Acessibilidade / Reportar erro

Direitos de propriedade e cidadania em sociedades pós-conflito: uma comparação entre Guatemala e África do Sul

Property rights and citizenship in post-conflict societies: Guatemala and South Africa compared

Resumos

Este estudo mostra como as disputas de terra dificultaram a solução de conflitos e limitaram a cidadania democrática na Guatemala pós-guerra e na África do Sul pós-apartheid. A agenda de pesquisa fundamenta-se historicamente nos legados da dominação colonial e da ditadura racial. A convergência de regra autoritária e discriminação racial resultou em atos deliberados de expropriação de terras comunais e forçou a remoção e o deslocamento de comunidades nativas. A erradicação de povoados inteiros, a migração de refugiados e a situação de populações transitórias acarretaram um notório abuso do Estado e o enriquecimento das elites. No entanto, o apoio da comunidade internacional à resolução do conflito e à reconciliação negligenciou a importância da terra para a estabilidade democrática e a paz social.

Direito de Propriedade; Solução de Conflito; Cidadania; Democracia


This study compares how land disputes hampered conflict resolution and limited democratic citizenship in post-bellum Guatemala and post-apartheid South Africa. The research agenda is grounded historically in the legacies of colonial domination and racial dictatorship. The convergence of authoritarian rule and ethnic discrimination resulted in deliberate acts of dispossession of communal lands and forced removals and dislocation of indigenous communities. The uprooting of entire villages, and the migration of refugees, and the plight of transient populations entailed egregious state abuse and elite self-enrichment. Yet, the international community's support for conflict resolution and reconciliation neglected the significance of land for democratic stability and social peace.

Property Rights; Conflict Resolution; Citizenship; Democracy


Direitos de propriedade e cidadania em sociedades pós-conflito: uma comparação entre Guatemala e África do Sul* * Trabalho apresentado na 43ª Convenção Anual da Associação de Estudos Internacionais, Nova Orleans, LA, 24-27 de março de 2002. Tradução de Ingrid Sarti - ingridsarti@br.inter.net.

Property rights and citizenship in post-conflict societies: Guatemala and South Africa compared

Mark Everingham

RESUMO

Este estudo mostra como as disputas de terra dificultaram a solução de conflitos e limitaram a cidadania democrática na Guatemala pós-guerra e na África do Sul pós-apartheid. A agenda de pesquisa fundamenta-se historicamente nos legados da dominação colonial e da ditadura racial. A convergência de regra autoritária e discriminação racial resultou em atos deliberados de expropriação de terras comunais e forçou a remoção e o deslocamento de comunidades nativas. A erradicação de povoados inteiros, a migração de refugiados e a situação de populações transitórias acarretaram um notório abuso do Estado e o enriquecimento das elites. No entanto, o apoio da comunidade internacional à resolução do conflito e à reconciliação negligenciou a importância da terra para a estabilidade democrática e a paz social.

Palavras-chave: Direito de Propriedade - Solução de Conflito - Cidadania - Democracia

ABSTRACT

This study compares how land disputes hampered conflict resolution and limited democratic citizenship in post-bellum Guatemala and post-apartheid South Africa. The research agenda is grounded historically in the legacies of colonial domination and racial dictatorship. The convergence of authoritarian rule and ethnic discrimination resulted in deliberate acts of dispossession of communal lands and forced removals and dislocation of indigenous communities. The uprooting of entire villages, and the migration of refugees, and the plight of transient populations entailed egregious state abuse and elite self-enrichment. Yet, the international community's support for conflict resolution and reconciliation neglected the significance of land for democratic stability and social peace.

Key words: Property Rights - Conflict Resolution - Citizenship - Democracy

Introdução

Este estudo analisa comparativamente a maneira pela qual as disputas de terra dificultaram a solução de conflitos e limitaram a cidadania democrática na Guatemala do pós-guerra e na África do Sul pós-apartheid. A pesquisa fundamenta-se historicamente nos legados da dominação colonial e da ditadura racial. A convergência entre o regime autoritário e a discriminação étnica deu lugar a atos deliberados de desapropriação de terras comunitárias e forçou a retirada e o deslocamento de comunidades nativas. A resistência popular aos Estados oligárquicos adquiriu proporções revolucionárias e irrompeu na forma de violência ideológica no final do século XX. Na medida em que a Guerra Fria declinava, porém, os Estados Unidos facilitaram acordos negociados entre os regimes militarizados que protegiam as elites dominantes e os movimentos revolucionários que representavam os grupos étnicos oprimidos.

A tão enaltecida realização dos acordos de paz e as transições para a democracia eleitoral na Guatemala e na África do Sul aumentaram a expectativa dos povos destituídos de direitos civis. Incontáveis violações dos direitos humanos provocaram uma explosão de demandas por justiça individual nos anos 90. Foi alto o preço a pagar pelas investigações em busca da verdade sobre os perpetradores da violência, que constituía o foco dos processos jurídicos (Ellis, 2000). Acordos negociados não abrandaram o terreno político onde se enfrentavam as questões controversas, tais como os custos econômicos e sociais da guerra civil e a distribuição de recursos. A desintegração de vilas inteiras e a migração de refugiados, bem como as condições de vida das populações temporárias, denunciavam o notório abuso do Estado e o enriquecimento das elites. No entanto, o apoio da comunidade internacional para a solução do conflito e reconciliação entre as partes negligenciou a relevância da terra para a estabilidade democrática e a paz social. "A questão da propriedade da terra não recebeu a prioridade que sua importância crucial demanda" (Hendrix, 1996/97)

Nos cenários políticos da Guatemala e da África do Sul, os direitos de propriedade continuam a ser contestados e as disputas contemporâneas impedem a cidadania democrática, enquanto as divisões de classe e de etnia se mantêm enraizadas no marco institucional dessas sociedades pós-conflito. Análises qualitativas de fontes oficiais e dados empíricos recentes demonstram como os esforços governamentais falharam em responder satisfatoriamente às reivindicações coletivas de restituição e distribuição de terra. Batalhas legais e explosões violentas frustraram os programas estatais desenhados pelas agências internacionais com o objetivo de promover o acesso à propriedade da terra nas antigas e frágeis zonas de guerra e nas comunidades rurais fragmentadas. As preferências neoliberais pelo mercado restringiram a capacidade estatal de conciliar o direito legal que protege os direitos individuais e as regras dos costumes que prevalecem nas tradições maias e africanas.

Os Direitos de Propriedade e a Solução do Conflito

O fim da Guerra Fria propiciou maior flexibilidade no ambiente de solução de conflitos, para além do contexto de guerra entre Estados e do desarmamento. A persistência de guerras civis e da violência racial nas regiões em desenvolvimento exigia que novos recursos e métodos fossem dedicados à solução dos conflitos. A finalidade de estabelecer e manter a paz passou a envolver intervenções diretas nos assuntos políticos internos dos Estados sitiados e despóticos.

Nesse sentido, a comunidade internacional engajou-se no processo pós-conflito de construção da paz, em busca da democratização das instituições estatais, da reconstrução da economia e da reconciliação das sociedades partidas. Esse novo mandato exigiu que as Nações Unidas e as organizações regionais se confrontassem com as realidades políticas internas e com limitações institucionais.

"As Nações Unidas não podem produzir ou manipular substancialmente a verdade fundamental; ela é um produto original, o resultado de ferozes batalhas entre grupos locais. A passagem para a lógica do compromisso só surgirá quando todas as partes se convencerem de que seus interesses serão mais bem atendidos através da paz e do processo de democratização" (Bertram, 1995:405).

