Sensibilidade da face após rizotomia seletiva do trigêmeo

Canelas, Horacio M.; Cruz, O. Ricciardi

doi:10.1590/S0004-282X1961000300001

Resumos

Ainda é controvertida a questão da sensibilidade profunda da face, particularmente no que diz respeito aos nervos incumbidos de sua transmissão. Enquanto alguns autores imputam tal mister ao nervo trigêmeo, outros o atribuem ao intermédio. Discute-se também qual o contingente (pontino ou mesencefálico) que, no trigêmeo, estaria encarregado da condução da sensibilidade proprioceptiva. Com a finalidade de contribuir para a solução do problema, os autores estudaram, em 23 pacientes submetidos à rizotomia seletiva do trigêmeo, as sensibilidades superficiais (tato, dor e temperatura) e profundas (barestesia e palestesia) da face. Foram analisadas estatìsticamente as alterações quantitativas e qualitativas observadas. Foi verificada elevação do limiar das sensibilidades profundas nas hemi-faces ipsolaterais à secção cirúrgica do trigêmeo. A média dos limiares de percepção vibratória nos territórios da face ipsolaterais e correspondentes topogràficamente às fibras radiculares seccionadas mostrou-se significativamente mais elevada que a relativa às hemifaces contralaterais. Entretanto, o estudo qualitativo não demonstrou correlação significativa entre hipoeste-sia vibratória e secção cirúrgica das fibras radiculares, mesmo em 6 pacientes em que ocorrera paresia facial como complicação operatória. Foi observada correlação altamente significativa entre os distúrbios das sensibilidades superficiais (particularmente tátil) e as fibras radiculares seccionadas. Os resultados são comentados à luz dos conhecimentos atuais sôbre a natureza complexa da sensibilidade vibratória. Os autores concluem que o nervo trigêmeo constitui uma das vias seguidas pela sensibilidade profunda da face, desde que se admita como responsável por ela o conjunto, semio-lògicamente indissolúvel, de receptores proprioceptivos situados nos músculos derivados dos dois primeiros arcos branquiais, relacionados com a mastigação e a mímica.

The deep sensibility of the face is still a matter of controversy, particularly in what regards the nerves responsible for its transmission. Some authors ascribe this role to the trigeminal nerve, and others to the nervus intermedius. It is also discussed which part (pontine or mesencephalic) of the trigeminal nerve carries the proprioceptive sensibility. As a contribution to the solution of the problem the authors studied, in 23 patients who underwent selective trigeminal rhizotomy, the cutaneous (touch, pain and temperature) and deep sensations (pressure and vibration senses) of the face. The quantitative and qualitative changes observed were statistically analysed. An increase in the threshold of deep sensations in the side of the face ipsilateral to trigeminal section was evidenced. The mean of the vibratory perception threshold in the facial areas ipsilateral and supplied by the sectioned radicular fibers was significantly higher than the mean relating to the contralateral side of the face. Nevertheless, the qualitative study did not show a significant correlation between vibratory hypoesthesia and surgical section of the radicular fibres, even in six patients who had a slight facial palsy as an operative sequel. A highly significant correlation was found between the changes in exteroceptive sensations (particularly touch) and the sectioned radicular fibers. The results are commented under the light of the current knowledge on the complex nature of the vibration sense. The authors reach to the conclusion that the trigeminal nerve is one of the pathways for the deep sensibility of the face, provided that one regards as responsible for this sensation the totality (indivisible by semiotic methods) of receptors located in the muscles derived from the first and second branchial arches, concerned with mastication and facial expression.

