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Representações da crise de 1929 na imprensa brasileira: relações entre história, mídia e cultura

Representations of the 1929 crisis in the Brazilian press: relations between History, media and culture

Resumos

O que o passado ensina sobre a leitura que a mídia faz de crises mundiais, seus impactos no Brasil e no cotidiano das classes trabalhadoras? Procuro responder tal pergunta analisando periódicos como o Jornal do Commercio e o Correio da Manhã, bem como um importante periódico comunista, representante do movimento operário da época, chamado A Classe Operária, ao longo de outubro e novembro de 1929. Pelo conteúdo dos jornais, percebemos duas interpretações para a crise: a da elite carioca, que parece não ter sofrido, pelo menos imediatamente, seus impactos, embora noticiasse suas repercussões no setor agro-exportador (principalmente na cafeicultura paulista) e a dos trabalhadores que, ao que tudo indica, sofreram não só com a crise de 1929, mas com todas as diferentes crises externas e internas que antecederam a Revolução de 1930.

História do Brasil República; crise de 1929; imprensa; cultura política


What does the past teach about the interpretation which media makes about worldwide crises, its impacts in Brazil and in worker classes' everyday lives? I intend to answer this question analyzing newspapers such as "Jornal do Commercio" and "Correio da Manhã", as well as an important communist journal named "A Classe Operária", along October and November of 1929. From the newspapers' content, we can recognize two interpretations of the crisis: one for Rio de Janeiro's elite, which apparently did not suffer, at least immediately, its impacts, although it informed the repercussions on agrarian exporting sector (mainly on Sao Paulo's coffee) and another from workers, who suffered not only with 1929 crisis, but with all the different internal and external crises which happened before 1930 revolution.

History of Brazilian Republic; 1929 crisis; press; political culture


ARTIGOS

Representações da crise de 1929 na imprensa brasileira: relações entre história, mídia e cultura

Representations of the 1929 crisis in the Brazilian press: relations between History, media and culture

Andréa Casa Nova Maia* * Este artigo só foi possível devido ao empenho e à colaboração de Taís Sanchez, Odinei Mota, Fernanda Abreu, Thalita Aguiar, Ítalo Mattos, Ana Paula Santiago e Aline Januario, meus queridos orientandos, que auxiliaram na pesquisa de fontes e formatação do artigo. Uma versão resumida foi apresentada no Congresso de 2010 da LASA (Associação de Estudos Latino-Americanos), Toronto, Canadá, de 6 a 9 de outubro de 2010.

Professora do Departamento de História. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Pesquisadora da FAPERJ. andreacasanova_1@hotmail.com

RESUMO

O que o passado ensina sobre a leitura que a mídia faz de crises mundiais, seus impactos no Brasil e no cotidiano das classes trabalhadoras? Procuro responder tal pergunta analisando periódicos como o Jornal do Commercio e o Correio da Manhã, bem como um importante periódico comunista, representante do movimento operário da época, chamado A Classe Operária, ao longo de outubro e novembro de 1929. Pelo conteúdo dos jornais, percebemos duas interpretações para a crise: a da elite carioca, que parece não ter sofrido, pelo menos imediatamente, seus impactos, embora noticiasse suas repercussões no setor agro-exportador (principalmente na cafeicultura paulista) e a dos trabalhadores que, ao que tudo indica, sofreram não só com a crise de 1929, mas com todas as diferentes crises externas e internas que antecederam a Revolução de 1930.

Palavras-chaves: História do Brasil República, crise de 1929, imprensa, cultura política

ABSTRACT

What does the past teach about the interpretation which media makes about worldwide crises, its impacts in Brazil and in worker classes' everyday lives? I intend to answer this question analyzing newspapers such as "Jornal do Commercio" and "Correio da Manhã", as well as an important communist journal named "A Classe Operária", along October and November of 1929. From the newspapers' content, we can recognize two interpretations of the crisis: one for Rio de Janeiro's elite, which apparently did not suffer, at least immediately, its impacts, although it informed the repercussions on agrarian exporting sector (mainly on Sao Paulo's coffee) and another from workers, who suffered not only with 1929 crisis, but with all the different internal and external crises which happened before 1930 revolution.

Keywords: History of Brazilian Republic, 1929 crisis, press, political culture

Introdução

Está na memória de todos a situação angustiosa em que encontrei a lavoura de café, ao assumir o governo, em 1930. De um lado, enormes estoques, invendáveis na ocasião, exerciam forte pressão baixista sobre o nosso principal produto; de outro, a falta de crédito agravava ainda mais as cores já tão sombrias desse quadro inquietador.

Impunha-se a adoção de medidas extremas, de emergência, até que, restabelecida a normalidade da vida cafeeira, fosse possível planejar uma política a longo termo. (...) Desobstruído o caminho, com a retirada daquela montanha de café que ameaçava permanentemente os preços, e, portanto, as colheitas futuras, entramos em fase de comércio normal, que permitiu a melhoria de cotações, inclusive o recente aumento dos preços verificado. Ao mesmo tempo em que iniciávamos ativa propaganda do café brasileiro, abrindo novos mercados e desenvolvendo os mercados tradicionais, desde o Japão aos Estados Unidos da América, criávamos o aparelhamento interno de assistência e melhoria da lavoura cafeeira. (...)

E, então, o emocionante espetáculo das floradas brancas, puras como os ideais que se abrigam no coração dos homens do campo, no peio de nossos lavradores, se repetirá, de quebrada em quebrada, como um facho de luz e de esperança, como um símbolo da riqueza de São Paulo e do Brasil.

Getúlio Vargas, sobre a eliminação do café em 1931. 1950. CPDOC-FGV.

A última grande crise econômica de alcance mundial foi mostrada pela mass media brasileira em geral como um evento que teria e que teve pouco ou quase nenhum efeito no país. O próprio presidente da República apareceu várias vezes na imprensa declarando que o Brasil estava seguro e que, o que era "um Tsunami" para os Estados Unidos, aqui no Brasil não passaria de uma "marolinha". Ao mesmo tempo, jornais alternativos, centros de mídia independente na internet e, mesmo alguns órgãos da grande imprensa, apresentavam números assustadores de crescimento dos índices de desemprego, principalmente na indústria automobilística e em outros setores de serviço controlados por multinacionais. Eu, que durante muitos anos lecionei uma disciplina de Política e Mídia, comecei a me perguntar por que a crise atual não pareceu ter entrado para o centro da agenda setting da mídia brasileira e realmente a impressão da opinião pública em geral foi a de que a crise parecia não ter atingido o país. Já tinha a resposta do ponto de vista econômico e social, mas o papel da mídia, geralmente crítica e "escandalosa", tinha sido diferente desta vez. Temos dados que comprovam que o país apresentou taxas de crescimento exemplares e várias estatísticas demonstram uma efetiva melhoria nas condições de vida da população nos últimos cinco anos. A edição de 14 de novembro de 2009 da conceituada revista The Economist teve o artigo de capa sob o título Brazil takes off. Em editorial, a publicação fez elogios ao desenvolvimento recente do País, embora afirmasse que o maior risco para o grande sucesso da América Latina era a prepotência e ao longo da reportagem também apresentava alguns riscos ainda presentes na economia brasileira, como a questão da corrupção, o crescimento de gastos com a folha de pagamento do governo (13% desde setembro de 2008), os problemas com educação e infraestrutura (constantes blecautes nas grandes cidades) e a violência. Foi aí que nasceu a idéia para este trabalho.

Voltar aos arquivos e perceber como a crise econômica mundial de 1929, oitenta anos antes, foi noticiada pela imprensa brasileira num momento em que a pauta e as preocupações dos brasileiros voltavam-se para a crise política que atingiu o país e foi responsável pela Revolução de 1930, que levou Getúlio Vargas ao poder. Sem dúvida, a crise das velhas oligarquias está diretamente ligada à crise do café, que já estava ocorrendo e só piorou com o crash de 1929. Mas como a grande imprensa da época, situada na capital federal (ainda o Rio de Janeiro) noticiou a crise lá e cá? Como a imprensa operária, no caso a imprensa comunista, noticiou a crise? Foi preciso voltar a Weber que, ao escrever sobre a imprensa em 1910, dizia que era necessário perguntar, para além do produto final, o periódico em si, por seus produtores, pelos redatores, editores e afirmava que "a situação do jornalista, assim como outros aspectos, varia bastante de acordo com o partido ou a natureza de seu jornal.".1 1 Weber apud ABREU, Alzira Alves de et al. Mídia e política no Brasil: jornalismo e ficção. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2003, p. 14.

O historiador sabe que faz parte da escrita da história a heurística do documento e que é preciso "desconfiar" das fontes. Pois, desde pelo menos o século XVI e a invenção de Gutenberg, mas principalmente no decurso do século XX, o jornalismo foi modelado pelo crescente reconhecimento de que os fatos não estavam aí simplesmente para serem reunidos e apresentados: os fatos poderiam ser ocultados e "editados" - para não cairmos no velho jargão "manipulação" - por governos e políticos inescrupulosos, muitas vezes proprietários de meios de comunicação, entre outros e até mesmo aqueles fatos que eram menos contestáveis exigiam um elevado grau de interpretação para terem sentido.

Ocorreu também uma mudança no ethos profissional do jornalismo. Os primeiros jornais dos séculos XVII e XVIII eram empreendimentos comerciais em escala relativamente pequenos, muitas vezes dirigidos por famílias. As gráficas eram bastante modestas e os preços altos, além de serem dirigidos primariamente para as elites comerciais, políticas e culturais. Mas os desenvolvimentos tecnológicos do início do século XIX revolucionaram as condições de produção de jornais, possibilitando que grandes tiragens fossem feitas a um custo relativamente menor. Ao mesmo tempo, o crescimento de pessoas alfabetizadas criou e expandiu o mercado de materiais impressos.

Outra mudança aconteceu na relação entre a imprensa e os partidos políticos. Houve uma tendência de despolitização, embora apesar da atenuação do vínculo, muitos jornais e periódicos continuassem a se alinhar com partidos ou facções específicas, ou a se situarem em uma área específica do espectro político-econômico. Talvez a mudança mais importante foi a emergência do jornalismo como uma profissão. A formação da profissão jornalística data do final do século XIX.2 2 Schudson apud THOMPSON, John B. O escândalo político: poder e visibilidade na era da mídia. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002, p. 82.

Os proprietários de jornais e os editores passaram a contar cada vez mais com escritores contratados e repórteres que eram pagos para conseguir notícias e escrever histórias. À medida que o corpo de escritores e repórteres se expandia, começou a emergir um ethos profissional que definia os princípios da boa prática jornalística. Esse ethos:

Enfatizava acima de tudo a obrigação de descobrir e apresentar os fatos. Mas ele também reconhecia a necessidade de narrar os fatos na forma de uma história que deveria ser viva, colorida e divertida. Os fatos e o entretenimento foram as idéias gêmeas da emergente profissão jornalística. Mas esses ideais não eram sempre totalmente compatíveis e eles permitiam ênfases diversas. Alguns jornais colocavam mais ênfase no ideal dos fatos e na necessidade de descobrir os fatos através de um processo de investigação, enquanto que outros – especialmente os que tinham como objetivo uma ampla circulação – davam mais ênfase ao entretenimento e à narração de histórias.3 3 THOMPSON, John B. O escândalo político, p.82,

Ou seja, certamente temos que ler as notícias a partir dessa nova estruturação da mídia, numa perspectiva crítica que incorpore na análise de antemão a subjetividade inerente a quem produziu a notícia. É imprescindível levar em conta o papel dos jornalistas e da imprensa no alargamento do debate político e também econômico. Embora saibamos que o jornalismo econômico tal como hoje é praticado nasceu nos anos 1970, pelo menos no Brasil:

Até esta década o noticiário econômico era essencialmente financeiro/comercial, voltado para informações práticas: cotações da bolsa, informações sobre câmbio, entrada e saída de navios, preços e produção de produtos agrícolas. Quando apresentava outros temas, eles não vinham acompanhados de uma análise, pois não existia um grupo de jornalistas dedicados e especializados em assuntos econômicos nas redações. Não existia cobertura do desempenho das empresas, nem dos diversos setores da economia.4 4 ABREU, Alzira Alves de et al. Mídia e política no Brasil, p. 23.