Os acordos negociados na Guatemala e na África do Sul constituíram um marco fundamental no caminho para a paz e a democracia na América Central e no Sul da África. Não obstante, os resultados obtidos nesses cenários pós-conflitos tinham como base os compromissos políticos estabelecidos entre setores poderosos dos regimes autoritários, por um lado, e revolucionários e reformistas que agiam em nome dos oprimidos, por outro. Para as elites da América Central, a paz era tida como uma oportunidade de colher os benefícios da recuperação econômica no contexto da globalização dos mercados agroexportadores. A implementação dos acordos de paz em El Salvador foi um teste importante da habilidade das Nações Unidas para promover a redistribuição de bens. Em relação ao item crucial do direito de propriedade, as elites salvadorenhas aceitaram a transferência limitada de terra para os antigos combatentes das zonas de guerra, mas rejeitaram uma ampla reforma agrária que visava prover os setores populares removidos e empobrecidos. Assim, as elites negaram-se a assumir a responsabilidade direta pelos custos da guerra e rejeitaram uma maior participação das organizações de massa na alocação de recursos (Pearce, 1998:601-612).

Fatores históricos e estruturais relacionados à autoridade colonial, à tirania política e à miséria social afetaram os resultados dos conflitos modernos nas regiões em desenvolvimento. Pearce (1999) contrasta o destino dos poderosos Estados militares na América Central com os frágeis Estados pós-coloniais na África Subsaariana. A estabilidade estatal em face dos desafios da guerrilha nos anos 80 deixou as elites em El Salvador e na Guatemala em uma posição relativamente forte para defender prerrogativas econômicas nos anos 90. As guerras de libertação nacional e as disputas ideológicas subseqüentes debilitaram muitos dos Estados africanos. Vários regimes de partido único e autocráticos desabaram sob o peso da violência étnica e tribal, revelando a vulnerabilidade das elites africanas depois da Guerra Fria. O caso da África do Sul não se enquadra na trajetória típica de independência e formação do Estado na África Subsaariana. Na verdade, a longevidade do Estado do apartheid baseava-se no uso sistemático da força e na proteção aos privilégios dos brancos. O apartheid,finalmente, sucumbiu à incessante resistência multiclassista e à obstinada pressão internacional.

As circunstâncias políticas internas na Guatemala e na África do Sul não ofereciam um cenário institucional propício ao tratamento dos direitos de propriedade como elemento essencial à democratização e à reconciliação. Os árduos processos em favor da paz, astuciosamente, incluíam garantias para as elites-chave que procuravam restringir o impacto das medidas legais e técnicas sobre seus interesses econômicos vitais. Ambos os países tinham um traço em comum no final dos anos 90: "Novas fontes de conflito localizado [...] surgiam, por exemplo, a respeito da questão da distribuição de terra, só em algumas regiões e sem mencionar a reforma agrária como uma demanda universal" (idem: 55-56). Os métodos de solução de conflitos que integram os direitos constitucionais sobre a propriedade individual, bem como os direitos consuetudinários sobre a propriedade comum e os bens comunitários, podem transcender as fronteiras étnicas e classistas.

"Na Guatemala e na África do Sul [...] foram o racismo e a desigualdade econômica as causas fundamentais da repressão e do desrespeito aos direitos humanos. Uma sociedade democrática em transição deve tentar [...] aprofundar sua democracia e promover o desenvolvimento econômico justo no futuro. O desenvolvimento a longo prazo deve ter como objetivo que todas as pessoas, independente de sua raça, etnia, ou riqueza própria, tenham oportunidades de participar politicamente e de viver vidas minimamente decentes" (Crocker, 2000:107).

Conseqüentemente, os direitos de propriedade constituem um instrumento institucional da maior relevância para erradicar os vestígios da discriminação.

As Heranças do Colonialismo e da Ditadura

As origens dos conflitos étnicos na Guatemala e na África do Sul acham-se profundamente enraizadas no direito colonial e na formação estatal. Embora o tempo e a trajetória dos colonizadores europeus tenham sido diferentes na Guatemala e no Sul da África, a independência e a construção da nação reificaram tudo o que não era nativo em ambos os países. As ditaduras oligárquicas perpetuaram o racismo no período da Guerra Fria, enquanto as prerrogativas das elites sobre a acumulação de riqueza e os direitos exclusivos de cidadania estabeleciam o perfil das instituições estatais. Essas condições estruturais destinavam a propriedade da terra a se tornar a questão privilegiada em um confronto político eivado de disputa ideológica.

O absolutismo ibérico espalhou-se rapidamente ao longo de três séculos na América Latina. A consolidação do poder colonial nos vice-reinados provocou a ampla destituição dos povos nativos de suas terras comunitárias, segundo a lógica da superioridade racial. Os crioulos e mestiços dominantes aproveitaram a aliança política e os privilégios econômicos, até que se tornou evidente que a Coroa espanhola não poderia enfrentar as forças de independência no início do século XIX. Os liberais que seguiram a tradição de Bolívar e os conservadores ainda partidários da Península herdaram a responsabilidade de formação do Estado e de construção da nação (Adams, 1995:52-53). A vitória dos liberais sobre a oposição conservadora no final do século XIX teve impacto dramático na configuração das instituições em toda a América Latina. Começando na Guatemala na década de 1870, as ditaduras republicanas estabeleceram noções imaginárias de igualdade perante a lei e de integração nacional. As famílias da elite mestiça definiram uma cidadania exclusiva através de uma identidade étnica coletiva e da invenção da pureza dos laços sangüíneos e das redes de parentesco (Casaús Arzú, 1999:55-63; Wilson, 1995:27).

O rápido desenvolvimento capitalista no começo do século XX expandiu a produção agroexportadora. Os mercados lucrativos do café, da banana e do açúcar permitiram à oligarquia mestiça consolidar seu controle sobre as políticas econômicas e as normas legais. A expansão dos direitos de propriedade individual provocou uma pressão inexorável sobre as comunidades nativas, instadas a abandonar as terras não demarcadas nas férteis regiões agrícolas. "A supressão dos direitos de todos os nativos e a superioridade assumida dos não-indígenas tornaram impossível qualquer reação efetiva por parte dos primeiros. Pouco, ou quase nada, poderia ser feito no plano local para solucionar os problemas relativos aos direitos da terra e aos direitos consuetudinários" (Adams, 1995:53). As divisões na sociedade guatemalteca a respeito do direito à terra e das oportunidades econômicas adquiriram nítido caráter ideológico depois da Segunda Grande Guerra.

A derrocada de Jorge Ubico interrompeu a tirania liberal em 1944. Um oficial militar populista, Juan José Arévalo, assumiu a Presidência através de eleições nacionais e, gradualmente, estabeleceu uma ordem democrática estável com participação popular e políticas de bem-estar social. Em 1951, seu protegido e sucessor Jacob Arbenz deslanchou uma campanha de organização do campesinato e de reforma agrária. Grandes extensões de terra ociosa foram expropriadas por decreto e redistribuídas aos pequenos e pobres produtores como propriedade comunitária vitalícia. Esta política prejudicou as plantações dos mestiços e da United Fruit Company, que operava na Guatemala desde os anos 20. Como a administração Eisenhower abordava a reforma agrária pelo prisma ideológico da Guerra Fria, em 1954 a CIA enviou centenas de oficiais militares leais à elite terratenente para derrubar o regime de Arbenz. Os militares garantiram o controle oligárquico da agricultura comercial e, por volta de 1962, menos de 5% dos pequenos produtores que haviam sido beneficiados pela redistribuição conseguiam manter sua terra, enquanto praticamente todos os líderes do movimento camponês estavam mortos (Sieder, 1998:101-102; CUC, 1996:1-2).