Sensibilidade da face após rizotomia seletiva do trigêmeo

Sensibility in the face following selective trigeminal rhizotomy

Horacio M. Canelas^I; O. Ricciardi Cruz^II

^IAssistente-Docente; Clínica Neurológica (Prof. Adherbal Tolosa) da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

^IIAssistente extranumerário; Clínica Neurológica (Prof. Adherbal Tolosa) da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

RESUMO

Ainda é controvertida a questão da sensibilidade profunda da face, particularmente no que diz respeito aos nervos incumbidos de sua transmissão. Enquanto alguns autores imputam tal mister ao nervo trigêmeo, outros o atribuem ao intermédio. Discute-se também qual o contingente (pontino ou mesencefálico) que, no trigêmeo, estaria encarregado da condução da sensibilidade proprioceptiva.

Com a finalidade de contribuir para a solução do problema, os autores estudaram, em 23 pacientes submetidos à rizotomia seletiva do trigêmeo, as sensibilidades superficiais (tato, dor e temperatura) e profundas (barestesia e palestesia) da face. Foram analisadas estatìsticamente as alterações quantitativas e qualitativas observadas.

Foi verificada elevação do limiar das sensibilidades profundas nas hemi-faces ipsolaterais à secção cirúrgica do trigêmeo. A média dos limiares de percepção vibratória nos territórios da face ipsolaterais e correspondentes topogràficamente às fibras radiculares seccionadas mostrou-se significativamente mais elevada que a relativa às hemifaces contralaterais. Entretanto, o estudo qualitativo não demonstrou correlação significativa entre hipoeste-sia vibratória e secção cirúrgica das fibras radiculares, mesmo em 6 pacientes em que ocorrera paresia facial como complicação operatória.

Foi observada correlação altamente significativa entre os distúrbios das sensibilidades superficiais (particularmente tátil) e as fibras radiculares seccionadas.

Os resultados são comentados à luz dos conhecimentos atuais sôbre a natureza complexa da sensibilidade vibratória. Os autores concluem que o nervo trigêmeo constitui uma das vias seguidas pela sensibilidade profunda da face, desde que se admita como responsável por ela o conjunto, semio-lògicamente indissolúvel, de receptores proprioceptivos situados nos músculos derivados dos dois primeiros arcos branquiais, relacionados com a mastigação e a mímica.

SUMMARY

The deep sensibility of the face is still a matter of controversy, particularly in what regards the nerves responsible for its transmission. Some authors ascribe this role to the trigeminal nerve, and others to the nervus intermedius. It is also discussed which part (pontine or mesencephalic) of the trigeminal nerve carries the proprioceptive sensibility.

As a contribution to the solution of the problem the authors studied, in 23 patients who underwent selective trigeminal rhizotomy, the cutaneous (touch, pain and temperature) and deep sensations (pressure and vibration senses) of the face. The quantitative and qualitative changes observed were statistically analysed.

An increase in the threshold of deep sensations in the side of the face ipsilateral to trigeminal section was evidenced. The mean of the vibratory perception threshold in the facial areas ipsilateral and supplied by the sectioned radicular fibers was significantly higher than the mean relating to the contralateral side of the face. Nevertheless, the qualitative study did not show a significant correlation between vibratory hypoesthesia and surgical section of the radicular fibres, even in six patients who had a slight facial palsy as an operative sequel.

A highly significant correlation was found between the changes in exteroceptive sensations (particularly touch) and the sectioned radicular fibers.

The results are commented under the light of the current knowledge on the complex nature of the vibration sense. The authors reach to the conclusion that the trigeminal nerve is one of the pathways for the deep sensibility of the face, provided that one regards as responsible for this sensation the totality (indivisible by semiotic methods) of receptors located in the muscles derived from the first and second branchial arches, concerned with mastication and facial expression.