É preciso explicitar o tipo de noticiário do qual estamos falando quando pensamos nos jornais de 1929 e 1930 partindo destes princípios acima elencados. Por outro lado, também à guisa de introdução, é necessário dizer que os anos 1930 determinaram o começo de um incrível crescimento da economia brasileira, onde o setor industrial teve fundamental importância. Porém, sem dúvida, os primeiros anos da década não ficaram imunes ao famoso Market Crash da Bolsa de Valores de Nova York em 1929, bem como a subseqüente chamada Grande Depressão. A indústria paulista – pelo fato de se manter parcialmente alimentada pela renda gerada pela economia cafeeira, mais diretamente afetada pela crise – também sofreu, de imediato, os efeitos do movimento recessivo da economia mundial: produção e emprego sofreram quedas substanciais. O impacto da crise de 1929 levou ao fechamento de muitas fábricas (o número de fábricas em 1930 era 23% menor do que o de 1928), reduzindo o volume físico de produção em 12%, e em quase 20% a quantidade de pessoas empregadas. Alguns ramos industriais foram atingidos de forma mais aguda, como o setor têxtil, o de vestuário e calçados, o de mobiliário e bebidas, entre outros. Já o ramo de produção de alimentos não sofreu redução em seu produto físico (embora isso tivesse decorrido principalmente do aumento da produção de açúcar), assim como o de papel e papelão.5 5 SUZIGAN, Wilson. A industrialização de São Paulo: 1930-1945. Revista Brasileira de Economia, Rio de Janeiro, v.25, n.2, p. 96, abr./jun.1971. Mas em 1932 já se observava alguma recuperação, embora não fossem atingidos os níveis de 1928.

Aqui cabe um parêntese buscando a relação entre café, Estado e industrialização, tendo em vista que há um debate entre historiadores e economistas sobre o papel da cafeicultura no desenvolvimento da indústria brasileira naqueles anos anteriores e imediatamente posteriores à crise de 1929. Analisar este debate não é o objetivo de nosso artigo, porém devemos dizer que em certa medida os jornais ora comprovam ora desmentem determinadas leituras sobre o papel do café no processo de industrialização e o grau de poder de barganha dos cafeicultores tanto em relação aos banqueiros, quanto em relação ao Estado no momento da crise.

Em artigo recente, intitulado Primeira República: economia cafeeira, urbanização e industrialização, José Miguel Arias Neto aponta para uma questão fundamental na relação café, estado e industrialização.6 6 ARIAS NETO, José Miguel. Primeira República: economia cafeeira, urbanização e industrialização. In: DELGADO, Lucília de Almeida Neves e FERREIRA, Jorge. O Brasil Republicano: o tempo do liberalismo excludente – da proclamação da República à Revolução de 1930. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003, p. 133-167. A ideia de que a expansão da economia cafeeira teria promovido a industrialização do país parece ter se consolidado no imaginário brasileiro contemporâneo, não só através da historiografia sobre o tema, mas também através dos meios de comunicação. Numa perspectiva crítica, o autor nos aponta para o fato de que a história do Brasil pareceu, durante muito tempo, ser a História de São Paulo e assim, o grande agente da modernidade, responsável pela abolição, pela proclamação, pela urbanização e inclusive pela industrialização, teria sido o fazendeiro paulista. Felizmente, com a ampliação dos estudos regionais, o campo de debate foi alargado e tornou-se possível demonstrar como não há uma necessária e inequívoca associação entre abolição, República, economia cafeeira, industrialização e urbanização. Aliás, as relações históricas entre esses fenômenos são complexas e contraditórias e possuem peculiaridades que só foram explicitadas quando das pesquisas em contextos locais em diferentes Estados do país. De todo modo, o autor sustenta que a dinamização da economia cafeeira a partir do século XIX provocou um movimento mais ou menos geral de modernização do país. E salienta que parte desse progresso estava articulado à exportação de capitais dos países industrializados envolvidos na forte concorrência imperialista em fins do século XIX e inícios do XX, para as regiões menos desenvolvidas. Para o autor, a expansão da economia cafeeira foi, ao mesmo tempo, produtora e produto dessa modernização. Ele verifica como o crescimento da malha ferroviária, por exemplo, coincide do ponto de vista cronológico, com a ampliação das exportações de café, o que comprova que a economia cafeeira simultaneamente dinamizou e foi dinamizada pela melhoria do sistema de transporte. De acordo com José Miguel, embora persista de certo modo, na memória nacional, a associação entre a República e o desenvolvimento da indústria nacional, é necessário destacar que a expansão cafeeira não propiciou apenas a melhoria dos portos e a implantação de ferrovias. De modo geral, ela estimulou e foi estimulada pelos melhoramentos urbanos e pelo desenvolvimento de determinados tipos de indústria ainda no período imperial (lembremos de Mauá e seus empreendimentos). De fato, do início do século XIX até 1889 foram criados vários estabelecimentos fabris, principalmente têxteis, de dimensões e capital diversos, que empregavam força manual, hidráulica e a vapor (como o dos irmãos Mascarenhas e da indústria têxtil em Minas Gerais, do Cedro Cachoeira e de outros empreendimentos na "Manchester mineira").

A economia cafeeira estimulou ainda o setor comercial e bancário, bem como promoveu gradativamente a integração do mercado interno nacional. Esse desenvolvimento foi particularmente acelerado após 1888 graças a três fatores principais: com a abolição da escravidão o governo imperial liberou créditos para a lavoura e adotou uma política emissionista mais flexível que, ao lado da enorme safra cafeeira e da entrada de capitais estrangeiros, provocou uma euforia nos negócios.

Proclamada a República, o governo provisório promoveu uma reforma financeira e bancária que, como todos os analistas do período demonstraram, era uma continuidade da política emissionista iniciada pelo visconde de Ouro Preto e que tinha por objetivo atender às demandas de crédito dos empresários. Através dessa reforma o governo republicano criou três bancos regionais autorizados a emitir três vezes mais papel e dinheiro em relação ao existente na época. Determinava, também, que a moeda seria garantida por Obrigações do Tesouro, e não em ouro. Além disso, a reforma contemplava a plena liberdade às sociedades anônimas. Os investimentos multiplicaram-se, dando lugar a uma especulação desenfreada que ficou conhecida como "Encilhamento" (relatado na obra de Taunay).7 7 TAUNAY, Visconde de. Encilhamento. Belo Horizonte: Itatiaia, 1976. Contudo, os historiadores e economistas do período verificaram também que, descontados os abusos da especulação, a política emissionista de inícios da República parece ter caracterizado um momento essencial no desenvolvimento industrial do país. Isso porque a reforma financeira criou condições, ao lado da grande exportação cafeeira, para um aumento no investimento em indústrias, inclusive através da importação de capital constante (máquinas e equipamentos) que se acrescentou à acumulação prévia, realizada no período imperial.

Houve, portanto, entre 18'9 e 1896, um boom no desenvolvimento e na acumulação industrial, tendo o ritmo de crescimento diminuído entre 1897 e 1904, para voltar a crescer a partir de 1905 até 1914. A crise pós-encilhamento, que coincidiu com a crise internacional e a política de caráter emergencial adotada para enfrentá-la, demonstrou duas faces do problema da relação entre café e industrialização. Em primeiro lugar, a manutenção do modelo agroexportador dependeria de uma intervenção nos mercados visando a forçar a alta dos preços e uma redução na expansão do café para evitar a superprodução. Em segundo, evidenciou que o crescimento industrial se processava em situação de dependência em relação à dinâmica da economia cafeeira – fator de fragilidade e instabilidade – que seria superado somente com o investimento nas indústrias de base, isto é, na produção de bens de capital. Em uma visão ampliada, pode-se dizer que uma política estatal definida para este setor foi, contudo, estabelecida apenas a partir de fins da década de 1940 e que, durante a Primeira República, nem sequer o problema da superprodução foi resolvido. José Miguel Arias Neto (2003) afirma que mesmo nos anos de crise a produção do café cresceu e, citando Celso Furtado, observa que, na impossibilidade de depreciar o câmbio, os dirigentes dos estados cafeeiros amadurecem a idéia de retirar do mercado parte dos estoques do produto: "no convênio, celebrado em Taubaté em fevereiro de 1906, definem-se as bases do que se chamaria política de "valorização" do produto".8 8 FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1971, p.179. Em um primeiro momento, essa política provocou reações adversas de vários grupos sociais e políticos, contudo os governos dos estados produtores terminaram por forçar o governo central a tomar para si a direção da política de valorização. De fato, abriu-se então o período de "apogeu" da cafeicultura e do poder nos fazendeiros na República Velha.

Na esteira dos teóricos da CEPAL, dos dependentistas e dos teóricos do desenvolvimento desigual e combinado do capitalismo, o autor observa que a industrialização brasileira se processou em conjunto com a expansão da cafeicultura, isto é, nos momentos em que ocorria um "vazamento de capital" para o setor. Por isso mesmo ela se concentrou nas regiões onde se processava a referida expansão. O inovador aqui é que para José Miguel Arias Neto, isso não significa que não tenha ocorrido um processo de industrialização em outras regiões, em um ritmo mais lento.9 9 ARIAS NETO, José Miguel. Primeira República: economia cafeeira, urbanização e industrialização, p.160. Por outro lado, a inserção do Brasil na divisão internacional do trabalho como país agroexportador condicionou a expansão da cafeicultura ao capital estrangeiro e, conseqüentemente, a industrialização se processou sob uma dupla subordinação: do capital internacional e do cafeeiro. Dessa situação decorrem duas características da indústria brasileira: ter surgido como "grande indústria de bens de consumo" voltada para um mercado interno em acelerado crescimento, como demonstrou Sérgio Silva.10 10 SILVA, Sérgio. Expansão cafeeira e origens da indústria no Brasil. São Paulo: Alfa-Omega, 1979. Este mesmo autor demonstrou que a base para a primeira acumulação industrial foi o grande comércio importador e exportador, no qual se destacavam as grandes casas comissárias de café, já na década de 1880. Essa burguesia comercial, à qual se somaram imigrantes como os Matarazzo, Crespi e outros, estabeleceu laços familiares com a grande burguesia cafeeira, o que facilitou uma fusão de capitais. É dessa fusão que surgiu uma burguesia industrial no Brasil.

Essa fusão de capitais não determinou uma linearidade de interesses e um alinhamento político automático. Um exemplo disso foram os constantes embates entre cafeicultores, comerciantes e industriais em torno das tarifas alfandegárias. A elevação das tarifas seria, teoricamente, do interesse dos industriais, que veriam suas atividades protegidas. Isso, contudo, não corresponde à realidade, uma vez que os industriais dependiam das importações de maquinário e de manufaturados, como o aço para a expansão de suas atividades.

Na medida em que São Paulo concentrou grande parte das indústrias do país, durante algum tempo minimizou-se a importância da economia cafeeira e da industrialização em outras regiões ou supôs-se também que, onde se desenvolvesse a cafeicultura, haveria automaticamente um processo de industrialização. A modernização ocorrida não pode ser confundida com a industrialização de São Paulo. Apesar de estar centralizado na região cafeeira, a despeito da concentração de capitais ter sido mais elevada e acelerada naquele estado, o processo de modernização autoritária ocorreu em todo o território nacional. Embora isso só apareça, com raríssimas exceções, na historiografia mais recente, é importante lembrar ainda de outras obras que deram início ao debate, de caráter mais geral, tais como História geral da agricultura brasileira, de Luís Amaral (1940), História econômica do Brasil, de Caio Prado Jr. (1945), e Formação econômica do Brasil, de Celso Furtado (1971).11 11 AMARAL, Luís. História geral da agricultura brasileira. 3 v. Rio de Janeiro: Companhia Editora Nacional, 1940; PRADO Jr., Caio. História econômica do Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1953; e FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil. Rio de Janeiro: Brasiliense, 1976. Infelizmente, ainda hoje, poucos são os trabalhos dedicados a alguma região para além de São Paulo, ou algum tema específico, ou algum produto em particular. No caso do café, deve ser mencionado o artigo de Boris Fausto, Expansão do café e política cafeeira.12 12 FAUSTO, Boris (dir.). História Geral da Civilização Brasileira. Tomo III: O Brasil Republicano 1. Estrutura de poder e economia (1889-1930). Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2006, p.215-276. Outro trabalho fundamental relacionado à atividade cafeeira é O cativeiro da terra, de José de Sousa Martins, que se dedica ao estudo da estrutura de produção em São Paulo. A hipótese do autor é de que a substituição do trabalho escravo não conduziu ao trabalho assalariado nos cafezais, mas sim ao colonato. Todavia, a existência de relações de produção pré-capitalista na cafeicultura está subordinada à lógica capitalista, segundo a qual o próprio capital engendra e reproduz relações não-capitalistas de produção.13 13 MARTINS, José de Sousa. O cativeiro da terra. 9 ed. São Paulo: Contexto, 2010. Outros estudos sobre agricultura podem ser citados, como Alberto Passos Guimarães (1963), Hélio Jaguaribe (1962), Nelson Werneck Sodré (1962), Delfim Netto (1973), Antônio de Barros Castro (1971). E, já no fim dos anos 70 e início dos 80, as pesquisas de Maria Yeda Linhares e Francisco Carlos Teixeira da Silva (1979 e 1981).