A revolução cubana inspirou o movimento guerrilheiro emergente a recrutar sua primeira geração de combatentes. Quadros revolucionários concentravam-se nos remanescentes do movimento popular espalhado nas montanhas rurais. O Comitê da Unidade Camponesa (CUC) surgiu em 1972 com o objetivo de propagar as reivindicações de terra comunitária no Departamento de Alta Verapaz e em outros lugares onde os camponeses ocupavam as terras abandonadas ou subutilizadas. A combinação de profunda queda nos preços de exportação e na produtividade somada à mobilização nativa no começo da década de 1980 provocou outra reação ideológica violenta. Em benefício dos proprietários mestiços, entre 1981 e 1983, os regimes militares de Efraím Ríos Montt e Oscar Mejía Víctores efetuaram a campanha da "terra seca",cujos resultados foram o assassinato de, aproximadamente, 100 mil índios e a destruição de quatrocentas aldeias, enquanto 500 mil refugiados deixaram o país rumo ao México e aos Estados Unidos (Adams, 1995:64; CUC, 1996:4).

Em 1982 foi criada a Unidade Revolucionária Nacional Guatemalteca (URNG), resposta armada aos "atos de genocídio contra o povo maia" que ocorreram no campo (United Nations, 2002:2). As guerrilhas contavam com o apoio indireto das organizações nativas, mas poucos índios se tornaram combatentes de fato. O Estado tinha como alvo em especial as aldeias onde funcionavam as cooperativas e as escolas. "O Exército achava que essas aldeias tinham potencial para se tornar simpatizantes dos revolucionários" (Wilson, 1995:218). Embora a administração Reagan tivesse suspendido a ajuda militar oficial à Guatemala entre 1982 e 1985, a CIA, juntamente com Israel e a Argentina, continuaram a colaborar com os militares na contra-revolução. A URNG resistiu, mas as táticas do movimento impediram que os guerrilheiros defendessem os povos maias.

A única experiência colonial na África do Sul marcou a luta pela construção da nação e pela cidadania de modo distinto de qualquer outra nos países da África Subsaariana. Em contraste com os movimentos nacionalistas africanos que conseguiram se libertar da dominação colonial européia após a Segunda Guerra Mundial, os descendentes dos colonizadores brancos foram a força principal por trás da formação do Estado na África do Sul. A partir de 1652, os colonos holandeses e ingleses usurparam as terras das tribos nativas, onde estabeleceram e instalaram mercados agrícolas internos. Pouco depois da vitória da Grã-Bretanha na guerra anglo-bôer de 1899-1902, a maioria dos grupos de colonizadores queria um Estado independente da Coroa. Esse sentimento levou à fundação da União da África do Sul em 1910. As Leis Nativas da Terra, de 1913, proibiam a contratação de camponeses negros como meeiros pelos proprietários brancos e designavam áreas especiais onde os africanos tinham direito a comprar ou alugar a terra. A Lei do Monopólio Nativo da Terra, de 1936, promoveu poderes estatais arbitrários para a aquisição de terras em qualquer lugar fora dessas áreas especiais. A política agrícola da União causou uma grave crise na produtividade, levando muitos brancos africânderes a migrar para áreas industriais urbanas, onde tiveram uma queda em seus padrões de vida (Horowitz, 1991:9-10; Murray e Williams, 1994).

Problemas políticos e econômicos proliferaram entre as elites afluentes de língua inglesa e os africânderes socialmente inferiores. A mobilização política africânder culminou com a vitória eleitoral do Partido Nacional em 1948. Sua liderança era composta de teólogos e intelectuais holandeses e alemães, que "acrescentaram um princípio étnico à categoria racial existente ao dar um novo conteúdo étnico ao rótulo 'africânder' [...] um povo genuíno, diferente, chamado por Deus para realizar seu destino como cristãos". O Partido Nacional exacerbou a profunda contradição entre o cidadão branco e o sujeito africano, através de "um programa massivo de ação afirmativa para os africânderes" (Vestergaard, 2001:20-21). Os fazendeiros africânderes reivindicavam amplas parcelas de terras ocupadas por grupos tribais em antigas e intermináveis disputas territoriais que datavam da chegada dos colonizadores holandeses em 1650.

A formação do Congresso Nacional Africano (CNA), em 1912, deu início à luta pela democracia não racial no interior de uma aliança entre a maioria africana, as comunidades negras e indígenas, e os democratas liberais brancos. O CNA, pacificamente, articulou demonstrações, greves e boicotes e, abertamente, condenou o apartheid em 1955, com a publicação do Manifesto da Liberdade:

"Nós, o povo da África do Sul, afirmamos para que todo o país e o mundo saibam que nosso povo foi privado de seu direito natural à terra, liberdade e paz por uma forma de governo fundada na injustiça e na desigualdade" (ANC, 1955:1).

O Manifesto referia-se explicitamente à expropriação da terra:

"As restrições sobre a propriedade da terra com base em critério racial devem terminar e toda a terra deve ser redistribuída entre aqueles que nela trabalham, de modo a eliminar a fome e a sede de terra" (idem:2).

As leis do apartheid eliminaram as pequenas fazendas de subsistência que dependiam do uso comum da terra. Em 1959, o Decreto de Autogoverno Banto fixou os africanos em áreas nativas demarcadas, onde as severas restrições à propriedade permanente da terra praticamente impossibilitaram a produção comercial. Essa política gerou uma população itinerante de trabalhadores negros em cidades-dormitórios rurais que, diariamente, migravam para os centros urbanos. A insegurança dos sem-teto impediu o CNA de organizar um movimento rural consistente voltado para a recuperação da terra expropriada.

Após ter sido banido em 1960, o CNA reformulou suas prioridades, que passaram da resistência pacífica das massas para o uso da força armada. Em 1961, a criação do Umkhonto we Sizwe (MK) ** ** Em bôer, no original [N.T.]. e das redes clandestinas tornou possível ao CNA obter apoio internacional de governos simpatizantes e organizações de solidariedade. Na medida em que o Estado de terror se intensificou no final dos anos 70 e início dos 80, o Conselho Revolucionário do CNA passou a contar com a filiação de colaboradores não-africanos. A classe trabalhadora industrial, cuja origem se localizava nos distritos negros, criou o Partido Comunista da África do Sul e gerou um movimento sindical forte. O líder comunista Joe Slovo tornou-se o principal estrategista do MK em 1985, tendo como alvo a resistência armada nas agências de segurança estatais. O movimento antiviolência organizou boicotes de consumidores e paralisações do trabalho, visando causar graves perdas de lucro no setor empresarial branco. Além disso, em 1986, os Estados Unidos apoiaram, ainda que tardiamente, a Assembléia Geral das Nações Unidas e a União Européia na condenação ao apartheidcomo crime contra a humanidade (Horowitz, 1991:11-15; ANC, 1997:3-5).

As políticas de exclusão na Guatemala e na África do Sul assumiram as dimensões ideológicas da Guerra Fria e as proporções revolucionárias da luta armada entre o início dos anos 60 e 80. As elites mestiça e africânder arregimentaram todos os meios disponíveis na defesa dos privilégios econômicos contra o que consideravam as monolíticas intrigas comunistas. A repressão debilitou e provocou divergências na estratégia dos revolucionários. O eixo de apoio do CNA dirigiu-se para a resistência urbana das massas nos distritos, enquanto a URNG adotou táticas de sobrevivência de baixa intensidade. Em ambos os casos, as rígidas barreiras de etnia e de classe impediram a realização de compromissos políticos, além de criar obstáculos aos possíveis cenários de desenlace pacífico.

As Nações Unidas e a Paz Negociada

As iniciativas regionais pela paz no Sul da África e na América Central coincidiram com o fim da Guerra Fria. O Conselho de Segurança das Nações Unidas exerceu papel fundamental no armistício da África Ocidental entre Angola, Cuba e África do Sul. Tratado de dezembro de 1988 possibilitou ao Conselho de Segurança persuadir o governo do apartheid a adotar um caminho pacífico para sair do isolamento diplomático e da marginalidade econômica. Em agosto de 1989, a Organização da Unidade Africana, mediante a Declaração de Harare, gerou um complexo debate nas Nações Unidas. Uma sessão especial da Assembléia Geral, ocorrida em 14 de dezembro de 1989, adotou a solução que exigia a democracia não racial na África do Sul (UNGA, 1989). Invocando o espírito da Declaração Universal dos Direitos Humanos, o documento incluiu orientações específicas para uma Constituição baseada na igualdade individual, na cidadania universal e nas liberdades civis. O presidente sul-africano F.W. de Klerk inaugurou o Congresso Nacional em 2 de fevereiro de 1990, decretando o fim da proibição do CNA, que vingou durante trinta anos, e de outras organizações antiapartheid. Nelson Mandela havia sido liberado da prisão uma semana antes. A retirada da Força de Defesa Sul-Africana da Namíbia preparou o caminho para a libertação do país em março de 1990. Em junho, uma equipe das Nações Unidas chegou à África do Sul com o objetivo de elaborar propostas de eliminação do apartheid.

