertezas negativas de então, é dizer, as expectativas de gasto dos empresários,14 14 Keynes tinha plena clareza que nas chamadas economias de mercado o gasto é que desencadeia fluxos monetários consistentes e que, dentre os gastos, alguns são determinantes, como os dos empresários, ao passo que os dos demais segmentos sociais não. Ainda: que naquela conjuntura era preciso aumentar a demanda, estimulando o consumo, e assim ativar as decisões empresariais de produção. Não obstante, ele também tinha clareza que a variável chave da dinâmica capitalista é a decisão de compra de máquinas e equipamentos (Investimento) e que esta, por ser orientada pelas expectativas de longo prazo, não é necessariamente alcançada pelos esforços anticíclicos das políticas governamentais. Enfim: o Estado poderia muito, mas não tudo - afinal, digo eu, para que revoluções burguesas e mais revoluções burguesas? Para colocar as decisões fundamentais de gasto nas mãos da classe trabalhadora? Keynes também entendia que havia apenas um ente capaz de fazê-lo, o Estado; ou seja, ele prescrevia tudo aquilo que os neoclássicos abominavam, para não dizer que ao fazê-lo em simultâneo questionava a fé inabalável nas virtudes do mercado por eles professada.

E mais: Keynes verbalizava que a crise em questão era não apenas uma grande crise capitalista, mas uma crise que poderia até mesmo comprometer a longevidade dessa ordem societária, com a qual ele, enquanto burguês assumido, estava profundamente comprometido. Nessa senda, como intelectual orgânico da referida ordem, devido à tendência para a entropia social que nela vislumbrava, defendia que a partir do Estado fossem operadas políticas anticíclicas, bem como políticas sociais re-distributivas de modo a fazer frente a alternativas de desenvolvimento como a então recém-expressa pela Revolução de 1917 - que por suposto muito o preocupava.

Vencidas as resistências, em vista da hegemonia acadêmica e da vigente ao nível dos homens de governo do seu tempo (convencidos que estavam das supra-mencionadas virtudes do Mercado), pouco a pouco a nova perspectiva chega ao poder, daí porque os Trinta Anos Gloriosos estão definitivamente associados ao nome de J. M. Keynes. No entanto, com os problemas manifestos já a partir dos anos 1960, o Estado do Bem-Estar Social e as políticas econômicas dessa época foram virulentamente atacados e, claro, o próprio Keynes. Era a volta triunfal do liberalismo econômico. As políticas adotadas por Tatcher e Reagan nos anos 1990 são bem emblemáticas do que veio de ser apontado.

Um mundo sem fronteiras como anunciava pouco tempo atrás uma empresa de telefonia era o caminho, o único, como também a referida 'dama de ferro'. Por conseguinte, o Estado é demonizado e o Mercado sacralizado - agências multilaterais à frente, tais como o Banco Mundial (BIRD) e Fundo Monetário Internacional (FMI).

Neste ponto, um comentário é inescapável: ele não foi desmontado de maneira ampla, geral e irrestrita. Ele o foi, isso sim, no que concerne às políticas públicas que alcançavam os elos mais frágeis das cadeias sociais e às barreiras que antes se antepunham à livre mobilidade internacional do capital, ao passo que era fortalecido, despoticamente, em relação às maiorias populacionais e suas entidades mais representativas.

Sem prejuízo do que veio de ser exarado nesta seção, o novo contexto, de mudanças no que concerne ao papel do Estado, como não poderia deixar de ser, posicionou (e posiciona) através das vozes de seus ideólogos burgueses a tese, tornada hegemônica, de que o capitalismo contemporâneo estaria finalmente liberto das amarras que obstavam a afirmação do espírito criativo e empreendedor dos indivíduos mundo afora - esta démarche será retomada na seção quatro e na final, e assim como nas duas precedentes, tendo em vista o foco deste artigo, o DL.

Desenvolvimento econômico e práxis escalares

Esta seção também seguirá o percurso histórico-teórico da anterior; assim sendo, os fisiocratas e os mercantilistas serão seu ponto de partida. No que interessa a este artigo, avançando desde logo a análise, pode-se dizer que não apenas eles tinham no âmbito nacional sua escala primordial de análise e proposição, mas também os dois principais analistas que se seguiram - já no âmbito da Economia Política.

No primeiro caso, tendo em vista o que se poderia denominar de modelo mais acabado, o do dr. Quesnay, era flagrante a preocupação dos fisiocratas, situada no plano nacional, com a distribuição/apropriação do produto agrícola por parte de classes sociais que para ela não concorriam. No segundo caso, o dos mercantilistas, a perspectiva escalar nacional era mais clara na medida em que entendiam/defendiam que a riqueza, ou seja, o acúmulo de metais preciosos, é que definiria se o país seria rico (ou não).

No que diz respeito aos dois grandes intelectuais que examinaram a nascente sociedade burguesa, a da Primeira Revolução Industrial (1770-1830/40), A. Smith e D. Ricardo, o alcance escalar nacional dessas suas obras é inquestionável. No caso deste último, vale um registro: sem prejuízo de ser ele um homem do Estado inglês, e por causa, é que elabora análises e propostas para o âmbito mundial. Vide acerca desse tema suas contribuições às teorias do comércio internacional, onde transcende o âmbito nacional exatamente por conta da necessidade de o seu país comprar produtos a baixo custo por conta dos problemas de produtividade nele existentes que, por sua vez, ao pressionarem os custos internos, acabavam contendo os lucros e as iniciativas de seu herói do progresso, a relativamente jovem burguesia industrial. Daí a defesa do livre mercado especializado em nível mundial.

