Acessibilidade / Reportar erro

Blade Runner : entre o passado e o futuro

Blade Runner : betwen past and future

Resumos

Blade Runner é muito mais do que um filme sobre o futuro. A versão remontada por Ridley Scott, em 1993, remete a dimensões que a versão que vimos inicialmente nos cinemas dissolvia. Problematiza de maneira contundente as relações entre passado, presente e futuro, questionando a concepção de tempo linear e as relações do homem com o seu próprio tempo e a sua própria história. Aqui, a temporalidade do que poderia ser chamado de propriamente humano constitui-se nas relações que o homem trava com a sua própria memória buscando, a partir disso, a comprovação de sua existência enquanto ser e, portanto, enquanto dono de seu passado e de sua própria vida.

Blade Runner; humanidade; memória; passado; temporalidade


Blade Runner is not only a film about the future. The Ridley Scott's version, remaked in 1993, show us dimensions that the first one had dissolved. Relations concerning past, present and future are the emphasis now, in order to question the linear conception of time and the relations between men and his own time and history. The temporality of the so called specific human kind emerges from the search towards his own memory which can prove his existence as human being and thus as master of his past and live.

Blade Runner; mankind; memory; past; temporality


ARTIGO

Blade Runner : entre o passado e o futuro

Blade Runner : betwen past and future

Paulo Menezes

Professor do Departamento de Sociologia da FFLCH-USP

RESUMO

Blade Runner é muito mais do que um filme sobre o futuro. A versão remontada por Ridley Scott, em 1993, remete a dimensões que a versão que vimos inicialmente nos cinemas dissolvia. Problematiza de maneira contundente as relações entre passado, presente e futuro, questionando a concepção de tempo linear e as relações do homem com o seu próprio tempo e a sua própria história. Aqui, a temporalidade do que poderia ser chamado de propriamente humano constitui-se nas relações que o homem trava com a sua própria memória buscando, a partir disso, a comprovação de sua existência enquanto ser e, portanto, enquanto dono de seu passado e de sua própria vida.

Palavras-chave:Blade Runner, humanidade, memória, passado, temporalidade.

ABSTRACT

Blade Runner is not only a film about the future. The Ridley Scott's version, remaked in 1993, show us dimensions that the first one had dissolved. Relations concerning past, present and future are the emphasis now, in order to question the linear conception of time and the relations between men and his own time and history. The temporality of the so called specific human kind emerges from the search towards his own memory which can prove his existence as human being and thus as master of his past and live.

Keywords:Blade Runner, mankind, memory, past, temporality.

A confiança na vida não existe mais;

a própria vida torna-se problema

(Nietzsche, 1982,P,#3,p. 25)

Blade Runner apresentou-nos uma nova visão sobre o futuro muito diferente daquelas que até então dominavam as imagens dos filmes que podíamos assistir nas sessões dos cinemas. A história situa-se em novembro de 2019, em Los Angeles. A cidade nada mais tem daquelas referências visuais que, em outros filmes, pareciam sempre nos dizer que o futuro era, freqüentemente, um aqui e um agora. A primeira imagem que vemos é a da explosão de gases na ponta de três altíssimas chaminés que, ao iluminar as nossas vistas, iluminam também difusamente o resto da cidade que se espalha lá embaixo, e da qual apenas uma sucessão de lâmpadas nos são dadas a perceber, sob um céu quase totalmente escuro. A imagem de um olho azul é vista bem de perto e podemos perceber, no reflexo que vemos em sua córnea, a mesma imagem da cidade que se espalha indefinidamente sob nossos pés. Um veículo voador cruza este céu e completa esta primeira aproximação do que seria este futuro no início do século XXI. Ao fundo ergue-se, perdida no meio da penumbra, uma construção em forma de pirâmide, do topo da qual se eleva uma forte luz em direção ao céu. A imagem aproxima-se de um prédio que, pela infinidade de luzes que se superpõem em seus andares, podemos presumir ser de uma altura espantosa.

Começamos, desde já, a trabalhar em meio a uma série de contrastes como este que coloca uma cidade plana, da qual nada a não ser algumas luzes podemos ver, ao lado deste edifício de dimensões monumentais.

O espantoso, entretanto, vai ocorrer quando as imagens penetram o interior do edifício. Um carro que voa nos faz esperar por uma sociedade onde o desenvolvimento tecnológico seja realmente algo digno de nota. Mas, a sala que nos será mostrada a seguir nos aponta para uma direção um pouco diferente. Vemos uma pessoa que fuma, iluminada por uma contraluz muito forte que nos mostra o ambiente tomado inteiramente por uma névoa bem espessa. Sob o teto, pende um ventilador que gira lentamente, como se a manter o ritmo exigido pela densidade do ambiente no qual se encontra, e como a servir de mediação entre o que nos é mostrado e o que nós conseguimos através dela vislumbrar. A luz penetra a sala por cima, vinda de uma janela que se espalha por toda a parte alta da parede, e que parece ser a sua única fonte de iluminação.

Isto contrasta com o aparelho de leitura de retina que esta pessoa abre sobre a mesa para examinar, como se fosse um detector de mentiras futurista, o olho de um suspeito de ser um replicante, versão extremamente desenvolvida de robôs, feitos à imagem e à semelhança do homem e com os quais se confundem. E um aparelho curioso, que levanta uma lente que é focada no olho daquela pessoa e que transfere a sua imagem em close para um monitor de televisão. Através dele pode-se medir a flutuação da pupila ou a dilatação involuntária da íris, método mais sofisticado e preciso do que a alteração das pulsações dos detectores atuais. O investigador, ao perguntar sobre as boas lembranças que Leon tem de sua mãe, recebe um tiro de uma arma que também, como o resto, mostra-se curiosa. Ele a segura em sua mão, o que nos mostra suas pequenas dimensões. Mas, o seu poder de fogo é espantoso. O primeiro tiro que ele dispara vai atravessar não só o corpo de quem lhe fazia as perguntas, como também a mesa, a garrafa térmica e a cadeira sobre a qual se sentava. Além disso, o impacto que vai causar joga-o através da divisória da parede que acaba quebrando-se por inteira. O segundo tiro, dado nas costas da cadeira, joga-a com violência contra uma outra mesa que se encontrava na outra sala. De pequenas dimensões, esta arma nos reserva explosivas surpresas.

Outros momentos ressaltam a tecnologia avançada da época. Nos letreiros na abertura do filme já se falava dos robôs Nexus 6 de alta tecnologia, além da exploração e colonização de outros planetas.

Na casa de shows onde Deckard vai fazer a investigação sobre a cobra, ele utiliza um videofone para entrar em contato com Rachel em sua casa. Zhora toma banho e se seca em um secador de corpo inteiro que existe ali no banheiro. Andando pelas ruas, podemos ver uma série de pessoas que carregam seus guarda-chuvas, que se distinguem dos atuais por serem os seus cabos hastes luminosas.

Os carros, que logo nos serão mostrados com detalhes, levantam-se verticalmente como helicópteros, encolhem as suas rodas para dentro e saem voando como pequenos aviões. Apresentam, em seus painéis, radares digitais que permitem sua locomoção segura e controlada, bem como garantem aterrissagem precisa no topo dos edifícios.

Nas formas de exibir as propagandas podemos ver os mesmos avanços tecnológicos. Várias laterais de altos prédios são completamente tomadas por outdoors eletrônicos que os transformam em gigantescas telas de televisão. Até mesmo outdoors ambulantes nós podemos ver cruzando os céus, com seu formato arredondado e cheio de luzes, como se fossem grandes moscas a carregar um painel luminoso contendo as últimas atrações de vendas, e correndo, literalmente, atrás de seu público potencial. Nada mais eficaz, pois você não precisa nem mesmo mais ir até ela. Agora, no mundo do futuro, ela mesma se dirige até onde você está. Basta olhar para cima.