A Guatemala voltou a ter um governo civil em 1985, após severas repreensões da Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas e de uma mudança na política oficial norte-americana no sentido da promoção da democracia. A despeito das extraordinárias restrições constitucionais aos poderes do Executivo, o presidente democrata-cristão Vinicio Cerezo uniu-se a outros presidentes centro-americanos na assinatura do Acordo de Paz Esquipulas II, em agosto de 1987. Esquipulas contemplava os diálogos bilaterais e proibia ajuda externa às forças paramilitares irregulares. O gesto de boa-fé de Cerezo viabilizou a iniciativa da URNG de ter encontros prévios com a Comissão a favor da Reconciliação Nacional, realizados em Oslo em março de 1990 e, um ano depois, com o Comitê Coordenador das Associações de Agricultura, Comércio, Indústria e Finanças [CACIF] da oligarquia mestiça. Esses encontros representaram o estabelecimento de uma agenda com o governo recém-eleito do conservador Jorge Serrano, em 1991. As Nações Unidas mantiveram o statusde observador durante as conferências bilaterais que se realizaram esporadicamente entre 1991 e 1993, mas se tornaram o mediador oficial depois que Serrano deixou o governo em junho de 1993, em conseqüência de uma crise política auto-imposta. O presidente interino, Ramiro de León Carpio, advogado com experiência internacional em direitos humanos, impôs urgência às negociações com a oposição.

A diluição global da ideologia como referência do conflito ofereceu um novo patamar diplomático para que as Nações Unidas pudessem lançar os fundamentos de uma reforma estatal pós-conflito na África do Sul e na Guatemala. Todavia, a paz manifestou-se nas ações obstinadas dos atores políticos internos e nas restrições institucionais do sistema autoritário. Em meados dos anos 80, as ditaduras raciais da África do Sul e da Guatemala demonstraram sua capacidade de resistência às revoltas armadas. As organizações revolucionárias atingiram tal nível de desgaste que foi necessária uma séria reavaliação das estratégias adotadas. As elites interpretaram o tênue impasse militar como uma oportunidade para reverter os prejuízos que afetavam a economia nacional. As oligarquias africânder e mestiça certamente não imaginavam uma mudança radical do regime simultaneamente a uma transformação social dramática. "Nas sociedades oligárquicas, se a democracia tiver de surgir, a relação entre a democracia política e a redistribuição igualitária deve ser controlada" (Wood, 2000:7-8).

A comunidade empresarial branca na África do Sul apresentou propostas (insignificantes) de negociação de acordos, na medida em que sanções econômicas internacionais e boicotes internos começaram a irromper. Membros de associações representantes de empresários e proprietários de terra encontraram-se com líderes exilados do CNA e sindicalistas em Zâmbia, em 1985, e novamente no Senegal, em 1987. Esses contatos informais deram voz às elites econômicas brancas em importantes decisões relativas à alocação de recursos (Charney, 1999). O isolamento internacional do apartheid levou o governo e o CNA à mesa de negociações, mas, no plano nacional, o acordo foi obtido principalmente em termos bilaterais. O Acordo Nacional de Paz, de setembro de 1991, refletia o desejo mútuo de reduzir a incerteza política através da democratização das instituições estatais (Sisk, 1995). Embora o apartheid já não pudesse manter o governo de minoria, o pacto de elite objetivava conter a oposição no âmbito de uma transição pacífica, sem os extremos de ambos os lados. A escalada da violência nos distritos e o êxito do Partido Nacional na colaboração com as organizações negras anti-CNA, em 1992, convenceram o CNA a abdicar do governo de maioria em troca da garantia dos direitos de propriedade (Jung e Shapiro, 1995:289-290; Wood, 2000:182-183). O discurso de Mandela na Conferência de MK, em setembro de 1992, destacou a atuação conjunta da liderança do CNA como fator determinante da vitória eleitoral. "As negociações devem ser percebidas como a culminação de todos os nossos esforços coletivos, através do uso de uma variedade de métodos destinados a alcançar nosso objetivo, [qual seja] a transferência do poder da minoria para a maioria" (ANC, 1993).

Várias agências das Nações Unidas estimularam as negociações na Guatemala com a introdução dos temas da recuperação econômica e do desenvolvimento social em maio de 1995. A agenda acrescida desses itens incitou os membros do CACIF a participar no debate crítico sobre a reforma agrária. A eleição para presidente do candidato do conservador Partido Avanço Nacional, Alvaro Arzú, em novembro desse mesmo ano, aumentou entre os membros do CACIF a confiança de que o governo não abandonaria a questão dos direitos de propriedade privada na mesa de negociações (Jonas, 2000:93-98). O resultado foi o Acordo sobre Temas Socioeconômicos e a Situação Agrária, assinado em maio de 1996, que não menciona a redistribuição geral da terra. Os dispositivos remetiam a responsabilidade pelo desenvolvimento rural, pelo acesso à terra e aos recursos produtivos, e pela solução dos conflitos a iniciativas futuras do governo e da Missão de Verificação das Nações Unidas na Guatemala (United Nations, 1996). Interpretações recentes do acordo indicam um significativo impulso na direção da democracia popular (Jonas, 2001:64; Wood, 2000:203). A análise de Robinson é menos otimista.

"O resultado do conflito regional foi a derrota condicional dos amplos setores populares na América Central bem como a vitória condicional dos novos grupos dominantes [que foi] oficializada nas negociações de paz com apoio internacional no final dos anos 80 e princípio dos 90 [e, ainda,] a transferência das contradições sociais do terreno militar para o âmbito político" (2001:196).

Nem os Estados Unidos nem o pequeno quadro de lideranças da URNG, que representam aproximadamente 3.600 combatentes, conseguiram convencer as elites a assumir inteiramente a responsabilidade pelos custos da guerra (ver Pearce, 1998; 1999; Vinegrad, 1999:220).

A comunidade internacional proclamou o fim da violência étnica conferindo o prêmio Nobel da Paz para a líder maia guatemalteca Rigoberta Menchú, em 1992, e para o líder do CNA Nelson Mandela e o presidente sul-africano F. W. de Klerk, em 1993. Essas comemorações do projeto de paz aumentaram as expectativas sobre os direitos de cidadania e reavivaram, nos africanos e nos maias, a memória coletiva de injustiças acumuladas.

A parte que se segue deste trabalho ilustra o modo pelo qual o ethos neoliberal tratou as demandas de restituição da terra e a redistribuição como problemas técnicos e distorções do mercado, em lugar de considerá-las conseqüências do racismo e da desigualdade a que foram submetidas as comunidades nativas pobres.

Reforma Estatal e Conflito da Terra

Um debate empolgado sobre a reforma da terra e sua restituição estava em curso na África do Sul antes da elaboração final do Acordo Nacional de Paz, de setembro de 1991. Comprovação escrita de posse legal e vínculo espiritual com o direito hereditário e com a comunidade eram critérios que deveriam definir o conceito de propriedade. A questão de saber se os direitos individuais de propriedade precediam o acesso coletivo à terra dividia os formuladores das instituições pós-apartheid(Claassens, 1991:11-12). O CNA lutava pela segurança da posse da terra e por sua redistribuição, e defendia procedimentos de reivindicação de terra em documento partidário de 1992 (ANC, 1992), porém adiou decisões políticas específicas para um momento posterior às eleições nacionais de 1994. Contudo, a vitória ressonante do CNA em abril não excluiu os partidos políticos dos brancos nem as organizações empresariais de novos arranjos democráticos. A distribuição de poder no governo Mandela implicou dois anos de intensas negociações a respeito da definição dos direitos de propriedade.