Logo, seja no que trata de Smith, mais adstrito à mesma Inglaterra, assim como em Ricardo, em que pese sua transcendência em relação a ela, esses autores mal disfarçavam, quando não assumiam mesmo, que falavam a partir dos interesses hegemônicos firmados (ou em processo de afirmação hegemônica) em seu país - e não de uma dada fração de seu território.

Conquanto não descurasse a chamada Questão Nacional, nem por isso Marx se refugiava no local, antes pelo contrário - sua perspectiva analítica, política e ideológica era voltada precipuamente para a análise da gênese e desenvolvimento do capitalismo e, sublinhe-se, para a luta de classes em âmbito internacional ("trabalhadores do mundo univos").

Avançando no tempo. É fato que os economistas neoclássicos atribuíam todos os Ótimos Econômicos e Sociais ao livre funcionamento dos mercados, e em qualquer escala que fosse. Nesses termos, ignoravam a Questão Nacional, posto que trazê-la à baila significaria lançar luzes sobre ela e seus conflitos internos, e ainda mais em contexto histórico de gravosas lutas entre os Estados Nacionais - a respeito dessas lutas vide o debate sobre o Imperialismo (Mazzuchelli, 1985; Lênin, 1963).

Por sua vez, Keynes tinha clareza que o processo de desenvolvimento era levado a cabo em nível nacional, conquanto, para ele, ocorresse em meio a flagrantes e muitas vezes violentos contenciosos internacionais.

Em suma: com maiores ou menores aproximações, em todos esses corpos teórico-analíticos a temática do desenvolvimento econômico segue o recorte nacional (com a exceção dos neoclássicos e a nuance de Marx), dialogando favoravelmente, ou não, com o binômio que nomeia esta seção.

Não é à toa que o ideário kantiano de delegações a entes supranacionais para dirimir os conflitos e instaurar a paz perpétua não resistiu ao capitalismo colocado em marcha na Inglaterra e, principalmente, quando os EUA tomam seu bastão em nível mundial e afirmam seus projetos nacionais de desenvolvimento econômico - pelo menos até os tempos mais recentes.

Mas por que 'até os tempos mais recentes'? Porque exatamente a partir desse momento, dos anos 1970, começava a ficar claro que os mencionados projetos estavam se esgotando seja do ponto de vista do comando societário sobre o Trabalho (Maio de 1968/Paris é signo exemplar das transformações em curso), seja do ponto de vista das frentes de aplicação/valorização do capital. Ou seja: fazia-se então necessário promover mudanças, particularmente duas (e imbricadas): uma ao nível do seu modo estrutural de operação (base tecnológica, organização da produção, legislação trabalhista etc.) e a outra ao nível da sua escala predominante ou relativamente privilegiada, a nacional.

No que concerne a essa última mudança, a do plano escalar, dois movimentos substantivos foram sendo processados, a saber: de um lado, a busca pela afirmação hegemônica da escala global em vista dos limites então colocados para a valorização do capital, em especial dos que por conta desses mesmos limites assumem formas crescentemente especulativas;15 15 A desregulamentação financeira para sua livre movimentação é apenas (sic) o corolário dessa engenharia/demanda social. Mas era preciso mais, em razão das massas de capitais acumuladas nos centros mundiais, porém premidas em sua busca de valorização; daí serem a desregulamentação comercial, a privatização de ativos públicos e a retirada de direitos sociais e trabalhistas outros dos seus corolários. e, de outro, da igual e simultânea afirmação da escala local em notável e notória inflexão em termos de análise e de proposição do estado das artes encontradiço na maioria dos analistas da vida capitalista de até então - esta démarche também será retomada nas seções quatro e na final (de Conclusões), outra vez mirando na discussão do DL.

Desenvolvimento local, e estruturas produtivas e espaço, estado e práxis escalares

A presente seção está organizada em três subseções: na primeira, são aprofundadas as mudanças socioestruturais operadas no capitalismo contemporâneo que, por sua vez, dentre outros determinantes, sugerem o porquê da emergência exegética do DL; na segunda, são resgatados os três eixos analíticos que subsidiaram metodologicamente a discussão do DE e que experimentaram, a partir dos últimos anos 1970, como apontado nas seções precedentes, radicais transformações, e tal e qual antes subsidiaram a exegese localista; e na terceira, de uma nova perspectiva, de maneira sintética e não-exaustiva serão aduzidas outras leituras (de natureza mais sociológica) sobre o DL.

Mudanças socioestruturais do capitalismo contemporâneas: um sintético e novo aprofundamento

É mais ou menos disseminado na atual contemporaneidade e especialmente nos espaços acadêmicos que o mundo mudou (e de maneira radical), grosso modo, a partir dos mencionados anos 1970. Mais precisamente: que desde então, em vista da emergência da chamada globalização e da sua imprescindível contrapartida doutrinária, o neoliberalismo, o capitalismo ingressou em uma nova etapa do seu desenvolvimento histórico.16 16 Esta nova etapa histórica seria a terceira da sua história, uma vez considerada a dimensão tecnológica como traço distintivo; explicando: se à primeira revolução industrial correspondem os avanços da mecânica e, à segunda, os verificados na química e na eletricidade, esta nova etapa, não valorados outros desenvolvimentos científicos e tecnológicos precedentes, seria a terceira.

A primeira questão a enfrentar, embora de modo sucinto, é se de fato a assertiva anterior procede, a de que o mundo mudou radicalmente (?). A resposta é que sim, e sem qualquer dúvida.17 17 Não obstante a manutenção de diversas permanências, próprias do modo de organização da vida social em tela, tais como a lógica da valorização do capital, as classes sociais e suas lutas, o papel do desenvolvimento científico e tecnológico enquanto arma decisiva da concorrência intercapitalista e de subordinação da força de trabalho etc. Para melhor compreensão dessas mudanças, pelo menos três fatos/processos societários precisam ser considerados, a saber: a crescente prevalência dos interesses das altas finanças sobre os negócios produtivos; a nova e relativamente disseminada, em âmbito mundial, revolução científica e tecnológica, de base informacional e lastreada na microeletrônica; e as transformações operadas ao nível do Estado, norteadas caricatamente por seu afastamento e mesmo oposição às anteriores práxis de cunho social-democrata/keynesianas.