Mas, o lugar de ouro da civilização de amanhã parece estar destinado à perfeição das imitações que se faz dos seres vivos. No decorrer de suas buscas, Deckard vai atrás de informações que consegue com um fabricante de cobras sintéticas. Elas são absolutamente perfeitas, não só em sua aparência e sua textura como também em seus movimentos, como podemos ver pela língua que se agita em sua cabeça. Como também o é a coruja que Tyrell tem em seu escritório e em seu apartamento. Ela é perfeita, em sua confecção e em seu vôo. Apenas o seu olhar, o reflexo da luz em sua pupila que se mostra vermelha ao fundo, nos induz a lembrar que aquele animal que nós vemos não é um animal de verdade. Como no exame, é o olho que nos traz as possibilidades de surpresas e de descobertas, algumas insuspeitas.

O escritório de Tyrell nos mostra mais momentos desta tecnologia. Seus ambientes são largos, com amplas janelas que nos deixam ver prédios também gigantescos que se elevam ali ao lado. Quando Deckard pede para diminuir a iluminação, um véu parece descer por dentro do vidro, como a aumentar-lhe a opacidade internamente e não, como seria de se esperar, apenas cortar-lhe a luz por meio de uma persiana que se colocasse à sua frente.

No prédio de Deckard, o elevador obedece a comandos vocais ao mesmo tempo que checa a identidade vocal de quem lhe dá o comando. Em sua casa, também um lugar muito alto, 97° andar, a porta se abre com um cartão eletrônico e as luzes se acendem automaticamente conforme ele se move de um ambiente para outro. O seu digitalizador de imagens também é mostra desse futuro, pois obedece às suas ordens através do simples comando de sua voz.

Mas, ao contrário do que poderíamos esperar de um mundo do futuro, a tecnologia não transforma este mundo em um mundo homogêneo em sua configuração.

Todos os ambientes são permeados por essa densa névoa que parece envolver o planeta como um todo, e que se mistura com a incessante fumaça dos cigarros que são fumados em profusão. Mesmo o escritório de Tyrell, o mais claro dentre todos, também parece estar iluminado somente por fora, mas, neste caso, por uma luz amarelada e espessa e não azulada como nos outros. A delegacia de polícia não foge a este padrão, sendo também tomada por uma fumaça que parece brotar do próprio ambiente na qual se encontra. Mesmo a casa de Deckard, com suas luzes automáticas, e a de Sebastian, com seus autômatos ambulantes, parecem apenas estar iluminadas por esta luz exterior que tudo invade e que a tudo dá esta espessura que reforça a densidade dramática da história a que estamos assistindo, como se olhássemos para uma sucessão de pinturas de Caravaggio.

O grande contraste, entretanto, ficará visível nas ruas e lugares públicos. Se os espaços internos são em geral amplos e vazios, os espaços públicos parecem tomados pelo seu inverso, aparecendo sempre entulhados de coisas e pessoas. As ruas estão sempre apinhadas, com um monte de gente se empurrando pelos caminhos, em um ir e vir incessante que parece ter tirado todo mundo de casa na mesma hora. Elas são estreitas e podemos ver uma imensa quantidade de dejetos, velhos aparelhos, papéis e coisas jogadas por todos os lados, sempre acompanhados de fumaças que saem de buracos por todo o chão. E como se a Terra, e as suas antigas ruas, tivesse transformado-se em grandes lixões a céu aberto. Todas as cenas externas são realizadas em tomadas muito fechadas, que não nos permitem ver muita coisa, sendo que a visão de quem está lá é sempre atrapalhada por uma imensidão de transeuntes que passa por trás e pela frente de quem estamos vendo.

O céu que tudo envolve é dominado por uma eterna escuridão, na maior parte das vezes. Em apenas um momento podemos ver algo um pouco diferente disso, quando Deckard dirige-se voando para o encontro com Tyrell e Rachel. O mundo, naquele instante, parece tomado por uma luz amarelada, ao mesmo tempo que podemos ver um sol que brilha ao céu mas que parece, ao mesmo tempo, estar sendo filtrado por algo muito espesso pois a luz que irradia é extremamente fraca. Mas, ao chão esta luz parece nunca conseguir chegar. As mas são sempre escuras, com anúncios de néon a piscar por todos os lados, enquanto uma chuva intermitente não se cansa de cair sobre elas e sobre todos os que vivem neste mundo. Chove por todos os lados. Até mesmo dentro de alguns edifícios a chuva não pára de cair, como vemos quando Sebastian entra em seu prédio, que tem todo o seu hall inteiramente tomado por poças d' água e por goteiras, como o está também a sua própria casa.

O curioso é que, enquanto as ruas estão superpovoadas, tomadas por essa inigualável multidão, os prédios que nos são mostrados parecem não serem habitados por ninguém. Nas várias vezes em que acompanhamos Deckard em sua casa, nunca mais ninguém foi visto andando por ali. Da mesma forma que Sebastian comenta que não existe mais ninguém habitando o prédio onde mora. Ele também é escuro e iluminado apenas por nesgas de luz que teimam caprichosamente em se esgueirar por entre suas paredes, às vezes fruto de uma luz muito forte que parece proveniente de um farol que gira sobre todos sem parar, reforçando com a sua circularidade a escuridão sem fim que parece ter se abatido sobre tudo e sobre todos. Não deixa de ser curioso que as ruas estreitas e superpovoadas sejam contidas por estes imensos espaços vazios e desabitados. Existe por lá toda uma imensa população que parece, estranhamente, não habitar em parte alguma. É como se a rua, mesmo estas ruas escuras, sujas, chuvosas e entulhadas, fosse o lugar possível de se tentar recuperar algum tipo de humanidade perdida.

Os ambientes são sempre frios, com imensas paredes que parecem herdadas de um passado longínquo e que se erguem imponentes em sua escuridão apenas reforçando o lugar ínfimo que os homens ocupam neste novo mundo. São ambientes recortados, ao mesmo tempo que amplos, com as paredes tomadas por placas com estranhos desenhos e que se repetem monotonamente com o mesmo padrão, sempre em tons escuros e sujos, sempre a desdobrar a ausência de vida que parecem confinar entre as paredes que contém.

A única exceção relativa a esta forma de habitar parece a ser casa na qual mora Tyrell. Suas portas são largas. Seu chão é brilhante e suas paredes são altas. Uma delas, significativamente, apresenta como decoração dois pedestais sobre os quais se podem ver duas águias de bronze. Grandes colunas erguem-se pela sala, em volta de uma imensa mesa, reforçando a sensação de estarmos caminhando pelo meio de um palácio. Sua janela, a única que vai até o chão de todos os ambientes pelos quais passamos, nos mostra a altura na qual estamos e de onde podemos vislumbrar este conjunto de edifícios em forma de pirâmides, com o sol brilhando ao lado, o que nos remete obrigatoriamente ao topo social de uma sociedade com o gigantismo monumental que a imagem de seus prédios parece desdobrar. É exceção relativa pois, mesmo banhada por esta luz diferente, esta casa também não deixa de ser um ambiente inteiramente recortado pelas sombras que o invadem e pelos reflexos que por ali se espalham e que, por esta estranha simbiose entre matérias diferentes, não nos permite ter uma visão clara e completa das coisas que envolve, sejam elas espaços ou pessoas, atitudes ou sentimentos. Mas, afinal das contas, quando é que a temos?

