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Papéis incendiários, gritos e gestos: a cena pública e a construção nacional nos anos 1820-1830

Resumos

A proliferação de manifestações como papéis chamados de incendiários, além de vozes, gritos e gestos nas ruas da capital do Império (Rio de Janeiro) nas décadas de 18201830, marca uma série de transformações e também permanências dos espaços públicos na polis. Da mesma forma, a sala do Teatro, na Corte, aparece como cena desta teatralização da política, em meio a tais expressões manuscritas, verbais e gestuais (que permanecem após a consolidação da imprensa periódica). Em geral elas continham aquilo que não podia ser impresso (ou mesmo falado) dentro dos limites vigentes e, ainda, permitiam envolver setores mais amplos do que o público habitualmente leitor ou redator. Destaca-se a importância de tais manifestações públicas para a política vivida no cotidiano, numa sociedade caracterizada pela comunicação oral e visual e num momento de construção da ordem nacional. As fontes utilizadas são: relatos de diplomatas franceses e jornais da época.


The spreading of public demonstrations, through papers that were named "incendiary", besides voices, screams and gestures in the streets of the capital of the Empire (Rio de Janeiro) in the decades of 1820/1830, mark a series of transformations and also the consolidation of the public spaces in the polis. In the same way, the Theater Room, in the Court, appears as a scene for this dramatization of politics, amid such handwritten, verbal and bodily expressions (which ended up remaining after the consolidation of the daily press). In general, they contained everything that could not be put into print (or even spoken) considering the set limits of that time and, yet, made it possible to reach wider sectors of the population than just the ones that were used to reading or writing. It highlights the importance of such public manifestations for the everyday politics, in a society characterized by the oral and visual communication and at the moment of the building up of the National order.