No período da Constituição interina, interesses diversos aproximavam o resultado das negociações sobre uma Constituição abrangente a uma transição gradual rumo à democracia (Berman e Abdollahian, 1999). À medida que a Assembléia Constituinte concluía seu trabalho, em meados de 1996, o artigo sobre os direitos de propriedade revelou-se polêmico a ponto de adiar a aprovação final da Carta. O Comitê Nacional da Terra (CNT) criticou o processo quando um acordo foi produzido em sessão privada, e responsabilizou o CNA e o Partido Nacional por concordarem em reduzir a capacidade do Estado de executar a reforma agrária (Compromise, 1996). O descontentamento popular e o escrutínio da mídia levaram a uma outra proposta que alarmou a União Agrícola Sul-Africana [SAAU], dominada pelos africânderes. Para o líder do Conselho da SAAU, era preciso estipular um padrão para determinar o grau e o modo de compensação para a terra confiscada. A seguir, a União Agrícola do Transvaal alertou sobre uma quantidade interminável de disputas legais que teriam lugar se a terra fosse expropriada sem método específico de pagamento (Right to property, 1996).

O prefácio da Constituição não apenas reconhece "as injustiças de nosso passado", como também garante que "todo cidadão é igualmente protegido pela lei". O artigo 25 contém uma contradição inerente entre os meios para que os cidadãos negros e de cor obtenham justiça pela expulsão e expropriação de suas terras e a linguagem normativa sobre a expropriação da propriedade (Constitutional Assembly, 1996:9). A aceitação da Constituição pelo CNA foi a saída de uma agenda de liberação nacional para um compromisso de recuperação econômica através do mercado neoliberal (Habib e Padayachee, 2000). A decisão calculada do Partido de abandonar a insistência sobre a reforma agrária abrangente refletiu a fragilidade dos laços políticos com as comunidades rurais que se originaram nos anos 50 (Levin e Weiner, 1996).

O Programa de Desenvolvimento e Reconstrução de 1995 propunha a restituição da terra aos africanos negros que haviam sido removidos pela força por brancos proprietários e por agentes de segurança depois de 19 de junho de 1913, ou que haviam tido suas terras confiscadas sob a autoridade da Lei do Monopólio Nativo da Terra de 1936. A política adotada visava desmantelar as áreas nativas demarcadas onde 75% da população negra morava em 2,3 milhões de hectares, ou 13%, de terra arável. No entanto, em virtude de restrições constitucionais relativas à expropriação arbitrária, a revogação da legislação não assegurava aos povos nativos a possibilidade de retorno imediato. A Comissão de Reivindicação da Terra foi sobrecarregada com um excesso de solicitações de restituição que envolviam basicamente cidadãos negros pobres enfrentando os recursos legais e financeiros dos brancos proprietários (Adams et alii, 1999). Uma vez que milhares de casos aguardavam solução nos arquivos de registros de processos judiciais no final dos anos 90, o Departamento de Assuntos da Terra e a Corte de Reivindicação da Terra empenharam-se em encontrar saídas criativas fora da Corte para as reivindicações. A vitória da comunidade de Getrudesburg na Comissão Regional de Reivindicação de Terras, em novembro de 2001, abriu um precedente para a cooperação informal no sentido de reverter práticas discriminatórias na Província do Nordeste. Governantes locais, líderes da comunidade cristã e fazendeiros brancos perceberam a injustiça da lei de 1936 e das subseqüentes expulsões da terra no início dos anos 60. O governo de Mbeki considerou o caso de Getrudesburg uma evidência da restituição acelerada no período entre 1999 e 2001. O ministro dos Assuntos da Terra Thoko Didiza anunciou um prazo de cinco anos para estabelecer 68 mil famílias mediante iniciativas locais (Zwane, 2002; Mgoqi, 2001).

A União Agrícola Sul-Africana influenciou a equipe de especialistas em desenvolvimento rural do Banco Mundial a propor uma solução de mercado "disposto a comprar - disposto a vender",para resolver o problema de distribuição da terra (Bond, 2000:172-173). A falta de oferta de crédito e de assistência técnica para os compradores pobres e sem-terra, e a baixa qualidade da terra tornada disponível pelos vendedores brancos endividados limitaram o alcance do programa de transferência. O Comitê Nacional da Terra e outras organizações não-governamentais de fazendeiros e trabalhadores rurais questionaram a eqüidade do Banco Mundial na abordagem da reforma agrária (Raid El-Ghomeny, 2001:121-122). O total das transações entre 1994 e 2001 atingiu menos de um milhão de hectares, ou 8% da terra arável, mantendo-se os 5% mais ricos proprietários rurais e comerciantes brancos com o controle de 40% da terra arável das antigas áreas nativas demarcadas. Noventa e quatro por cento dos fazendeiros têm acesso a 5 hectares, ou menos; e a quantidade média de terra dos fazendeiros negros não ultrapassou o nível de 1,3 hectare do apartheid. Depois de sete anos em que esforços governamentais não mudaram a estrutura da propriedade da terra, o Comitê Nacional da Terra pressionou pela expansão das opções de propriedade de acordo com a necessidade dos indivíduos e das comunidades (NLC, 2001:1).

A insegurança legal da propriedade comum nas comunidades nativas é outro fator responsável pelo elevado índice de pobreza e criminalidade nas antigas áreas nativas demarcadas. Uma pesquisa feita pela Unidade de Pesquisa e Desenvolvimento do Sindicato Sul-Africano, em 1998, identificou severas restrições na disponibilidade de bens e recursos para manter a subsistência agrícola. A maior concentração da população rural está na província de KwaZulu Natal, onde 76% da população de 4,9 milhões de habitantes vive em condições abjetas (Deininger e May, 1999:7-11; NLC, 2001:1-2). Em abril de 1994, um acordo entre o CNA, o Partido Nacional e o Partido da Liberdade de Inkatha tornou mais complicada a questão da propriedade da terra na província. A transferência de 95% da terra para o controle do rei Zulu assegurou aos chefes poderosos que o Estado não interviria na alocação da terra tradicional (Wood, 2000:188). Embora o governo estivesse sob forte pressão dos cidadãos descontentes de KwaZulu Natal, que queriam retornar ao seu pedaço de terra, a ilegitimidade das agências estatais e a supremacia da autoridade tradicional impediram uma solução para o conflito. Ondas de invasões de terra, roubos e homicídios atingiram as áreas mais afetadas pela expropriação e pela desintegração da comunidade (Ka'nkosi, 2001).

Na Guatemala, a presença diplomática das Nações Unidas possibilitou ao Banco Mundial participar diretamente da elaboração de um mecanismo de resolução de conflitos e de um projeto de financiamento da terra voltado para esse mesmo objetivo, ou seja, resolver o núcleo do conflito (World Bank, 1998). O Banco supervisionou a criação do órgão Dependência Presidencial sobre a Solução dos Conflitos da Terra (CONTIERRA) em julho de 1997. CONTIERRA tornou-se responsável por nada mais nada menos do que a resolução dos conflitos de terra mediante a restituição às comunidades camponesas removidas, elaboração de uma legislação para registro e titulação da terra, e a implementação de requisitos constitucionais relacionados à substituição de terras não ocupadas (United Nations, 1996). Os dirigentes do CONTIERRA colaboraram com os consultores internacionais para registrar as reivindicações de terra em cada departamento do país. A tarefa era especialmente difícil nas remotas regiões montanhosas rurais de Alta Verapaz, Huehuetenango e Quetzaltenango. Os efeitos da guerra tinham disseminado a competição entre fazendeiros pobres e grupos indígenas pela ocupação defactoda terra. Júris de arbitragem conduziram audiências só em espanhol, e não nas línguas nativas, o que contribuiu para a desconfiança a respeito das intenções estatais. Sem recursos humanos e financeiros, CONTIERRA várias vezes concluiu as investigações sem obter um acordo proveitoso entre as partes (United Nations, 2000:10-11). Assim, quase cinco anos depois da paz negociada, os conflitos de terra permaneceram como a fonte principal de violência e criminalidade nas áreas rurais, onde o positivismo legal não se traduziu imediatamente em comum entendimento da justiça (United Nations, 2001:14).