Já os estudos sobre a industrialização no Brasil, vindos da Economia, a partir da década de 1950, desenvolveram-se dentro da Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL), criada em 1948 e que tinha por objetivo produzir análises próprias que permitissem um melhor entendimento da problemática latino-americana, em substituição aos modelos teóricos dominantes desenvolvidos a partir da realidade histórica de outros países. Este ponto de vista é expresso por Celso Furtado no livro Formação econômica do Brasil e localiza o desenvolvimento das indústrias brasileiras fundamentalmente nos anos posteriores a 1930. Para Furtado, a crise de 29, ao provocar a queda acentuada dos preços do café, colocou em questão o funcionamento do modelo exportador. Entretanto, a política cafeeira adotada no início da década de 30, ao garantir a compra de cafés invendáveis externamente, assegurou a manutenção do nível de renda do país, funcionando como uma medida anti-depressiva. Se, de um lado, a demanda por produtos importados foi mantida, de outro, persistiam as dificuldades de importação, em consequência da depressão internacional. Tal situação criou condições favoráveis à produção interna de bens manufaturados. No período anterior, a Primeira Guerra Mundial é interpretada como uma conjuntura específica, em que o afrouxamento das ligações do setor agro-exportador com os mercados externos criou facilidades para o surgimento do primeiro crescimento industrial brasileiro. As análises de Conceição Tavares também se inserem em tal perspectiva.14 14 TAVARES, Maria da Conceição. Da substituição de importações ao capitalismo financeiro. Rio de Janeiro: Zahar, 1972. Distinto viés de análise aparece com Stanley Stein, em seu Origens e evolução da indústria têxtil de algodão no Brasil - 1850/1950 (1979).15 15 STEIN, Stanley J. Origens e evolução da indústria têxtil de algodão no Brasil, 1850/1950. Rio de Janeiro: Campus. 1979. No livro, o autor demonstra a importância da expansão industrial brasileira anterior a 1930, destacando aí o papel dinamizador das atividades comerciais. De todo modo, com a crise do modelo cepalino nos anos 60, decorrente do fato de a industrialização brasileira não ter correspondido às expectativas, tornou-se necessário buscar novas perspectivas de análise. A tese de que a expansão industrial dos países latino-americanos estava associada aos momentos de crise do modelo exportador - no caso do Brasil, baseado no café - recebeu duras críticas, e, conseqüentemente, um amplo debate sobre o tema foi inaugurado no começo dos anos 70.

A obra de Warren Dean colocou em outros termos as relações entre atividade exportadora e expansão industrial.16 16 DEAN, Warren. A industrialização de São Paulo (1880-1945). São Paulo: Difusão Européia do Livro/EDUSP, 1971. Para o autor, a expansão industrial brasileira foi uma decorrência do crescimento das exportações de café, e a Primeira Guerra Mundial, contrariamente às análises até então consagradas, representou, não um elemento de incentivo, e sim um obstáculo à industrialização. Na medida em que a guerra criava entraves para a importação de bens de capital, limitava o aumento da capacidade produtiva do nosso parque fabril. Assim também, a Grande Depressão e a crise do café quase paralisaram as indústrias de São Paulo em 1930, tendo a seguir dificultado o crescimento industrial durante toda a década. De acordo com Dean, o comércio exportador do café ao promover o crescimento da renda interna, criou no Brasil um mercado para produtos manufaturados, além de impulsionar o desenvolvimento de estradas de ferro e estimular os investimentos em infra-estrutura, o que por sua vez integrou e ampliou este mesmo mercado, como já foi colocado. Além disso, o café foi responsável pelo aumento da oferta de mão-de-obra, ao estimular a imigração, e introduziu no país recursos em moeda estrangeira que passaram a ser utilizados para a importação de insumos e bens de capital destinados ao setor industrial.

Villela e Suzigan (1973) questionam o argumento de que as dificuldades do setor exportador promoveram a expansão da indústria brasileira.17 17 VILLELA, Annibal e SUZIGAN, Wilson. Política do governo e crescimento da economia brasileira: 1889-1945. 2 ed. Rio de Janeiro: IPEA/INPES, 1975. Também apontam como fator importante no estudo da industrialização o papel das políticas governamentais, destacando o papel do Estado nessa relação. Em seu trabalho sobre as origens e o desenvolvimento da indústria brasileira entre 1855 e 1939 (1986), Suzigan defende a tese de que o desenvolvimento industrial no século XIX foi induzido pela expansão do setor exportador. Este impulso dinâmico arrefeceu após a Primeira Guerra Mundial, uma vez que a partir de 1900, o próprio setor industrial, embora incipiente, já passara a estimular investimentos. Na década de 1920, em parte devido aos incentivos governamentais, acentuou-se a diversificação da estrutura industrial. Foi na década de 1930, entretanto, que a crise do setor exportador e a Grande Depressão romperam a ligação entre a cafeicultura e o crescimento industrial - embora o investimento industrial continuasse a depender da capacidade de importação criada pelo setor exportador -, iniciando-se assim um processo de industrialização via substituição de importações. Esta interpretação de Suzigan não enfatiza as diferenças e especificidades regionais do processo de expansão industrial.

Em linhas gerais, W. Suzigan em Indústria brasileira: origens e desenvolvimento,18 18 SUZIGAN, Wilson. Indústria brasileira: origem e desenvolvimento. Nova edição. São Paulo: Hucitec/Editora da Unicamp, 2000. afirma que podemos identificar quatro principais teorias interpretativas para explicar o processo de industrialização do Brasil: 1) a teoria dos choques adversos (para esta teoria, a produção industrial interna teria aumentado imediatamente após a crise de 1929, como conseqüência de um esforço substitutivo, no momento em que a capacidade de importar havia declinado drasticamente e já havia uma capacidade produtiva instalada, que permaneceu até o momento inutilizada); 2) a industrialização liderada pela expansão das exportações; 3) o capitalismo tardio e 4) a industrialização intencionalmente promovidas por políticas do governo. De forma geral, a teoria dos choques adversos afirma que a ocorrência de problemas no setor externo da economia – crise, guerras e etc. – suprimiam a capacidade de importação que, somada à manutenção da renda interna, abria espaços sugestivos para o desenvolvimento industrial. Tanto para C. Furtado e Tavares quanto para Suzigan, o desenvolvimento industrial até 1930, não pode ser vinculado à substituição de importações mediante a algum choque adverso, essa teoria só pode ser aplicada à crise do café (final da década de 20) e a Grande Depressão da década de 1930, que suprimiram a capacidade de importação, quando ao mesmo tempo foi mantida demanda interna pela garantia do nível de empregos no setor agroexportador em função da política de valorização do café pós-1930, Entretanto, autores como Roberto Simonsen encontraram diversificação considerável no setor industrial para o período da I Guerra Mundial vinculado ao fato das dificuldades representadas pelo "choque adverso da I Guerra".

A visão que aponta a industrialização liderada pela expansão das exportações estabelece uma relação direta entre o setor industrial e o desempenho agroexportador, dizendo que em momentos de expansão de exportações, os investimentos no setor secundário eram acentuados e, em momentos de crise no setor externo da economia os investimentos recuavam, assim, essa teoria vê um movimento linear entre os setores agroexportador e industrial da economia e não uma dicotomia entre as classes urbanas e rurais como a historiografia tradicional enxerga.

Essa visão possui dois principais trabalhos: o de W. Dean e R. Nicol.19 19 NICOL, Robert. A agricultura e a industrialização no Brasil (1850-1930). São Paulo: Universidade de São Paulo, 1974. (História, Tese de doutorado). Este afirma que o desenvolvimento industrial brasileiro esteve atrelado ao setor exportador somente até 1930, quando daí em diante a indústria brasileira seria impulsionada pelas substituições das importações, mediante ao choque adverso da Grande Depressão, portanto uma visão que se encontra em concordância com Suzigan, Furtado e Tavares. Já W. Dean, afirma que a relação agroexportação/indústria avança para período posterior à década de 1930, dizendo que a crise do café e a Grande Depressão de trinta, ao atingirem o setor exportador da economia brasileira quase paralisaram a indústria paulista. A teoria do capitalismo tardio, considerando a condição periférica da economia brasileira e latino-americana, defende que o crescimento industrial seria resultado do movimento de acumulação de capital do setor agroexportador. Em suma, essa teoria defende que a o capital industrial era uma extensão do capital cafeeiro, que em momentos de intensa acumulação transbordaria para outros setores, porém, diferente da teoria da industrialização liderada pela expansão das exportações, esta não vê linearidade entre o avanço do capital cafeeiro e o industrial. Para essa visão, o capital industrial só pode ser considerado a partir da década de 1880, momento em que se deram as condições para a industrialização, como o grande movimento de imigração e com a abolição.

Suzigan por sua vez, refuta a idéia defendida por Mello de que o capital industrial brasileiro tenha se iniciado a partir da década de 1880,20 20 MELLO, João Manuel Cardoso de. O capitalismo tardio. 8 ed. São Paulo: Brasiliense, 1991. afirmando que tal fator já havia ocorrido em período anterior, o autor em questão também não concorda com a não linearidade entre os capitais cafeeiro e industrial para período anterior à década de 1930.

Temos ainda a visão da industrialização intencionalmente promovida por políticas do governo que atribuem a industrialização brasileira, incluindo o período anterior à década de 1930 às políticas de governo. Essa visão diz que a política econômica para o desenvolvimento industrial no país estava pautada na política cambial de desvalorização da moeda, baixando os preços relativos dos produtos nacionais e, além disso, a indústria, nessa visão, teria sido também protegida, de forma intencional, pelas tarifas alfandegárias. Porém, Villela e Suzigan afirmam que o papel do Estado em período anterior à década de 1930 para o desenvolvimento industrial no Brasil não teve significado importante e que a política cambial possuía o caráter de proteger e garantir o padrão da renda da classe agroexportadora e não de promover condições excepcionais à industrialização.21 21 VILLELA, Annibal e SUZIGAN, Wilson. Política do governo e crescimento da economia brasileira.

Para a industrialização no período posterior a 1930, devemos considerar de fato a substituição de importações, as quais viam-se mais caras e de difícil acesso. S. Mendonça diz que a década de 1930 é um momento de modificação acentuada para a acumulação de capital no país, quando o Estado demonstra-se na intenção de transformar o pólo urbano-industrial no centro dinâmico da economia do país. A autora afirma que os condicionantes para essa opção estão diretamente ligados à conjuntura internacional, com a crise do café e a Grande Depressão e a um fator político: a perda de hegemonia da oligarquia paulista. Em suma, Sônia Mendonça, Wilson Suzigan, Celso Furtado e Maria da Conceição Tavares concordam com a ideia de que o desenvolvimento industrial no país pós-crise do café e Depressão de 1930 esteve estreitamente vinculado ao setor agroexportador. Para Francisco de Oliveira assim como para Tavares, cria-se a partir da crise do café e da Grande Depressão, um novo modelo de política econômica que representou as novas acomodações políticas e administrativas para o novo modelo de acumulação de capital.

As formulações acerca da complementaridade entre a economia exportadora e os impulsos à industrialização foram desenvolvidas nos trabalhos de um grupo de economistas da Unicamp, entre os quais se destacam Sérgio Silva (1976), Wilson Cano (1977), João Manoel Cardoso de Mello (1982) e Liana Aureliano (1981).22 22 AURELIANO, Liana M. No limiar da industrialização. São Paulo: Brasiliense, 1981. A despeito de seus enfoques específicos, estes estudos têm em comum a valorização das relações café-indústria como fator fundamental para a compreensão do processo de industrialização no Brasil. De acordo com estes trabalhos, o capital industrial originou-se na década de 1880, na esteira de um rápido processo de acumulação ocorrido no setor exportador de café. Contudo, a relação entre o capital cafeeiro e o capital industrial era contraditória, em função da subordinação do segundo ao primeiro, e deste ao capital internacional. Assim, o desenvolvimento do capitalismo baseado no comércio do café, ao mesmo tempo que estimulou o desenvolvimento industrial, impôs-lhe limites que permitem caracterizá-lo como tardio e específico.