No primeiro caso, a referida prevalência tornou ainda mais instável a já visceralmente instável economia capitalista ao multiplicar, e muito, a riqueza (sic) financeira, ao mesmo tempo em que problematizou (e continua problematizando) o crescimento econômico mais sustentado - que, aliás, ocorreu com êxito notável nos Trinta Anos Gloriosos. No segundo caso, o das novas tecnologias, com elas houve profundas alterações nas formas do viver, nos diversos tipos de relacionamentos pessoais e institucionais, nos processos de produção (vide a discussão sobre as estruturas produtivas desenvolvida neste artigo), no próprio leque de bens e serviços disponibilizados no mercado etc.; e não fora suficiente, essas novas tecnologias abriram simultaneamente novas frentes de aplicação capitalista,18 18 É possível supor que algumas vezes as atuais mudanças tecnológicas, ao reverso, até mesmo constranjam determinados gastos, em especial os de compra de máquinas e equipamentos, em vista da sua celeridade (dada à necessidade de horizontes mais alongados para a realização de cálculos capitalistas, o que o frenesi da mudança tecnológica por vezes bloqueia). além de operarem de maneira decisiva como suportes para o deslocamento e cotação em tempo real da verdadeira montanha de ativos financeiros em busca de valorização pelo mundo, demarcando, nesses termos, clara linha de corte em relação às três décadas supramencionadas. Por fim, no terceiro caso, cabe sublinhar a definição de um novo Estado, mais minimalista no que concerne às anteriores coberturas sociais e trabalhistas, assim como em relação às suas pregressas políticas anticíclicas e, ao reverso, profundamente imbricado com os interesses da banca (leia-se: das referidas altas finanças).19 19 É trivial que cada um dos aspectos ora enunciados demanda extensos desenvolvimentos analíticos. Porém, seja pela existência de ampla e consagrada literatura sobre cada um deles, seja por conta do presente artigo não ter neles seu objeto, é que se resolveu tão somente pontuá-los.

Em resumo: o mundo mudou mesmo, e radicalmente, sendo um dos seus traços mais distintivos a volta triunfal do liberalismo que, junto com a nova base tecnológica, ao passo que liberta o capitalismo de antigas amarras, nota-damente das que dizem respeito à livre circulação dos capitais voláteis especulativos em nível mundial, em simultâneo constrange esse modo específico de organização da vida social no que trata das possibilidades da sustentação de taxas elevadas de crescimento da renda e do emprego no longo prazo.

Portanto, as mudanças operadas nesse tempo histórico visavam (e visam) precipuamente libertar às chamadas forças de mercado das amarras existentes no tocante a sua reprodutibilidade. Explicando: o retorno em alto e bom som ao liberalismo tinha (e tem) por objetivo, numa frase, tanto desobstruir os gargalos relativos à valorização do capital quanto ultrapassar os limites colocados pela classe trabalhadora ao seu (dele) comando societário. Por conseguinte, é à luz dessa nova orientação, tornada hegemônica, que se foram afirmando as práxis pró-privatização, pró-desregulamentação comercial financeira, pró-flexibilidade das relações contratual-trabalhistas e, evidentemente, a exegese das virtudes do Mercado e dos defeitos do Estado.

*

Tudo isso, enfim, ao tempo em que afirmava a tese da inexorabilidade histórica da emergência de forças incontroláveis, como que caídas dos céus e não de processos sócio-históricos totalmente determinados, tanto sugeria adequações quanto lutas de resistência. A exegese delista vem ao mundo exatamente com essa dualidade, posto supor ser possível conjugar a desconsideração analítica e prática dessas mudanças estruturais com supostas resistências, quando não enfrentamentos mesmo, a partir de práxis microescalares, posturas antiEstado Nacional etc. É surreal (!) - o exame cuidado dessas discussões é feito nas subseções que seguem.

O Desenvolvimento Local e os novos eixos analíticos produzidos pelo neoliberalismo e a globalização

O novo caldo de cultura exposto nas seções precedentes e particularmente na última subseção, ao evidenciar mudanças substantivas do capitalismo contemporâneo, como veio de ser examinado, permite mesmo reafirmar que ele ingressou/definiu uma nova etapa de sua história. Para tal, tendo em vista o objeto-maior do artigo, o exame crítico do DL, vale explorar um pouco mais os eixos de mudança examinados nas três primeiras seções - Estruturas Produtivas (e seus Espaços), Papel do Estado e Práxis Escalares.

No que concerne às Estruturas Produtivas (e seus Espaços), é evidente que as novas tecnologias, ao facultarem a desintegração vertical da produção, graças às operações em rede, permitem que determinadas empresas, particularmente as mais competitivas, contem a partir de então com fornecedores ágeis e baratos, muitos deles terceirizados, possibilitando assim o aumento de seus ganhos. É nesse contexto que, ao lado dos enganosos léxicos referidos e de outros que poderiam aqui ser mencionados,20 20 Tais como sinergia, flexibilidade, governança, capital social, empoderamento etc. em plena era da mundialização do capital (Chesnais, 1993), re-emerge exegeticamente a tese de que essas mudanças estariam inaugurando possibilidades progressistas auspiciosas por conta das novas estruturas produtivas, menores, e espacialmente deslocadas (em relação aos grandes centros urbanos). De outra forma: desconsiderando o fato de o novo contexto ser ainda mais adverso às maiorias populacionais, os delistas promovem o ressurgimento do velho small is beautiful, convidando as pessoas a voltarem a um mundo idílico de pequenos e cooperativos produtores, todos dedicados ao bem comum da comunidade (outra vez sic).

