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A Justiça Militar e a implantação da ordem republicana no Brasil

Resumos

Este artigo discute a relação entre a Justiça Militar brasileira e o processo político como um elemento da constituição da ordem republicana após 1889. É analisada a continuidade das instituições monárquicas na área da justiça castrense. Apontam-se, ainda, os mecanismos doutrinários e organizacionais que viabilizaram a instrumentalização política da Justiça Militar durante os governos de Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto.

Justiça Militar; justiça de exceção; direito militar; implantação da República; militares e política.


This article discusses the relationship between the Brazilian Military Justice and the political process as constitutive element of the Republican order after 1889. It analyzes the continuity of monarchical institutions in the Military Justice. It also points out doctrinal and organizational mechanisms that enabled the political exploitation of the Military Justice under Deodoro da Fonseca's and Floriano Peixoto's administrations.

Military Justice; justice of exception; military law; establishment of the Republic; military and politics.


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  • 1
    BENJAMIN, Walter. Teses sobre filosofia da história (Tese VIII). In: KOTHE, Flávio (Org.). Walter Benjamin. São Paulo: Ática, 1985. p. 157.
  • 2
    Ver MATTOS, Ilmar Rohloff de. O tempo saquarema. São Paulo: Hucitec, 1987.
  • 3
    COSTA, Emília Viotti da. A Proclamação da República. In: _____. Da Monarquia à República. Momentos decisivos. 2. ed. São Paulo: Ciências Humanas, 1979. p. 291-326.
  • 4
    A propósito, ver LEMOS, Renato. A alternativa republicana e o fim da monarquia. In: GRINBERG, Keila; SALLES, Ricardo (Org.). O Brasil Imperial. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2009. v. III 1870-1889, p. 401-444.
  • 5
    Os parágrafos que se seguem estão baseados em LEMOS, Renato. Justiça Militar e ordem republicana no Brasil: da linha de comando à defesa do Estado (1889-1895). In: ENCONTRO REGIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE HISTÓRIA (ANPUH), XII, 2006, Niterói. Anais eletrônicos. Disponível em: <www.rj.anpuh.org/conteudo/view?ID_ CONTEUDO=303#indice> Acesso em: 24 nov. 2011.
  • 6
    COSTA, Emília Viotti da. A Proclamação da República. In: _____. Da Monarquia à República, op. cit. p. 322.
  • 7
    ARARIPE. Tristão de Alencar. Aspectos particulares da conjuntura. A Justiça Militar e os interesses da segurança nacional. Rio de Janeiro: Escola Superior de Guerra. Departamento de Estudos, C - 79 - 61, 1961. p. 13-14.
  • 8
    Carta do tenente-coronel Jacques Ourique ao Jornal do Commercio, do Rio de Janeiro, em 10 de dezembro de 1889, transcrita em PORTO, Manuel Ernesto de Campos. Apontamentos para a história da República dos Estados Unidos do Brasil. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1890. p. 959.
  • 9
    Ver, por exemplo: ENGELS, Friedrich. Anti-Dühring. 1878. Seção II; WEBER, Max. Economia e sociedade. Brasília: Editora da Universidade de Brasília, 1999. v. 2, Capítulo IX; TILY, Charles. Coerção, capital e estados europeus, 1990-1992. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1996.
  • 10
    FERREIRA, Pinto. Curso de direito constitucional. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1964. p. 331.
  • 11
    BASTOS, Paulo César. Superior Tribunal Militar. 173 anos de história. Brasília: Superior Tribunal Militar, 1981. p. 21.
  • 12
    NEQUETE, Lenine. O Poder Judiciário no Brasil a partir da Independência. II - República. Brasília: Supremo Tribunal Federal, 2000. p. 34.
  • 13
    BANDEIRA, Esmeraldino O. T. Curso de direito penal militar. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1915. p. 13.
  • 14
    BANDEIRA, Esmeraldino O. T. Direito, justiça e processo militar. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1919. p. 187.
  • 15
    Exposição do deputado Cândido Mota na Câmara dos Deputados em 25 de agosto de 1911 apud BANDEIRA, Esmeraldino O. T. Direito, justiça e processo militar, op. cit. p. 188.