Do conjunto de estudos produzidos na Unicamp, destacamos aqui aqueles realizados por Wilson Cano (1977, 1978 e 1985),23 23 CANO, Wilson. Raízes da concentração industrial em São Paulo. 2 ed. São Paulo: T. A. Queiroz, 1981. que, ao analisar o caso de São Paulo, oferece também propostas de interpretação sobre a industrialização no Rio de Janeiro. De fato, seu modelo do complexo cafeeiro, destinado a explicar as origens e o dinamismo da indústria paulista, pressupõe a possibilidade de generalização para as demais áreas cafeeiras do país. Já em seu trabalho de 1977, utilizando os mesmos procedimentos de análise construídos a partir da realidade paulista, Cano procura demonstrar como e por que a economia carioca teria sofrido um processo de "retrocesso industrial". Esta proposta de generalização do modelo do complexo cafeeiro e de sua aplicação para o entendimento das realidades econômicas do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo encontra-se porém melhor explicitada em seu artigo Padrões diferenciados das principais regou cafeeiras (1850-1930) de 1985. Neste texto, tomando como referencial de análise a economia paulista, Cano propõe-se a explicar as razões fundamentais pelas quais as principais regiões cafeeiras do período assinalado tiveram dinâmicas distintas de crescimento e de transformação econômica. O elemento fundamental de diferenciação entre São Paulo e as demais regiões consistiria no fato de que apenas naquele Estado constituiu-se plenamente o complexo cafeeiro, já que, nos demais, as relações sociais de produção vigentes e as peculiaridades da comercialização e do financiamento do café não o permitiram. Assim, o elemento capaz de explicar seja a expansão industrial, seja a perda de dinamismo desta atividade, seria a relação café-indústria. De acordo com esta perspectiva complementarista no caso de São Paulo, o elemento propulsionador da industrialização teria sido, portanto, o desenvolvimento da lavoura cafeeira. Instituindo desde cedo o trabalho livre, São Paulo teria eliminado um freio à expansão do café, e ao mesmo tempo criado um amplo mercado para produtos alimentícios e industriais. Por outro lado, a expansão da lavoura teria também ampliado as bases de acumulação, abrindo oportunidades de inversão de capital tanto no desenvolvimento de uma agricultura mercantil como na indústria. Finalmente, teriam surgido condições para a criação de um mercado de trabalho livre que reduzia a pressão dos custos da produção industrial. Enquanto São Paulo se expandia, a utilização mais intensa e prolongada do trabalho escravo na cidade e no Estado do Rio teria esvaziado a possibilidade de criação de um setor agrícola dinâmico que pudesse trocar impulsos com o setor industrial. Dificultando o aparecimento de um mercado de trabalho livre e amplo, o escravismo prolongado teria impedido o desenvolvimento da produção de gêneros alimentícios baratos - capazes por sua vez de baratear o custo da força de trabalho - bem como a criação de um mercado consumidor para produtos industrializados. Por inferência, conclui-se que, na medida em que a antiga economia cafeeira do vale do Paraíba e da região de Minas declinava, toda a economia fluminense e carioca entrava num processo de "inexorável atrofia".

Outra proposta de interpretação sobre a expansão industrial na Primeira República é apresentada por Flávio Versiani e José R.M. de Barros.24 24 VERSIANI, Flávio R. e BARROS, José R. M. de. (orgs.). Formação econômica do Brasil: a experiência da industrialização. São Paulo: Saraiva, 1978; VERSIANI, Maria Teresa R. Proteção tarifária e o crescimento industrial brasileiro dos anos 1906-1912. Brasília: Dep. de Economia da UNB, 1981. (Texto para Discussão). Um dos pontos centrais do argumento desses autores é a defesa da tese que o Estado desempenhou um papel positivo na promoção do desenvolvimento industrial brasileiro antes de 1930. Este apoio concretizou-se, inicialmente, através de uma política de proteção alfandegária deliberada e, posteriormente, através da concessão de incentivos e subsídios a indústrias específicas. Estudando o desenvolvimento da indústria de tecidos de algodão, esses autores sugerem que o desenvolvimento industrial deu-se de forma cíclica, alternando fases de aumento de capacidade produtiva e fases de aumento da capacidade de produção. Essa alternância seria fruto da variação da taxa de câmbio. Mais uma contribuição de Versiani e Barros, já citados, ainda que não especificamente preocupados com diferenciações regionais no processo de expansão industrial, foi abrir novas perspectivas de análise, rompendo com uma visão dicotômica, ao defender a hipótese de que a industrialização surgiu como resultado dos estímulos produzidos pela conjugação de períodos de dificuldades e de expansão do setor exportador. Também indicam que o setor cafeeiro não constituiu importante fonte de recursos diretos para a indústria, e que os capitais para a nova atividade provieram principalmente do comércio de importação e do reinvestimento de lucros do próprio setor fabril.

Assim, quero fazer duas perguntas, que tentarei responder no presente artigo. Primeira: como a imprensa representante das elites cariocas (no sentido político, econômico, mas também cultural), da capital federal - no caso Correio da Manhã e Jornal do Commercio - construiu uma determinada visão da crise econômica mundial no momento em que esta foi desencadeada, dando ênfase principalmente ao que estava acontecendo fora do país e em São Paulo, como se o restante do Brasil estivesse protegido ou distante dos holofotes da grave conjuntura que o mundo vivia naquele estágio do capitalismo. Segundo: como os jornais operários, cujo exemplo aqui será A Classe Operária, periódico comunista, apresentaram de imediato a violência com que a crise de 1929 afetou, não só a cafeicultura e, por conseguinte, os trabalhadores do campo, mas também inúmeros operários da incipiente indústria brasileira.

"Market Crash" lá e "Crise do Café" aqui: a crise vista através da imprensa brasileira

O Correio da Manhã25 25 Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 29/10/1929.

O Correio da Manhã, apesar de ser um periódico carioca, era lido em todo país, e, de certo modo, era dirigido principalmente para as elites políticas, econômicas e culturais da capital federal. Como outros periódicos da época, o Correio também ditava as regras da vida social e cultural não só para o Rio de Janeiro, mas para todos os lugares onde sua distribuição alcançava. Sua postura ante a quebra da Bolsa de Valores de Nova York não foi de total despreocupação. Noticiava diariamente a condição das praças internacionais, inclusive a de São Paulo. No entanto a sua linguagem nos leva a crer que tratava a crise sob uma visão externa, isto é, como se o Rio de Janeiro estivesse imune aos abalos econômicos e apenas São Paulo fosse sensível a isso.

O final do mês de outubro de 1929 foi marcado por grandes manchetes acerca da situação financeira mundial, assim como do seu reflexo no principal produto de exportação do Brasil, em que "durante toda a semana observou-se certo nervosismo devido às constantes flutuações deste artigo".26 26 Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 20/10/1929. A ênfase, contudo, é posta na política interna ao atacar fortemente o presidente da República, Washington Luiz, e aos chamados "figurões da arrogante oligarquia paulista",27 27 Alfredo Pujol (A. Gustavo P.), advogado, jornalista, crítico, político e orador, nasceu em São João Marcos, RJ, em 23 de março de 1865, e faleceu em São Paulo, SP, em 20 de maio de 1930. Eleito em 14 de novembro de 1917 para a Cadeira n. 23, na sucessão de Lafayette Rodrigues Pereira, foi recebido em 23 de julho de 1919, pelo acadêmico Pedro Lessa. Era filho do educador Hippolyte Gustave Pujol e de Maria Castro Pujol. Iniciou os estudos primários com o pai. Transferiu-se para São Paulo, onde concluiu os preparatórios e cursou a Faculdade de Direito, bacharelando-se em 1890. Quando estudante trabalhou como revisor de jornais, exercendo também o magistério particular. O advogado distribuiu a sua atividade no foro criminal e no civil. Foi consultor jurídico da Associação Comercial de São Paulo. A imprensa constituiu sempre a sua atração. Escreveu em jornais de São Paulo, como o Diário Mercantil e o Estado de São Paulo, de Campinas e do Rio de Janeiro. Iniciou a carreira política em 1888, ainda estudante do 3o ano do curso jurídico. Ao lado de Francisco Glicério, encetou a propaganda republicana com discursos e conferências políticas. Em 1892, o Partido Republicano Paulista elegeu-o deputado estadual. Três anos depois era secretário do Interior, e dedicava-se à causa do ensino. No quadriênio presidencial de Campos Sales, abandonou o mandato de deputado em virtude de divergências políticas. Militou com relevo na campanha civilista de Rui Barbosa, quando a opinião nacional se manifestou contra o militarismo implantado por Pinheiro Machado, com a candidatura do marechal Hermes da Fonseca à presidência da República. Cf: http://www.biblio.com.br/defaultz.asp?link=http://www.biblio.com.br/conteudo/biografias/alfredopujol.htm. Acesso em: 5 mar. 2012. os quais nada perderiam com os efeitos da crise. No dia 26, o público carioca – e, por que não de todo Brasil? – fora informado dos infortúnios sofridos pela sociedade paulista, a qual assumiria medidas desesperadas para atenuar os efeitos da crise que, na verdade, poderia ser prevista. O jornal relata que os lavradores não conseguiam, sequer, fazer chegar regularmente o café ao ponto de embarque; comenta dos prejuízos e avarias suportados pelos lavradores que eram, claramente, desamparados. Em 29 de outubro de 1929, estampava na capa a seguinte manchete: "O mercado esteve ontem numa situação de verdadeiro pânico. Em São Paulo pede-se a moratória e a emissão de papel moeda". Ainda, é claro, falando da conjuntura paulista enquanto o Rio de Janeiro assistia ao boom da tensão sem abalos.

O Correio da Manhã de primeiro de novembro de 1929 trazia como manchete "A crise do café continua alarmando a praça" e noticiava que "Realizou-se ontem uma reunião conjunta dos representantes do Centro do Café e dos banqueiros. Depois de uma conferência, que foi secreta, redigiu-se uma nota sobre o que nela se discutiu. Como falou em São Paulo o senhor Alfredo Pujol".28 28 O Jornal do Commercio é, segundo seu próprio site na internet, o mais antigo veículo em circulação ininterrupta na América Latina. A primeira edição do jornal, criado pelo francês Pierre Plancher, circulou no dia 1º de outubro de 1827. Ao chegar ao Brasil, em 1824, Plancher fundou dois jornais, um deles o Jornal do Commercio, tendo como foco a economia, com base nas publicações Preços Correntes, Notícias Marítimas e Movimento de Importação e Exportação editadas por Plancher desde sua chegada ao Rio. Em pouco tempo, transformou-se em folha política e comercial. Pedro I, pressionado pelos portugueses, ia fazendo concessões que poderiam prejudicar os brasileiros e o Jornal do Commercio, assim, entrou em campo para defender os interesses nacionais, uma característica que preservou ao longo de sua história. A reunião havia sido realizada às 15h na sede da Associação bancária, no Rio de Janeiro. E, segundo a matéria: "O escopo visado foi encontrar um corretivo à depressão do mercado, no declínio alarmante dos negócios sobre o importante produto, examinando-se as possibilidades dum amparo financeiro ao principal elemento de riqueza da economia nacional." Na reunião, os cafeicultores expuseram as dificuldades e o comércio cafeeiro solicitou aos banqueiros que facilitassem os meios de crédito. "Esse pedido foi deferido, em parte, pelos banqueiros, devendo os negociantes ser atendidos, desde que essa concessão de crédito não sobrecarregue as responsabilidades dos estabelecimentos a que seja affecta. Assim o caso teria ficado resolvido." Ao final da reunião, em nota oficial, a safra de 3 milhões de sacas seria assim dividida: 1 milhão e tantas mil exportadas; 1,9 milhão financiadas nos reguladores; 500 mil em mãos de fazendeiros de boas condições financeiras; 500 mil a serem financiadas por bancos (a começar pelos do Rio). Segundo a matéria ainda não havia naquela data intenção de hostilizar o governo, mas sim o intuito de evitar que agravasse com maiores perturbações e ao que tudo indicava, o nervosismo dos primeiros momentos estava passando. De todo modo, é importante levar em consideração que, como havia um fraco desenvolvimento do capitalismo no nível da produção, havendo maior concentração na circulação, embora politicamente dirigente, a burguesia cafeeira era em grande parte caudatária dos interesses do capital financeiro, que controlava as exportações em regime de oligopólios. Historiadores da economia já citados na introdução deste artigo em sua maioria concordam que a burguesia cafeeira era o "sócio menor" do capital estrangeiro no Brasil. Vivendo em situação de constante endividamento, os fazendeiros reclamavam das políticas ortodoxas que, desde o acordo de consolidação da dívida no governo Campos Salles, beneficiavam mais os especuladores do que os "produtores". Portanto, os interesses dos banqueiros e dos fazendeiros não eram inteiramente coincidentes, e em algumas situações revelaram-se até mesmo antagônicos.