No que concerne ao Papel do Estado, é também evidente que em vista da chamada globalização, e da doutrina neoliberal que busca legitimá-la, seja enquanto fato histórico, seja como categoria síntese desses novos tempos, sobressai a aversão ao Estado Providência e às políticas econômicas de cunho keynesiano. É assim que vão sendo desmontadas todas as estruturas que ancoraram e deram sentido à pax capital-trabalho lograda nos Trinta Anos Gloriosos. É como se o capital dissesse em alto e bom som: não precisamos mais de vocês! Não há mais o que pactuar! Afinal, isso faz sentido na medida em que se considera que as novas tecnologias, assim como a plasticidade e a liberdade de movimento praticamente planetário do capital lhe permitiu valorizar suas aplicações em volumes inauditos - e ele o fez e à larga, principalmente na órbita financeira.

E para esse fim uma mudança adicional precisava ser levada adiante: o Estado que antes condensava as relações de classe a la Poulantzas, ou seja, buscando mostrar-se de todos, tendo em vista algum equilíbrio social, passa então a se aproximar cada vez mais da máxima leninista, datada, do Estado enquanto petit comité da classe dominante. Não é à toa que os neoliberais retumbante e alegremente decretaram (decretam) que o Estado Estruturante do passado nada mais poderia fazer no contexto da globalização - além de não devê-lo fazer, claro, mesmo se o pudesse! Será mesmo? Por que não? Também não é à toa que para gáudio da direita e refúgio de parcela da esquerda avulta a discussão sobre o chamado Poder Local, bem como a orientação de desenvolvimento adstrita a essa escala.

No que concerne às Práxis Escalares é igualmente evidente que a busca por liquidar a escala nacional (pelos neoliberais) resulta naturalmente do que veio de ser examinado neste artigo e, em especial, nos dois parágrafos precedentes. Explicando: se de um lado a práxis em busca de afirmação hegemônica defende que a anotada globalização inviabiliza o antigo Estado, de outro sustenta que há uma solução, a do desenvolvimento em escalas mais microrrecortadas.21 21 Tendo em vista o chamado capital social acumulado em dado lugar e a construção de harmonias cooperativas, sujeitas a uma boa governança - num misto de discurso progressista e ato de vanguardismo político. É assim que concomitantemente sobressai tanto a escala global (a do capital mundializado) quanto a local e, pari passu, faz-se tábula rasa das escalas intermediárias (estaduais e nacionais, por exemplo). Nesse desenho de um mundo clean, harmonioso, de cooperações, de sinergias desenvolvidas em nome do bem-comum etc., em contraposição ao mundo dark22 22 Esta análise é bastante devedora de Brandão (2007). do Desenvolvimento Econômico, de roldão desconsideram que lugar não equivale a local (por suposto), como também as determinações mais gerais do capitalismo - que evidentemente continuam atuando em todo e qualquer espaço capitalista, seja ele qual for.23 23 Cabe sublinhar aqui, como afirma Brandão (2007), que não há escala ruim ou escala boa; afinal, escala boa é a sugerida pelo próprio objeto em questão. No entanto, isso não impede que seja aqui reiterado que a maioria dos grandes problemas mundiais exige a consideração das escalas intermediárias - no caso brasileiro, da estadual e da nacional. Mas é óbvio que em vista do que se escreveu no início desta nota, nada contra, antes pelo contrário, se o problema puder ser resolvido, por exemplo, no âmbito municipal. Por outro lado, também é bom não perder de vista que o poder municipal não deve nem de longe ser desconsiderado (Oliveira, 2001).

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As análises desenvolvidas nesta seção mostraram:

1. Que a afirmação hegemônica da nomeada globalização e de sua doutrina, o neoliberalismo, tomados como pontos de chegada de uma longa evolução histórica (com ironia, por favor) e não como processo social pleno de contradições e conflitos, para não falar de antagonismos mesmo, contribuiu enormemente para a exegese da tese do DL, revelando-a como mais uma das pontas de lança do capital para ganhar corações e mente mundo afora quanto às virtudes do atualizado credo liberal; e

2. Que a redução do tamanho das estruturas produtivas e as mudanças expressas espacialmente, a minimização do Estado nos termos já discutidos e a busca de soluções societárias eivadas por práxis escalares mais micro foram decisivas para a exegese já tantas vezes anotada!

Algumas observações críticas adicionais (de natureza mais sociológica) ao Desenvolvimento Local

Uma das inegáveis pretensões dos partidários do DL,24 24 Esta subseção é inspirada em trabalho de F. de Oliveira, de 2001, intitulado Aproximações ao enigma: o que quer dizer desenvolvimento local? como já se indicou, é a de se contrapor ao DE -, isso porque ele não valorizaria os aspectos humanos em vista da sua perspectiva economicista. Se desse ângulo eles estão corretos (no limite), não é menos verdade que, por causa, os anotados partidários se aproximam da visão da ONU (Organização das Nações Unidas) do Desenvolvimento Humano. E isso é ruim? Não necessariamente, a menos quando pretendem mensurar a cidadania...

Além disso, o não-Desenvolvimento Local, adjetivado ou não pelo humano, ao não se inscrever no âmbito da discussão sobre o subdesenvolvimento, peculiar às periferias do capitalismo, mostra-se nitidamente insuficiente para dar conta do fenômeno. Não se pode ignorar o significado e as consequências teóricas e práticas do alheamento em tela - não fora, claro, sua própria práxis escalar. Dizendo de outra forma: o não-Desenvolvimento Local, como fenômeno social, logo inescapavelmente eivado de especificidades históricas, torna-se ininteligível quando desconsidera o todo no qual ele se inscreve, o modo de produção e reprodução capitalista, e ao fazê-lo se mostra indelevelmente mais uma das expressões do atual conservadorismo burguês.