O Banco Mundial recomendou uma reforma agrária orientada para o mercado para lidar com o caso mais dramático de distribuição desigual da terra na América Latina. O Fundo do Monopólio da Terra (FONTIERRAS) foi promulgado por decreto em 1999, com o objetivo de aglutinar a terra subutilizada para compra pelos fazendeiros pobres e pelas cooperativas. O FONTIERRAS movimentou mais de mil pedidos de indivíduos e grupos, representando mais de 40 mil pequenas famílias proprietárias. No entanto, só 2.800 receberam pouco mais de 13 mil hectares em 1999, enquanto 337 famílias foram contempladas com aproximadamente 2.500 hectares em 2000 (United Nations, 2000:5-8). Para aumentar a produtividade, a abordagem de orientação para o mercado estimulou a doação de títulos de propriedade das terras comunitárias a proprietários individuais, além de promover o fim da propriedade comum (Raid El-Ghomeny, 2001:131-132). Contudo, os preços altos por hectare e a escassez de crédito, combinados aos cortes de verba que resultaram das dotações legislativas em 2000 e 2001 impediram que a oferta de terra disponível atendesse à demanda existente. Por outro lado, as vantagens trazidas pelas agências de desenvolvimento internacional não introduziram mudanças estruturais radicais na propriedade da terra (CONGCOOP/CNOC, 2001). Os setores de subsistência ainda constituem quase 96% dos produtores, que cultivam escassos 20% da terra arável, enquanto os grandes proprietários rurais e comerciantes, que representam apenas 1% de todos os produtores, controlam 70% da área agrícola total (United Nations, 2000:1).

O ressurgimento das comunidades maias em Alta Verapaz ilustra a maneira pela qual os conflitos étnicos, tanto quanto a luta de classes, têm como base o clamor pela terra. A distribuição desigual está certamente relacionada à expansão da produção para exportação. Os maiores proprietários de terra na região são as elites mestiças e os descendentes de imigrantes alemães que chegaram à Guatemala durante a fase inicial do crescimento do café, no final do século XIX. Esses senhores ausentes vivem em áreas urbanas e empregam capatazes e guardas armados para proteger seus complexos agrícolas. Mas, os efeitos do Estado de terror nos anos 80 transformaram a identidade étnica em critério tão importante quanto os conflitos de classe para determinar a legitimidade da propriedade da terra que os povos nativos tiveram confiscada e de onde foram removidos (Wilson, 1995:20-37).

A violência permanente na região de Ixil de Quiché também questiona a validade da interpretação simplista de classe dos conflitos de terra. As lutas contemporâneas são alimentadas por diferentes compreensões do que seja a ocupação legítima (Stoll, 1998:44). Cinco séculos de racismo e opressão não apagaram da memória coletiva o significado cultural de lugares históricos. Até mesmo a tentativa de genocídio étnico efetuada pelos atrozes regimes militares no início dos anos 80 não pôde afastar a espalhada diáspora maia de pedaços específicos de terra. Rigoberta Menchú captou a complexidade do problema quando se dirigiu aos refugiados Ixil que retornavam às suas fazendas: "Nós somos parte da terra (e) precisamos ter a terra para trabalhar e viver, mas agora nos deparamos com a dura realidade de que milhares de guatemaltecos vieram do exílio para ver que suas terras estão ocupadas por novos proprietários" (apud CUC, 1996:5). O Acordo de Reassentamento das Populações Aldeãs Desalojadas pelo Conflito Armado reconhecia que os atingidos eram principalmente os povos nativos rurais que nunca haviam registrado sua terra junto às autoridades estatais (United Nations, 1994). A distância entre "a verdade histórica [e] a verdade documentada" nas remotas regiões como Alta Verapaz e Quiché tornava a solução do conflito extremamente difícil (Conde, 1997).

A Cidadania em Sociedades Pós-Conflito

As transições para a democracia eleitoral na África do Sul e na Guatemala ofereceram alternativas políticas viáveis para povos destituídos de direitos de cidadania que apoiaram movimentos revolucionários. Mas os apelos pela paz da comunidade internacional ecoaram em um momento em que a ideologia neoliberal global impunha aos governos a necessidade de proteger os direitos individuais de propriedade das eventuais transformações profundas das relações sociais. "O que é crucial para os neoliberais é a sólida proteção da liberdade e dos direitos de propriedade, com particular ênfase no poder do Estado de proteger o capital da expropriação e do confisco através da nacionalização ou socialização dos meios de produção" (Gill, 2001:14). Uma compreensão negativa da liberdade levou as oligarquias mestiçasdo pós-guerra guatemalteco e os senhores africânderes do pós-apartheid sul-africano a apelar para a força da lei a fim de preservar seus bens contra a restituição e a redistribuição. A reforma estatal negligenciou a utilidade do direito consuetudinário para solucionar os conflitos e levantou fronteiras institucionais para fazer face às demandas coletivas por direitos de terra.

Na Guatemala, os mediadores das Nações Unidas convenceram o governo a cotejar as questões mais polêmicas dos direitos indígenas durante o processo de paz. As organizações pan-maias defendiam medidas legais para disseminar o mito mestiço da homogeneidade social. O Acordo sobre Identidade e Direitos dos Povos Indígenas, de abril de 1995, apoiava-se na Convenção dos Povos Indígenas e Tribais dos Países Independentes, adotada pela Organização Internacional do Trabalho [ILO], como principal instrumento para promover "o gozo dos direitos gerais de cidadania sem discriminação" (ILO, 1989; United Nations, 1995). Sob os auspícios da administração de De León Carpio, a legislação ratificou a Convenção 169, em março de 1996, e iniciou um debate para reconhecer a Guatemala como um Estado multiétnico de acordo com o direito internacional. A Convenção 169 requer modificações constitucionais para criar os instrumentos legais e administrativos que garantam o título e a proteção, a recuperação, a restituição e a compensação dos direitos das terras indígenas (United Nations, 1995).

Os principais partidos políticos conservadores da Guatemala ganharam as eleições nacionais no final dos anos 90. Tal situação deixava aos advogados do direito consuetudinário uma tarefa desanimadora. Logo que Alvaro Arzú assumiu a Presidência, no final de 1996, sua administração rejeitou a proposta de conceder aos magistrados municipais e locais a jurisdição sobre os conflitos de terra nas áreas rurais. Após uma série de consultas multilaterais, os representantes legais dos direitos indígenas apresentaram uma proposta abrangente para um referendum nacional em maio de 1999. As associações mestiças empresariais e agrícolas opuseram-se veementemente às reformas, "insistindo no direito legal unitário para defender [seus] privilégios históricos" (Sieder, 2001:7). Em uma eleição com apenas 18% de eleitores, 56% votaram contra as cinqüenta propostas de modificação das práticas executivas e legislativas e dos procedimentos judiciais. O resultado desestimulante demonstrou a incapacidade do movimento indígena de forjar um consenso entre os principais partidos políticos e as organizações da sociedade civil, bem como de traduzir a maioria numérica em cidadania efetiva. "Os resultados do referendum revelaram uma séria divisão no país e demonstraram que uma boa parte da população urbana e não-indígena não percebeu nas propostas de multiculturalismo qualquer importância para elas" (United Nations, 2002:1).