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Trabalho da Clínica Neurológica (Prof. Adherbal Tolosa) da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

Clínica Neurológica - Hospital das Clínicas da Fac. Med. da Univ. de São Paulo - Caixa Postal 3461 - São Paulo, Brasil

1. ADRIAN, E. D.; CATTELL, McK.; HOAGLAND, H. - Sensory discharges in single cutaneous nerve fibres. J. Physiol., 72:377-391 (8 agôsto) 1931.
2. ARANA ÍÑIGUEZ, R.; REBOLLO, M. A. - Neuroanatomia, 2ª ed. ínter-Médica, Buenos Aires, 1958, pág. 108.
3. BAZETT, H. C. - Methods of investigation of sensation in man and the theoretical value of results obtained. Proc. A. Res. Nerv. a. Ment. Dis., 15: 83-97, 1935.
4. BRAIN, W. R. - Enfermedades del Sistema Nervioso. Trad. 5ª ed. inglêsa (1955) por E. Audi e R. Muratorio Posse. Ateneo, Buenos Aires, 1958, pág. 32.
5. BROWN, M.; YACORZYNSKI, G. K. - Studies of the sensation of vibration. II: Vibration sensibility in the face following retrogasserian neurectomy. AMA Arch. Neurol, a. Psychiat., 47:813-820 (maio) 1942.
6. van BUSKIRK, C; CALLAWAY, E. - Observations on vibratory thresholds. Confinia Neurol., 16:301-308, 1956.
7. CANELAS, H. M. - Sensibilidade vibratória. Valor semiótico em algumas afecções do sistema nervoso. Arq. Neuro-Psiquiat., 16:275-352 (dezembro) 1958.
8. CHIASSERINI, A. - Estado atual da terapêutica cirúrgica das neuralgias típicas do nervo trigêmeo. Resenha Clín.-Cient., 27:147-151 (maio) 1958.
9. CURSCHMANN, H.; KRAMER, F. - Tratado de las Enfermedades del Sistema Nervioso. Trad. 2ª ed. alemã (1924) por R. Sarro. Labor, Barcelona, 1932, pág. 9.
10. DANOWSKI, T. S.; MOSES Jr., C; MARGOLIS, H. M. - Vibratory sense and oscilometric index in gout and in rheumatoid arthritis. Am. J. M. Sc., 239:295-300 (março) 1960.
11. DAVIS, L. E. - The deep sensibility of the face. AMA Arch. Neurol, a. Psychiat., 9:283-305 (março) 1923.
12. DeJONG, R. N. - The Neurological Examination, 2ª ed., Hoeber, New York, 1958.
13. ECHLIN, F.; FESSARD, A. - Synchronized impulse discharges from receptors in the deep tissues in response to a vibrating stimulus. J. Physiol., 93:312-334, 1938.
14. FOX Jr., J. C; KLEMPERER, W. - Vibratory sensibility: a quantitative study of its thresholds in nervous disorders. AMA Arch. Neurol, a. Psychiat., 48:622-645 (outubro) 1942.
15. FROHRING, W. O.; KOHN, P. M.; BOSMA, J. F.; TOOMEY, J. A. - Changes in the vibratory sense of patients with poliomyelitis as measured by the pallesthesiometer. Am. J. Dis. Child., 69:89-91 (fevereiro) 1945.
16. GORDON, I. - The sensation of vibration, with special reference to its clinical significance. J. Neurol, a. Psychopathol., 17: 107-134, 1936-37.
17. GRINKER, R. R. - Neurology, 3ª ed. Thomas, Springfield, 1945, pág. 335.
18. KEILLER, W. - Nerve Tracts of the Brain and Cord. Mac-millan, New York, 1927, págs. 40-41.
19. KRIEG, W. J. S. - Functional Neuroanatomy. Blakiston, Filadélfia, 1942, págs. 223-226.
20. MASQUIN, P.; TRELLES, J. O. - Precis d'Anatomo-Physiologie Nórmale et Pathologique du Système Nerveux Central, 3ª ed. G. Doin, Paris, 1949, pág. 158.
21. MIRSKY, I. A.; FUTTERMAN, P.; BROH-KAHN, R. H. - The quantitative measurement of vibratory perception in subjects with and without diabetes mellitus. J. Lab. a. Clin. Med., 41:221-235 (fevereiro) 1953.
22. NEWMAN, H. W.; DOUPE, J.; WILKINS, R. W. - Some observations on the nature of vibratory sensibility. Brain, 62:31-40 (março) 1939.
23. PFAFFMANN, C. - Afferent impulses from the teeth resulting from a vibrating stimulus. J. Physiol., 97:220-232 (dezembro) 1939.
24. PÉRILHOU, P.; PIÉRON, H. - a) Le méchanisme de l'excitation vibratoire en reception osseuse ou cutanée. Compt. Rend. Soc. Biol., 136:400-401 (13 junho) 1942. b)Relation de la sensibilité vibratoire avec la frequence. Compt. Rend. Soc. Biol., 136:424-425 (27 junho) 1942. c) Quelques caractéristiques des sensations vibratoires. Compt. Rend. Soc. Biol., 136: 448-449 (11 julho) 1942.
25. PIÉRON, H. - De l'indifférenciation des sensibilités vibratoires par stimulation osseuse ou cutanée dans le comportement des temps de réaction. Compt. Rend. Soc. Biol., 136:11-15 (10 janeiro) 1942.
26. POLLOCK, L. J. - Vibration sense. AMA Arch. Neurol, a. Psychiat., 37:1383-1386 (junho) 1937.
27. RANSON, S. W.; CLARK, S. L. - Anatomia do Sistema Nervoso. Trad, da 9° ed. americana (1953) por O. J. Aidar. Atheneu, Rio de Janeiro, 1955, págs. 249-250.
28. STEINESS, I. - a) Vibratory perception in normal subjects. A biothesiometric study. Acta Med. Scandinav., 158:315-325, 1957. b) Vibratory perception in diabetics. A biothesiometric study. Acta Med. Scandinav., 158:327-335, 1957. c) Bio-thesiometry in the diagnosis of lumbar disk protrusion. Neurology, 8:793-795 (outubro) 1958.
29. STRONG, O. S.; ELWYN, A. - Human Neuroanatomy. Williams & Wilkins, Baltimore, 1943, págs. 216-219.
30. SYMNS, J. L. M. - a) An accurate method of estimating the vibratory sense. Brit. M. J., i:539-540 (9 março) 1912. b) A method of estimating the "vibratory" sensation. Quart. J. Med., 11:33-58 (outubro) 1917.