Mas poder-se-ia arguir, dizendo de forma diversa o que veio de ser reiterado, que o DL não operaria como elo de reprodução estrutural do capitalismo contemporâneo; é dizer que ele não contribuiria para tal na medida em que estaria voltado, sobretudo, para o avanço da cidadania em vista do seu potencial de mobilização social em sua escala - a local. A resposta a esse questionamento é negativa.

É negativa mesmo que, apenas para raciocinar, fosse possível deixar de lado o seu recorte escalar (local) e sua adequação aos novos tempos (como já se explicou), bem como a tentação de medir cidadania pela quantidade de bens e serviços - tão ao gosto da ONU. É em síntese negativa porque a cidadania não tem como ser obtida pela via do consenso, da harmonia, da reunião de indivíduos que trabalham pelo bem-estar comum - aliás, como lembra F. de Oliveira, essa concepção se encontra inclusive na contramão da tradição de um liberal como Rousseau, que sublinhava o conflito.

Desse modo:

Como consequência, está se elaborando um discurso sobre o desenvolvimento local como paradigma alternativo à sociedade plagada de conflitos por todos os lados; desenvolvimento local é apresentado como um emplastro (...) capaz de curar todas as mazelas de uma sociedade pervertida, colocando-se no seu lugar bucólicas e harmônicas comunidades (Oliveira, 2001, p. 13).

Ora, fechar-se para a complexidade da sociedade moderna de nada ajuda; e mais: porque ao se refugiar na escala local, posto ignorar a mencionada complexidade trans-escalar, liquida-se tanto como categoria quanto em suas pretensões progressistas. Por outro lado, caso queira enfrentar essa complexidade, deixará necessariamente de ser Local. Como ser não sendo - haja dialética!

Aprofundando um pouco mais essa démarche: o resgate de uma espécie de ágora grega que poderia aproximar os governados dos governantes na escala municipal, por exemplo, exige uma práxis radicalmente crítica; isso porque a chamada democracia representativa vem se mostrando crescente engodo tal a separação existente entre eles e, pior, em franco alargamento. Daí porque tomar a globalização como um dado do modelo de análise se constitui em verdadeiro despautério. De outro modo: não cabe desconsiderá-la simplesmente porque ela é decisiva para a elaboração de qualquer proposta que se queira de fato transformadora. Enfim: a luta pela cidadania exige a transcendência da escala local; é dizer: a consideração da sua atual e principal escala de atuação, a do capital mundializado - embora não apenas, como já se indicou.

Insista-se, concluindo, que não se pode perder de vista que o adversário é global, é concentrador e é antidemocrático,25 25 Nesses termos, vale ter em conta que o capitalismo liberal contemporâneo aproxima-se perigosamente do totalitarismo fascista. "A distinção entre o público e o privado, uma aquisição da modernidade, quando desfeita, torna impossível até mesmo definir o que é uma política de mera ação dos atores privados, que é a tendência que se insinua (...), por exemplo, na filantropização da ação social" (Oliveira, 2001, p. 38). e que nesses termos se há algo de positivo no DL é sua imbricação, embora por vias tortas, com a cidadania. Até porque

[a] luta pela cidadania é a forma mais moderna, contemporânea, da luta de classes. É a luta pelos significados, pelo direito à fala e à política (Oliveira, 2001, p. 17).26 26 Dois apontamentos complementares (tendo em vista o Brasil): um é que o Poder Local, pelo menos nas médias e grandes cidades, está longe de ser pequeno, valendo a pena colocá-lo sob tensão; e o outro, em complemento, é que a luta pela verdadeira aplicação do Estatuto da Cidade, do Usucapião da Propriedade Privada, do Orçamento Participativo (apesar dos seus limites) etc. são mecanismos exemplares de elevação da cidadania, e não a apaziguadora e adequada saída Desenvolvimento Local.

*

Comentário adicional. A desconsideração das escalas intermediárias de poder e de governo, como mostrada em diversos escritos críticos, acabou levando à realização de intervenções tipicamente pontuais, efêmeras e fragmentárias. Para superar esses limites poder-se-ia arguir sobre a necessidade de articular o DL com políticas efetivamente públicas de governo (e não supor que as novas e menores estruturas produtivas, o recuo do papel do Estado no que trata das suas anteriores obrigações públicas e as microescalas são dados da análise e naturalmente eivados de positividades). Mas há aqui um grave problema: essa articulação tende a feri-lo de morte ou a torná-lo um 'frankstein', conceitual e operacional, a menos que ele se limite apenas a objetos de ação e reflexão estritamente locais, a ações do tipo comunitárias, abandonando consequentemente suas muitas, arrogantes e não-embasadas pretensões.

Conclusões

Estas conclusões estão organizadas em dois blocos analíticos; a saber: no primeiro, são resgatadas as principais conclusões tópicas do artigo; e, no segundo, o que aqui se denominou com certo grau de imprecisão de outras e principais conclusões. Como segue.

Principais conclusões tópicas

Sobre as estruturas produtivas. Mostrou-se que se é fato que as pequenas e médias sempre existiram, não dá para negar que a centralização e a concentração do capital são expressões imanentes do modo de produção capitalista; e, além disso, que apenas a partir da atual nova etapa é que houve a exegese das virtudes da reunião cooperativa, sinérgica etc. de micro, pequenas e médias empresas e/ou da reunião cooperativa de pequenos produtores derivada de casos vendidos como paradigmáticos, o que, como já se anotou, somou para a re-emergência exegética da perspectiva delista - por suposto ignorando-se que a supramencionada centralização e concentração continuam em curso, posto serem elementos constitutivos do capitalismo, independentemente das estruturas em telas estarem (ou não) mais fatiadas e mais espraiadas (ou não) pelo território.