Esta mistura se expressa também no que podemos ver dos ambientes externos. As mas parecem sempre tomadas por uma infinidade de pequenos lugares para comer que estão sempre fazendo frituras, invariavelmente dirigidos por orientais. A língua que se fala é uma mistura de várias línguas, inglês, espanhol, japonês etc. Mas, mesmo estes lugares, aparentemente resquícios de um passado distante, não são impermeáveis à tecnologia. A mesma banquinha que vende cozidos de peixe, que se comem da mesma maneira de antes, possui um microscópio tão poderoso que consegue ler o número de série de uma escama, que Deckard havia encontrado na banheira do quarto de Leon, impresso em uma de suas estruturas moleculares. O mesmo acontece no bar onde dança Zhora, um lugar confuso como todos os outros, cheio de gente vestida com modelos anos 40, mas que possui um show de dança com uma sofisticadíssima cobra artificial. Ou, como observamos nas imagens da casa de Sebastian, onde seus bonequinhos robôs convivem com ratos que vemos passear por cima da mesa. Todos os lugares e ambientes espelham esta multiplicidade difusa e desconexa, que coloca de maneira constante e incessante o novo no meio do velho. Nenhum lugar é inteiramente novo. Nenhum, também, é inteiramente velho. Mas, parece que aqui alguma coisa está invertida, pois não é o velho que surge no meio do novo, como um resquício impertinente e renitente do passado. Ao contrário, é o novo que emerge no meio do velho, mostrando a sua resistência ao lado de sua persistência. Devemos ressaltar, além disso, que todos espaços do filme são cortados, por um lado, pela superposição de imagens de objetos que os seccionam à nossa frente e, por outro, pelas sombras que esta iluminação peculiar rebate em suas paredes, quando eles mostram-se amplos e vastos, sempre no sentido de criá-los pesados e opressivos, o que vai aumentar, pela sua própria indefinição, a apreensão que a história deveria desdobrar em nós.

Assim convivem, lado a lado, a mais alta tecnologia e os ambientes mais áridos e rudimentares, mostrando-nos que a relação direta entre desenvolvimento tecnológico e melhoria da qualidade de vida pode ser, ela sim, uma ficção. Nada parece nos garantir que uma venha junto com a outra, da mesma forma que a possibilidade de colonizar outros planetas não conseguiu fazer com que a própria Terra se tornasse um lugar primoroso para se viver. Pelo contrário, parece ser o lugar onde ficaram somente aqueles que não conseguiram ir para algum outro, como insinua Sebastian, ao dizer para Pris que ficou aqui apenas por não ter conseguido passar no exame médico. Apesar de ser ele um engenheiro genético de altíssima especialização, capaz de projetar máquinas tão bem feitas como os replicantes. Que, na verdade, não são apenas máquinas mas, como lhe diz Roy, "não somos computadores, somos seres vivos".

Tyrell já nos havia prevenido sobre isto, ao dizer a Deckard que eles são "mais humanos que os humanos". Feitos à imagem e semelhança do homem, só que muito melhores, a única coisa com a qual eles não são alimentados na origem é de sentimentos. Mas, como a invenção sempre supera o criador, eles aprendem sozinhos a sentir e, por isso, saem de fábrica com um curioso dispositivo de segurança: seu tempo de "vida" é limitado e em quatro anos eles acabam por se autodestruir, vítimas de um processo de degeneração que lhes é aplicado em sua própria cadeia genética.

É aqui que está a questão central de nossa história. Quatro desses replicantes fogem para a Terra, onde sua presença é proibida e, portanto, onde são caçados até se conseguir exterminá-los ou, como se diz no filme, removê-los. Deckard, um antigo blade runner, ou caçador de andróides, como o título brasileiro vai correndo nos anunciando por não gostar de mistérios, é intimado a voltar à ativa e caçar estes fugitivos que quiseram vir para um lugar de onde todos parecem é querer sair. Mas, é evidente que este não é o assunto de fundo que o filme nos coloca, e que o leva para muito longe do que seria um mero filme de ação policial.

A questão crucial que está ali imersa, e que vai ser perseguida por todos e em todos os instantes, é relativa ao tempo, ao tempo que nós temos, ao tempo de vida que comanda nossa existência. Todos estão, na verdade, em busca do tempo perdido.

Os replicantes sabem quando foram feitos, mas não que vivem apenas quatro anos, apesar de terem conhecimento que sua temporalidade é limitada. É, portanto, em busca deste segredo, que pode significar também a possibilidade de adiar o seu próprio fim, que eles desembarcam na Terra em busca de informações que lhes possibilitem alterar o ritmo do inevitável. Mas, mesmo esta idéia é permeada de meandros e sutilezas que acabam por fazer a sua jornada muito mais complexa e a nossa muito mais intrigante e interessante.

Todas as pistas nos são dadas no momento em que, investigando o quarto de Leon, Deckard encontra escondida no fundo de uma gaveta uma série de fotos que os replicantes tiravam de si mesmos com freqüência. Isto o deixa intrigado, por não conseguir entender as razões pelas quais eles tiravam e guardavam estas fotos. Mas, pensando as fotos como paralisações de tempo, no sentido de um recorte do fluxo temporal, se por um lado elas poderiam ser percebidas como petrificações deste tempo, por outro, nada mais fariam do que ressaltar, pela pseudo-presença deste mesmo tempo, os indícios de sua ausência1 1 Sobre as relações entre tempo e imagem cf. outras discussões em Menezes (1996, p. 83-85 e 1997, p. 33-46). . Como se fosse uma prova negativa, a existência das fotos dá a eles o que eles não possuem: um passado, uma história, uma vida inteira, com começo, meio e fim. São, portanto, a prova definitiva de que eles possuem um passado, que seu tempo transcorre como qualquer outro, como o de qualquer outro.

A trajetória dos replicantes em busca deste tempo inexistente vai seguir o mesmo caminho que nossos olhos se esforçam em iluminar. Eles também começam pelo olho, o mesmo olho das imagens do começo que pareciam nos querer dizer que somente através deles poderíamos enxergar alguma coisa. Olhos que são o caminho e o passaporte para se chegar a algum lugar, pois são eles que podem dizer quem são os replicantes para alguém que possua os olhos treinados para percebê-lo, para distingui-los dos humanos. Olhos... Eles são o centro das possibilidades. Eles são o elemento fundamental que pode diferenciar o joio do trigo. Tudo parece resumir-se a uma simples questão de saber ver, e de saber compreender aquilo que se vê. Neste sentido, é aqui que vão se colocar as mais intensas e profundas dificuldades.

O mundo é absolutamente límpido e sem mistérios para o chefe de polícia, que chama os replicantes de monstrengos, como que a demonstrar um grande ressentimento em virtude de sua própria aparência, esta sim não "muito" bela. Isto, entretanto, não parece ser tão claro para mais ninguém. Deckard sente-se mal quando atira em Zhora pelas costas, quando ela está fugindo. A cena é toda em câmera lenta e podemos vê-la ser atingida pelos tiros e, ao cair, quebrar uma série de vidraças que estão no seu caminho. Ouvimos o som de seu coração bater cada vez mais forte enquanto corre. Deckard se aproxima com o andar cambaleante e com o rosto tomado pela apreensão e pelo mal estar de ter sido obrigado a atirar em alguém, quando o vemos olhar para baixo atordoado e suspirar com desconsolo, com a respiração ofegante. Nada é muito claro e toda a indefinição dos espaços que nos cercavam agora parece tomar conta dos tempos que nos penetram.