Datas de Publicação

Publicação nesta coleção
05 Dez 2013
Data do Fascículo
1961

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[1] 1. ADRIAN, E. D.; CATTELL, McK.; HOAGLAND, H. - Sensory discharges in single cutaneous nerve fibres. J. Physiol., 72:377-391 (8 agôsto) 1931.

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[24] 24. PÉRILHOU, P.; PIÉRON, H. - a) Le méchanisme de l'excitation vibratoire en reception osseuse ou cutanée. Compt. Rend. Soc. Biol., 136:400-401 (13 junho) 1942. b)Relation de la sensibilité vibratoire avec la frequence. Compt. Rend. Soc. Biol., 136:424-425 (27 junho) 1942. c) Quelques caractéristiques des sensations vibratoires. Compt. Rend. Soc. Biol., 136: 448-449 (11 julho) 1942.

[25] 25. PIÉRON, H. - De l'indifférenciation des sensibilités vibratoires par stimulation osseuse ou cutanée dans le comportement des temps de réaction. Compt. Rend. Soc. Biol., 136:11-15 (10 janeiro) 1942.

[26] 26. POLLOCK, L. J. - Vibration sense. AMA Arch. Neurol, a. Psychiat., 37:1383-1386 (junho) 1937.

[27] 27. RANSON, S. W.; CLARK, S. L. - Anatomia do Sistema Nervoso. Trad, da 9° ed. americana (1953) por O. J. Aidar. Atheneu, Rio de Janeiro, 1955, págs. 249-250.

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