Sobre a temática do Estado. Mostrou-se que, apesar da sua centralidade para fins do avanço das relações sociais capitalistas, ela nunca foi consensual; que o Estado, em que pese a própria ideologia burguesa, nunca esteve de fato à margem da vida societária em tela,27 27 Apenas para pontuar: a chamada Acumulação Primitiva, fase imediatamente pregressa ao advento do capitalismo, sabidamente nada possui de idílica, de formiguinhas previdentes, pois, como a categoria sugere, ela não foi apenas primitiva porque prévia, mas também porque sanguinolenta. Afinal, era preciso arrancar os produtores diretos das suas anteriores condições de trabalho, bem como das terras em que viviam para jogá-los nas cidades enquanto mercado de consumo e força de trabalho - a serviço do capital. Esta tarefa foi feita pelo Estado, e armado! Ver também, em adição ilustrativa, a sangria de recursos para a especulação financeira, garantidora do rentismo, que sem o concurso decisivo dos seus muitos braços, armados ou não, dados os elos internos aos países articulados a esse interesse, não teria como se instaurar tão marcada e generalizadamente como ocorre nesta quadra da vida mundial. posto lhe ser imanente; que seu desmonte na atual contemporaneidade ocorreu de maneira parcial na medida em que se deu inteira e socialmente determinado, uma vez que em oposição às maiorias populacionais; e que, apesar do exposto, tal desmonte foi discursiva e ideologicamente operado enquanto arma de conquista hegemônica, posto que vendido de um lado como algo positivo para todos e, de outro, como fato histórico que impossibilitava que o antigo Estado continuasse a atuar como antes. A nova práxis relativa ao Estado, mais minimalista, como já se examinou, é trivial, igualmente contribuiu para a exegese do âmbito local.

Sobre a temática das práxis escalares. Mostrou-se que a discussão do DE desde sempre esteve associada à noção de país/nação, daí porque o âmbito nacional era sua escala analítica e de proposição privilegiadas; era porque apenas a partir da atual nova etapa da história capitalista, depois de longo interregno, é que houve a retomada das supostas soluções espacialmente microrrecortadas. Isso é necessariamente ruim? Não. Ruim é a exegese e o abandono e/ou desconsideração de dimensões e possibilidades outras, riquíssimas, como a das práxis relativas às escalas intermediárias - por exemplo.

Sobre o Desenvolvimento Local. Inspirado em Oliveira, mostrou-se que essa categoria é uma contradição em processo ou em seus próprios termos, posto ser impossível, teórica e praticamente ignorar as demais escalas de análise e da prática política, caso se queira efetivamente fazer frente à natureza do desenvolvimento econômico (e societário) do capitalismo contemporâneo; ou seja, ignorar o verdadeiro totalitarismo fascista definidor da natureza que ele veio a assumir na atual contemporaneidade com a financeirização da riqueza. Daí resulta que no limite é inescapável explorar todas as escalas da análise e da ação política, e que de nada adianta fugir para lugares supostamente harmoniosos e cooperativos. No entanto, sem prejuízo de todas as críticas que foram aqui feitas, o destaque à luta cidadã é sem dúvida bem-vindo - afinal, como diz Oliveira, essa é a forma da luta de classes contemporânea; vale o acréscimo, desde que orientada para a geração de tensões em todas as escalas de poder que se fizerem necessárias (inclusive a local, claro).

Outras e principais conclusões

Algumas vezes anotou-se neste artigo que o DL re-emergiu com ares pre-tensiosos, ainda que disfarçado em falsa modéstia; isso porque ele sugere que o mundo é complexo, que a força da globalização não deixa alternativa para os progressistas, que o Estado entrou em profunda crise (leia-se: Estado Providência) e que as escalas menores, além de serem o que restou para ações de resistência social ou mesmo de confronto com a ordem vigente (vide e a Economia Solidária), são as únicas que permitiriam avanços quer no plano da renda e do emprego, quer da cidadania. Ocioso reiterar aqui todas as críticas já expostas, bem como sua recusada, pelos partidários do DL, que ele é tão somente mais uma das peças, léxico e instrumento da globalização neoliberal.

Por outro lado, em que pese suas virtudes,28 28 Ao politizar o processo de geração de riqueza e da sua apropriação, como é visto em diversos autores filiados à tradição da Crítica da Economia Política, mas também em outras correntes teóricas; ao sublinhar a importância do Estado enquanto mediador entre o Mercado e a Sociedade (vide o Estado Providência de Keynes); ao questionar a divisão internacional do trabalho e a teoria das vantagens comparativas assentadas na especialização das nações (vide os aportes da Cepal); etc. o DE também incorreu e incorre em erros ao sugerir que ele leva ao desenvolvimento social, seja mecanicamente nas vozes de alguns (vide a teoria do bolo da época do chamado Milagre Econômico brasileiro), seja através do controle da voracidade do Mercado na dos social-democratas. A questão é que ao fim e ao cabo os interesses da economia, ou seja, dos empresários e, em especial, dos grandes detentores de riqueza sempre prevalecem e prevalecerão em relação aos demais interesses, mantida a ordem burguesa - e ainda mais nas formações sociais periféricas.