A imposição da ordem constitucional depois do colapso da administração colonial na África Subsaariana restringiu a soberania popular. As poderosas elites africanas freqüentemente utilizaram a Constituição para garantir o controle sobre os recursos e limitar a extensão da cidadania a certos grupos étnicos. "O discurso de direitos e o Estado de Direito foram um clamor não apenas dos movimentos populares contra o governo arbitrário, mas também das minorias em busca de um guarda-chuva legal sob o qual pudessem manter e reproduzir seus privilégios" (Mamdani, 1990:372-373). A experiência única da África do Sul com a administração colonial e a formação do Estado desencadeou uma luta acirrada pelos direitos de cidadania por quase um século. O CNA recomendava a resistência multiclassista ao apartheidem defesa da democracia não racial e uma ordem constitucional homogênea. Essa filosofia orientou o CNA em suas negociações com o Partido Nacional, gerando uma contradição na definição de cidadania democrática (Ramphele, 2001:10-11).

A política oficial de terras na África do Sul revelou a impossibilidade de adjudicar as reivindicações indígenas segundo as normas consuetudinárias e de defender os direitos dos proprietários brancos com títulos legais. As sucessivas administrações do CNA, com Mandela (1994-99) e Mbeki (1999-), evitaram apresentar a elaboração de uma lei para os cidadãos africanos e outra para os brancos. Embora os acadêmicos sul-africanos afirmem que o direito internacional protege os direitos de propriedade dos povos nativos, o governo não assinou a Convenção 169 da OIT (Bennett e Powell, 1999:452). A instabilidade política e a violência racial relacionada aos direitos da terra no Zimbábue reanimaram o debate público sobre a redução da pobreza e o desenvolvimento sustentável nas antigas áreas nativas demarcadas (Turner, 2001:2).

Observe-se ainda que o Movimento dos Povos Sem-Terra uniu-se ao Comitê Nacional de Terras em uma áspera crítica à cláusula da propriedade na Conferência Mundial contra o Racismo, ocorrida em Durban, África do Sul, em setembro de 2001.

"Apesar da ambigüidade do objetivo da Seção 25, a posição de facto das relações de propriedade na África do Sul pesou em favor dos beneficiários do apartheid. A proteção à propriedade privada existente através do requisito que os beneficiários do apartheid sejam pagos por 'justa compensação' prejudicou gravemente as perspectivas de uma reforma agrária significativa. A atual cláusula da propriedade eleva o custo da reforma agrária para o Estado" (NLC, 2001a:3).

A proposta continha uma cláusula de "obrigações sociais" que permitiria ao Estado expropriar terras subutilizadas sem compensação e possibilitaria aos povos nativos reivindicar os direitos sobre as terras comuns desde o começo da administração colonial em 1652.

O empenho da comunidade internacional no sentido de resolver os conflitos deve incluir soluções inovadoras para a reforma agrária como condição de êxito dos acordos de paz. Desse modo, as heranças do colonialismo e da ditadura poderão ser administradas com mais eficiência e firmeza. Uma pesquisa recente do Banco Mundial enfatizou a importância do direito consuetudinário da terra nos países em desenvolvimento, onde a restituição e a distribuição potencializam os conflitos políticos (World Bank, 2001:3). A qualidade da cidadania democrática entre as populações nativas depende do seu vínculo histórico e cultural com a terra. O direito consuetudinário não deveria tornar-se um instrumento de subversão da autoridade estatal, mas sim uma forma de eliminar os anacronismos da exclusão legal e da discriminação racial em sociedades como a guatemalteca e a da África do Sul.

(Recebido para publicação em junho de 2002)