Na mesma publicação, o jornal destacava a "A situação de Wall Street e sua repercussão em várias praças", dizendo que "Abrindo ontem, ao meio dia a Bolsa de Nova York, na primeira hora, acusou alta. Essa alta inesperada e o progresso do mercado causaram sensação." De acordo com o periódico teria havido redução da taxa do Banco da Inglaterra, a bolsa de Nova York ainda estaria em confusão, a bolsa de Londres ficou fechada, a situação da praça de Paris era considerada boa, o Banco da Índia aumentara as suas taxas e o cartel europeu do aço prevenira-se. Enfim, os assuntos tratados falavam sobre as altas e baixas na bolsa de Bruxellas, ocorrera uma sessão especial no dia anterior na bolsa de Nova York, uma baixa na taxa de desconto, falava sobre a taxa de desconto do Banco Holandês e redução da taxa de desconto nos EUA.

Ainda nesta edição, uma manchete chama atenção ao tratar de "Uma conseqüência da crise do café, em São Paulo", narrando que, numa ação para acalmar os ânimos, o Diretor Geral da Secretaria da Fazenda e do Tesouro de São Paulo permitiu que os paulistas sacassem das Caixas Econômicas todo dinheiro que haviam depositado. Todavia, esta medida tornou a situação ainda mais tencionada, uma vez que "à entrada da Caixa Econômica foram efetuadas várias prisões de boateiros, que estavam espalhando notícias falsas e alarmantes sobre a situação" que passavam.

Nas primeiras edições do mês de novembro, o jornal já divulgava uma pequena melhora no mercado de Santos, bem como anúncios de reuniões dos principais órgãos político-econômicos do café, ou seja, o Instituto de Café de São Paulo, a Associação de Torradores de Café, a Liga Agrícola Brasileira, o Instituto Mineiro de Café, os lavradores de Ribeirão Preto e até o encontro do presidente do Banco do Brasil com algumas personalidades paulistas. No dia 3 de novembro, Fábio Aranha, presidente da Liga Agrícola Brasileira dizia ao Correio da Manhã que a crise seria debelada na medida em que houvesse esforços conjuntos entre os governos, bancos e lavradores. Neste número, dentre outros informes, o Presidente do Banco do Brasil fazia declarações otimistas e mantinha-se o debate em torno dos acontecimentos em São Paulo e no exterior. A principal preocupação era com o café paulista. Tanto que Y. de Almeida Prado escreveu uma matéria só sobre a situação do café e o governo da República. Na edição do dia três de novembro de 1929, o Correio também repetia a palavra oficial e destacava que a situação parecia estar se normalizando. A declaração de Vieira de Moura demonstra bem essa posição: "Não há crise do café, o que há é exploração política".

Embora a posição de diversos políticos tenha sido a de minimizar os efeitos da crise, a proposta abaixo bem demonstra como existia de fato uma preocupação com o efeito da carestia dos trabalhadores, para alguns setores da sociedade e mesmo para o veículo de comunicação em questão,

pedindo ao Congresso urgentemente a revogação do artigo do Regulamento Sanitário em vigor que permite a venda do café contendo até vinte por cento de palha ao consumidor carioca; a quarta no sentido de a Mesa do Conselho representar ao Conselho Nacional do Trabalho e, especialmente, ao Patronato Agrícola de são Paulo, no sentido de serem resguardados, na atual crise do café os direitos dos trabalhadores e colonos agrícolas dos seus salários aviltando-se, outrossim, que a pretexto daquela fiquem os referidos trabalhadores sujeitos à diminuição dos seus salários nesse momento de carestia geral da vida, fixando-se-lhes um 'salário mínimo', isto é, proporcional às subsistências, preceito este contido no Tratado de Versailles, do qual foi o Brasil signatário. (grifo nosso).

Nas páginas do Correio, embora tudo parecesse estar melhorando a cada dia, contraditoriamente, deputados pediam que se apresentasse ao Congresso propostas que pudessem salvaguardar os trabalhadores, ainda que este ainda não tivesse sequer direito a um salário digno e já estivessem, como será visto a seguir no A Classe Operária, tendo que trocar seu trabalho por comida em algumas fazendas do interior do Estado de São Paulo, vivendo quase que em regime de semi-escravidão.

Jornal do Commercio 29 29 O Jornal do Commercio é, segundo seu próprio site na internet, o mais antigo veículo em circulação ininterrupta na América Latina. A primeira edição do jornal, criado pelo francês Pierre Plancher, circulou no dia 1º de outubro de 1827. Ao chegar ao Brasil, em 1824, Plancher fundou dois jornais, um deles o Jornal do Commercio, tendo como foco a economia, com base nas publicações Preços Correntes, Notícias Marítimas e Movimento de Importação e Exportação editadas por Plancher desde sua chegada ao Rio. Em pouco tempo, transformou-se em folha política e comercial. Pedro I, pressionado pelos portugueses, ia fazendo concessões que poderiam prejudicar os brasileiros e o Jornal do Commercio, assim, entrou em campo para defender os interesses nacionais, uma característica que preservou ao longo de sua história.

No dia primeiro de novembro de 1929, com a manchete "A CRISE DO CAFÉ", o noticiário do Jornal do Commercio falava sobre uma convenção nacional dos torradores de café que discutiria os projetos legislativos referentes ao produto no comércio nacional, bem como questões relativas à campanha de propaganda "da rubiácea". Também trazia o projeto da câmara legislativa estadual de São Paulo para solucionar a crise do café.

No mesmo dia outra notícia de São Paulo, acerca de uma conferência realizada no dia anterior na Rádio Sociedade Record, a conferência do Sr. Mário Eredia, do Departamento de Publicidade da Sociedade Rural Brasileira sobre o palpitante assunto da crise cafeeira. De acordo com o periódico, "o orador abordou a questão por um aspecto completamente novo, qual seja o da defesa dos fazendeiros contra as situações que atravessamos. Terminou dirigindo um apelo aos lavradores para que intensifiquem as suas providências em favor da policultura, como meio de prevenção contra possíveis crises." Enquanto isso, em Nova York, o café fechava em alta, apesar dos boatos pessimistas vindos de Londres.

É interessante destacar uma análise feita na publicação do dia 2 de novembro sobre a situação econômica e financeira do Brasil por Mário de A. Ramos, como se o momento mais grave da crise estivesse passando: "As condições do mercado do café tem tido um alarme demasiado, pois o que se passa é fenômeno econômico de previsão certa; há cerca de um ano justo, o descrevemos com suas conseqüências que pronunciávamos que podiam ser catastróficas; há apenas a agravá-las a baixa simultaneamente das bolsas de títulos e mercadorias de Nova York". O jornalista também criticava a ausência de calma do mercado. Afirmava que o Instituto do Café deveria transferir o café que possuía armazenado para os portos do Báltico, do Mar do Norte, do Atlântico, do Mediterrâneo e do Oriente e que os cônsules brasileiros destes lugares deveriam ser instruídos a venderem o café em leilões. De acordo com Mário Ramos, por ser café de qualidade inferior e mais barato, se infiltraria nos interlands dos respectivos portos, criando novos consumidores. As perdas que ocorressem deveriam ser divididas por todos os interessados que em parte se comprometeriam pelos lucros anteriores havidos. E ele ainda dizia: "Toda a vez que há um período de alta de preço artificial, chega sempre o momento onde os compradores começam a se abster, pois não podem mais pagar os preços elevados que se lhes reclama. A essa crise fatal, sucede uma liquidação que tem por efeito acentuar o movimento de baixa e se para manter uma alta de preços excessiva, se pratica uma política de crédito mais liberal, ter-se há podido sem dúvida retardá-la, mas não evitá-la". Defensor do Presidente, ele fechava seu comentário da seguinte maneira: "Honra ao presidente da República por sua sabedoria com que se está conduzindo este caso em que a firmeza da sua vontade e seu grande patriotismo estão de inteiro serviço da Nação."

A crise do café também era comentada pelo Dr. Hannibal Porto, que escrevera para o Jornal, afirmando que o "deputado Daniel Carvalho em entrevista dada o Correio da Manhã, cometeu um erro ao aconselhar que intensifique a propaganda do café para os países do Centro, Sul e Leste da Europa, bem como os países da Ásia, deslocando dos bulevares de Paris e de Londres. Segundo o Dr. Porto, "ao dar esse conselho, ele não apreciou a importância do mercado francês, cujo consumo de café brasileiro aumentou nos últimos três anos". Em defesa ao ex-presidente do Instituto do Café, ele afirmava que o mesmo havia compreendido isso e não tinha se descuidado da propaganda nos países do Norte, do Sul e do Centro Europeu. Também ele propunha como solução a intensificação da propaganda, mas sem modificar a organização atual cujos resultados não poderiam ser contestados. Para o escritor, "Hoje, quem vai à Europa, nota que o Brasil já é mais bem conhecido e que se bebe o café do Brasil de boa qualidade por preço muito razoável" e, para terminar, segundo ele, "a propaganda bem orientada, o barateamento da produção e a conquista de novos mercados, que assegure maior e sempre crescente consumo, representam a chave do problema".

De acordo com o Jornal do Commercio, ao analisar a "evolução do pensamento paulista", a crise do Instituto do Café de São Paulo serviu para o estudo do problema cafeeiro e proporcionou aos dirigentes paulistas, diante das realidades, mudanças de orientação. Assim, para mostrar a "evolução", o periódico recordava que

jornais paulistas, atendendo ao que se resolvera a Sociedade Rural Brasileira, os senhores Dr. Bento de Abreu, Sampaio Vida, Aurélio Junqueira e Quartim Barbosa, estiveram a 31 de Outubro com o Presidente de São Paulo, a quem expuseram o seu ponto de vista favorável ao aumento das entradas e à elevação do stock de café em Santos a um milhão e duzentas mil sacas, de acordo com o Convênio, de modo que haja maiores vendas e exportação, embora sejam reduzidos os preços mantidos até agora.

Segundo a matéria, o Sr. Júlio Prestes declarara que estava de acordo o que foi supracitado, e que, a propósito, conferenciaria com o Presidente da Associação Comercial de Santos e o Presidente do Instituto do Café. Essa resolução do Presidente do Estado, segundo a Gazetinha, caderno especial do Jornal do Commercio, demonstrava que as ponderações que "nós outros vínhamos fazendo há tanto tempo e que outros também fizeram oportunamente, foram, afinal, reconhecidas como verdadeiras e necessárias". O Jornal do Commercio foi enfático ao afirmar que o decreto era mais um reconhecimento oficial da crise, que "há poucas semanas os situacionistas de São Paulo faziam questão de negar". Também traz referências de um discurso muito crítico, do Sr. Francisco Junqueira – um deputado estadual paulista –, ao presidente Washington Luiz. Segundo o jornal:

O Sr. Francisco Junqueira reclamou, também, no seu discurso que o café será vendido e exportado com mais rapidez, para evitar crises como a atual. (...) o Sr. Francisco Junqueira assim confirma o que temos escrito sobre o assunto: Estamos ainda, (...) vendendo cafés de 1927, com a safra de 28 nos armazéns reguladores e a de 29 já terminada. Isso significa que a lavoura com o produto da safra de 27 e adiantamentos de Santos, fez o custeio de 3 anos. (...) Daí, sr. Presidente, a razão das nossas aperturas, das dificuldades financeiras da lavoura, determinada pela retenção exagerada do produto. Essa retenção exagerada embora traduza as melhores intenções do Instituto e de seus dirigentes, só pode produzir efeitos negativos. (...) Mas, conclui o Sr. Junqueira, confirmando a tese que vimos sustentando muito antes da crise atual, mas é preciso que ela seja flexível e manobrada de modo a permitir a exportação das nossas safras com mais rapidez do que se vem fazendo, embora com isso sofra o respectivo preço.