Nesses termos, o DE também operou e opera notável exegese, com pretensões hegemônicas, buscando afirmar dada visão de mundo: a de que a Industrialização, como aconteceu no Brasil em quase todo o século passado, era o único caminho a ser seguido - tal qual o verificado nos países centrais. Hoje, de maneira atualizada aos novos tempos (sic), a visão ora hegemônica aponta um novo e outra vez único caminho, o da adequação subordinada à globalização, explorando as 'janelas de oportunidades' que estariam abertas na economia mundial...

A verdade é que nem um nem outro são capazes de promover transformações societárias efetivamente progressistas. Então, o que fazer?

Talvez seja por isso que o antigo Desenvolvimentismo, com alguma atualização aos novos tempos, e mais ainda algo do tipo getulista, e.g., um modelo de Desenvolvimento Nacional e Autônomo, também atualizado (Brun, 2012), continuam a povoar as mentes de muitos intelectuais e cidadãos à esquerda no Brasil e em diversas partes da América Latina! Seriam essas, enfim, dada à atual correlação de forças, em verdade as únicas alternativas disponíveis (de resistência)?

Notas do autor

Registro aqui meus agradecimentos ao dr. Eduardo Stotz, do Fórum Itaboraí, por sua leitura atenta e contributiva do/ao presente trabalho, o qual, para ser justo, eximo de qualquer responsabilidade.