Não é sem sentido o fato de que eles começam a sua busca pela fábrica de olhos, um lugar tão entulhado e esquisito como os demais. Mas é com Sebastian que as relações vão se tornar cada vez mais complexas. Ele é, como dissemos, um engenheiro genético. Ele se encontra com Pris, que se esconde no meio dos entulhos na porta de seu edifício, e a convida para subir. Em um certo momento, Sebastian começa a desconfiar deles pois, excelente observador que é, percebe que ela e Roy são muito diferentes, são muito perfeitos para serem humanos. Talvez porque todos os humanos que aqui estão mostram-se muito mais imperfeitos que aqueles que os imitam, que são mais fortes, e, no caso de Pris, Roy e Rachel, mais perfeitos e bonitos. Os humanos, por sua vez, mostram-se cheios de defeitos.

Gaff, o estranho policial - que fala pouco e passa o seu tempo fazendo origamis que vai soltando pelos lugares por onde passa, como a nos deixar pistas de algo que ainda não percebemos - tem em seu próprio rosto as marcas desta confusa percepção das coisas, não só por seu rosto apresentar traços orientais e ocidentais, como, principalmente, por ser seu olho quase transparente, por parecer ser cego mas conseguir ver. Sebastian é a expressão patente desta dissincronia pois seu rosto todo enrugado nos mostra uma imagem incompatível com os 25 anos que ele diz a Pris ter como idade. Ele, criador genético de uma série de seres perfeitos, carrega em si mesmo a marca das imperfeições que tenta corrigir nos outros, melhor dizendo, da imperfeição subcutânea que insere em todos os replicantes perfeitos, de última geração. Por possuir a "síndrome de Matusalém", que causa a degenerescência avançada das glândulas, ele acaba sofrendo do mesmo mal que os atinge, a precoce e inevitável falta de tempo, que é, também, a aceleração interna de seu próprio tempo. Como o próprio Tyrell, que tem uma inteligência privilegiada, sendo o pai criador de todos os replicantes, mas que nos mostra seus olhos muito imperfeitos, escondidos atrás das grossas lentes trifocais que seus óculos teimam em nos mostrar.

Sua figura é especial, por ser aquele que mora no topo do mundo, por ser aquele que transforma a sua própria solidão e impotência em uma eterna criação de seres mais perfeitos do que ele. O quarto de dormir onde ele recebe Sebastian nos mostra bem como é o seu mundo. Já vimos a sala onde ele convive com as suas estátuas e com bustos como decoração, como se fossem referências imortalizadas de sua própria finitude inevitável. Alguns imortalizam-se nas obras perfeitas que esculpem e que legam à posteridade. Ele imortaliza-se na perfeição das obras finitas que projeta. Que acabam por lhe copiar rapidamente também a inteligência. Além das emoções, que eles parecem aprender no pouco tempo em que vivem, uma cena que passa quase despercebida vai nos mostrar, também, a sua capacidade de tudo aprender com rapidez e perfeição. Roy, olhando para o tabuleiro de xadrez, pergunta a Sebastian se o seu oponente (Tyrell) é mesmo bom. Ele lhe responde que é um gênio, que só conseguiu derrotá-lo uma vez. Momentos antes, ele havia corrigido Roy em um movimento errado no xadrez. Quando estão no elevador para chegar até o apartamento de Tyrell, Sebastian começa a jogar com ele através do alto-falante. Roy sussurra uma jogada que desconcerta completamente a Tyrell, que, através dela vai perder a sua segunda partida para Sebastian. Isto nos mostra o seu grau de perfeição e a rapidez de seu auto-aprendizado, que fez com que a criação finalmente se mostrasse mais inteligente do que o seu criador, como demonstra o sorriso franco que ele solta no momento em que Tyrell reconhece a sua derrota. Derrota esta que, na verdade, vai ser dupla, pois é só neste instante que ele permite a Sebastian (e a Roy) subir até o seu apartamento. Seu quarto espelha o seu ser, com uma gigantesca cama na qual se deita sozinho, ladeada por cortinas e repleta de travesseiros, coberta por lençóis e cobertas brancas, como as antigas camas da realeza medieval. Seu quarto é todo repleto de velas, que vão dar a Tyrell um ar divino, como se acesas em sua própria graça, e que o deixam com a mesma iluminação flutuante e sombria que parece perseguir a tudo e a todos no decorrer do filme. Contrastam, entretanto, com as roupas de dormir e o casaco também brancos com o qual se veste. Sua expressão, ao ver Roy, deixa claro o que vai acontecer. Ele olha lentamente para baixo, sem que sua voz ao falar demonstre qualquer tipo de alteração. Ele reafirma o seu lugar de sempre, superior e prepotente, ao comentar que não é uma coisa fácil encontrar o seu próprio criador. Outro indício deste seu lugar é o fato de falar de si próprio em tom majestoso, em terceira pessoa, no momento em que pergunta a Roy "o que você deseja dele? (o seu criador)". Seu medo se expressa no fato de se afastar quando Roy se aproxima e o chama de fucker. Ele já sabe que Roy deseja escapar da morte, coisa que somente o criador poderia saber como conseguir. Mas que, para seu azar, infelizmente não sabe. O sinal da perfeição de sua criação mostra-se também o sinal de sua própria limitação. "Uma luz que brilha o dobro, vai também brilhar a metade do tempo... e você brilhou com muito, muito brilho, Roy". A sorte está lançada, no momento em que o criador reconhece a perfeição de sua criatura, que se redobra obviamente no reconhecimento de sua própria genialidade, de sua própria perfeição incompleta, em sua fertilidade deslocada. Chama-o de filho pródigo, de um grande orgulho. Roy abaixa a cabeça, sobre a qual Tyrell vai passar sua mão em sinal de compaixão e consolo. Mas, quando Roy o pega pelo rosto o final é inevitável. Ele dá em seu criador o beijo da morte, e esmaga o seu crânio dando-lhe a mesma coisa que dele havia recebido como presente de vida: a própria morte.

Voltemos às fotografias. É através delas, das que Deckard acha na casa de Leon, que ele vai conseguir chegar até Zhora. Com o seu digitalizador de imagens, consegue investigar os segredos que aquelas fotos escondem, que elas sempre escondem. Desconfiando do modo como Roy está sentado, como o fotógrafo de Blow Up, segue as linhas do olhar e encontra um outro corpo no quarto ao lado. Lá, através da imagem de um espelho convexo, pode vislumbrar algo brilhante que lhe chama a atenção, e que ele vai descobrir estar no braço de uma mulher que consegue ver pela imagem de outro espelho que está na porta do armário e que se reflete neste, duplamente desvelador. As imagens parecem ser o elemento fundamental que pode nos levar a alguma descoberta, neste mundo onde tudo é enevoado e obscuro, onde as imagens se refletem e se desdobram, onde nada se dá com clareza para os olhos apreciarem. Neste novo mundo, novamente as imagens adquirem o seu lugar de referência primeira sobre a qual se constroem todos os significados. Não só aqueles que nos dizem quem somos, mas, e principalmente, aqueles que nos dão pistas para descobrirmos aquilo que fomos, e que não deixa de se redobrar naquilo que pensamos que somos.