  • ADAMS, Martin, SIBANDA, Sipho e THOMAS, Glen. (1999), The Institutional Arrangements for Land Reform: The South Africa Case Apresentação do Departamento de Assuntos da Terra, Republic of South Africa, no workshop de Política Nacional da Terra, Harare, Zimbabwe, 14-15 de junho.
  • ADAMS, Richard. (1995), "Ethnic Conflict, Governance, and Globalization in Latin America, with Special Attention to Guatemala". Ethnic Conflict and Governance in Comparative Perspective. Research Paper, nş215, Woodrow Wilson Center, pp. 51-69.
  • ANC (African National Congress). (1955), The Freedom Charter Congress of the People, Kliptown, South Africa, 26 de junho.
  • ______. (1992), ANC Policy Guidelines for a Democratic South Africa. Adotado na Conferência Nacional, Johannesburg, South Africa, 28-31 de maio.
  • ______. (1993), Keynote Address of the President of the African National Congress, Nelson Mandela MK Conference, Eastern Transvaal, South Africa, 3-4 de setembro.
  • ______. (1997), Strategy and Tactics. Documento de referência na 50Ş Conferência Nacional da ANC, Johannesburg, South Africa, 6 de dezembro.
  • BENNETT, T. e POWELL, C. (1999), "Aboriginal Title in South Africa Revisited". South African Journal of Human Rights, vol. 15, nş4, pp. 449-485.
  • BERMAN, Dianne e ABDOLLAHIAN, Mark Andrew. (1999), "Negotiating the Peaceful Expansion of the South African Electorate". Journal of Conflict Resolution, vol. 43, nş2, pp. 229-244.
  • BERTRAM, Eva. (1995), "Reinventing Governments: The Promise and the Perils of United Nations Peace Building". Journal of Conflict Resolution, vol. 39, nş3, pp. 387-418.
  • BOND, Patrick. (2000), Elite Transition: From Apartheid to Neoliberalism in South Africa London, Pluto Press.
  • CASAÚS ARZÚ, M. E. (1999), "La Metamorfosis del Racismo en la Élite de Poder en Guatemala", in R. Adams, C. Smith e C. Hale (eds.), Racismo en Guatemala: Abriendo el Debate sobre un Tema Tabú. Guatemala, AVANSCO, pp. 47-92.
  • CHARNEY, Craig. (1999), "Civil Society, Political Violence, and Democratic Transitions: Business and the Peace Process in South Africa, 1990 to 1994". Comparative Studies in Society and History, vol. 41, nş1, pp. 182-206.
  • CLAASSENS, Aninka. (1991), "Who Owns South Africa? Can the Repeal of the Land Acts De-Racialise Land Ownership in South Africa?". OccasionalPaper,nş11, University of Witwatersrand, Johannesburg, fevereiro.
  • CUC (Comité Unidad Campesina). (1996), "Breve Historia del Movimiento Campesino". Guatemala: La Situación del Agro, vol. 2, nş12.
  • "Compromise on Property Clause 'Horse Trading': Land Committee". (1996), Sunday Times, Cape Town, 9 de maio.
  • CONDE, Miguel. (1997), "Conflicto por Propiedades Dividen Comunidad Ixil". La Nación, Costa Rica, 14 de abril.
  • CONGCOOP/CNOC (Confederación Guatemalteca de Cooperativas/ Coordinadora Nacional de Organizaciones Campesinas). (2001), FONTIERRAS, Structural Adjustment and Access to Land in Guatemala Washington, Inter-Summit Property Systems Initiative, USAID/OAS.
  • CONSTITUTIONAL ASSEMBLY. (1996), The Constitution of the Republic of South Africa Cape Town, Constitutional Assembly, 8 de maio.
  • CROCKER, David. (2000), "Truth Commissions, Transitional Justice, and Civil Society", in R. Rotberg e D. Thompson (eds.), Truthvs. Justice Princeton, Princeton University Press, pp. 99-121.
  • DEININGER, Klaus e MAY, Julian. (1999), Is there Scope for Growth with Equity? The Case of Land Reform in of South Africa Washington, D.C., World Bank.
  • ELLIS, Stephen. (2000), "Review Essay on the Report of the Truth and Reconciliation Commission, volumes 1-5". Transformation, nş42, pp. 57-72.
  • GILL, Stephen. (2001), Constitutionalizing Inequality and the Clash of Globalizations. Trabalho apresentado na 42Ş Conferência Anual da Associação de Estudos Internacionais, Chicago, IL, 21-24 de fevereiro.
  • HABIB, Adam e PADAYACHEE, Vishnu. (2000), "Economic Policy and Power Relations in South Africa's Transition to Democracy". World Development, vol. 28, nş2, pp. 245-263.
  • HENDRIX, Steven. (1996/97), "Pride of Ownership: Land Tenure and Conflict Resolution". Harvard International Review, vol. 19, nş1.
  • HOROWITZ, Donald. (1991), A Democratic South Africa? Constitutional Engineering in a Divided Society Berkeley, University of California Press.
  • ILO (International Labor Organization). (1989), Convention Concerning Indigenous and Tribal Peoples in Independent Countries Convention 169 of 27 June, Geneva, ILO (http://ilolex.ilo.ch:1567/english/convdisp1.htm).
  • JONAS, Susanne. (2000), "Between Two Worlds: The United Nations in Guatemala", in T. S. Montgomery (ed.), Peacemaking and Democratization in the Western Hemisphere. Miami, North-South Center Press at the University of Miami, pp. 91-106
  • ______. (2001), "Democratization through Peace", in C. Chase-Dunn, S. Jonas e N. Amaro (eds.), Globalization on the Ground: Postbellum Guatemalan Democracy and Development Lanham, MD, Rowman and Littlefield, pp. 49-81.
  • JUNG, Courtney e SHAPIRO, Ian. (1995), "South Africa's Negotiated Transition: Democracy, Opposition, and the New Constitutional Order". Politics and Society, vol. 23, nş3, pp. 269-308.
  • KA'NKOSI, Sechaba. (2001), "Bloodbath Warning on Land Claim". Sunday Times, Cape Town, 25 de novembro.
  • LEVIN, Richard e WEINER, Daniel. (1996), "The Politics of Land Reform in South Africa after Apartheid". Journal of Peasant Studies, vol. 23, nş2/3, pp. 93-119.
  • MAMDANI, Mahmood. (1990), "The Social Basis of Constitutionalism in Africa". Journal of Modern African Studies, vol. 28, nş3, pp. 359-374.
  • MGOQI, Wallace. (2001), End of the Year Message to the Nation on Land Restitution in of South Africa by the Chief Land Claims Commissioner Pretoria, Department of Land Affairs.
  • MURRAY, Colin e WILLIAMS, Gavin. (1994), "Land and Freedom in South Africa". Review of African Political Economy, vol. 21, nş61, pp. 315-325.
  • NLC (National Land Committee). (2001), Black, Rural, and Poor: The Racist Roots of Rural Poverty in South Africa Johannesburg, NLC.
  • ______. (2001a), The Rule of Law, Land Occupations and the Call for a Social Obligations Clause: A Critique of the Constitutional Property Clause Johannesburg, NLC.
  • PEARCE, Jenny. (1998), "From Civil War to 'Civil Society': Has the End of the Cold War Brought Peace to Central America?". International Affairs, vol. 74, nş3, pp. 587-615.
  • ______. (1999), "Peace-Building in the Periphery: Lessons from Central America". Third World Quarterly, vol. 20, nş1, pp. 51-68.
  • RAID EL-GHOMENY, M. (2001), "The Political Economy of Market-Based Land Reform", in K. Ghimire (ed.), Land Reform and Peasant Livelihoods London, United Nations Research Institute for Social Development, pp. 105-133.
  • RAMPHELE, Mamphela. (2001), "Citizenship Challenges for South Africa's Young Democracy". Daedalus, vol. 130, nş1, pp. 1-17.
  • "Right to Property Not Entrenched in New Constitution: SAAU". (1996), Johannesburg Times, 9 de julho.
  • ROBINSON, William. (2001), "Neoliberalism, the Global Elite, and the Guatemalan Transition", in C. Chase-Dunn, S. Jonas e N. Amaro (eds.), Globalization on the Ground: Postbellum Guatemalan Democracy and Development Lanham, MD, Rowman and Littlefield, pp. 189-205.
  • SIEDER, Rachel. (1998), "Customary Rights and Local Power in Guatemala", in R. Sieder (ed.), Guatemala after the Peace Accords London, Institute of Latin American Studies/University of London, pp. 97-115.
  • ______. (2001), Law, Citizenship, and Multiculturalism: Guatemala after the Peace Accords Berkeley, Center for Latin American Studies/University of California.
  • SISK, Timothy. (1995), Democratization in South Africa: The Elusive Social Contract Princeton, Princeton University Press.
  • STOLL, David. (1998), "Human Rights, Land Conflict and Memories of the Violence in Ixil Country of Northern Quiché", in R. Sieder (ed.), Guatemala after the Peace Accords London, Institute of Latin American Studies/University of London, pp. 42-56.
  • TURNER, Stephen. (2001), "Sustainable Development: What's Land Got to Do with It?". SANGONET Newsletter, Johannesburg, 29 de novembro.
  • UNGA (United Nations General Assembly). (1989), Declaration on Apartheid and its Destructive Consequences in Southern Africa (A/RES/S-16/1). New York, General Assembly.
  • UNITED NATIONS. (1994), Agreement on the Resettlement of the Population Groups Uprooted by Armed Conflict Guatemala, MINUGUA, junho.
  • ______. (1995), Agreement on Identity and Rights of Indigenous Peoples Guatemala, MINUGUA, abril.
  • ______. (1996), Agreement on Socioeconomic Aspects and the Agrarian Situation Guatemala, MINUGUA, maio.
  • ______. (2000), The Situation on the Compromises Relative to Landin the Peace Accords Guatemala, MINUGUA, abril.
  • ______. (2001), Conflict sin Guatemala Guatemala, MINUGUA, fevereiro.
  • ______. (2002), Report of the Consultative Group Meeting for Guatemala Misión de Verificación de las Naciones Unidas en Guatemala (MINUGUA). Guatemala, 18 de janeiro.
  • VESTERGAARD, Mads. (2001), "Who's Got the Map? The Negotiation of Afrikaner Identities in Post-Apartheid South Africa". Daedalus, vol. 130, nş1, pp. 19-43.
  • VINEGRAD, Anna. (1998), "From Guerrillas to Politicians: The Transition of the Guatemalan Revolutionary Movement in Historical and Comparative Perspective", in R. Sieder (ed.), Guatemala after the Peace Accords London, Institute of Latin American Studies/University of London, pp. 209-227.
  • WILSON, Richard. (1995), Maya Resurgence in Guatemala Norman, University of Oklahoma Press.
  • WOOD, Elisabeth. (2000), Forging Democracy from below: Insurgent Transitions in South Africa and El Salvador New York, Cambridge University Press.
  • WORLD BANK. (1998), Land Issues in Central America Washington, D.C., Land Policy Network.
  • ______. (2001), Question and Answer on Land Issues at the World Bank. Preparado para o Annual Meeting of the Boards of Governors - 2001, World Bank, International Monetary Fund, Washington, D.C., 29-30 de setembro.
  • ZWANE, Simon. (2002), "Land Claims". Sunday Times, Cape Town, 3 de fevereiro.
  • *
    Trabalho apresentado na 43ª Convenção Anual da Associação de Estudos Internacionais, Nova Orleans, LA, 24-27 de março de 2002. Tradução de Ingrid Sarti -
  • **
    Em bôer, no original [N.T.].
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      19 Jan 2011
    • Data do Fascículo
      Jun 2002

    Histórico

    • Recebido
      Jun 2002
    Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Instituto de Relações Internacionais Rua Marques de São Vicente, 225 - Casa 20 , 22453-900 Rio de Janeiro - RJ - Brasil, Tel.: (55 21) 3527-2284, Fax: (55 21) 3527-1560 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
    E-mail: cintjournal@puc-rio.br