  • 16
    "A constituição do Império não continha disposições expressas no tocante à jurisdição militar, cuja existência apenas a lei ordinária assegurava." BASTOS, Paulo César. Superior Tribunal Militar, op. cit. p. 29.
  • 17
    SOUZA, Adriana Barreto de. A Justiça Militar no Império. In: CASTRO, Celso; D'ARAÚJO, Maria Celina (Coord.). 200 anos de Justiça Militar. Rio de Janeiro: Cpdoc, 2007. p. 42-47.
  • 18
    ARARIPE, Tristão de Alencar. Aspectos particulares da conjuntura, op. cit. p. 13-14.
  • 19
    Ibidem.
  • 20
    LEMOS, Renato. A Justiça Militar na República. In: CASTRO, Celso et al. (Org.). 200 anos de Justiça Militar. Rio de Janeiro: Cpdoc/FGV, 2007. p. 76.
  • 21
    "Mensagem dirigida por Deodoro da Fonseca ao Congresso na primeira sessão dos trabalhos constituintes", transcrita em: BONAVIDES Paulo; ANDRADE, Paes de. História constitucional do Brasil. 4. ed. Brasília: Ordem dos Advogados do Brasil, 2002. p. 645-654.
  • 22
    ARARIPE, Tristão de Alencar. Aspectos particulares da conjuntura, op. cit. p. 13-14.
  • 23
    Reformado a partir de autorização concedida ao Ministério da Marinha por decreto de 14 de fevereiro de 1891, em 7 de março seria decretada sua versão definitiva. A primeira legislatura ordinária republicana, no entanto, o consideraria inconstitucional e, em 1893, o STF o declararia nulo.
  • 24
    MORAES, Evaristo de. Da monarquia para a república, 1870-1889. 2. ed. Brasília: Editora da Universidade de Brasília. p. 144 apud ALVES, Paulo. A verdade da repressão. Práticas penais e outras estratégias na ordem republicana (1890-1921). São Paulo: Arte & Ciência; Unip, 1997. p. 32.
  • 25
    Apud ALVES, Paulo. A verdade da repressão, op. cit. p. 16. Grifo meu.
  • 26
    No texto do decreto, a expressão usada é "segurança interna" da República.
  • 1
    ALVES, Paulo. A verdade da repressão, op. cit. p. 19.
  • 28
    Código Criminal do Império, de 1830.
  • 29
    OITICICA, José. Artigo em Spartacus, Rio de Janeiro, ano I, n. 16, 15 de novembro de 1919 apud ALVES, Paulo. A verdade da repressão, op. cit. p. 15.
  • 30
    LEMOS, Renato. Benjamin Constant. Vida e história. Rio de Janeiro: Topbooks, 1999. p. 461.
  • 1
    Sobre a atividade legislativa do Governo Provisório, ver LEAL, Aurelino. História constitucional do Brasil. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1915. p. 201-204.
  • 32
    LEMOS, Renato. Benjamin Constant. Vida e história, op. cit.
  • 33
    ALVES, Paulo. A verdade da repressão, op. cit. p. 28 e 30.
  • 34
    A respeito, ver LEMOS, Renato. Justiça Militar e ordem republicana no Brasil: da linha de comando à defesa do Estado (1889-1895), op. cit.
  • 35
    COSTA, Wilma Peres. Os militares e a primeira constituição republicana. In: MORAES, João Quartim de et al. A tutela militar. São Paulo: Vértice, 1987. p. 33. O texto transcreve e analisa artigos do projeto da Comissão de Juristas diretamente relacionados a assuntos militares. Ernesto Senna transcreve outros artigos do projeto: SENNA, Ernesto. Deodoro: subsídios para a história. 2. ed. Brasília: Editora da Universidade de Brasília, 1981. O texto produzido pela Comissão de Juristas e as emendas de Rui Barbosa estão em BARBOSA, Rui. Obras completas. Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Saúde, 1946. V. XVII (1890), Tomo I, A Constituição de 1891. É transcrito, ainda, em LYRA, Augusto Tavares de. Organização política e administrativa do Brasil. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1941.
  • 36
    Transcrita em BONAVIDES, Paulo; ANDRADE, Paes de. História constitucional do Brasil, op. cit. p. 645-654.
  • 37
    Observe-se que, apesar de criticar a legislação penal militar, Deodoro, respondendo a uma saudação feita por um congressista e buscando afirmar as vantagens de sua formação militar para o exercício dos cargos de chefe do Governo Provisório e provável futuro presidente constitucional, buscou amparo nos códigos que acabara de negar: "Educado na aritmética positiva do Conde de Lippe, quer como soldado quer como homem do governo, jamais desconheci a necessidade de respeitar a lei, o direito e a justiça, e, qualquer que seja de ora em diante a minha posição, hei de manter e cumprir a Constituição dos Estados Unidos do Brasil". Ibidem.