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Bibliografia

  • OLIVEIRA, Cecília Helena L. de Salles. DARNTON, Robert & ROCHE, Daniel (orgs.). Revolução Impressa. A imprensa na França. 1775-1800, São Paulo: Edusp, 1996.
  • FARGE, Arlette.Dire et mal dire. L'opinion publique au XVIIIe siècle Paris: Seuil, 1992.
  • GUERRA, François-Xavier. Modernidad e independencias. Ensayos sobre las revoluciones hispánicasMadrid: Mapfre, 1992.
  • HABERMAS, Jürgen. Mudança estrutural da esfera pública, Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1984.
  • MATTOS, Ilmar R. de.O Tempo Saquarema, São Paulo: Hucitec, 1987
  • MOREL, Marco. La formation de l'espace public moderne à Rio de Janeiro (18201840): opinion, acteurs et sociabilités, Tese de Doutorado, U.F.R. d'Histoire, Université de Paris I, dezembro de 1995.
  • NEVES, Lúcia Maria Bastos Pereira das. Corcundas, constitucionais e pés-de-chumbo: a cultura política da independência. 1820-1822, Tese de Doutorado em História, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, 1992
  • O disfarce O disfarce do anonimato. O debate político através dos folhetos: 1820-1822Dissertação de Mestrado em História, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, 1979.
  • 1
    Este artigo é parte da tese de doutorado, La formation de l'espace public moderne à Rio de Janeiro (1820-1840): opinion, acteurs et sociabilités, U.F.R. d'Histoire, Université de Paris I, defendida em dezembro de 1995.
  • 2
    François-Xavier Guerra. Modernidad e independencias. Ensayos sobre las revoluciones hispánicas, Madrid: Mapfre, 1992.
  • 3
    Entre a vasta bibliografia sobre o episódio, ver: Luis Henrique Dias Tavares.História da sedição intentada na Bahia em 1798, São Paulo: Pioneira, 1975; István Jancsó, Na Bahia contra o Império. História do ensaio de sedição de 1798, São Paulo / Salvador: Hucitec / Edufba, 1996; Florisvaldo Mattos. A comunicação social na Revolução dos Alfaiates, 2a ed., Salvador: Academia de Letras da Bahia / Assembléia Legislativa do Estado, 1998.
  • 4
    Arlette Farge. Dire et mal dire. L'opinion publique au XVIIIe siècle, Paris: Seuil, 1992, trabalho que inspirou diversas partes deste artigo. Sobre as formas de publicização no Antigo Regime v. Gilles Feyel,L'Annonce et la Nouvelle. La presse d'information et son évolution sous l'Ancien Régime (1630-1788), Tese de Doutorado em História, Université de Paris I, 1994.
  • 5
    Ilmar R. de Mattos abriu caminho para esta abordagem ao tratar do "mundo da rua ou da desordem", na perspectiva dos grupos dirigentes, em O Tempo Saquarema, São Paulo: Hucitec, 1987, pp. 109-129; 251-279. No tocante a estas diferentes formas de comunicação no período, pela historiografia brasileira, v. Lúcia Maria Bastos Pereira das Neves. Corcundas, constitucionais e pés-de-chumbo: a cultura política da independência. 1820-1822, Tese de Doutorado em História, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, 1992; e Cecília Helena L. de Salles Oliveira. O disfarce do anonimato. O debate político através dos folhetos: 1820-1822, Dissertação de Mestrado em História, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, 1979.
  • 6
    Correspondance Politique du Brésil (CPB), vol. 1, Archives du Ministère des Affaires Étrangères (AMAE), Paris, despacho de 05/03/1821. Nenhuma das peças citadas por estes diplomatas foi ainda localizada em arquivos brasileiros: trabalhamos aqui apenas com a referência destes agentes.
  • 7
    CPB, vol. 1, despacho de 09/06/1821, AMAE, Paris.
  • 8
    CPB, vol. 1, despacho de 22/09/1821, AMAE, Paris.
  • 9
    CPB, vol. 1, despacho de 09/10/1821, AMAE, Paris.
  • 10
    CPB, vol. 3, despacho de 12/03/1824, AMAE, Paris.
  • 11
    Marco Morel, Cipriano Barata na Sentinela da Liberdade, Salvador: Academia de Letras da Bahia / Assembléia Legislativa do Estado, 2001, pp. 152 e 172.
  • 12
    CPB, vol. 4 , despacho de 26/10/1826, AMAE, Paris.
  • 13
    O redimensionamento da importância de textos tidos como secundários na Revolução Francesa aparece em diversas obras de história cultural, como por exemplo: Robert Darnton e Daniel Roche (orgs.). Revolução Impressa. A imprensa na França. 1775-1800. São Paulo: Edusp, 1996.
  • 14
    CPB, vol. 11, despacho de 27/03/1830, AMAE, Paris.
  • 15
    Diario Fluminense, no 90, 24/04/1830.
  • 16
    Este aspecto foi tratado em Marco Morel. A política nas ruas: os espaços públicos na cidade imperial do Rio de Janeiro. In: Estudos Ibero-Americanos, PUCRS, v. XXIV, n. 1, p. 59-73, junho de 1998.
  • 17
    Ver a este respeito Dominique Julia. A violência das multidões: é possível elucidar odesumano? In: Boutier & Julia (orgs.). Passados recompostos: campos e canteiros da História. Rio de Janeiro: UFRJ/FGV, 1998, pp. 217-232.
  • 18
    CPB, vol. 1, despacho de 05/06/1821, AMAE, Paris.
  • 19
    CPB, vol. 13, despacho de 20/07/1831, AMAE, Paris.
  • 20
    CPB, vol. 13, despacho de 09/06/1831, AMAE, Paris.
  • 21
    CPB, vol. 15, despacho de 31/12/1833, AMAE, Paris.
  • 22
    Esta parte é uma versão reelaborada de meu trabalho Teatro na Corte, palco de conflitos políticos. In: Lená Medeiros de Menezes (org.), História e Violência, Anais do VII Encontro Regional da Associação Nacional de História, Núcleo do Rio de Janeiro, ANPUHRJ/CCS-UERJ, 1996, pp. 437-440.
  • 23
    Quando falar aqui de "Teatro", refiro-me à sala oficial de espetáculos do Rio de Janeiro, situada no então Largo do Rossio, local conhecido também por Praça do Teatro, Praça da Constituição a partir de 1824, e que chama-se hoje Praça Tiradentes. D. João em 1813 inaugura-o com o nome de Real Teatro São João. Destruído por um incêndio no dia da promulgação da Constituição de 1824, o Teatro foi reinaugurado dois anos depois com o nome de Imperial Teatro de São Pedro de Alcântara. Após a abdicação do imperador, 1831, o local é rebatizado de Teatro Constitucional Fluminense. Em 1838, com a chamada política do Regresso, volta a se chamar Teatro São Pedro de Alcântara. Estas mudanças de nome confirmam a densidade das disputas políticas em torno desta sala de espetáculos. Sobre a história do Teatro no Rio de Janeiro consultar, entre outros: Lothar Hessel. O teatro no Brasil da colônia à regência. Porto Alegre, 1974; Max Fleiss. O teatro no Brasil. In: Dyonisos, RJ, 6(5), fevereiro de 1955; e Lafayette Silva. História do teatro Brasileiro, Rio de Janeiro, 1938.
  • 24
    Sobre o conceito de espaço público consultar a obra clássica de J. Habermas.Mudança estrutural da esfera pública. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1984.
  • 25
    Para o conceito de "lutas de representação" ou "lutas simbólicas" ver dois ensaios deRoger Chartier: Le monde comme représentation. In: Annales E.S.C., Paris, no 6, novembre /décembre 1989; Opinion publique et propagande en France. In: Michel Vovelle (dir.). L'image de la Révolution Française, vol. IV,Paris/Londres: Pergamon Press/Sorbonne, 1989.
  • 26
    R. Walsh. Notícias do Brasil (1828-1829), Belo Horizonte: Itatiaia, 1985, vol. 1, p. 204.
  • 27
    Cf. Carte Géographique, statistique, historique et politique du Brésil, J. M. Darmet, Paris, 1826.
  • 28
    CPB, vol. 1, despacho de 17/05/1821, AMAE, Paris.
  • 29
    CPB, vol. 1, despacho de 05/06/1821, AMAE, Paris.
  • 30
    CPB, vol. 1, despacho de 12/04/1822, AMAE, Paris.
  • 31
    CPB, vol. 3, despacho de 07/09/1825, AMAE, Paris.
  • 32
    CPB, vol. 12, despacho de 30/09/1830, AMAE, Paris.
  • 33
    Sobre o crescimento dos jornais e associações neste período, v. a Parte III de MarcoMorel. La formation de l'espace public moderne à Rio de Janeiro (1820-1840) acteurs, opinions et sociabilités, Doutorado em História, Université de Paris I, outubro de 1995.
  • 34
    Nova Luz Brazileira , no 132, 19/4/1831
  • 35
    O Republico, no 74, 9/6/1831.
  • 37
    Nova Luz Brazileira, no 26, 9/03/1830.
  • 38
    Diario Fluminense, no 76 e 79, 30/09/1831 e 4/10/1831 CPB, despacho de 31/12/1833, vol.15, AMAE, Paris.
  • 39
    Conforme testemunho do barão de Rouen, representante diplomático francês: CPB, vol. 19, despacho de 25/06/1840, AMAE, Paris.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jun 2002
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