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Internacional: "To be or not to be?"

International: "To be or not to be?"

Ser internacional: as revistas acadêmicas brasileiras comungam essa ambição. Entretanto, esse desejo imediatamente impõe definições que guiem as estratégias para sua realização: afinal, o que é um periódico internacional?

Muitas respostas podem ser esboçadas visando essa conceptualização. O periódico deve efetivamente circular entre o público interessado em vários países, além de seguir padrões internacionais básicos que viabilizem a indexação e a verificação dos dados e análises veiculados nos artigos. Precisa também se estabelecer como referência respeitada pelos expert s, assim como se apresentar como veículo atraente para autores de instituições de pesquisa dentro e fora do Brasil. O sistema de submissão oferece transparência de procedimentos, previsibilidade e pontualidade de resultados de avaliação e, em caso de aprovação do artigo, de sua publicação. Uma vez publicados, os artigos logram ampla circulação por meio dos indexadores e portais, cumprindo com eficácia a missão de tornar público o saber produzido. A boa indexação e o Identificador de Objeto Eletrônico (DOI, Digital Object Identifier ) são condições essenciais para a avaliação do impacto dos artigos e dos periódicos. A revista se torna, então, peça de debate, móvel de estímulo da curiosidade científica e instrumento de transformação do mundo pelo poder do conhecimento.

Em relação a essas questões, as novas regras da SciELO têm despertado polêmica. Para a internacionalização, esse portal tem apresentado algumas exigências e, também, benefícios. Entre os privilégios, há o acesso gratuito ao ScholarOne, acompanhado de ampla e competente consultoria sobre sua utilização. Esse sistema de submissão insere o periódico nas redes mundiais, atraindo e facilitando a submissão originária de outros países além do Brasil. Também se afina a padrões internacionais de submissão e agrega respeitabilidade para o periódico aos olhos de leitores, autores e revisores dos mais variados países.

As principais exigências de internacionalização consistem em 20 a 25% de pareceristas e autores de filiação estrangeira, 15% a 25% de editores associados estrangeiros que participem ativamente da gestão dos manuscritos, 25 a 30% de artigos inéditos em inglês. Esses pontos têm aspectos positivos e negativos.

A meu ver, a busca de pareceristas fora do país pode realmente catapultar o prestígio e a qualidade do periódico. De forma alguma isso significa uma atitude colonizada ou de submissão acadêmica. Antes, é uma possibilidade de diálogo profícuo entre experiências diversas. Artigos sobre história da América Latina e Caribe receberão avaliações estimulantes de pesquisadores hispânicos, textos sobre história da África poderão ser proveitosamente julgados por pesquisadores daquele continente. Brasilianistas europeus e norte-americanos também podem oferecer um olhar original. Essas são algumas possibilidades, mas há outras a serem exploradas. O resultado desse diálogo será evidentemente positivo para os autores, em processos editoriais ricos para o aprimoramento dos seus artigos. A percentagem exigida dos pareceres não é tão grande assim, entre 20 e 25%, ou seja, dois a cada dez pareceres deverão contar com avaliador internacional. Vale lembrar que esse contato não se dá necessariamente no eixo norte-sul, mas pode urdir fios diversos na rede de contatos acadêmicos globais.

O mesmo raciocínio vale para a exigência de autoria. Ousaremos apostar na atração de artigos de autores latino-americanos e caribenhos, africanos e asiáticos, especialmente se considerarmos que existem centros de pesquisa sobre América Latina nos quatro cantos do mundo.

A exigência da parceria editorial com estrangeiros é um dos maiores desafios, mas pode resultar em colaborações profícuas, em que esses editores associados sirvam como elementos de divulgação da revista e, também, de proposição de novas práticas, novos objetivos, novos rumos para nossos periódicos, de acordo com a experiência que eles trazem de sua realidade acadêmica. Considerando a inserção crescente de nossos pesquisadores em redes internacionais de pesquisa e conhecimento, também podemos esperar que essa exigência se concretize, mesmo que em longo prazo, com grandes ganhos para nós.

Não obstante tantas expectativas positivas, a porcentagem mínima de autores estrangeiros (20 a 25%) pode viciar nossos processos editoriais. Para cumprir a meta, há sempre o perigo de que editores acabem por privilegiar artigos estrangeiros nem tão bons, em detrimento de outros melhores de autores brasileiros, apenas para cumprir a meta estabelecida.

A exigência de artigos em língua inglesa também merece maior atenção e debate. Afinal, para a área de História, o espanhol e o francês são línguas acadêmicas de grande circulação do conhecimento produzido. Somado a isso, para cumprir a meta, as revistas traduzem, para o inglês, artigos submetidos em português. As dificuldades dessa prática são muitas. Os custos são estratosféricos, em tempo de verbas cada vez mais reduzidas. As traduções nem sempre podem ser feitas com a qualidade necessária: muitos textos têm estrutura narrativa literária, escapam de uma revisão meramente técnica, e o tempo é curto para cumprir a pontualidade necessária das edições quadrimestrais ou trimestrais.

Os desafios são imensos para a área de História, e nossas revistas têm realmente um longo caminho a percorrer, assim como a SciELO precisa sensibilizar-se com aspectos que nos diferenciam de outros campos do conhecimento. O tempo dirá dos desafios, das perdas e dos ganhos. Cabe aos conselhos editoriais pressionarem a SciELO para que considere algumas características da História, mas também é preciso ouvir e valorizar o que esse portal está nos oferecendo e como vem nos estimulando em prol do aprimoramento das revistas. Enfim, é preciso haver disposição – entre os diferentes atores envolvidos – para ouvir, discordar, reavaliar e mudar.

Ninguém duvida que é preciso internacionalizar os periódicos publicados no Brasil, e a História não pode ficar fora disso. Assim, a resposta à pergunta colocada pelo título deste editorial é, certamente, "To be !". Mas o dilema se desloca imediatamente: "How to be international? ". E aqui, "how " expressa duas coisas: quais condições configuram internacionalização? Por quais meios a alcançaremos? E aí sim, podemos concluir, alimentando uma miríade de novas indagações: "that is the question... ".

Agradecimentos

Agradeço ao Tom pelo diálogo e ao Armando Olivetti pela revisão do texto.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Apr 2016
Pós-Graduação em História, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Minas Gerais Av. Antônio Carlos, 6627 , Pampulha, Cidade Universitária, Caixa Postal 253 - CEP 31270-901, Tel./Fax: (55 31) 3409-5045, Belo Horizonte - MG, Brasil - Belo Horizonte - MG - Brazil
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