  • 38
    Debateu-se a composição do novo tribunal. Emenda subscrita por destacados oficiais parlamentares, como José Simeão, José de Almeida Barreto e Custódio de Melo, propôs que o integrassem doze membros militares, como acontecia no Conselho Supremo Militar e de Justiça, e "quatro desembargadores de notável saber, todos nomeados pelo presidente da República, sujeita a nomeação à aprovação do Senado". Já a subemenda à emenda aditiva da comissão, apresentada pelo militar e deputado - que, por dois meses, presidira o estado do Piauí em 1890 e seria presidente, depois, do estado de Alagoas (1892-94) - Gabino Besouro, propunha que os membros militares fossem quinze, e os "jurisconsultos", três.
  • 39
    O autor da emenda foi Manoel Prisciliano de Oliveira Valadão, tenente-coronel e deputado por Sergipe, secundado por Gabino Besouro. Os Anais da Assembleia Nacional Constituinte registram, também, emenda ao mesmo artigo, de autoria do deputado Retumba, não aprovada, em que se substituía a expressão "crimes militares" por "delitos militares".
  • 40
    A emenda sobre a revisão dos processos militares foi aceita integralmente na primeira discussão, mas, "na redação para a segunda discussão, foi suprimida, sem qualquer explicação, a última parte, ficando a competência com o Supremo Tribunal Federal e não com o Supremo Tribunal Militar (...)". ROURE, Agenor de. A Constituinte republicana. 2. ed. Brasília: Senado Federal; Editora da Universidade de Brasília, 1979. v. 2.
  • 41
    NEQUETE, Lenine Nequete. O Poder Judiciário no Brasil a partir da Independência, op. cit. p. 34.
  • 42
    A propósito, ver SAES, Décio. A formação do Estado burguês no Brasil (1888-1891). Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985.
  • 43
    Apenas com a Constituição de 1934 ela se deslocaria para o âmbito do Judiciário.
  • 44
    SAES, Décio. A formação do Estado burguês no Brasil (1888-1891), op. cit. p. 70.
  • 45
    RODRIGUES, Leda Boechat. História do Supremo Tribunal Federal. 2. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1991. v. 1, p. 3.
  • 46
    Guerra civil que conflagraria o Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná até agosto de 1895, em oposição ao governador gaúcho Júlio de Castilhos e ao presidente Floriano Peixoto, que o apoiava.
  • 47
    Ver RODRIGUES, Leda Boechat. História do Supremo Tribunal Federal, op. cit.
  • 48
    Acórdão para o pedido de habeas corpus no 410, de 16 de agosto de 1893, em favor de Mário Aurélio da Silveira, transcrito em RODRIGUES, Leda Boechat. História do Supremo Tribunal Federal, op. cit. p. 161-164.
  • 49
    Acórdão para o pedido de habeas corpus no 771, de 8 de maio de 1895, em favor do tenente-coronel José Facundo da Silva Tavares transcrito em RODRIGUES, Leda Boechat. História do Supremo Tribunal Federal, op. cit. p. 161-164.
  • 50
    SALES, Campos. Da propaganda à presidência. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1983. p. 63.
  • 51
    Levante da esquadra sediada na baía da Guanabara, no Rio de Janeiro, em oposição a Floriano Peixoto, que se estenderia a março de 1894 sob a chefia, inicialmente, do almirante Custódio de Melo e, depois, do almirante Luís Felipe Saldanha da Gama.
  • 52
    CARONE, Edgard. A República Velha (evolução política). São Paulo: Difusão Europeia do Livro, 1971. p. 109. O autor menciona a recusa de oficiais da ativa a comandar a esquadra governista contra os revoltosos. Ibidem, p. 111.
  • 53
    BANDEIRA, Esmeraldino O. T. Curso de direito penal militar, op. cit. p. 40.
  • 54
    Ibidem, p. 43.
  • 55
    Ibidem, p. 40.
  • 56
    Senado Federal, sessão em 5 de agosto de 1905. Transcrito em: FUNDAÇÃO CASA DE RUI BARBOSA (Org.; sel.). Pensamento e ação de Rui Barbosa. Brasília (DF): Fundação Casa de Rui Barbosa; Senado Federal, 1999. p. 267. Grifos meus.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Jun 2012

Histórico

  • Recebido
    30 Nov 2011
  • Aceito
    13 Mar 2012
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