O interessante, neste momento da reportagem deste periódico é perceber o debate político intrínseco nos discursos sobre a crise do café:

Foi que disse ainda, em setembro, na revisão do Convênio de Café em São Paulo o eminente Dr. Pereira Lima, presidente do Instituto Mineiro do Café. O Sr. Francisco Junqueira dá o exemplo abaixo, que é uma ilustração da tese que tem sido a nossa antes da crise atual: "Exemplificando: se a safra de 1928 é de dez milhões de sacas, o preço deverá ser 'A'. Se a de 29 é de quinze milhões, o preço deverá ser 'A menos tanto'. É quantidade suprindo a baixa do preço e dando ao produtor o preço compensador que ele precisa. Se a safra for menor, o preço será maior, isto é, de 'A mais tanto': é ainda a quantidade do produto fazendo oscilar o preço para mais ou para menos. Estabelecida pela retenção essa proporção nos preços em relação às safras, teremos respeitado o princípio econômico da oferta e da procura. O produtor receberá preço satisfatório; o consumo terá maior margem para a sua expansão; a lavoura obterá sempre recursos para acudir as suas necessidades; os estabelecimentos de crédito ficarão em situação folgada, e São Paulo voltará à sua posição de principal fornecedor dos mercados, deixando nos seus concorrentes o papel de lhes fornecer as faltas, exclusivamente." O Sr. Francisco Junqueira pede leis federais e acordos com os outros Estados interessados para a retirada do stock de exportação dos tipos inferiores a 7 e para o imposto sobre as plantações novas. Tendo o sr. Gama Cerqueira, leader da minoria da câmara estadual de São Paulo, minoria pertencente ao Partido Democrático, censurado a maneira como a maioria tinha antes repelido as suas críticas, mas declarando que estava pronta a colaborar e aceitar tudo que os governantes apresentassem para salvar o café, o Sr. Armando Prado, leader do Governo e do PRP, ocupou a tribuna para responder. O sr. Armando Prado reconheceu a crise e assim explicou a suspensão da concessão dos créditos por parte do Banco do Estado. É um documento importante, que devemos consignar. O trecho do discurso do leader do sr. Júlio Prestes na câmara estadual de São Paulo, referente ao assunto é o seguinte: Estudando as origens da crise que atravessamos, disse o Sr. Armando Prado, prosseguindo que não é exata a afirmação que ela provém da super-produção e da retenção exagerada. O financiamento dos cafés em São Paulo ficou estabelecido deste modo: a defesa financeira ficou a cargo do Banco do Estado. O financiamento das safras estava sendo feito, graças a um empréstimo. Desse empréstimo, tomado a Lazard Brothers, três parcelas nos foram enviadas, das dez em que havia sido combinado se dividisse o mesmo. Essas três séries foram colocadas. Depois, porém, esses banqueiros suspenderam o fornecimento. Mas, se o fizeram, foi porque a Inglaterra resolveu defender os seus capitais contra a crise que se anunciava para todo o mundo, e para isso ergueu a taxa de descontos do Banco de Londres (...) Então o Governo de São Paulo, melhorada a situação em Londres vai apenas exigir as novas quotas do empréstimo aos Srs. Lazard Brothers? A situação do café, no Brasil inteiro, depende, afinal, da política seguida em São Paulo.

Acredito que aqui fique explícito de que maneira o jornal cumpria sua função de formador de opinião, tendo em vista que o mesmo se via como tendo um olhar atento para com o que passava no estado de São Paulo, "não só para servir aos (...) leitores paulistas, como os desta Capital, do Brasil inteiro e do estrangeiro".

Portanto, o Jornal do Commercio, além de simplesmente "informar", colocava-se numa postura otimista diante das circunstâncias relativas à conjuntura político-econômica:

Temos tido uma demagogia cafeeira, que tem prejudicado pelos exageros de ocasião as medidas necessárias. Vemos agora que, diante de realidades perigosas, o pensamento dos dirigentes da lavoura e do comércio de São Paulo vai evoluindo, para melhor, de acordo com as circunstâncias. A força política social e econômica desses dirigentes é formidável e notória. Registramos com satisfação a evolução do pensamento desses leaders, pois isso permite a realização de uma política de defesa do café mais racional e segura.

O comentário de algumas Revistas Ilustradas

Nas revistas O Malho, de 16 de novembro de 1929 e Paratodos, de 15 de fevereiro de 1930, também encontrei duas matérias que me chamaram a atenção, pois falavam de crise. No Malho de novembro, havia uma matéria intitulada "Separando o Joio do Trigo", onde o jornalista tecia elogios ao governo de Washington Luiz, que estaria tentando resolver a crise, enquanto alguns representantes do comércio jogavam contra o próprio crédito nacional. Segundo o artigo, os "espertalhões" que sonhavam com a política emissionista seriam desmascarados pelo presidente que, dizia o repórter, não era

nenhum neófito, que pudesse confundir fenômenos distintos como a crise econômica e a especulação de bolsa... Viu logo, portanto, o que estava em jogo não era só a lavoura do café propriamente, senão uma dúzia de espertalhões e outro tanto de imprevidentes que não queriam, afinal, mostrar ao país o estado lastimável de seus negócios.

Para o autor, o café realmente sofrera um abalo como acontecera em outras nações, mas ironizava: "Agora, que além dos reflexos da crise mundial, haja no caso do nosso café muita manobra inconfessável é também um fato". Este era o motivo da desmoralização da política financeira do governo. Afinal, para o jornalista do Malho,

mal o governo resistiu aos que pretendiam desmoralizar a sua política financeira com medidas incompatíveis com ela, logo o mercado nacional voltou a funcionar com tendência a regularizar-se. Graças a Deus, o chefe da Nação não se deixou impressionar pela cena de terror preparada exatamente para atemorizá-lo. Pode deste modo, S. Ex. separar perfeitamente o "joio do trigo", mandando depois que o Banco do Brasil amparasse com o redesconto os legítimos produtores da riqueza nacional – os fazendeiros. Quanto aos interesses intermediários especuladores que descontem apenas os seus pecados...

Aqui fica evidente a ligação dos periódicos com o poder público. Embora vários jornais e revistas exercessem o papel de fiscalizadores da política e do Estado, alguns periódicos recebiam o patrocínio dos governos que era o principal mantenedor de grande parte da imprensa da época. Aqui a defesa é feita em nome não só do presidente, mas também aos fazendeiros, como se os mesmos não tivessem nenhuma responsabilidade sobre os acontecimentos, como se a crise interna e externa fossem fenômenos causados pelos especuladores.

Já na Paratodos de fevereiro de 1930, na página 32, Mário Nunes questionava a questão de uma falência do teatro carioca relacionando-a a crise econômica de maneira interessante:30 30 Mário Nunes (Vassouras RJ 1886 - Rio de Janeiro RJ 1968). Crítico e autor. Um dos fundadores da Associação Brasileira de Críticos Teatrais. Durante mais de 50 anos, de 1913 a 1964, publica crítica teatral no Jornal do Brasil. Na Associação Brasileira de Críticos Teatrais, ABCT, exerce as funções de presidente e vice-presidente. Funda a revista Palcos e Telas. Colabora também para o jornal O Malho, e os periódicos Paratodos e Vida Doméstica.

Debatem os jornais a questão do teatro. A situação não pode ser pior, todos os empreendimentos fracassam, só há um teatro aberto, o Recreio. A indústria sofre as conseqüências de uma prolongada e grave crise econômica. E a molesta ainda mais uma onda de derrotismo.

A crise econômica parecia ter chegado aos meios culturais da capital carioca e os maiores prejudicados eram, sem dúvida, os atores; embora Mario Nunes defendesse que a culpa do fracasso nos empreendimentos teatrais estava na própria categoria de diretores e atores que, perante a crise, deveriam se submeter a receber ordenados mais baixos para garantir a presença do público pagante. Os preços dos espetáculos teriam que baixar devido ao contexto crítico vivido pela sociedade brasileira aos fins da década de vinte. A falta de público no teatro carioca demonstra, justamente, até que ponto a crise mundial afetou diversos grupos sociais, principalmente os tradicionais freqüentadores dos espaços de entretenimento da cidade.

A Classe Operária 31 31 O crescimento deste órgão de imprensa do Partido Comunista criado em 1º maio de 1925 obteve grande repercussão já nas primeiras edições, a ponto de logo se esgotar, observando, então, a necessidade de que fosse produzido nas máquinas de O Paiz a partir do segundo número. A economia em crise provocava fortes reflexos sobre os operários que ainda no governo de Washington Luiz estavam excluídos do jogo político e sem direitos sociais, sendo fortemente reprimidos em suas mobilizações. Cf. FERREIRA, Jorge e NEVES, Lucília. O Brasil Republicano, vol. 1. O tempo do liberalismo excludente. Os trabalhadores replicavam às ações do governo através do apoio ao Partido Comunista, bem como da manutenção das suas organizações e, além disso, criando outros jornais menores. Ao que tudo indica, a representação na imprensa das classes populares acabou sendo favorecida pelo desencadear da crise. A Classe Operária era um dos porta-vozes de maior expressão dos trabalhadores, alcançando diversos pontos do país na medida em que aumentava a sua tiragem, que chegou a 30.000 em 1928, possuindo mais de 500 correspondentes operários em vários estados que apresentavam as suas necessidades imediatas e suas queixas salariais.

O periódico que talvez melhor descreva a situação dos trabalhadores brasileiros pós-crise de 1929 foi o órgão central do PCB, então chamado Partido Comunista do Brasil (secção brasileira da Internacional Comunista).32 32 É importante explicitar que o PCB era no período estudado chamado de Partido Comunista do Brasil. Esta denominação é original de sua fundação em 1922, e mostra seu alinhamento com a União Soviética, uma prática comum entre os partidos comunistas do mundo (PCA – Partido Comunista da Argentina; PCE – Partido Comunista da Espanha etc.). No entanto, com as denúncias dos crimes de Stalin (1956) essa vinculação tornou-se problemática e em 1961 o PCB modificou suas diretrizes e procurou mostrar seu distanciamento das crueldades praticadas por Stalin. Em 15 de fevereiro de 1930, ao noticiar o Congresso dos Colonos e Assalariados Agrícolas, esclarecia sobre a redução dos salários de 40%, bem como a falta de pagamentos que agravava a situação dos colonos em decorrência da crise do café.

Em 17 de abril de 1930, trazia como manchete "O próximo primeiro de maio e sua significação de luta contra a miséria e contra a Reação". Perguntava-se qual seria a situação dos trabalhadores naquele momento e afirmava:

Basta lançar os olhos para o que se passa. Basta palpar a realidade brutal que nos apresenta olhos adentro, todos os dias e todas as horas. Nas vastas extensões do campo, nas grandes fazendas de café, aonde coronéis e os novos senhores de escravos se haviam acostumado a converter em ouro o sangue de seus colonos e de seus assalariados, a desolação e a morte. Para fazer face à crise, produzida pela alta artificial do café, os grandes fazendeiros descarregaram sobre os colonos e os trabalhadores agrícolas, a sua ofensiva.

O jornal A Classe Operária de abril noticiava que trabalhadores haviam sido despedidos em massa e que, naquele momento, estavam "mendigando a problemática e arrogante 'caridade' dos senhores burgueses. Levas de sertanejos a vagarem perdidas e famintas pelo interior do Brasil". A crise, segundo o periódico, atingira não só o trabalhador do campo, mas também o da cidade:

Nas fábricas, e principalmente nas fábricas de tecidos, o trabalho é irregular. A ofensiva patronal desencadeada no Barreto em Niterói, como o primeiro passo para uma ofensiva geral contra os salários e pelo aumento das horas de trabalho. Os grandes burgueses vivem cheios de notícias de suicídios de trabalhadores desempregados. (...) derramam lágrimas de crocodilo ao saber dessas mortes, mas, como sua missão é iludir as classes trabalhadoras, não ligam essas mortes à sua verdadeira causa – o regime de miséria crescente das massas, engendrado pelo capitalismo, entregue aos azares da produção para o mercado".

Chamando os trabalhadores para lutarem por seus direitos no dia primeiro de maio, que estava próximo, o jornal também trazia uma leitura bastante interessante sobre a situação internacional e nacional:

A situação internacional agrava-se cada vez mais. O Krak da bolsa de Nova York explodiu como um vulcão embaixo do mundo capitalista. O exército do sem-trabalho sobe a milhões a surgimento de semana a semana (mais de 4 milhões na riquíssima América do Norte; mais de 3 milhões na "restaurada" Alemanha, mais de 2 milhões na Inglaterra). E o rumor de revolta das massas famintas embebe a atmosfera capitalista de negros presságios. Ao mesmo tempo, verifica-se que a União Soviética vai registrando os maiores sucessos de aplicação do Plano de 5 anos (que será realizado em 4 anos).