Elas são a referência confiável de nossa humanidade original, ao nos mostrar através delas a existência de um passado que podemos resgatar como sendo o nosso, como sendo parte de nossa história. E não é por outra razão que Rachel, já desconfiada das origens de sua existência anterior, mostra para Deckard uma foto em que está com a sua mãe, tirada quando ela era "pequena", e que, como as imagens não mentem, deveria bastar como prova suficiente de que seu passado era realmente seu, e verdadeiramente passado. A crença nessa pseudo-veracidade das imagens mostra-se como a prova do engano, na mesma dimensão de sua própria confiabilidade. Ao ser uma prova da "paralisação" do tempo, ao mostrar a nossa própria imagem enquanto passado, conseqüentemente, mostra também a realidade de nossa existência neste presente. É ela que nos fornece a relação entre tempo e memória, que nos mostra qual é o nosso sentido no mundo em que estamos, qual é o fundamento de nossa própria identidade. Sem memória não temos identidade. Sem passado não temos identidade. Sem ambos nós simplesmente não existimos. Perdemos a nossa consistência ao perdermos os nossos caminhos trilhados, que vão tirar a certeza de quem nós somos. É por isso que Rachel se agarra tanto à prova "irrefutável" de sua existência anterior, que, ao lhe dar uma comprovação de seu passado, lhe dá ao mesmo tempo a prova irrefutável de seu presente humano, garantia inexeqüível da possibilidade de seu futuro, mesmo que incerto, como o de todos nós.

Aqui colocam-se também os fundamentos das dúvidas que começam a tomar conta dos pensamentos de Deckard. Quando ele conversa com Tyrell, espantado com o fato de Rachel não saber que era uma replicante, o que tinha feito o seu teste ser mais longo do que o normal, ele também surpreende-se com a capacidade tecnológica que se tinha adquirido para até mesmo implantar-se memórias, para que fosse possível se inventar um passado. Para Tyrell, isto seria uma forma de diminuir a ansiedade e a obsessão que os replicantes sentiam por terem tão pouca experiência emocional, por serem tão imaturos. Ao mesmo tempo, serviria para aumentar a confiabilidade no controle que se poderia exercer sobre eles. Ao lhes dar uma identidade segura através de um passado reconhecível, Tyrell pensava garantir a segurança de sua existência presente e pôr um final nas suas buscas por um tempo maior de vida pois, neste caso, ele pareceria ser mesmo ilimitado. Não podemos nos esquecer que Leon matou seu investigador exatamente no momento em que este lhe perguntava sobre as boas lembranças que ele tinha de sua mãe. No momento em que ele era questionado exatamente sobre o que era fundamental nas buscas dos replicantes: a compreensão de sua origem e de sua temporalidade, elemento decisivo para que se pudesse alterar os limites de seu futuro, devolvendo-lhes assim a sua própria história2 2 Aqui nos contrapomos às interpretações de Carlos Eduardo Lins da Silva, que ao ver esta busca como uma expressão do tempo "pós-moderno" afirma que os replicantes vivem só no presente (cf. 1991. p. 53). .

Mas aqui, sem ser percebida uma outra dimensão de questionamentos vai aparecer implacavelmente. Se podemos finalmente enxertar em alguém o seu passado, construindo com ele as suas memórias, prova de sua existência e humanidade, como poderemos nós mesmos, a partir daí, ter certeza de que aquele passado que temos e assumimos como nosso é realmente algo que nós possuímos e que nós realmente vivemos? Se, no limite, perdemos até esta certeza mais primordial, como poderíamos nos distinguir daqueles que foram feitos para serem exatamente como nós, nossos duplos mais que perfeitos?

A busca destas respostas parece jogar uma indefinição em todos os nossos pressupostos, como as imagens do filme vinham nos fazendo desde o seu começo. Aqui, entre os humanos, parece não haver nenhum tipo de relacionamento mais próximo. A única cena de carinho que pudemos presenciar ao longo de todo o filme, com exceção das que ocorrem entre Deckard e Rachel, foi a de um beijo rápido e forte entre Roy e Pris. Que ele viria a dar suavemente de novo, ao encontrá-la morta. Não estaria o filme, durante todo o seu decorrer, questionando-nos sobre os lugares e os critérios que definem aquilo que temos como mais isento de dúvidas: a nossa própria e insuspeita humanidade? Ou, mais contundentemente, questionando os valores que definem o que somos e, principalmente, como nos vemos?

Esta troca de lugares parece estar presente em quase todas as pessoas. Devemos nos lembrar que Rachel salva Deckard de morrer nas mãos de Leon. Ela mata, ali, um daqueles com quem em princípio deveria estar se aliando, movida pelas últimas descobertas de que seu passado era, na verdade, o passado implantado da sobrinha de Tyrell. Quando Roy aparece de surpresa no apartamento de Sebastian, toda a demonstração de apreensão e de medo nos chega através da expressão de temor que o seu boneco - de nariz comprido com ponta vermelha e roupa de soldado - exala pelo movimento ininterrupto de seus olhos. Deckard, por fim, ao se apaixonar por uma replicante parece também não querer aceitar sem questionamentos o lugar pressuposto no qual todos tentam se colocar mas no qual não conseguem estabilizar-se nunca.

É no registro desta perspectiva que gostaríamos de investigar as imagens que Deckard recorda ao sentar ao piano de sua casa.

Imersos que estamos nestes ambientes sempre sombrios que se furtam a serem apreendidos completamente, vemos Deckard com a cabeça recostada dedilhar suavemente as teclas do piano. É um piano cheio de memórias, cristalizadas pelas fotos que ostenta sobre ele. Enquanto está lá, perdido em seus pensamentos, as imagens começam a ficar mais claras e nos mostram uma cena totalmente diferente das que vínhamos acompanhando. Somos invadidos por esta imagem muito amarela, um amarelo mais claro e brilhante que os poucos ocres que havíamos visto até então. Temos ali a visão de uma floresta, tomada pela mesma névoa que acompanha o filme, mas que de seu brilho inusitado nos deixa perceber um cavalo que corre em câmara lenta por entre suas árvores. Quando ele se volta, e vem em nossa direção, podemos perceber um fino chifre que lhe sai da cabeça e que se mostra fino e comprido quando ele vira o pescoço bem em frente de nós. O rosto de Deckard se volta para as fotos que ele colocou sobre o piano, que nos mostram o que devemos pressupor ser a sua família, ou ex-família, seus pais, seus parentes, dos quais até agora não tivemos nenhum outro indício, além das próprias imagens que ali estão. Mas, ao questionar as imagens que Rachel tinha de seu passado, não terá ele também colocado dúvidas sobre as imagens que ele mesmo, Deckard, guarda saudosamente como indícios de uma vida anterior? Não começará ele também a duvidar de sua própria história, de seu próprio caminho, que pode ser apenas como o de Rachel, um nada transposto de outra pessoa?

Imerso nestes pensamentos, Deckard leva Rachel ao seu apartamento, logo após ela ter salvo a sua vida. Com exceção das cenas do unicórnio e as da casa de Tyrell, os únicos outros momentos em que o filme abandona a luz azul e fria que domina todos os seus espaços e espíritos sombrios são os que nos mostram os encontros de Deckard e Rachel. A iluminação parece atingir ali uma coloração mais sépia, adquirindo um tom quente que envolve com seu calor não apenas os personagens que ali estão mas até nós mesmos que a vemos com olhos diferentes daqueles com que quase havíamos nos acostumado. São os poucos lugares onde o calor da existência parece não discriminar "humanos" e "não-humanos", criadores e criaturas, que a partir de um certo momento nem nós mesmos conseguimos identificar tão bem.