Notas

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  • 1
    Professor do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IPPUR/UFRJ). Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Doutor em Economia pelo Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (IE/Unicamp). <
  • 2
    Este artigo resulta de palestra ministrada pelo autor (em 09/10/2012) no curso de atualização intitulado "Papel do Estado no município: integração setorial e mudança social", promovido pelo Fórum Itaboraí: Política, Ciência e Cultura na Saúde/Fundação Oswaldo Cruz, Petrópolis, RJ.
  • 3
    A esse respeito, ver Natal e Góes (2009). Nesse trabalho, os autores mostram que a categoria e as experiências sob essa orientação são bem anteriores às verificadas na atual contemporaneidade, sublinhando-se aí o imediato pós Segunda Guerra Mundial; e, ainda, que essas práxis se deram em contraposição ao extraordinário desenvolvimento econômico dos países centrais dessa época que, sabidamente, não alcançou a todas as pessoas e a todos os espaços, inclusive em seus próprios domínios (os dos países centrais).
  • 4
    Pensa-se aqui especulativamente em sociedades orientadas pela busca da geração da riqueza (mas que respeite o meio ambiente), pela luta em torno da justiça social distributiva e pelo equilíbrio (sem qualquer alusão à abordagem neoclássica) espacial, e tudo isso em processo de radicalização democrática.
  • 5
    Embora usada recorrentemente, como aqui, esta expressão,
    intervenção do Estado, é em verdade um equívoco, pois sugere um Estado externo à economia e à sociedade capitalistas, o que é uma evidente impossibilidade histórica - para maiores detalhes vide nota 27.
  • 6
    Mas cuidado: maior possibilidade de desconcentração produtiva não equivale à efetiva desconcentração por causa dos fatores de atração dos grandes negócios existentes nos espaços citadinos economicamente mais dinâmicos.
  • 7
    Desde que deixadas à margem de políticas governamentais efetivamente públicas, não cumprirão senão esse papel - e o farão tanto mais ampliem sua escala econômica.
  • 8
    Definida pelo acúmulo de metais preciosos na denominada órbita da circulação; é dizer: seja no comércio propriamente dito (comprando mais barato e vendendo mais caro, ou mesmo saqueando colônias), seja através da pirataria etc., e, tudo isso, insistindo, com apoios de todas as ordens dos Estados Nacionais então em gestação.
  • 9
    Leia-se: a defesa de que a divisão internacional do trabalho em livre concorrência, orientada pela especialização das diversas nações, seria geradora de Ótimos Econômicos na escala-mundo.
  • 10
    O termo Marginalista deriva do emprego da Teoria dos Limites que, remetida para as chamadas Equações Diferenciais, permitiria cálculos matemáticos referidos à n-ésima unidade, seja ela de emprego ou de satisfação no consumo, por exemplo, e assim a maximização de determinada função (matemática).
  • 11
    Cumpre assinalar que toda e qualquer elaboração do campo das Ciências Sociais, aplicadas ou não, é necessariamente ideológica, posto expressar determinada visão de mundo. A neutralidade plena é uma invenção, mistificadora, do pensamento burguês; a diferença, essa sim a observar, diz respeito aos aportes que contribuem para o entendimento da realidade e quais, dentre eles, têm como objetivo exatamente realizar o inverso, é dizer, encobrir ou lançar nuvem de fumaça sobre os reais determinantes dos fatos e processos sociais capitalistas. Ver a respeito a discussão de Marx, em
    O capital, sobre o fetiche.
  • 12
    Tais Ótimos, no âmbito da análise neoclássica, são conceitos derivados do modelo de maximização (matematicamente definido), dada à livre concorrência (Henderson e Quandt, 1976).
  • 13
    Ele que fora não apenas educado em Cambridge, mas também o mais brilhante aluno de A. Marshall nessa mesma universidade, sendo este possivelmente o mais destacado economista neoclássico de todos os que fundaram tal escola de economia.
  • 14
    Keynes tinha plena clareza que nas chamadas economias de mercado o gasto é que desencadeia fluxos monetários consistentes e que, dentre os gastos, alguns são determinantes, como os dos empresários, ao passo que os dos demais segmentos sociais não. Ainda: que naquela conjuntura era preciso aumentar a demanda, estimulando o consumo, e assim ativar as decisões empresariais de produção. Não obstante, ele também tinha clareza que a variável chave da dinâmica capitalista é a decisão de compra de máquinas e equipamentos (Investimento) e que esta, por ser orientada pelas expectativas de longo prazo, não é necessariamente alcançada pelos esforços anticíclicos das políticas governamentais. Enfim: o Estado poderia muito, mas não tudo - afinal, digo eu, para que revoluções burguesas e mais revoluções burguesas? Para colocar as decisões fundamentais de gasto nas mãos da classe trabalhadora?
  • 15
    A desregulamentação financeira para sua livre movimentação é apenas (sic) o corolário dessa engenharia/demanda social. Mas era preciso mais, em razão das massas de capitais acumuladas nos centros mundiais, porém premidas em sua busca de valorização; daí serem a desregulamentação comercial, a privatização de ativos públicos e a retirada de direitos sociais e trabalhistas outros dos seus corolários.
  • 16
    Esta nova etapa histórica seria a terceira da sua história, uma vez considerada a dimensão tecnológica como traço distintivo; explicando: se à primeira revolução industrial correspondem os avanços da mecânica e, à segunda, os verificados na química e na eletricidade, esta nova etapa, não valorados outros desenvolvimentos científicos e tecnológicos precedentes, seria a terceira.
  • 17
    Não obstante a manutenção de diversas permanências, próprias do modo de organização da vida social em tela, tais como a lógica da valorização do capital, as classes sociais e suas lutas, o papel do desenvolvimento científico e tecnológico enquanto arma decisiva da concorrência intercapitalista e de subordinação da força de trabalho etc.
  • 18
    É possível supor que algumas vezes as atuais mudanças tecnológicas, ao reverso, até mesmo constranjam determinados gastos, em especial os de compra de máquinas e equipamentos, em vista da sua celeridade (dada à necessidade de horizontes mais alongados para a realização de cálculos capitalistas, o que o frenesi da mudança tecnológica por vezes bloqueia).
  • 19
    É trivial que cada um dos aspectos ora enunciados demanda extensos desenvolvimentos analíticos. Porém, seja pela existência de ampla e consagrada literatura sobre cada um deles, seja por conta do presente artigo não ter neles seu objeto, é que se resolveu tão somente pontuá-los.
  • 20
    Tais como sinergia, flexibilidade, governança, capital social, empoderamento etc.
  • 21
    Tendo em vista o chamado capital social acumulado em dado lugar e a construção de harmonias cooperativas, sujeitas a uma boa governança - num misto de discurso progressista e ato de vanguardismo político.
  • 22
    Esta análise é bastante devedora de Brandão (2007).
  • 23
    Cabe sublinhar aqui, como afirma Brandão (2007), que não há escala ruim ou escala boa; afinal, escala boa é a sugerida pelo próprio objeto em questão. No entanto, isso não impede que seja aqui reiterado que a maioria dos grandes problemas mundiais exige a consideração das escalas intermediárias - no caso brasileiro, da estadual e da nacional. Mas é óbvio que em vista do que se escreveu no início desta nota, nada contra, antes pelo contrário, se o problema puder ser resolvido, por exemplo, no âmbito municipal. Por outro lado, também é bom não perder de vista que o poder municipal não deve nem de longe ser desconsiderado (Oliveira, 2001).
  • 24
    Esta subseção é inspirada em trabalho de F. de Oliveira, de 2001, intitulado Aproximações ao enigma: o que quer dizer desenvolvimento local?
  • 25
    Nesses termos, vale ter em conta que o capitalismo liberal contemporâneo aproxima-se perigosamente do totalitarismo fascista. "A distinção entre o público e o privado, uma aquisição da modernidade, quando desfeita, torna impossível até mesmo definir o que é uma política de mera ação dos atores privados, que é a tendência que se insinua (...), por exemplo, na filantropização da ação social" (Oliveira, 2001, p. 38).
  • 26
    Dois apontamentos complementares (tendo em vista o Brasil): um é que o Poder Local, pelo menos nas médias e grandes cidades, está longe de ser pequeno, valendo a pena colocá-lo sob tensão; e o outro, em complemento, é que a luta pela verdadeira aplicação do Estatuto da Cidade, do Usucapião da Propriedade Privada, do Orçamento Participativo (apesar dos seus limites) etc. são mecanismos exemplares de elevação da cidadania, e não a apaziguadora e
    adequada saída Desenvolvimento Local.
  • 27
    Apenas para pontuar: a chamada Acumulação Primitiva, fase imediatamente pregressa ao advento do capitalismo, sabidamente nada possui de idílica, de formiguinhas previdentes, pois, como a categoria sugere, ela não foi apenas primitiva porque prévia, mas também porque sanguinolenta. Afinal, era preciso arrancar os produtores diretos das suas anteriores condições de trabalho, bem como das terras em que viviam para jogá-los nas cidades enquanto mercado de consumo e força de trabalho - a serviço do capital. Esta tarefa foi feita pelo Estado, e armado! Ver também, em adição ilustrativa, a sangria de recursos para a especulação financeira, garantidora do rentismo, que sem o concurso decisivo dos seus muitos braços, armados ou não, dados os elos internos aos países articulados a esse interesse, não teria como se instaurar tão marcada e generalizadamente como ocorre nesta quadra da vida mundial.
  • 28
    Ao politizar o processo de geração de riqueza e da sua apropriação, como é visto em diversos autores filiados à tradição da Crítica da Economia Política, mas também em outras correntes teóricas; ao sublinhar a importância do Estado enquanto mediador entre o Mercado e a Sociedade (vide o Estado Providência de Keynes); ao questionar a divisão internacional do trabalho e a teoria das vantagens comparativas assentadas na especialização das nações (vide os aportes da Cepal); etc.
  • Correspondência:
    Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IPPUR/UFRJ)
    Prédio da Reitoria, sala 543, CEP 21941-590
    Cidade Universitária, Ilha do Fundão, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      28 Fev 2013
    • Data do Fascículo
      Abr 2013
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