Para os redatores do jornal comunista, a crise econômica no Brasil, declarada na primavera de 1929, estava inteiramente ligada à baixa catastrófica dos preços do café no mercado mundial. De acordo com A Classe Operária, esta baixa assinalava a falência da política dos preços do Instituto de Defesa do Café, órgão dos grandes fazendeiros de café do Brasil, no qual dominava o capital inglês. A política de aumento exagerado dos preços do café no mercado mundial determinou, por um lado, a acumulação de grandes quantidades de café, artificialmente colocadas em estoque no país e, de outro lado, em vários países (Venezuela, Colômbia, América Central, África do Sul), desenvolveu-se rapidamente plantações de café. Disto resultava que a produção mundial do café excedia ao consumo mundial, ocasionando a superprodução desse produto.

Segundo o periódico, a falência política dos preços mundiais elevados do café atingiu principalmente o Brasil, que fornecia, naquele momento, mais de 2/3 da produção mundial desse produto, cuja exportação constituía 70% de suas exportações.33 33 Vale lembrar que o café representava cerca de 70% das exportações em termos de valor, e não volume ou quantidade. Na análise do jornal,

a crise do café se processa na base de uma economia nacional, cuja estrutura está por si mesmo, minada por uma crise profunda, proveniente do caráter colonial da economia brasileira e da crescente contradição entre o desenvolvimento rápido do modo de produção capitalista e a base econômica e social, que ainda se conserva feudal e escravagista. Este fato, ligado ao amadurecimento da crise econômica mundial e, principalmente, à crise econômica dos Estados Unidos da América do Norte, para onde o Brasil exportava, sobretudo, seu café, cria condições que prolongarão a crise econômica do país, ameaçando-lhe a economia de uma catástrofe completa, principalmente em conseqüência da profunda agravação da luta entre o imperialismo inglês e o americano, e da intervenção, nessa luta, das diversas classes populares do Brasil.

Os jornais falavam de suicídio, fábricas fechadas, êxodo rural, miséria no campo e na cidade. Traziam relatos e entrevistas de trabalhadores que estavam vivenciando a crise. O jornal publicado em três de julho traz um relato emocionante de um trabalhador no interior paulista, que trabalhava, na atual conjuntura, a troco de comida. Além de descrever a emigração para Minas, Mato Grosso e Goiás. Só que os camponeses iam a pé, pois não tinham sequer dinheiro para o transporte. Segundo o entrevistado, os cafeicultores não estavam pagando os salários por conta da crise.

Um trecho surpreendente também é o que diz respeito à miséria do camponês, numa publicação datada de 19 de julho de 1930. Um trabalhador agrícola, fugido das fazendas de São Paulo, contara sua odisséia a outro jornal e o A Classe Operária aproveitava o relato para pedir a organização da luta contra dos fazendeiros e proprietários, pedindo aos leitores a formação de um comitê de luta em cada fazenda. O camponês relata que

trabalhava na fazenda do Coronel Junqueira, irmão da famosa "rainha do café", Mme Iria Junqueira. Um dia a serra da oficina cortou-me a mão, deixando-me completamente inutilizado para o trabalho. Em todo esse tempo não recebi um vintém. Reclamei e o coronel expulsou-me da fazenda, dizendo-me que se eu não trabalhava não podia receber ordenado. E eu fora ferido quando trabalhava para ele... Dirigi-me, então, para a fazenda do coronel Joaquim Pires, na Barrinha, município de Jaboticabal. Ali trabalhei seis meses, mas também nem eu nem meus companheiros recebíamos nossos ordenadores, porque o patrão alegava não ter dinheiro devido a crise. Resolvi então vir embora para o Rio onde tenho um filho. Vim, como tantos outros, a pé. Levei nessa viagem cerca de um mês.

O relato é rico sobretudo por nos revelar a situação das fazendas de café durante a crise, pois ao ser questionado sobre a miséria existente no interior paulista, o camponês respondia:

O senhor não pode fazer uma idéia do que é aquilo. Famílias inteiras emigram para Minas, Mato Grosso e Goiás. Vão todos a pé porque não tem dinheiro para uma passagem. Os fazendeiros com a crise não pagam mais a ninguém. Tomam até as provisões dessa pobre gente. Algum, mais magnânimo, deixa-os levar um saco de cada gênero. E assim mesmo são muito poucos os que assim fazem, porque a maioria não paga os colonos e nem deixa levar os alimentos que guardaram.

Também os empresários ingleses tentavam "resolver" o problema da crise com cortes no número de empregados. De acordo com uma matéria publicada em 28 de julho de 1930, a empresa estava cortando centenas de trabalhadores na tentativa de minimizar os impactos da crise:

A empresa imperialista Leopoldina Railway, que todos os anos remete para Londres milhares e milhares de contos de lucros, está agora cortando centenas de trabalhadores de todas as secções. Dizem que o corte atingirá a 700 empregados. Só de Imbitiba já foram despedidos 80.

E o jornal ainda conclama os ferroviários a se organizarem para a luta por direitos: "Os milhares de trabalhadores da Leopoldina devem organizar a luta, por todas as formas, contra este infame processo de 'resolver' a crise. Somente pela luta enérgica poderão eles fazer respeitar os seus direitos". Notícias de greves também eram comuns nas páginas d' A Classe Operária na época da crise, demonstrando o grau de mobilização de diferentes categorias de trabalhadores.

Considerações Finais

Por falar em imprensa e greves, gostaria de concluir com uma greve dos gráficos ocorrida antes do Crash da Bolsa de NY, em abril de 1929, o que demonstra nossa hipótese inicial de que, embora a crise tenha também atingido o Brasil, a conjuntura interna do país já denotava o eminente esgotamento da política econômica liberal e a própria manutenção das oligarquias tradicionais no poder, pautadas por um liberalismo excludente que deixava fora do jogo político a maioria da população que permanecia alijada da possibilidade de tornar-se cidadãos. Estas oligarquias muitas vezes sequer cumpriam as leis que elas mesmas, no poder, decretavam. Concordo aqui com a afirmação de Claudia Viscardi, quando diz que "a incapacidade do sistema de absorver as mudanças profundas vividas pelo país, ao longo da década de vinte, ocasionaram o seu lento e progressivo esgotamento".34 34 VISCARDI, Cláudia M. Ribeiro. O teatro das oligarquias: uma revisão da "política do café com leite". Belo Horizonte: C/Arte, 2009, p. 220. Na greve, os gráficos exigiam o cumprimento das leis:

lutamos pela lei de férias, pela proteção efetiva às mulheres operárias, pela real aplicação das leis dos menores, porque usamos de um direito facultado aos trabalhadores de quase todo o mundo pela própria burguesia, indo até a paralisação do trabalho como meio mais eficiente de conquistar aquilo a que temos o direito, mas que nos é negado pelo capitalismo todo poderoso...35 35 O Trabalhador Gráfico. Boletim da greve, São Paulo, p. 2, 20/04/1929. . Citado por SILVA, Zélia Lopes da. A face oculta da reprodução: um estudo sobre os trabalhadores industriais de São Paulo, 1930-34. Campinas, SP: Universidade Estadual de Campinas, 1983 (História, Dissertação de mestrado), p.67-68.

A greve foi suprimida e os trabalhadores não conseguiram alcançar os direitos almejados. A derrota dos gráficos, mais a crise econômica de 1929 acabaram por imprimir ao movimento operário um recuo em suas lutas e seus periódicos refletiram como um espelho tal recuo.

Da história da crise e seus impactos no Brasil, ainda temos muito que dizer e estudar, principalmente sobre as memórias dos trabalhadores do campo e das fábricas que foram fechadas. Também ainda temos muito que refletir sobre os impactos, talvez não tão imediatos, de todas as crises do capitalismo na vida do homem simples que, no seu cotidiano, vive e luta como pode para sobreviver, sempre a parte dos fluxos de capital volátil que a cada segundo, através das mais avançadas tecnologias de comunicação, transitam de um canto a outro do planeta... Cada vez mais distante do capital apátrida que não parece se preocupar com o destino de nosso mundo, mas com os profits cujos valores são cada vez mais virtuais de tantos zeros que as cifras atingem.

Artigo recebido em: 12/09/2011.

Aprovado em: 01/04/2012.