São momentos de extremo carinho. No primeiro encontro entre os dois, após Deckard ter, de maneira um pouco ríspida, falado de dados insuspeitos do passado de Rachel para lhe comprovar que sua história nada mais era do que um monte de imagens implantadas e retiradas de outro lugar, ao qual ele como policial poderia ter acesso, a reação de Rachel é singular, pois de seu rosto cabisbaixo podemos apenas ver uma suave lágrima que escorre de seus olhos entristecidos. No segundo, mesmo envolta em um espesso casaco, Deckard lhe pergunta se ela está tremendo, tendo assim a mesma reação que ele tem quando atira em alguém, mesmo sendo este alguém um "replicante". O que mostra quão pantanoso é o terreno que separa estas duas formas de existência e os valores que elas implicam. Deckard não consegue nunca se referenciar a eles com a frieza de Bryant, o chefe de polícia, e nem mesmo com a ambigüidade que os atos e os olhos de Gaff resplandecem. Ele não consegue mais avaliar para distinguir, valorando a vida em detrimento de uma hierarquia (des) qualificadora.

Ao negar esta pressuposição de lugares determinados que definem não só o que somos mas também o que devemos fazer e conseqüentemente sentir, Deckard finalmente se deixa envolver por Rachel. A cena é especial. Tentando soltar algumas palavras de alívio para que Rachel consiga atenuar a sua dor por ter matado alguém, ele a olha para dizer como consolo que aquilo faz "parte do serviço". A reação de Rachel é incisiva. Podemos ver apenas os closes de seus rostos. Com a voz baixa e triste, ela o olha para dizer que aquilo não faz "parte do serviço". Deckard desvia seu olhar suavemente para o lado, demonstrando o seu desalento pela frase infeliz que agora ele se deu conta de ter pronunciado. Rachel o olha novamente nos olhos para, então, recolher o seu olhar virando o rosto lentamente para o chão, iluminado apenas por uma luz aconchegante que a envolve tanto quanto o macio casaco de peles com o qual se protege. Um leve e quase imperceptível sorriso amargurado se esboça em seus lábios quando ela pronuncia, com a voz embargada, que ela é o serviço, enquanto um suspiro toma conta de seu peito. Quando ela dele se aproxima no banheiro, seus olhos borrados nos comprovam que ela chorou. Tomada pela indefinição de sua própria origem, pergunta a Deckard se ele conhece a data que, ao lhe dizer sobre o seu nascimento também lhe mostrará o limite de sua própria vida. Mas ela não vai guardar esta indefinição apenas para si mesma. Vai transferi-la também para Deckard, ao perguntar-lhe seja havia sido feito com ele o mesmo teste que ele aplicava nos outros. O seu silêncio é sintomático, fruto das dúvidas que parecem dele haver irremediavelmente também tomado conta. Ela senta-se ao piano para olhar as fotos que ali estão. Seu tocar gracioso acompanha a dissolução da impecabilidade de sua imagem, que ela ostentava até então. Solta seus cabelos, o que reforça a beleza de seus traços. Deckard a beija no pescoço e ela se levanta e se afasta correndo para ir embora. Tomado por uma recaída de "macho", como a comprovar a sua humanidade que fora colocada em suspeição, ele agarra a porta que ela começou a abrir e a fecha de uma maneira brusca. A seguir, empurra-a com vigor em direção à parede e, colocando as mãos em seu rosto, beija-a profundamente. Ela ainda tenta resistir mas não consegue, enquanto ele a faz repetir que o quer, que o deseja.

A luta entre Deckard e Roy vai nos mostrar o outro lado desta complexa equação. É a luta final, entre a vida e a morte. Roy é o último que restou, pois Pris já está morta. Ele parece se divertir com Deckard, como se tudo não passasse de um grande jogo, expresso no momento em que pega sua mão, quebra dois de seus dedos para depois devolver-lhe a arma. Seu momento de profunda emoção nos é mostrado quando ele, sobre o corpo de Pris, chora a perda de sua companheira. Ele vai continuar a perseguição a Deckard sobre os telhados, sempre banhados pela chuva ácida incessante que parece nunca ter um fim. Mas, no meio do caminho, seu próprio corpo começa a dar mostras de degenerescência, por movimentos de contração involuntária que tomam conta de seus dedos e que os fazem contraírem-se. Lá em cima, Deckard erra um salto de um telhado para outro, e fica pendurado em uma viga, tentando segurar-se para não cair lá embaixo. Roy segura uma pomba branca com o olhar pensativo, volta-se e, em um pulo perfeito, coloca-se no mesmo telhado em que Deckard tentou chegar. Olha-o com seus profundos olhos azuis. Ele lhe pergunta se não é uma grande experiência viver com medo, da mesma forma que Leon lhe havia perguntado pouco antes de morrer. Ambas as perguntas nada mais fazem do que ressaltar a experiência que eles próprios tinham durante toda a sua curta vida, o medo de não saber o quanto se vai viver, qual é o seu dia final. "Isto é que é ser um escravo", ele nos diz deixando claro a apreensão que esta indefinição trazia. Ser um escravo de seu tempo incerto, ser escravo de um passado inexistente, ser escravo da ausência de identidade que só o a memória do tempo que vivemos pode nos dar.

O sorriso nos lábios de Roy prenuncia o seu fim, no momento em que Deckard já sem forças abre a mão e começa a cair. Mas Roy, em sua perfeição inigualável, é mais rápido que o corpo que cai e o segura, exatamente com a mão que começava a morrer. Ao puxá-lo novamente para o telhado, sob o olhar de espanto de Deckard, que parece não estar acreditando em seus próprios olhos, Roy senta-se e pronuncia suas últimas palavras. "Eu vi coisas que vocês não acreditariam. Naves de ataque em chamas nas bordas de órion. Vi a luz do farol cintilar no escuro na Comporta de Tannhäuser. Todos estes momentos se perderão no tempo... como lágrimas, na chuva". Sua voz é pausada e calma, em contraste com a vigorosa perseguição que eles faziam até então. Deckard o olha com os lábios abertos, ainda tomado pelo espanto do que estava presenciando e que o confundia mais do que nunca. O rosto de Roy, escurecido pela luz que ao brilhar por trás contorna-o e o transforma em uma auréola de vida, tomado pela chuva que escorre em suas faces, mostra-nos a tristeza que parece ter tomado conta de seu ser, que tem os minutos contados para apagar a sua luz e levar com ela tudo aquilo que representa a nossa humanidade: a nossa história, as nossas memórias, o nosso passado. Assim, não somos tomados de surpresa no momento em que ele anuncia que é tempo de morrer. Já sabemos que não é de Deckard que ele fala, mas de si mesmo. Um derradeiro sorriso se insinua entre seus lábios, antes que seu rosto se volte lentamente para baixo, para restar ali, tristemente estático, com os pingos de chuva a escorrer pelo seu rosto agora inerte. Deckard ainda parece não acreditar que Roy, em seus últimos momentos de vida, tenha mostrado ter aprendido a lição definitiva em sua capacidade de tudo fazer com perfeição, a ponto de passar não só a lutar pela vida, como ele perseguia insistentemente desde o começo, como também passar a compreender de maneira profunda o seu próprio valor (o inigualável valor da vida). Ao torná-lo um valor seu, não poderia mais retirá-la de alguém que, como ele, lutava persistentemente para preservá-la e mantê-la, independente de todas as dúvidas, de todas as incertezas. Não poderia retirá-la de alguém que lutava, como ele lutava, incessantemente para viver.

A aparição final de Gaff nos coloca frente à última de nossas incertezas, ao dizer que o trabalho de Deckard terminou. Ele volta inseguro para casa, procurando por Rachel, sem saber se ela está ainda viva. Entra no apartamento e a encontra coberta por um lençol. Ao levantá-lo, encosta o seu rosto sobre o dela que permanece imóvel e, ao apertar os olhos, começa a chorar suavemente. Sentindo sua presença, Rachel acorda abrindo lentamente seus olhos. A partir daí, Deckard inicia a fuga, abrindo a porta e empunhando a sua arma, como a espreitar alguma emboscada. No momento em que ela caminha para o elevador, percebe algo sobre o chão que se moveu quando ela por ali passou. Abaixa-se e pega um origami em papel prateado, com a forma de um unicórnio. Seu sorriso é acompanhado pela lembrança da última frase que Gaff lhe disse, logo após a morte de Roy: "É pena que ela não vai viver [para sempre]. Mas, afinal, quem vive?".

Eles entram no elevador que sobre eles fecha a sua pesada porta. E nada mais vemos do que a escuridão.

Esta cena final nos remete a algumas coisas e imagens que fomos deixando pelo caminho. O origami nos mostra que Gaff passou por lá, e que não quis acabar com a vida de Rachel, mostrando que até ele escondia alguns segredos. Este origami nos lança ainda mais dúvidas sobre o fato de ser Deckard ele mesmo um replicante, como o seu sonho já nos havia levado a pensar. Este unicórnio final nos leva a crer que Gaff sabia disto, mas deixou para ambos as decisões sobre o que fazer com o resto incerto de suas vidas, sejam lá quais forem, pois, agora, todas as certezas foram definitivamente dissipadas.

Em Blade Runner, o tempo é o tempo da própria vida. Que é de quatro anos para os replicantes. A busca do tempo de vida, tempo físico, é também a busca do tempo onde o tempo tinha sentido. Busca, portanto, de suas relações com a memória, não mais vista como algo a ser enterrado e esquecido. Neste sentido é exemplar a história de Rachel. Mergulhada em profundas dúvidas sobre a própria existência, busca nas fotos de si mesma e de sua família as provas de seu passado, as provas de sua passeidade, pois a foto é expressão do tempo paralisado, do tempo de antes, do tempo de sua infância e, portanto, do tempo de sua humanidade, prova inquestionável de sua existência. Os outros replicantes, Roy, Leon, Pris e Zhora, conscientes de sua existência finita, fazem muitas fotos de si mesmos, numa busca incessante de tentar reconstruir, de reconquistar um tempo da memória e da existência, criar para si mesmos as provas de um passado que fosse realmente deles, não tão distante no tempo mas o único a que eles poderiam almejar. Única possibilidade de uma vida de verdade que os tirasse da melancolia de uma indeterminação inesgotável3 3 "Fixado no passado, regressando ao paraíso ou ao inferno de uma experiência não ultrapassável, o melancólico é uma memória estranha: tudo findou, ele parece dizer, mas eu permaneço fiel a esta coisa finda, estou colado a ela, não há revolução possível, não há futuro"(Kristeva, 1989, p. 61). . Que também se espelha na multiplicidade temporal que edifícios e grandes monumentos, com aparência de pirâmides egípcias e ruínas greco-romanas, com ornamentos barrocos e pilastras trabalhadas, vão compor na escuridão de seus cenários futuristas. Um futuro a um só tempo sombrio e obscuro.

Os replicantes refazem o trajeto da experiência. Vão em busca da primeira relação definidora com o mundo, o olhar. Procuram a fábrica de olhos. Querem, de fato, descobrir o sentido da existência. "É doloroso viver com medo". "Nada pior do que uma coceira que não se pode coçar". Não deixa de ser irônico que o humano com o qual eles têm a relação mais próxima, J. F. Sebastian, sofra da mesma "doença" da qual todos eles padecem. Degeneração precoce, curto tempo de vida, deterioração interna de si mesmo. O elo de ligação entre eles vai aparecer pela ausência, pela vida que se escoa rapidamente, sem que contra isso nada mais possa ser feito. Por isto buscam a vida, o poder da criação, o Pai Criador, Tyrell. Ao descobrirem a impossibilidade de terem mais vida, de conquistarem mais tempo, assassinam o pai criador com o beijo da morte, aniquilam o seu tempo antes que o deles se acabe, como ele havia feito com eles antes de nascerem.

A existência de sentimentos é sempre a ligação entre dois mundos aparentemente inconciliáveis. Os replicantes passam a ter sentimentos com o passar do tempo. Rachel chora quando descobre que não é humana. Recobra, através disso, um indício de sua humanidade inexistente.

É neste contexto que se recoloca o problema do sentido da vida. Roy, no fim do filme, ao recusar matar Deckard, recusa-se a matar o que mais procurou durante todo o tempo. A própria vida. Com passado, presente e, portanto, possibilidade de futuro. Curiosamente, com a mesma mão que está ferida, que está morrendo, junto com ele. A mão que morre é também a mão que pode, em um único momento, dar ao outro o que ele queria para si mesmo em sua busca incessante: a vida. Assume, neste momento preciso, o lugar do Pai Criador, único instante em que consegue escapar de sua própria esterilidade, único momento em que detém o controle e o poder sobre a vida e a morte. Sobre a vida e a morte do outro. Adversário que é, ao mesmo tempo, receptáculo do que mais anseia. Tempo e memória. Vida.

Em Blade Runner todos são sós. A exceção irônica está justamente nos replicantes que formam uma estranha "família" que luta insistentemente para constituir a sua própria identidade, para reconhecerem-se como seres físicos, como seres vivos.

Para Deckard, o problema eterno é descobrir quem é humano. Por isso ele é um errante, como também o são todos os replicantes. Eles são, ao mesmo tempo que não são. São exilados dentro de seu próprio corpo, o único lugar onde têm, e só podem ter, uma existência totalmente problemática. Gaff, o policial, parecia o mais não-humano dos personagens. Mas, as soluções são sempre complexas, como a nos mostrar que podemos estar sempre olhando para o lado errado quando encontramos as nossas singelas respostas. Gaff deixa escapar um momento de sensibilidade escondida, quando deixa Raquel viver e, portanto, fugir com Deckard. E, talvez, até mesmo quando deixa o próprio Deckard viver, guardião que parece ser de seu segredo mais profundo. Os replicantes buscam, em todo o seu tempo, uma humanidade-identidade-tempo-memória perdida, não só para eles, mas perdida no próprio homem que vive em um mundo cujo sentido não é mais visível e imediato, onde tudo o que parecia ser fácil transforma-se em indagações que escorrem inquestionavelmente por entre os nossos dedos. Além do fato de ser esta união final problemática por mais uma última indefinição, por ser uma união obrigatoriamente estéril, o que reforça a sua remissão a um futuro ainda mais incerto.

É isto, por fim, o que as imagens de Blade Runner parecem nos querer mostrar. Com um único e curioso senão. Não deixa de ser um fato interessante que, na verdade, não foi este o filme que todos viram durante toda uma década. Aquele que nos foi mostrado, e que passou nos cinemas em todos esses anos, era um pouco diferente deste4 4 É somente a a partir de 1993 que a versão original de Blade Runner, remontada pelo diretor, tornou-se acessível para o público. . Um pouco diferente em suas imagens, mas, entretanto, muito diferente nas possibilidades que nos mostrava e nos significados que sugeria.

Vejamos quais são, fundamentalmente, as suas diferenças.