  • 1 Weber apud ABREU, Alzira Alves de et al. Mídia e política no Brasil: jornalismo e ficção. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2003, p. 14.
  • 2 Schudson apud THOMPSON, John B. O escândalo político: poder e visibilidade na era da mídia. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002, p. 82.
  • 3 THOMPSON, John B. O escândalo político, p.82,
  • 4 ABREU, Alzira Alves de et al. Mídia e política no Brasil, p. 23.
  • 5 SUZIGAN, Wilson. A industrialização de São Paulo: 1930-1945. Revista Brasileira de Economia, Rio de Janeiro, v.25, n.2, p. 96, abr./jun.1971.
  • 6 ARIAS NETO, José Miguel. Primeira República: economia cafeeira, urbanização e industrialização. In: DELGADO, Lucília de Almeida Neves e FERREIRA, Jorge. O Brasil Republicano: o tempo do liberalismo excludente da proclamação da República à Revolução de 1930. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003, p. 133-167.
  • 7 TAUNAY, Visconde de. Encilhamento. Belo Horizonte: Itatiaia, 1976.
  • 8 FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1971, p.179.
  • 9 ARIAS NETO, José Miguel. Primeira República: economia cafeeira, urbanização e industrialização, p.160.
  • 10 SILVA, Sérgio. Expansão cafeeira e origens da indústria no Brasil. São Paulo: Alfa-Omega, 1979.
  • 11 AMARAL, Luís. História geral da agricultura brasileira. 3 v. Rio de Janeiro: Companhia Editora Nacional, 1940;
  • PRADO Jr., Caio. História econômica do Brasil São Paulo: Brasiliense, 1953;
  • e FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil Rio de Janeiro: Brasiliense, 1976.
  • 12 FAUSTO, Boris (dir.). História Geral da Civilização Brasileira. Tomo III: O Brasil Republicano 1. Estrutura de poder e economia (1889-1930). Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2006, p.215-276.
  • 13 MARTINS, José de Sousa. O cativeiro da terra. 9 ed. São Paulo: Contexto, 2010.
  • 14 TAVARES, Maria da Conceição. Da substituição de importações ao capitalismo financeiro. Rio de Janeiro: Zahar, 1972.
  • 15 STEIN, Stanley J. Origens e evolução da indústria têxtil de algodão no Brasil, 1850/1950. Rio de Janeiro: Campus. 1979.
  • 16 DEAN, Warren. A industrialização de São Paulo (1880-1945). São Paulo: Difusão Européia do Livro/EDUSP, 1971.
  • 17 VILLELA, Annibal e SUZIGAN, Wilson. Política do governo e crescimento da economia brasileira: 1889-1945. 2 ed. Rio de Janeiro: IPEA/INPES, 1975.
  • 18 SUZIGAN, Wilson. Indústria brasileira: origem e desenvolvimento. Nova edição. São Paulo: Hucitec/Editora da Unicamp, 2000.
  • 19 NICOL, Robert. A agricultura e a industrialização no Brasil (1850-1930). São Paulo: Universidade de São Paulo, 1974. (História, Tese de doutorado).
  • 20 MELLO, João Manuel Cardoso de. O capitalismo tardio. 8 ed. São Paulo: Brasiliense, 1991.
  • 21 VILLELA, Annibal e SUZIGAN, Wilson. Política do governo e crescimento da economia brasileira.
  • 22 AURELIANO, Liana M. No limiar da industrialização. São Paulo: Brasiliense, 1981.
  • 23 CANO, Wilson. Raízes da concentração industrial em São Paulo. 2 ed. São Paulo: T. A. Queiroz, 1981.
  • 24 VERSIANI, Flávio R. e BARROS, José R. M. de. (orgs.). Formação econômica do Brasil: a experiência da industrialização. São Paulo: Saraiva, 1978;
  • VERSIANI, Maria Teresa R. Proteção tarifária e o crescimento industrial brasileiro dos anos 1906-1912 Brasília: Dep. de Economia da UNB, 1981. (Texto para Discussão).
  • 25 Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 29/10/1929.
  • 26Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 20/10/1929.
  • 31 O crescimento deste órgão de imprensa do Partido Comunista criado em 1ş maio de 1925 obteve grande repercussão já nas primeiras edições, a ponto de logo se esgotar, observando, então, a necessidade de que fosse produzido nas máquinas de O Paiz a partir do segundo número. A economia em crise provocava fortes reflexos sobre os operários que ainda no governo de Washington Luiz estavam excluídos do jogo político e sem direitos sociais, sendo fortemente reprimidos em suas mobilizações. Cf. FERREIRA, Jorge e NEVES, Lucília. O Brasil Republicano, vol. 1.
  • 34 VISCARDI, Cláudia M. Ribeiro. O teatro das oligarquias: uma revisão da "política do café com leite". Belo Horizonte: C/Arte, 2009, p. 220.
  • 35O Trabalhador Gráfico Boletim da greve, São Paulo, p. 2, 20/04/1929.
  • Citado por SILVA, Zélia Lopes da. A face oculta da reprodução: um estudo sobre os trabalhadores industriais de São Paulo, 1930-34. Campinas, SP: Universidade Estadual de Campinas, 1983 (História, Dissertação de mestrado), p.67-68.
  • *
    Este artigo só foi possível devido ao empenho e à colaboração de Taís Sanchez, Odinei Mota, Fernanda Abreu, Thalita Aguiar, Ítalo Mattos, Ana Paula Santiago e Aline Januario, meus queridos orientandos, que auxiliaram na pesquisa de fontes e formatação do artigo. Uma versão resumida foi apresentada no Congresso de 2010 da LASA (Associação de Estudos Latino-Americanos), Toronto, Canadá, de 6 a 9 de outubro de 2010.
  • 1
    Weber apud ABREU, Alzira Alves de et al.
    Mídia e política no Brasil: jornalismo e ficção. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2003, p. 14.
  • 2
    Schudson apud THOMPSON, John B.
    O escândalo político: poder e visibilidade na era da mídia. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002, p. 82.
  • 3
    THOMPSON, John B.
    O escândalo político, p.82,
  • 4
    ABREU, Alzira Alves de et al.
    Mídia e política no Brasil, p. 23.
  • 5
    SUZIGAN, Wilson. A industrialização de São Paulo: 1930-1945.
    Revista Brasileira de Economia, Rio de Janeiro, v.25, n.2, p. 96, abr./jun.1971.
  • 6
    ARIAS NETO, José Miguel. Primeira República: economia cafeeira, urbanização e industrialização. In: DELGADO, Lucília de Almeida Neves e FERREIRA, Jorge.
    O Brasil Republicano: o tempo do liberalismo excludente – da proclamação da República à Revolução de 1930. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003, p. 133-167.
  • 7
    TAUNAY, Visconde de.
    Encilhamento. Belo Horizonte: Itatiaia, 1976.
  • 8
    FURTADO, Celso.
    Formação econômica do Brasil. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1971, p.179.
  • 9
    ARIAS NETO, José Miguel. Primeira República: economia cafeeira, urbanização e industrialização, p.160.
  • 10
    SILVA, Sérgio.
    Expansão cafeeira e origens da indústria no Brasil. São Paulo: Alfa-Omega, 1979.
  • 11
    AMARAL, Luís.
    História geral da agricultura brasileira. 3 v. Rio de Janeiro: Companhia Editora Nacional, 1940; PRADO Jr., Caio.
    História econômica do Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1953; e FURTADO, Celso.
    Formação econômica do Brasil. Rio de Janeiro: Brasiliense, 1976.
  • 12
    FAUSTO, Boris (dir.).
    História Geral da Civilização Brasileira. Tomo III: O Brasil Republicano 1. Estrutura de poder e economia (1889-1930). Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2006, p.215-276.
  • 13
    MARTINS, José de Sousa.
    O cativeiro da terra. 9 ed. São Paulo: Contexto, 2010.
  • 14
    TAVARES, Maria da Conceição.
    Da substituição de importações ao capitalismo financeiro. Rio de Janeiro: Zahar, 1972.
  • 15
    STEIN, Stanley J.
    Origens e evolução da indústria têxtil de algodão no Brasil, 1850/1950. Rio de Janeiro: Campus. 1979.
  • 16
    DEAN, Warren.
    A industrialização de São Paulo (1880-1945). São Paulo: Difusão Européia do Livro/EDUSP, 1971.
  • 17
    VILLELA, Annibal e SUZIGAN, Wilson.
    Política do governo e crescimento da economia brasileira: 1889-1945. 2 ed. Rio de Janeiro: IPEA/INPES, 1975.
  • 18
    SUZIGAN, Wilson.
    Indústria brasileira: origem e desenvolvimento. Nova edição. São Paulo: Hucitec/Editora da Unicamp, 2000.
  • 19
    NICOL, Robert.
    A agricultura e a industrialização no Brasil (1850-1930). São Paulo: Universidade de São Paulo, 1974. (História, Tese de doutorado).
  • 20
    MELLO, João Manuel Cardoso de.
    O capitalismo tardio. 8 ed. São Paulo: Brasiliense, 1991.
  • 21
    VILLELA, Annibal e SUZIGAN, Wilson.
    Política do governo e crescimento da economia brasileira.
  • 22
    AURELIANO, Liana M.
    No limiar da industrialização. São Paulo: Brasiliense, 1981.
  • 23
    CANO, Wilson.
    Raízes da concentração industrial em São Paulo. 2 ed. São Paulo: T. A. Queiroz, 1981.
  • 24
    VERSIANI, Flávio R. e BARROS, José R. M. de. (orgs.).
    Formação econômica do Brasil: a experiência da industrialização. São Paulo: Saraiva, 1978; VERSIANI, Maria Teresa R.
    Proteção tarifária e o crescimento industrial brasileiro dos anos 1906-1912. Brasília: Dep. de Economia da UNB, 1981. (Texto para Discussão).
  • 25
    Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 29/10/1929.
  • 26
    Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 20/10/1929.
  • 27
    Alfredo Pujol (A. Gustavo P.), advogado, jornalista, crítico, político e orador, nasceu em São João Marcos, RJ, em 23 de março de 1865, e faleceu em São Paulo, SP, em 20 de maio de 1930. Eleito em 14 de novembro de 1917 para a Cadeira n. 23, na sucessão de Lafayette Rodrigues Pereira, foi recebido em 23 de julho de 1919, pelo acadêmico Pedro Lessa. Era filho do educador Hippolyte Gustave Pujol e de Maria Castro Pujol. Iniciou os estudos primários com o pai. Transferiu-se para São Paulo, onde concluiu os preparatórios e cursou a Faculdade de Direito, bacharelando-se em 1890. Quando estudante trabalhou como revisor de jornais, exercendo também o magistério particular. O advogado distribuiu a sua atividade no foro criminal e no civil. Foi consultor jurídico da Associação Comercial de São Paulo. A imprensa constituiu sempre a sua atração. Escreveu em jornais de São Paulo, como o
    Diário Mercantil e o
    Estado de São Paulo, de Campinas e do Rio de Janeiro. Iniciou a carreira política em 1888, ainda estudante do 3o ano do curso jurídico. Ao lado de Francisco Glicério, encetou a propaganda republicana com discursos e conferências políticas. Em 1892, o Partido Republicano Paulista elegeu-o deputado estadual. Três anos depois era secretário do Interior, e dedicava-se à causa do ensino. No quadriênio presidencial de Campos Sales, abandonou o mandato de deputado em virtude de divergências políticas. Militou com relevo na campanha civilista de Rui Barbosa, quando a opinião nacional se manifestou contra o militarismo implantado por Pinheiro Machado, com a candidatura do marechal Hermes da Fonseca à presidência da República. Cf:
  • 28
    O
    Jornal do Commercio é, segundo seu próprio site na internet, o mais antigo veículo em circulação ininterrupta na América Latina. A primeira edição do jornal, criado pelo francês Pierre Plancher, circulou no dia 1º de outubro de 1827. Ao chegar ao Brasil, em 1824, Plancher fundou dois jornais, um deles o
    Jornal do Commercio, tendo como foco a economia, com base nas publicações Preços Correntes, Notícias Marítimas e Movimento de Importação e Exportação editadas por Plancher desde sua chegada ao Rio. Em pouco tempo, transformou-se em folha política e comercial. Pedro I, pressionado pelos portugueses, ia fazendo concessões que poderiam prejudicar os brasileiros e o
    Jornal do Commercio, assim, entrou em campo para defender os interesses nacionais, uma característica que preservou ao longo de sua história.
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    O
    Jornal do Commercio é, segundo seu próprio site na internet, o mais antigo veículo em circulação ininterrupta na América Latina. A primeira edição do jornal, criado pelo francês Pierre Plancher, circulou no dia 1º de outubro de 1827. Ao chegar ao Brasil, em 1824, Plancher fundou dois jornais, um deles o
    Jornal do Commercio, tendo como foco a economia, com base nas publicações Preços Correntes, Notícias Marítimas e Movimento de Importação e Exportação editadas por Plancher desde sua chegada ao Rio. Em pouco tempo, transformou-se em folha política e comercial. Pedro I, pressionado pelos portugueses, ia fazendo concessões que poderiam prejudicar os brasileiros e o
    Jornal do Commercio, assim, entrou em campo para defender os interesses nacionais, uma característica que preservou ao longo de sua história.
  • 30
    Mário Nunes (Vassouras RJ 1886 - Rio de Janeiro RJ 1968). Crítico e autor. Um dos fundadores da Associação Brasileira de Críticos Teatrais. Durante mais de 50 anos, de 1913 a 1964, publica crítica teatral no Jornal do Brasil. Na Associação Brasileira de Críticos Teatrais, ABCT, exerce as funções de presidente e vice-presidente. Funda a revista Palcos e Telas. Colabora também para o jornal
    O Malho, e os periódicos
    Paratodos e
    Vida Doméstica.
  • 31
    O crescimento deste órgão de imprensa do Partido Comunista criado em 1º maio de 1925 obteve grande repercussão já nas primeiras edições, a ponto de logo se esgotar, observando, então, a necessidade de que fosse produzido nas máquinas de
    O Paiz a partir do segundo número. A economia em crise provocava fortes reflexos sobre os operários que ainda no governo de Washington Luiz estavam excluídos do jogo político e sem direitos sociais, sendo fortemente reprimidos em suas mobilizações. Cf. FERREIRA, Jorge e NEVES, Lucília.
    O Brasil Republicano, vol. 1. O tempo do liberalismo excludente. Os trabalhadores replicavam às ações do governo através do apoio ao Partido Comunista, bem como da manutenção das suas organizações e, além disso, criando outros jornais menores. Ao que tudo indica, a representação na imprensa das classes populares acabou sendo favorecida pelo desencadear da crise.
    A Classe Operária era um dos porta-vozes de maior expressão dos trabalhadores, alcançando diversos pontos do país na medida em que aumentava a sua tiragem, que chegou a 30.000 em 1928, possuindo mais de 500 correspondentes operários em vários estados que apresentavam as suas necessidades imediatas e suas queixas salariais.
  • 32
    É importante explicitar que o PCB era no período estudado chamado de Partido Comunista do Brasil. Esta denominação é original de sua fundação em 1922, e mostra seu alinhamento com a União Soviética, uma prática comum entre os partidos comunistas do mundo (PCA – Partido Comunista da Argentina; PCE – Partido Comunista da Espanha etc.). No entanto, com as denúncias dos crimes de Stalin (1956) essa vinculação tornou-se problemática e em 1961 o PCB modificou suas diretrizes e procurou mostrar seu distanciamento das crueldades praticadas por Stalin.
  • 33
    Vale lembrar que o café representava cerca de 70% das exportações em
    termos de valor, e não volume ou quantidade.
  • 34
    VISCARDI, Cláudia M. Ribeiro.
    O teatro das oligarquias: uma revisão da "política do café com leite". Belo Horizonte: C/Arte, 2009, p. 220.
  • 35
    O Trabalhador Gráfico. Boletim da greve, São Paulo, p. 2, 20/04/1929. . Citado por SILVA, Zélia Lopes da.
    A face oculta da reprodução: um estudo sobre os trabalhadores industriais de São Paulo, 1930-34. Campinas, SP: Universidade Estadual de Campinas, 1983 (História, Dissertação de mestrado), p.67-68.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Jul 2013
    • Data do Fascículo
      Abr 2013

    Histórico

    • Recebido
      12 Set 2011
    • Aceito
      01 Abr 2012
    Pós-Graduação em História, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Minas Gerais Av. Antônio Carlos, 6627 , Pampulha, Cidade Universitária, Caixa Postal 253 - CEP 31270-901, Tel./Fax: (55 31) 3409-5045, Belo Horizonte - MG, Brasil - Belo Horizonte - MG - Brazil
    E-mail: variahis@gmail.com