Ao nível das imagens, elas são praticamente duas. Cada um dos filmes tem uma cena a mais do que o outro. No filme de 1982 não existe a cena do unicórnio, que foi sumariamente suprimida. A cena final também não é a mesma. Após saírem do elevador, eles pegam o carro voador de Deckard e se dirigem provavelmente em direção ao norte, como Rachel havia insinuado. Nesta partida, Deckard comenta para si mesmo que Gaff não sabia que Rachel era uma replicante especial, sem tempo limitado para morrer, enquanto os vemos voando entre montanhas, repletas de árvores verdes, com seus cumes cobertos de neve. Só isto já bastaria para alterar completamente os rumos de nossa história.

Sem a cena do unicórnio, o origami final deixado por Gaff reduzir-se-ia a um mero indício e lembrete de sua passagem por ali e de sua bondade em deixar que Rachel vivesse. Bondade que teria a sua importância mediada pelo fato de que, com os pensamentos finais de Deckard, eles seriam além de tudo fruto de um desconhecimento de sua condição especial de vida longa ou, pelo menos, não intencionalmente curta. A isto se soma aquele "paraíso" na Terra, para onde eles se dirigem e que colocaria ao menos uma indagação na cabeça do espectador: se ainda existia por ali algum lugar bucólico, o que é que todo mundo ainda estaria fazendo em cidades como aquelas?

O outro elemento que completa esta modificação não se dá ao nível das imagens mas ao nível das palavras. Para ser mais preciso, não exatamente dos diálogos mas da introdução de um narrador que, em off, nos vai contando coisas pelo caminho. Este narrador se encarna na pessoa do próprio Deckard, que, desde a sua primeira aparição, começa a nos explicar tudo aquilo que estamos vendo. Como se a desconfiar da capacidade do público em entender o que se estava mostrando; ou como se a desconfiar do potencial das imagens que a ele eram mostradas. Enfim, fruto de uma desconfiança em sua capacidade de ser compreendido, Deckard nos explica o significado das coisas que vê ou que faz. Assim, podemos saber que ele já foi casado, que a língua que se fala é uma mistura de espanhol, japonês etc, que Gaff era um policial, que seu chefe era racista pois chamava os negros de crioulos, que replicantes não tinham escamas, não deveriam ter emoções etc, etc.

Com isto, o filme que nós víamos era um filme que destruía uma grande parte das indefinições que o original deveria portar, como seus elementos constitutivos. Sem essas indefinições, a história transforma-se em uma seqüência de perseguições que brindam o espectador com um happy end pois, além de tudo, além de ser perfeita e linda, Rachel também tinha o seu tempo de vida ilimitado. Isto sem contar com o fato de, nesta versão, Deckard não ter nenhuma base para suspeitar ser ele também um replicante, parecendo que a história se volta para ser um conto de fadas pós-moderno que termina por realizar a união indissolúvel entre o homem e a andróide. A partir disso, não havia mais nenhuma razão para, no fim da década, não se realizar até mesmo a união de uma esposa com o marido morto, como pudemos ver em Ghost.

Preferimos, entretanto, mostrá-lo ainda com o espírito de busca e de incerteza que estavam fundados em sua origem e que são os momentos de suas perguntas mais profundas e de suas respostas mais incertas, que estavam marcados por uma certa percepção de mundo que atravessou alguns lugares da década que então se encerrava. Hoje, podemos perceber como aqueles diálogos aparentemente inúteis tentavam retirar do espectador a possibilidade de duvidar, de no meio de tantas indefinições perguntar-se a si mesmo sobre o seu passado e sobre a sua história, sobre a possibilidade de suas transformações, e, assim, conseguir manter as suas dúvidas e não invadi-las e dissolvê-las em certezas inabaláveis. Nada parece mais atual do que refletir sobre isso agora, neste fim de milênio.

Neste sentido, ao contrário do que víamos, poderíamos, como agora podemos de novo, manter vivas em nós a cena final que dissipa todas as certezas com o fechar-se da porta do elevador.

Poderíamos, portanto, continuar problematizando o impensável, ao lado do que sempre foi dado também como evidente.

"Pena que ela não viverá. Mas, quem vive?"

Recebido para publicação em março/1999

  • Bachelard, Gaston. (1988) A dialética da duração. São Paulo, ática.
  • Benjamin, Walter. (1986a) A imagem de Proust. In:_______. Obras escolhidas I. São Paulo, Brasiliense, p. 36-49.
  • Bruni, J. C. (1991) Tempo e trabalho intelectual. Tempo Social, São Paulo, 3(1-2): 155-168.
  • Cardoso, Irene R. de A. (1995) Foucault e a noção de acontecimento. Tempo Social, São Paulo, 7(1-2): 53-66.
  • Deleuze, Gilles. (1985) L' Image-temps. Paris, Minuit.
  • Foucault, M. (1981) As Palavras e as coisas. São Paulo, Martins Fontes.
  • Goldmann, Annie. (1985) L'Errance dans le cinéma contemporain. Paris, Henri Veyrier.
  • Gross, Sabine. (1992) Film - real time, life time, media time. ( mimeo).
  • Kolker, R. P. (1983) The altering eye. New York, Oxford University Press.
  • Kristeva, Júlia. (1989) Sol negro - depressão e melancolia. Rio de Janeiro, Rocco.
  • Menezes, Paulo. (1996) Cinema: imagem e interpretação. Tempo Social, São Paulo, 8(2): 83-104.
  • _______. (1997) A trama das imagens. São Paulo, Edusp.
  • Morin, Edgar. (1985) Le cinéma ou l'homme imaginaire. Paris, Minuit.
  • Nietzsche, Friedrich. (1982) Le gai savoir. Paris, Gallimard.
  • Peary, Danny. (1989) Cult movies. 2 vols. New York, Delta Books.
  • Powell, Dillys. (1989) The golden screen. London, Pavilion Books.
  • Sartre, Jean Paul. (1996) O imaginário. São Paulo, Ática.
  • Silva, Carlos Eduardo Lins da. (1991) Blade Runner - o caçador de andróides. In: Labaki, Amir(org.). O cinema dos anos 80. São Paulo, Brasiliense.
  • Sorlin, P. (1977) Sociologie du cinéma. Paris, Aubier.
  • Tarkovski, Andrei. (1990) Esculpir o tempo. São Paulo, Martins Fontes.
  • Vogel, Amos. (1974) Film as a subversive Art. New York, Randon House.
  • Xavier, Ismail. (1984) O discurso cinematográfico, a opacidade e a transparência. São Paulo, Paz e Terra.
  • 1
    Sobre as relações entre tempo e imagem cf. outras discussões em Menezes (1996, p. 83-85 e 1997, p. 33-46).
  • 2
    Aqui nos contrapomos às interpretações de Carlos Eduardo Lins da Silva, que ao ver esta busca como uma expressão do tempo "pós-moderno" afirma que os replicantes vivem só no presente (cf. 1991. p. 53).
  • 3
    "Fixado no passado, regressando ao paraíso ou ao inferno de uma experiência não ultrapassável, o melancólico é uma memória estranha: tudo findou, ele parece dizer, mas eu permaneço fiel a esta coisa finda, estou colado a ela, não há revolução possível, não há futuro"(Kristeva, 1989, p. 61).
  • 4
    É somente a a partir de 1993 que a versão original de
    Blade Runner, remontada pelo diretor, tornou-se acessível para o público.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Abr 2012
    • Data do Fascículo
      Maio 1999

    Histórico

    • Recebido
      Mar 1999
    Departamento de Sociologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo Av. Prof. Luciano Gualberto, 315, 05508-010, São Paulo - SP, Brasil - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: temposoc@edu.usp.br